quarta-feira, 3 de junho de 2009

Minha velhice


(Foto da série Reviajando com o Google Maps)

Eu a vejo com no canto dos olhos. Chegou sorrateira, como quem não quer nada. Depois se esparramou em sulcos e rugas sobre o meu rosto.

Eu a percebi sob a luz mais clara no espelho de aumento do banheiro.

Ali, no aumento do espelho, minha velhice se evidenciou em pelos brancos e adiposidades, em flacidez e cores esmaecidas.

De início, me fiz de sério e respeitoso para a minha velhice. Encolhi a barriga. Fiquei mais em casa. Parei de usar bermudas. Bebi menos. Evitei esportes e esforço físico. Parei de fumar. Ri menos. Eliminei a companhia dos maliciosos.

Foi um erro demente.

É uma mulher frívola, essa minha velhice.

É mais nova do que eu, mas está acabadona.

Ela é vaidosa com suas bolsas, que se expandem enormes e escuras sob meus olhos. E se aproveitou do meu respeito para me deixar mais feio e preguiçoso.

Por isso, depois tentei espantá-la com graças duvidosas, exageros mal-pensados, diversões de outros tempos. Mas já não adianta mais.

Minha velhice está instalada.
É uma coroca malvada, que me rouba palavras e nomes em todas as conversas. Que apaga os números e senhas que preciso lembrar. É ela que me rói o humor, que range os meus dentes quando durmo.

Minha velhice ronca e incomoda minha mulher. Só meus filhos acham graça dos roncos que ela me faz.

É a minha velhice que monta sobre as minhas costas, que me tira o fôlego depois de subir umas poucas escadas. É ela que me faz recusar os convites a bares e farras. (Mas disso também tenho culpa, confesso.)

Minha velhice me quer quietinho num canto de casa. E ali é realmente muito agradável.

É bom pra se ler os clássicos.
Recostar na poltrona, confortável.
Ouvir música baixinho.
Mas acontece pouca coisa.

Minha velhice é chata.

2 comentários:

Shirley de Queiroz disse...

Poxa, Careca. Pela primeira vez me imaginei ficando velha de verdade. Sacanagem....

Careca disse...

Shirley, acontece com todo mundo. Não é tão ruim, vai.:)

Frase do dia