terça-feira, 30 de junho de 2009

Tcham-tcharam-raaam, tcham-tcham-tcharam

Uma das minhas cenas prediletas do cinema é de um filme com o Harrison Ford, acho que é “Os Caçadores da Arca Perdida”. Indiana Jones está cansado de perseguição e pancadaria e um gigante com um turbante começa a agitar uma cimitarra e a gritar com o nosso herói. Ele observa, com quase desdém, o homenzarrão girar e regirar a espada. Dá uma olhada para você, o espectador sagaz. E, então, com um sorriso de lado puxa o revólver e manda bala no gigante. E depois ajeita o chapéu.

O chapéu de Indiana Jones é um Fedora Safari-Brown, custa trinta dólares e pode ser comprado on-line.

segunda-feira, 29 de junho de 2009

El consertador de puertas

O homem que conserta portas

Neste final de semana, fiz a maior pose do mundo para colocar as portas nos armários da cozinha.

As duas outras portas , nos quartos das crianças, eu já havia consertado.

Aproveitando que a minha mulher foi levar as crianças para o exame médico da aula de natação, corri até a loja de mequetrefes para comprar dobradiças, aldrabas e lingüetas. Comprei uma porção. Aí coloquei "Eye Of the Tiger" pra tocar, fiz umas flexões de braço, amarrei uma faixa vermelha na testa, preparei a caixa de ferramentas e sorri para o meu espelho. O melhor sorriso "o-iluminado-jack-nicholson" que eu treino, desde os dezesseis anos.

_It´s too bad she won´t live, but anyway, who does? - eu pergunto, repetindo a última frase de Blade Runner, aquela que a música do Vangelis engole no final.

Depois que Eye of The Tiger terminou, iniciei o gigantesco trabalho de consertar as portas dos armários. Foi bem mais fácil do que eu pensei, mas suei um bocado.
Ao final, minha mulher foi compreensiva. E só fez cara de paisagem para uma porta mal-colocada. Tive que concordar, em silêncio. Dei uma guaribada, ajeitei, mas ainda está ruim. Depois vou ter que colocar novamente. É que já estava de noite, e eu não queria mais fazer barulho. Outro dia arrumo. De verdade. É vero.

Coisas bestas sem o menor sentido

Ao mesmo tempo em que eu procuro me concentrar nas coisas banais e tirar algum proveito dos afazeres cotidianos, eu também me pego fazendo coisas bestas sem o menor sentido.
Por exemplo? Descobri que eu faço caretas para o espelho antes e depois de escovar. São caretas caprichadas, de verdade, com a língua para fora, olho arregalado, dá para ver aquele sino da garganta. Minha filha me surpreendeu, no meio de uma careta, e propôs um concurso. Ela gostou muito da brincadeira. E agora propõe novos concursos de caretas a todo instante, especialmente na hora do almoço.
_Paiê, olha essa! – e ela esbugalha os olhinhos e estica a língua para o lado, franze a testa e puxa os cantos da boca com as mãos.
Ela fica linda de qualquer jeito mas eu faço cara de sério e digo:
_Horrível ! - e repuxo as minhas orelhas, pisco um olho e finjo morder a língua como se fosse um desdentado.
_Argh! – e meu filho também entra na disputa, dobrando as orelhas, pondo a língua para fora, repuxando os olhos igual a um chinês.
Minha mulher assiste a tudo em silêncio. De repente também faz uma careta impressionante.
_Mamãe ganhou! – diz a minha princesinha.
Tenho que concordar com ela.

Todos de férias, menos eu, é claro

É visível a diferença, pela manhã. Todos os três estão radiantes, descansados, brilhantes. Só eu estou com a minha cara de sempre, com o meu terno e gravata de sempre. Meu filho e minha filha acordaram espontaneamente, sem nenhuma reclamação. Mas toda essa felicidade é contagiante. Eu fico feliz por osmose.

domingo, 28 de junho de 2009

Putz, não é que ganhamos!

O futebol é um esporte extraordinário porque nem sempre a melhor equipe vence.
Na Copa das Confederações, o ditado funcionou às mil maravilhas. Não havia uma única equipe boa. Ninguém deu show de bola. E assim, a seleção de Dunga ganhou. O futebol de Lúcio fez a diferença e triunfou.

Dá pra perceber que tem alguma coisa errada porque não escutei um único foguete. Nem sequer um traque. Em termos de empolgação da torcida, a coisa foi chinfrim, chinfrim. Tudo bem, não é copa do mundo, mas sequer um foguete?!

Ô coisa chué.

sábado, 27 de junho de 2009

Dois projetos

Projeto 1 - O melhor do Careca Volume 1
Anteontem falei em projeto e não disse o que era. É bem simples. Uma compilação de crônicas e textos do blog, junto com algumas ilustrações selecionadas dos moleskines.
Já comecei, estarei fazendo aos pouquinhos, todas as noites. A idéia é deixar tudo pronto em PDF e disponibilizar no blog. Serão vinte crônicas e vinte ilustrações.


Projeto 2 - Mário Salimon e o rock de Brasília
Um dia, não foi ontem, faz algum tempo, li no blog do meu amigo Mário Salimon a história da sua trajetória musical. É também um pedaço da história do rock de Brasília e também da minha geração nessa cidade. Mário cantou e conviveu com boa parte dos músicos que se projetaram nacionalmente a partir do cenário musical de Brasília, na segunda metade dos anos oitenta. Um dia tenho que conversar com o Mário sobre a possibilidade dele escrever um livro sobre essas coisas. Só de fotos, ele, o Dulcídio e o César Mendes têm um arquivo enorme.

quinta-feira, 25 de junho de 2009

Um projeto para esse ano

As pessoas costumam virar o ano com projetos para os doze meses seguintes. Mas eu sou meio devagar. Então, finalmente, estou com um projeto para o resto desse ano.

Bié, Michael Jackson
Esse cara sacolejou o planeta com seu pop, com o "andar da lua" e outras esquisitices. É um artista de tirar o chapéu. Mas prefiro lembrar de Michael Jackson ainda menino prodígio, cantando "Ben" ou "ABC", num desenho pop psicodélico que passava na TV da minha infância. "Ben", para quem não sabe, era uma música de filme de terror. Era um rato, o melhor e único amigo de um menino. Não lembro mais do filme. Mas no desenho, toda hora aparecia um ratinho, o Ben. A música é de cortar o coração. E "ABC" é super legal.

quarta-feira, 24 de junho de 2009

Joe Hill é o novo Stephen King

No dia dos namorados, minha mulher me presenteou com um monte de livros. Achei ótimo, é claro. Um desses presentes está me deixando com um medo danado. É a nova fera dos contos de terror. O incrível Joe Hill, com o seu fantástico livro de contos "Fantasmas do Século XX".

