quarta-feira, 7 de maio de 2008
Um bloquinho no bolso
Às vezes eu gosto de passear no parque da cidade. Geralmente vou sozinho, durante a semana, depois que eu levo as crianças para a escola. É uma maneira de aliviar a cabeça. Na área do parque que eu freqüento, não aparece quase ninguém.
Eu sempre ando com um bloquinho no bolso. E um toco de lápis. É para escrever uma frase qualquer, um trecho de diálogo. Serve também para rabiscar um esboço de um troço que tenha me chamado a atenção. Como o lápis está sempre quebrando a ponta, arrumei um apontador e também ando com ele no bolso. E já que muitas vezes eu preciso apagar, também saio com uma borracha legal. Na verdade, são duas borrachas. Também ando com uma borracha limpa-tipos, bem macia e maleável. É muito boa para retirar a grafite sem estragar o papel.
Para evitar que o bloquinho se estrague, eu uso um porta-blocos adaptado. Na verdade, como os porta-blocos são muito grandes, não cabem no bolso de trás da calça jeans. Depois de muito procurar, achei um porta-cartões muito bom e barato. Parece couro. É preto e todo costurado. Se você apalpar dá para perceber que tem um papelão do lado de dentro. É bonito, não é feio não. E o bloquinho coube bem. Então eu uso um porta-cartão para colocar o bloco.
Com todos esses apetrechos, que cabem na palma da mão, eu vou para o parque e fico passeando. Às vezes eu paro, procuro um banco, uma cadeira. E sento um pouco para anotar as minhas observações. Pode ficar tranqüilo que eu não fico bisbilhotando ninguém. Primeiro porque não é área de Cooper, nem do povo fazer ginástica. Fico bem uma meia hora sem ver outro ser humano. E é incrível, porque estou no meio da cidade. E não vejo ninguém. Nessas horas, eu sempre penso que existe alguma coisa errada comigo. Entre mais de dois milhões de pessoas da cidade, eu sou o único sujeito que vai para esse trecho do parque e fica lá, meia hora, sozinho, uma vez por semana.
Ali perto do banco, descobri que já fiz uma marca de ficar em pé. É dali que eu gosto de olhar as árvores do parque, o grande espelho d´água. O céu. Fico pensando no minimalismo que a minha vida está se tornando. Na minha rotina, essa coisa chinfrim. Na falta de recursos, que me obriga a um certo ascetismo. É nessa hora que eu piso com mais força no chão. Os monges tomam impulso antes de levitar? Como se pega uma mosca com um par de palitos? Para afastar mais elucubrações, eu coloco os fones nos ouvidos. Nem se eu quisesse poderia escutar alguma conversa. Às vezes eu coloco o volume bem alto, que é para não escutar nem os pensamentos. Fico olhando a paisagem. Escuto música nacional. Música estrangeira. Música erudita. Rock pauleira. É bem inofensivo.
Se eu canso de escutar música, então eu vou para casa. Nunca fiquei mais de uma hora nesses passeios. Transcrevo, abaixo, as anotações feitas no bloquinho, nesta quarta-feira:
“Eu perdi a guerra? Mas nem se deram ao trabalho de declará-la”!
“Máquina de ditar bobagens”.
“É que nem fazer ginástica. É preciso esquentar. Rabiscar. Depois escrever”.
“Escrever besteira é melhor do que não escrever”?
“Sentado à beira do caminho, perdi o meu tempo”. (HáHai-Karái)
E, por último, eu desenhei uma formiga. Lá tem muita formiga.
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13 comentários:
velho preciso andar com um bloquinho desses.
preciso também escrever assim, "como" e "o quê" você escreve, pq é muito bom, chapa.
abraço
Eu preciso andar com um bloquinho desses também. Não perder nada...
Paulo, valeu. Um abraço,
Rodrigo,
acompanho também o seu "Terra de Ninguém". O texto do barbeiro é bárbaro. Um abraço,
adorei o hahaha do karai.
O consumismo tem seu preço. No preço, vem incluída a opção por não levar os filhos à escola, não ter bloquinho, não pensar, não parar para escrever e não sofrer pelas dúvidas. Será que vale o preço da conta? Eu não sei...
Um abraço,
Franka, você tem olho clínico!Um abraço,
Mwho,abração.
Meu irmão tb fala HaiKarái...
Aliás tem muita coisa que vc escreve que lembra meu irmão, só que ele não escreve.
BjKas DollKa
Doll, seu irmão tem cabelo? Brincadeira. Beijks
Careca, da próxima vez que for lá, faz uma foto desse seu cantinho no parque e bota aqui pra gente ver.
Deu uma vontade danada de ver esse espelho d'água com as árvores e, se possível, as formigas.
Pisar mais fundo e levantar vôo, tô nessa mas sem sucesso...por enquanto...
beijos!
M.J., também preciso aprender. Bjs
Meu irmão é cabeludo
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