Como todos que acompanham este blog sabem, sou um cara que lê no banheiro. Leio em outros lugars, também. Mas durante a semana, predomina o banheiro. E só consigo ler em dois períodos. No período da manhã, das seis às seis e vinte. À noite, é possível estender a leitura por quarenta minutos, mas somente depois das crianças já terem ido pra cama. Se eu leio mais, não consigo atualizar o blog ou só acochambro a atualização.

Mas para conseguir ler alguma coisa, eu preciso despistar a Rose, a cozinheira-governanta-secretária-faxineira-babá-quebradora-de-portas-universitária que trabalha aqui em casa. A Rose não pode ver um livro solto no banheiro que coloca na estante. E como a minha estante é uma bagunça, demoro um tempão para encontrar um livro ali.

Por isso, para despistar a Rose, eu sempre coloco dois livros no banheiro. Desse modo consigo induzir a Rose a pensar que um dos livros pode estar sendo lido pela minha mulher. Como a Rose não é louca de esconder um livro que a minha mulher está lendo na estante, ela acaba deixando os dois livros em paz, no banheiro.

Mas dessa vez não precisei disfarçar. Minha mulher está lendo a bela autobiografia do Isaac Bashevis Singer. Eu leio o Joe Hill.

Recomendo a experiência a quem gosta de suspense. Os contos são absurdos, fantásticos, assustadores, envolventes. E assustadores, também. Joe Hill é um craque. É daqueles escritores que criam uma empatia contigo a partir da primeira frase. Você começa a ler e não para mais. São 17 contos. Até agora, li apenas três contos. E ja estou com pena de ler o próximo porque aí só vão faltar 13 contos. É raro encontrar um escritor que você sabe que é muito bom só de ler umas coisinhas. Joe Hill é um desses caras. Se encontrar numa livraria, compre que é bom mesmo. O livro é da Editora Sextante.

terça-feira, 23 de junho de 2009

Bié,bié, diploma

Eu poderia ficar de fora dessa, afinal já deixei o jornalismo há alguns anos. Mas resolvi deixar a minha opinião sobre o fim da exigência do diploma.

Quem sair da faculdade hoje, só com o diploma de jornalista, é um sério candidato a virar outro tipo de profissional. Já era difícil, mesmo com a exigência do diploma: poucas vagas, competição brutal, pouquíssimos veículos concentrados em rede e controlados por pequenos grupos políticos, acúmulo de funções, horas extras não remuneradas a dar com o pau e baixos salários.

Agora, sem a exigência do diploma: poucas vagas, competição brutal, pouquíssimos veículos, acúmulo de funções, horas extras a dar com o pau, baixos salários e concorrência com especialistas de outras categorias.

O diploma era uma reserva de mercado num mercado autofagista, mas que estabelecia, a seu modo, uma competição entre jornalistas. Mesmo assim, via de regra, jornalista morria cedo, sem grana, cheio de dívidas e com um monte de processos nas costas.

A partir dos trinta anos comecei a ir a enterros dos caras que tinham cinquenta, que eram os chefes diretos. Aos trinta e três, fui a quatro enterros no mesmo ano, todos de jornalistas amigos, na faixa dos cinquenta. Dois deles, Mário e Fausto, foram meus chefes e gurus profissionais. Sabiam tudo, tinham testemunhado e coberto todas as grandes histórias de suas épocas, fumavam feito caiporas e morreram de ataques fulminantes.

Ambos eram ferrenhos adeptos da objetividade.
O fim da exigência não impede:
.um aviltamento salarial ainda maiord.
.o canibalismo e a competição desenfreada por vagas nas empresas de comunicação com outras categorias, como médicos, economistas, advogados, cientistas políticos, etc.

Isso já ocorre há muito tempo na área de publicidade, onde a palavra final é de quem paga.
.a concentração de poder e influência de alguns veículos.

O fim da exigência também não garante:
.maior qualidade dos profissionais de comunicação.
.informação isenta e equilibrada.

O fim da exigência do diploma também não modifica a lógica brasileira da concessão de rádio e tv. O poder costuma premiar os já poderosos com as concessões.

O mundo passa por uma crise de empregos. Muita gente acha que a desregulamentação é uma excelente solução.

Eu tenho as minhas dúvidas.


Go, Gary, go!

O mundo também passa por uma transformação gigantesca do papel e da forma de atuação dos veículos de comunicação. Recentemente, o ilustrador Gary Taxali fez um protesto que atraiu alguma atenção na Internet. Foi contra o Google. O maior site de buscas da Internet, que movimenta bilhões de dólares, enviou a Gary um convite para que ele fizesse uma ilustração para o Google.

_Sim, e o quanto ganho com isso?
_Não lhe pagaremos nada. Ganharás a divulgação do seu trabalho para zilhões de pessoas no planeta.
_Vão se f... - respondeu Gary.

No final, tudo o que ele ganhou com a recusa foi o mesmo que o Google disse que ele ganharia. Mesmo assim, fiquei fã do Gary. Ele fez o que todo mundo adorava ver o Carlitos fazer. Chutou a bunda do cartola.

segunda-feira, 22 de junho de 2009

As portas que caem

Como a minha kombi de leitores já sabe, a Rosenereide está fazendo faculdade. A Rosenereide é a governanta, cozinheira, babá, doceira e secretária daqui de casa. E as coisas estavam indo muito bem. Mas os primeiros efeitos da educação superior já começaram a se fazer sentir. As portas dos armários daqui de casa estão todas caindo. É o efeito "portageist". Em duas semanas, três portas de armários da cozinha e duas dos armários dos quartos dos meninos já se foram. Cinco portas em 14 dias. Uma proporção altíssima de queda de porta por dia da semana.

Hoje consegui arrumar duas. As três portas da cozinha não dou conta de consertar, só chamando um marceneiro. As dobradiças se foram. O lugar das dobradiças se espedaçou. Felizmente, as férias da faculdade da Rose estão chegando. Começam na semana que vem. Só me restavam três portas de armário intactas.

domingo, 21 de junho de 2009

Uma ligação internacional

O Cabeça e a Mulher do Cabeça estão na Itália, uma diferença de quatro horas a mais no relógio. Por isso, aproveitando o fato de que fiquei acordado até a meia-noite de sexta-feira, resolvi ligar para o Cabeça só para ver se ele lembrava da minha encomenda. O Cabeça é meio esquecido.
_Alô, Cabeça?
_UOm,,,mdslmçlkhjçoçl çlmçmçl,mlçlkjuta!
_É o Careca, Cabeça. Quantas horas aí na Itália?
_JLkjlkjlkajçlkjçalkjçdfaoeihjoihq´éiouroie´riwej´rjcquta!!
_A ligação está meio ruim, Cabeça. Parece que você está falando com uma fronha na boca. Está tudo bem, Cabeça? Bom, deve ser o fuso horário. Aí devem ser umas quatro horas da manhã, certo?
_Podsueojpoeipeoiviaypodoiupoiqu´´qoe´powiqjfkjçflqiwejpqoywipfuehphççlkjçlkjlkjtuta!
_Tá legal, bicho. A conversa está muito boa, mas não quero mais tomar o seu tempo, amigo...
_Tlçakjçlkjeoijpoiqjpoijepijproijqepofjçalkjlçkamvnvoahuiuivaitomarklhjoqjóiejauta!
_Sim, agradeço muito. Olha, e se não for muito incômodo, não esquece aquela pizza quatro queijos, hein?
_Pouquehknçkhaçljlkjfoijaçlkfqueopajljhçlakhlkjroriuseufikjlakjlviahlajlkjflaçljlkjçlkjuta!
_Isso mesmo, gruyere, muzzarela, gorgonzola e parmesão. Até lá.


Hoje, com o três a zero sobre a Itália, quase liguei de novo. Afinal, o Cabeça é meio esquecido. Além disso, talvez seja melhor pedir uma napolitana. Rá!



Esse é o meu post de número 600. Eu não sabia que teria tanto a dizer num blog. Muita bobagem, é verdade. Mas também faço sérios exercícios de criatividade e, às vezes, risíveis reflexões sobre as coisas que me acontecem ou deixam de acontecer. De qualquer modo, não imaginei que receberia mais de vinte e seis mil visitas. Considero isso um tremendo privilégio e agradeço especialmente à minha kombi de leitores. Sem vocês, isso já teria perdido a graça. Obrigado.

sábado, 20 de junho de 2009

São João Ninja e a Quadrilha Jazz

Neste sábado fizemos os preparativos para ir à Festa Junina da escola das crianças. Eles mudaram de uma escola alternativa mais perto de casa para uma outra escola um pouco menos alternativa, que é bem mais longe. O estranho é que demoro menos tempo para levar os dois para essa escola. A distância é maior, o trajeto é mais reto e o trânsito é bem menos intenso.

O meu filho e a minha filha, de seis e quatro anos, respectivamente, ensaiaram as quadrilhas exaustivamente nas últimas semanas. Estavam super-animados e felizes. E nós corremos com a preparação para chegar na hora certa, na escola alternativa. A menina quis sardas e trancinhas. Ficou uma caipirinha muito linda com o vestido de chita, cheio de fitas vermelhas e laços. O Chapéu de palha deu um toque todo especial.

A calça jeans do meu filho estava pra lavar. Então tivemos todo um trabalho de convencimento para uma outra calça comprida e para uma camisa de botões. O menino não quis a pintura de bigode fajuto, nem costeleta, nem nada. Só o chapéu-de-palha. Também fez questão de um lenço vermelho. E também ficou um caipira super-bonito com um par de botinas e um cinto com fivela grande, que eu havia feito ainda no ano passado.

A minha mulher preparou uma bandeja enorme de cachorro-quente e um bolo de milho. Também levamos uns quatro litros de suco. Como no sábado o trânsito é bem tranqüilo, chegamos com folga. O clima da escola, de festa caseira, estava muito bom.

E as quadrilhas das crianças foram super-legais, com aqueles meninos todos se atrapalhando com as mímicas e mesuras, os gestos e gentilezas, e errando os passos. Mas todos curtiram, não teve nem choro e nem menino parado no meio da quadra, fazendo beicinho. As crianças estavam se divertindo e a platéia também. Super-legal.

Aí entrou a turma da quarta série. Os meninos vestidos de calça e camisetas pretas. As meninas de colant preto.

_Gente, acho que vai rolar uma quadrilha jazz! – eu falei, só para levar uma cotovelada dolorida da minha mulher nas costelas. Com os olhos, ela me indicou a professora da turma da quarta série. A professora também estava de colant preto e sapatilhas de balé pretas. Ela me olhava como os pitbulls olham para os seres humanos. Ela também disse alguma coisa em iídiche ou sânscrito na minha direção, enquanto batia o pé esquerdo, com as mãos na cintura. Temi pela minha existência medíocre sob aquele olhar rotweilleriano. Se a música não tivesse começado eu teria que ser levado para uma farmácia e submetido ao tratamento contra a raiva e tétano.

A música não era xote, nem baião, nem xaxado e nada que tivesse sanfona, triângulo e zabumba.Em seguida, assisti, escandalizado, à mais terrível demonstração de que a educação infantil caminha rapidamente para a mais corrupta degringolação lisérgica e porra-louca. As crianças não fizeram coisa nenhuma que tivesse a menor parecença com uma quadrilha, com festa junina, ou com pula-fogueira. Parecia um balé Pink Floyd. Uma alegoria para um poema de William Carlos William. Uma dança para los lobos de la marijuana amarga. Mas não falei nada. Aplaudi com todo mundo. Sorri para as crianças. Acenei. Dei tchau. Só no final é que não pude resistir:

_Viva São João Ninja! Viva!!

E dessa vez minha mulher nem me deu cotovelada.

sexta-feira, 19 de junho de 2009

Um poeta entre os canibais

Eles estão por toda parte. Eles estão lá fora. E eles são Canibais. É muito fácil ver todos daqui de cima, pela janela do apartamento. E os canalhas ficam me vigiando.

Aí toca a campainha e chega o Poeta. Nunca avisa, o Poeta. É sempre uma surpresa.

_Pronto, chegou quem faltava! – ele diz e vai correndo abrir uma cerveja, fazer uma bandeja de queijo temperado de tira-gosto. Os poetas são entrões, todo mundo sabe disso. E adoram cerveja, vinho e tira-gosto.

O Poeta examina a geladeira e reclama das coisas que vê.

_Pô, só tem comida saudável! Cadê as salsichas? Cadê as guloseimas?

O Poeta vasculha a geladeira.

_Não tem vodka no congelador?

O Poeta examina os armários.

_Cadê o baconzitos? E o amendoim? Castanha-do-pará? Cadê a macadâmia? O pistache? Pô? Cadê os belisquetis?

E o Poeta, com uma bandeja de gulodices e com a cerveja gelada caminha para o sofá.

_Tem vídeo novo aí? Lá no bolso do meu casaco tem um pirata do novo Transformers, quer ver? Tem um vídeo da Beyoncéé também, do outro lado do casaco. Ué, não curte essas coisas? Que cara mais desantenado. E aposto que nem tem canal adulto da TV a cabo! Acertei!

_Cadê a mulher? Embarangou-se? Tenho de tirar o boné para o Caetano. “Mulher não pode embarangar” é uma das melhores frases do século. O Caetano é demais! O Caetano é um sábio! E viva Paulinho da Viola! E viva Paulinho da Viola!

Mas tem dia que eu não tenho paciência com o Poeta.

Hoje coloquei o Poeta entre os Canibais.

Daqui de cima estou vendo ele tentar convencer os Canibais, na base da metáfora.

Coitado.

Não sobrou nem a unha.

Poetas são descartáveis. E alimentam os Canibais.

quinta-feira, 18 de junho de 2009

O anti-magnetismo animal

_Acho que amanhã vai chover.
_Que nada, vai fazer o maior sol!
_Fiu!
_...!
_De onde vem esse barulho de martelada? Só pode ser desse vizinho de cima, o ex-síndico! Aquele cara é o maior criador de caso.
_Nada disso. O ex-síndico mora do outro lado da prumada. O barulho de quebradeira vem daquela loura esquisita, que desce com o cachorro pelo elevador social.
_Você está enganada. A loura é que mora do outro lado da prumada. E isso é martelada.
_De jeito nenhum. E o ex-síndico era muito gentil. Nunca tive o menor problema com ele. Era solução, aquele cara. Nota dez!
_Xurinbindão,dubiru, dão, dão, era um garotão do... Martelo!
_...! E você vive reparando na loura, hein? Piso quebrado. Isso é barulho de quebra-dei-ra!
_Fiu!
_...!Loura, loura,loura...
_Foi você que falou da loura. Eu nem sabia do cachorro ascensorista.
_Cachorro...
_Amanhã o Brasil vai dar um chocolate nos Estados Unidos. O Robinho vai arrebentar, joga demais aquele chupador de polegar!
_A seleção está numa tremenda maré de sorte. O Robinho não desencanta nem com reza braba.
_Pé-de-pato mangalô! E três vezes!
_....!Viu. Parou a quebradeira.
_É o cachorro da loura que está berrando no chuveiro ou é o ex-síndico?
_Se for o cachorro, ele canta muito bem!
_De que lado você está, afinal?
_Ai, como você é paranóico e chato! E além de tudo é do contra! Não posso falar nada que você vira do avesso. Se eu falo que a nuvem é branca você diz que é preta! Eu não sou obrigada a concordar com tudo o que você fala, ouviu? Vou dormir, boa noite!
_Fiu!
Dizem que os opostos se atraem. Mas dá um trabalho...

terça-feira, 16 de junho de 2009

Auto-sabotagem do Careca

Auto-sabotagem é um tema que vem me cercando nas últimas semanas. Nas minhas navegadas pela Internet, tenho percebido aqui e ali o assunto surgir, na penumbra das telas. Naqueles pixels mais do canto, fugazes e velozes.
Auto-sabotagem é um assunto muito furtivo, que escapa entre os dedos. Por isso também fugi do tema por algum tempo. Mas aí me dei conta de que é melhor falar sobre isso antes que eu seja apunhalado pelas costas por mim mesmo.
A auto-sabotagem é um vício. E para se curar de qualquer vício, o primeiro passo é admitir que você é viciado. Então , para me livrar desse vício, comecei pelo “mea culpa”.
Achei exagero bater no peito e arrancar tufos de cabelos. Até porque só tenho tufos de cabelo no peito e na barriga, sobrancelha não conta. Além disso, ia doer pra caramba.
Então eu olhei para o espelho do banheiro, que está meio ruim, vai ser preciso trocar. Fiquei ali, olhando para o fundo dos meus olhos, nossa, estou com uma verruga nova. Aí esqueci o que eu estava fazendo. Minha memória é uma droga.
Fiz um esforço gigantesco para lembrar o que eu estava fazendo ali. Tentei associar as coisas logicamente. Espelho .Barriga. Tufo. Banheiro. Eu. Verruga. Não deu certo.
Tentei uma outra associação. Sobrancelha. Espelho. Tufo. Barriga. Banheiro. SETBB. SOESTUBARBAN.
_Já sei – eu berrei, completamente cheio da mesma razão diabólica que recheia os enredos de Código da Vinci e Anjos e Demônios .
_ Estou aqui para fazer a barba e tomar banho! Mas é claro! É lógico!
E então eu tomei banho e fiz a barba. Depois, uns trinta minutos depois, eu me lembrei que estava determinado a fazer alguma coisa urgente para me livrar do meu vício de auto-sabotagem. Aí deixei isso pra depois, como faço com a maioria das coisas urgentes.
Isso foi há seis meses, é claro. Hoje foi diferente. Decidi encarar o meu vício de auto-sabotagem na frente do espelho do banheiro e com um mantra.
_Deixe de sabotagem – eu disse, uma vez.
_Deixe de sabotagem – eu disse, outra vez.
_Eu não estou te ouvindo, Careca – disse a minha mulher, fora do banheiro. Tem papel no armário.
_Deixe de... mas que coisa mais besta, ficar falando alto no banheiro – eu disse.
_É besta mesmo – disse o vizinho de cima. O duto de ventilação do banheiro do meu apê é um atentado à privacidade humana. Mas deveria ser estudado por engenheiros de som. Desse meu banheiro, sou capaz de escutar descargas e pei...outros sons de outros 47 banheiros.
Mas do que é que eu estava falando mesmo?

segunda-feira, 15 de junho de 2009

Diálogos com o telemarketing

_Alô, é o Seu Careca?
_Sou eu mesmo.
_Aqui é do Banco TAL, quem está falando é a Jaqueline, e a partir de agora, para sua maior segurança, nós vamos gravar esta conversa. Está tudo bem, Seu Careca?
_Sim, tudo ótimo, obrigado por perguntar.
_Pois então, Seu Careca, nós gostaríamos de confirmar umas informações, é possível?
_Nós quem?
_O quê?
_Não, QUEM. Você disse “nós gostaríamos de confirmar”. Quem é nós?
_Nós, do Banco, né, Seu Careca?
_Ah, você trabalha no banco? Engraçado, não me lembro de ver nenhuma Jaqueline aí na agência.
_Não, eu trabalho PARA o banco, Seu Careca. E estou confirmando algumas informações, tudo bem?
_ Tudo bem, Jaqueline. Já vai gravar?
_Já, já. Já está gravando, Seu Careca, e nós gostaríamos de...
_”Tranquei a vida, nesse a...partamento...”
_Seu Careca? Está tudo bem?
_Pô, Jaqueline, atrapalhou a gravação. Vou ter que começar de novo.
“Tranquei a vida, nesse a...partamento...”
_Seu Careca?
_Pô Jáqui. Você não gosta de Fábio Júnior, é?
_Seu Careca, nós gostaríamos de...
_Tudo bem, eu troco de música.
_Mas Seu Careca!?
_”Eu sou apenas um rapaz, lati no americano, sem dinheironubolso, sem parentes importantes, e vim do interior...”
_Seu Careca?
_Também não gosta de Belchior, Jáqui? Ele é mais fanho do que eu. Pelo menos isso você tem que admitir. Se bem que o fanho do Belchior não é um fanho qualquer, é um diferencial, é marca personalizada, mais até que o bigode...
_Seu Careca?
_Pois não, Jáqui?
_Nós poderíamos ligar um outro dia, num horário mais conveniente?
_Claro. Amanhã, nessa mesma hora. Eu já vou ensaiar desde já...
_Clic.

_Alô, é o Seu Careca?
_Jáqui, é você?
_Não, aqui é do Banco TAL, meu nome é Sandra e a partir de agora, para sua maior segurança, nós vamos gravar esta conversa. Está tudo bem, Seu Careca?
_Tudo ótimo, você conhece a Jaqueline?
_Desculpe, Seu careca, mas já estamos gravando e precisamos confirmar umas informações.
_Pode ir falando que eu confirmo.
_Precisamos do seu nome completo, CPF...
_Pois então, lê daí que eu falo sim ou não.
_Não, é o Senhor que vai dizer.
_Não, eu não dou informação por telefone.
_...Ahnn, nós poderíamos ligar um outro dia, num horário mais conveniente?
_Talvez sim, talvez não.
_...Ahn, e qual seria o melhor dia e o melhor horário?
_Amanhã, nessa mesma hora.

_Alô, é o Seu Careca?
_Jáqui? Sandra? Já está gravando?

domingo, 14 de junho de 2009

Uma peruca para ser MAD Beethoven

A minha vida inteira, percebi outro dia, eu desejei ter um busto de Beethoven na estante. Músico genial, cantado em verso e prosa, homenageado por Chuck Berry e pelos Beatles, Beethoven sempre fez falta aqui em casa. Embora eu só tenha notado essa ausência flagrante depois que eu comprei um kit “aprenda-a-fazer-escultura-sozinho”. Eu ando muito artístico, desde que comecei esse blog.

Ocorre que eu aproveitei um mega-ofertão de uma loja e trouxe um kit desses pra casa, no ano passado. O kit-escultura ficou dentro de um armário, pegando poeira, um tempão. E aí, num dia perto do carnaval, enquanto eu procurava os meninos durante mais uma seção de “Monstro do Armário”, tropecei no kit-escultura.

Depois, passaram mais algumas semanas, o kit empoeirou de novo. E teria ficado mais tempo empoeirado se não fosse o último feriado. É que, no sábado, liguei para o meu amigo Cabeça, para combinar o almoço tradicional de todo sábado.
_Pô, Careca, isso são horas? – ele me disse, à guisa de alô.
_Acorda, vagal, vamos almoçar – eu emendei, de bate-pronto.
_Estou em Lisboa, animal, sofrendo intensamente de jet-lag – ele me informou.
_Pô, Cabeça, o Brasil em crise e você torrando os reais em pastéis de Belém e vinho do Porto, que falta de patriotismo!
_Portugal é só o primeiro pit-stop. Dessa vez, vamos para a Itália – esnobou o Cabeça.
_Aproveita a viagem – falei, desligando o telefone. Só então me toquei da diferença de fuso horário. Então deixei passar mais cinco minutos, que era o tempo do Cabeça voltar a dormir e liguei novamente, é claro.
_Desculpe estar ligando novamente, Cabeça, mas é que senão depois eu esqueço. Aproveitando a sua ida à Itália, pode me fazer um favor?
_Tudo bem, ô Careca, fala aí – ele disse, prestativo.
_ Traz uma marguerita? Não, traz uma quatro queijos!
Considerando a diferença de fuso horário, até que ele não me xingou muito.

O que me traz, novamente, ao assunto da escultura. Bom, eu e minha mulher ficamos sem companhia para o almoço tradicional com o Cabeça e a Mulher do Cabeça, por isso acabamos por almoçar rapidinho. E depois, voltando mais cedo para casa, eu acabei abrindo o kit-escultura. E a primeira lição do kit escultura é fazer uma escultura de uma pessoa que você conheça bem, que é você mesmo. Eu segui todas as instruções cuidadosamente. Usei espelhos. Observei a minha própria cara com atenção. Amassei papel alumínio. Fiz uma base legal. E aí mostrei para a minha mulher:
_Quê ce acha, amor?
_Sei não, me lembra alguém, mas não me lembra você – ela disse, cautelosa.
_Vou ler o manual de instruções de novo – eu disse, resignado.

Fiz mais um esforço artístico e coloquei mais daquela massa plástica. Com a espátula, tentei reforçar relevos, detalhar nariz, boca e olhos. Aí desisti. Sem querer derrubei a cabeça no chão, junto com uma tinta e outros badulaques que estavam sobre a mesa. Enquanto eu lavava as mãos eu escutei ela comentar:
_Agora ficou parecido com o Mad, amor – ela falou, rindo como se me consolasse ter feito um busto ficar parecido com o Alfred Newman sem cabelos.
_E se você colocar uma peruca, vai ficar igualzinho àqueles bustos do Beethoven – ela continuou.
_Acho que eu não me conheço direito – eu falei, a título de desculpa.
_Ou então está ficando surdo – ela completou.
_Vai ver, meu dente da frente vai cair...

sexta-feira, 12 de junho de 2009

Grude

Grude. O melhor apelido que ele inventou para ela foi “grude”. Era bem simbólico. Traduzia um monte de coisas numa palavra curta, fácil de dizer, sem letras repetidas. Perfeito. Grude. Remete a ritmo, parece uma derivação de “grunge”. Mas a principal imagem que a palavra evoca é a de colar, grudar, da cola caseira que usava para grudar papéis em casa. Grude.
Muito usado para colar bandeirinha em cordão, para enfeitar “arraiá” de festa de São João. Muito usado para colar papel de seda de balão e pipa.
Ele ainda se lembrava da última vez que havia feito grude, para colar uma pipa num dia em que a cola havia acabado. Não havia nenhum trocado à vista e nem paciência para ir até a papelaria comprar um pouco. Colocou um pouco de água na colher, maizena (não tinha polvilho doce, que é melhor). Depois levou ao fogo, mexendo com o toco do palito de fósforo e esquentou até borbulhar um pouco, dar liga.
Aí usou o grude para grudar o papel de seda que já havia cortado. A cola improvisada parecia uma geleca transparente, com umas partes meio pretas, tostadas. Quando era menino, uma vez provou o gosto de grude, e não era ruim, era só sem sal. Tinha usado o bambu rachado de um espetinho de churrasco para a armação de varetas. Tudo pronto, atou a linha Corrente 040, própria para empinar pipa, que tinha comprado havia muito tempo. O cabresto da pipa ficou bom, bem equilibrado. A cauda da pipa fez com tirinhas de plástico, nem muito longa nem muito curta, mas de bom tamanho. Com tudo pronto, chamou o filho para ir soltar a pipa. E foi uma tarde muito feliz, porque o menino adorou ver a pipa subir feito um foguete com o vento forte. O plástico da cauda farfalhando numa miríade de reflexos, com barulho de folha seca sendo quebrada.
Mas o apelido surgiu antes do filho e da filha. Grude. Surgiu quando ainda só havia um casal apaixonado, nos tempos de namoro. No tempo em que não conseguiam ficar muito tempo longe um do outro e estavam sempre agarrados. Quando sempre se consultavam antes de fazer qualquer coisa. Na época em que fazia frio debaixo das cobertas. Quando...
_Ué, e não é mais assim?
_É claro que é, grude, mas eu estava tentando fazer uma metáfora...
_Gosto muito de metáfora...
_É bem poético, né?
_Super.

quarta-feira, 10 de junho de 2009

Duas frases espertas

Frases espertas que eu ouvi nos últimos dias:

1 - "O pessoal de design é realmente muito bom de serviço. Embora eles tenham demorado quase 500 anos para colocar rodinhas nas malas."

2 - "A idade da pedra não terminou por falta de pedras. "

terça-feira, 9 de junho de 2009

Parabéns, Donald!

Parabéns, Donald!
Sim, parabéns!
Meu destino é ser um velhinho como Donald, que hoje faz aniversário. Aos 75 anos, é rabugento, mal-humorado e teimoso. Um pato completamente humano.

Me identifico muito com o Donald.
Sou um humano completamente pato. Quém!

O GP do Brasil
Um sujeito me entregou um panfleto na rua. Era uma oferta de pacote de viagem e hospedagem em dez vezes para o GP do Brasil. Fiquei tentado. Nunca vi o GP do Brasil no autódromo. Até hoje, no autódromo, só vi corridas de moto, kart, stock cars, turismo e F-3. E olha que moro pertinho, pertinho de um autódromo.
Nunca vi uma prova de F-1 na arquibancada. Deve ser muito legal. Meu primo Niltim uma vez foi ver um GP Brasil , em Interlagos. Voltou com os olhos brilhando. Conta a história até hoje, rindo que só. Por isso e muito mais, ver o GP do Brasil está na minha lista de coisas que quero fazer antes de 2020. Veja aí:
Lista curta de coisas que eu quero fazer antes de 2020
1 – Aprender a tocar bateria.
2 – Aprender a cozinhar.
3 – Mergulhar.
4 – Velejar no Mediterrâneo.
5 – Aeromodelismo com rádio controle.
6 – Ver os jogos de abertura e final da Copa do Mundo de Futebol.
7 – Ver uma corrida de F1.
8 – Jantar em Praga.
9 – Alpinismo.
10 – Golfe.
O problema dessa lista é que ela é muito dinâmica. Golfe, por exemplo, apareceu esta semana. Jantar em Praga é um clássico. “Mergulhar” voltou depois de um longo período de ausência. Tirei Hipismo. Também tirei Remar em Amsterdam. Velejar é outro clássico. Mas primeiro preciso aprender a velejar. Se bem que também nunca mergulhei. Tanta coisa para aprender. Tanta preguiça para espantar.

segunda-feira, 8 de junho de 2009

As pessoas que travam

Ultimamente, meu radar móvel está aprimorando a capacidade de localizar, com apenas uma varredura, “as pessoas que travam”.
O conceito de “Pessoa que trava” foi desenvolvido há vários anos por um grande amigo meu, o fotógrafo beligerante e sempre bem-quisto Marcelo Feijó. Ele é um dos melhores fotógrafos do país. E de acordo com a mãe dele, a D. Beatriz, também é um dos mais preguiçosos. Na última exposição do Feijó, uns três anos depois da virada do século, D. Beatriz se virou para ele, enquanto Feijó autografava o meu exemplar, e disse:
_Marcelo, quando é que você vai montar exposição com foto nova? Essas aí todo mundo já viu. Desde o tempo dos Ladrões de Alma.
A mais pura verdade. A família Rocha Lima sempre foi conhecida por dizer, na lata, o que passa na cabeça e dá na telha. Pois foi assim, com poucas palavras, que numa noite de cerveja e pizza, Marcelo Feijó definiu ali, no Pizzaiollo, para mim e para o Velho Tom, o que era uma “pessoa que trava”.
_Existem muitos tipos de pessoas. As melhores pessoas são as que fazem as coisas e que também gostam de ver as coisas serem feitas.
_Sei não, parece conversa de voyer – filosofou o Velho Tom.
_Passa a pizza – eu disse.
_As pessoas medianas são as que fazem as coisas mas não se interessam pelo que as outras fazem – continuou o Feijó.
_Sou do time dos heterossexuais – resmungou Velho Tom.
_A marguerita está ótima – eu disse.
_As pessoas baixas são as que não fazem nada e também não se interessam por nada – continuou o Feijó.
_Pervertidos zoófilos – esbravejou o Velho Tom, pedindo a saideira.
_Ué, e as pessoas que travam? –eu perguntei, tolamente.
_Nem me fale! Tenho horror de gente assim! – disse, categórico, Marcelo Feijó.
Pois, então.
Meu radar tem localizado montes e montes dessas pessoas que travam. E quando você menos espera, lá estão elas, olhando sobre os seus ombros, na maior travação. E aí é preciso parar tudo. E dizer, Xô!

domingo, 7 de junho de 2009

O segundo livro que estava lendo

Como a minha kombi de leitores já sabe, eu tenho um estratagema para conseguir ler um livro aqui em casa. Eu escolho dois livros na estante e deixo no banheiro. É a única forma de evitar a fúria organizadora da Rose, a governanta-babá-cozinheira-passadeira e futura assistente social que trabalha aqui em casa. Se eu deixar apenas um livro, a Rose guardará. Com dois, um ela pensa que a minha mulher pode estar lendo um deles. Desse modo, ela não mexe em nenhum.


Dessa vez, no entanto, cometi um erro estratégico com o meu estratagema. Escolhi "Amor e Exílio", a autobiografia até os trinta anos do Isaac Bashevis Singer, o quarto maior escritor de todos os tempos. O primeiro é Dostoiévsky, o segundo é Henry Miller, o terceiro é uma porção de escritores empatados, e o quarto é o Singer, junto com o Canetti.

Pois essa autobiografia, com esse título romântico, meio feminino, eliminou as possíveis dúvidas da Rose. Ela guardou o Motim no Bounty na estante. Demorei dois dias para encontrar o livro na estante. Perdi o pique dessa leitura.

Acabei devolvendo o livro para a estante. Esse é sempre um momento solene. Deixo um pedaço de papel, marcando o ponto onde parei a leitura. Anoto a data e o horário da desistência. E também o motivo. "Perdi o pique". "Achei um saco". "Não vale nada". "Monte de lixo". "Tente outra vez".

Um dia, quando folhear aquele livro novamente na estante, terei ao menos uma pista do que me fez abandonar a leitura. E muitas vezes, o abandono não tem nada a ver com o livro em si, mas com a hora e o dia da desistência.

Ainda Google Maps




Conversando com o Cabeça é que percebi que a nova funcionalidade do Google Maps continua a passar despercebida.

É o seguinte: é como se você mergulhasse do trampolim no copo dágua.

Você mergulha do satélite até a linha do chão.

E lá, você tem uma visão de 360 graus, percorrendo um eixo como o da imagem acima.

É realmente fantástico. Na maioria das vezes você consegue ver cartazes, letreiros, pixações nas paredes. Pessoas que passavam no momento das fotos. Se chovia ou fazia sol.

Acabo de "voltar" de uma rua de Barcelona. Essa aí de cima. Não consegui encontrar o que eu procurava. Um bar mequetrefe onde comi um quibabe com um amigo nepalês. Foi há três anos, mas parece que foi em outra década.

sexta-feira, 5 de junho de 2009

O boleiro está na copa


(Aí perto, nessa rua de Chicago, tem a lanchonete que inventou o Hot-Dog)

Faz tempo que eu não escrevo sobre alguma coisa no trabalho. É porque o ritmo de atividades tem sido tão maluco que não dá tempo de perceber o trivial. Mas hoje, numa hora que eu estava morrendo de raiva de um arquivo perdido por uma pane elétrica, escutei uma pessoa gritar no cubículo atrás de mim:
_O boleiro está na copa! O boleiro está na copa!
Boleiro? Eu estava meio travado e demorei a entender que boleiro é o sujeito que vai de andar em andar para vender bolos. Esse edifício meio burrinho onde eu trabalho tem coisas realmente pitorescas. E o sujeito que vende bolos deve ter um primo na segurança do prédio, porque se eu quiser subir com um pacote preciso explicar mil vezes o que tem dentro. Um vez quis subir com uma caixa de papelão e pensei que teria que passar por uma revista corporal, do jeito que os caras olharam enfezado para mim. Bolas.
E bolos. Houve realmente uma corrida de pessoas até a copa para comprar bolos. Nunca tinha visto isso. A copa é pequena, cabe pouca gente entre a máquina de café e a pia. Mas as pessoas parecem não se importar com aperto, quando é hora de comprar bolo. De longe, do meu cubículo, dava para escutar a galera disputando os bolos.
_Tem de laranja?
_O de mandioca está reservado.
_Ainda tem rocambole?
_Larga!
_Solta!
_É meu, é meu!
E daí a pouco eu vi o desfile de gente passando no corredor, carregando vistosos pedaços de bolo. Bolo de amêndoas. De fubá. De cenoura. De banana.
_E aí Careca? Não vai querer bolo? – disse o C3PO, o cara mais antipático do trabalho.
_Hoje não, obrigado.
_Está de regime, né? – continuou o C3PO.
_Não sou muito fã de bolo.
_Isso é fãbuloso – ele disse, orgulhoso do trocadilho.
_Você que reservou o bolo de mandioca, não foi? – eu perguntei, num tom que considerei “numa boa”.
_É fui eu sim, por quê? Vai fazer piadinha? Vai sacanear? Qual é o problema da mandioca? Vai fazer alguma insinuação? Vai falar sobre preferência sexual? Hã? Hã?
_Vai chupar uma am-pô-la, ô C3 - eu pensei em dizer. Mas não disse. Sexta-feira não é um bom dia para brigar. Estraga o fim de semana. Ao invés disso eu fiquei calado. E eu só ia dizer que também gosto de bolo de mandioca. Numa boa. Além disso, descobri que o meu arquivo não estava perdido. Virei para a minha tela.
_Hein? Não vai falar nada? – insistiu o energúmeno.
Mesmo assim não falei nada. Só mostrei um dedo. O fura-bolos.

quinta-feira, 4 de junho de 2009

Calle Cava de San Miguel



Calle Cava de San Miguel em Madri, na Espanha, o portão de entrada para Plaza Mayor. Um lugar super-legal, mega-turístico de guarda-chuva no drink. Um dia quero voltar.

quarta-feira, 3 de junho de 2009

Minha velhice


(Foto da série Reviajando com o Google Maps)

Eu a vejo com no canto dos olhos. Chegou sorrateira, como quem não quer nada. Depois se esparramou em sulcos e rugas sobre o meu rosto.

Eu a percebi sob a luz mais clara no espelho de aumento do banheiro.

Ali, no aumento do espelho, minha velhice se evidenciou em pelos brancos e adiposidades, em flacidez e cores esmaecidas.

De início, me fiz de sério e respeitoso para a minha velhice. Encolhi a barriga. Fiquei mais em casa. Parei de usar bermudas. Bebi menos. Evitei esportes e esforço físico. Parei de fumar. Ri menos. Eliminei a companhia dos maliciosos.

Foi um erro demente.

É uma mulher frívola, essa minha velhice.

É mais nova do que eu, mas está acabadona.

Ela é vaidosa com suas bolsas, que se expandem enormes e escuras sob meus olhos. E se aproveitou do meu respeito para me deixar mais feio e preguiçoso.

Por isso, depois tentei espantá-la com graças duvidosas, exageros mal-pensados, diversões de outros tempos. Mas já não adianta mais.

Minha velhice está instalada.
É uma coroca malvada, que me rouba palavras e nomes em todas as conversas. Que apaga os números e senhas que preciso lembrar. É ela que me rói o humor, que range os meus dentes quando durmo.

Minha velhice ronca e incomoda minha mulher. Só meus filhos acham graça dos roncos que ela me faz.

É a minha velhice que monta sobre as minhas costas, que me tira o fôlego depois de subir umas poucas escadas. É ela que me faz recusar os convites a bares e farras. (Mas disso também tenho culpa, confesso.)

Minha velhice me quer quietinho num canto de casa. E ali é realmente muito agradável.

É bom pra se ler os clássicos.
Recostar na poltrona, confortável.
Ouvir música baixinho.
Mas acontece pouca coisa.

Minha velhice é chata.

terça-feira, 2 de junho de 2009

Estou com medo de avião




Maps Google Maps

Nesses tempos de medo de avião, recomendo uma re-viagem ao exterior, uma trip cibernética, usando o Google Maps (http://maps.google.com/?ie=UTF8&z=4&om=1&layer=c). Agora, existe a possibilidade de uma navegada tridimensional nas ruas de cidades nos EUA, Espanha, França e alhures.

O novo gimmick permite uma visão panorâmica ao rés do chão, com visão de 360 graus.

É muito, muito, muito legal!!

Acabo de voltar, por exemplo, do Jardin Du Carroussel, o balão/rotatória que fica em frente à pirâmide de vidro do Louvre. E também olhei por debaixo da Torre Eiffel, como podem ver...

Estou com medo de avião. Mas tenho certeza de que passará.


A minha incompetência brazuca

Brasileiros costumam ter uma visão inglória dos brasileiros. Brasileiros gostam de falar no plural, englobando toda a nação em suas generalidades. Nós gostamos de nos dizer todos irmãos. Mas só até a porta do baile, é claro. Ao mesmo tempo, não suportamos que um estrangeiro diga isso para a gente, especialmente se o estrangeiro for um argentino. Um comercial de chinelos, que até recentemente era visto na TV, ilustrava essa situação com rara perspicácia e clareza. Enquanto tomavam uma cerveja, dois brazucas lamentavam os problemas da terrinha, mas bastava um “Hermano” abrir a boca para os dois começarem a desmentir o latino. Minha identificação com esse comercial foi total. Inclusive na preferência pela cerveja. Aliás, me senti o maior patrício, porque achava que era comercial de cerveja. Hoje que me disseram que era comercial de chinelos.

segunda-feira, 1 de junho de 2009

Mais de 25 Mil Visitas

E quase cinquenta mil page-views.
Obrigado a todos.

Um diálogo do almoço em família

_Eu e a minha mulher vimos um filme legal na sexta-feira à noite...
_Que filme? – disse minha irmã.
_Hancock, parecia um filme de super-herói, mas foi muito interessante porque...
_Achei uma droga – ela falou, com autoridade. Ela sempre fala com muita autoridade.
_...!
_É péssimo. Assisti a esse filme quando eu morava nos Estados Unidos. Saímos de casa debaixo de uma nevasca para ir ao shopping. Era a estréia desse filme, com o Will Smith e a Charlize Teron. Chatérrimo. Nem esperamos o final. As piadas não tinham graça, e as cenas de ação eram as piores que eu já tinha visto. Puxei o meu marido e saímos do cinema. Fiquei com uma raiva danada de ter saído de casa, no maior frio, para ver essa porcaria.
_....!
_Filme legal foi um que eu vi no sábado, na TV a cabo. Uma comédia muito engraçada, dirigida pelo Henry Mancinni, o mesmo que fez a música da Pantera Cor-de-Rosa.
_Mancinni nunca dirigiu um filme – eu disse, categórico, como se tivesse acabado de fazer uma busca no Google.
_Dirigiu sim, ele dirigiu um monte de filmes com o Peter Sellers – retrucou minha irmã, com a autoridade de sempre.
_Jamais. Mancinni sempre fez trilha sonora. Ele nunca dirigiu nem curta-metragem. Talvez tenha feito um super-8, um VHS. Mas filme, filme, filme, pra valer, nunca dirigiu. No máximo, regeu uma orquestra de estúdio. Filme, não – e aqui mantive a minha pose de super-certo, de mega-especialista.
_Rapaz, hoje vai ter jogo do Corínthians - disse meu irmão.
_O Gornaldo vai jogar? – perguntou a minha irmã.
_Ele cumpre suspensão ...– informei, contribuindo para a mudança definitiva de assunto.

Na volta para casa, minha mulher quer saber porque eu sempre me meto em discussões estúpidas.
_Não tenho a menor idéia. Mas é sempre engraçado. E desta vez foi ela que começou.

Frase do dia