terça-feira, 26 de abril de 2011

A dino aula

Meu filho sabe muita coisa sobre os dinossauros e às vezes impressiona as pessoas com os seus conhecimentos. Outro dia, na escola, uma professora de outra turma o ouviu conversando com um dos primos sobre dinos e propôs um desafio.

_Que tal você dar uma aula sobre dinossauros para os alunos do quinto ano? – ela disse.

_Eu topo – disse o meu filho, de bate-pronto.

Isso aconteceu na semana passada, mas por causa do feriado, parece que o grande dia da aula magna sobre dinos chegou mais rápido, nesta terça-feira. Ontem ele passou uma boa parte da tarde preparando o material para a aula.

_Pai, você acha que eles vão gostar?

_Tenho certeza. Você sabe muito sobre os dinossauros. Mas talvez seja bom preparar uma lista para servir de roteiro sobre o que você vai falar.

Ele fez uma lista com nove itens e estudou um pouco a enciclopédia sobre dinos. Também montou e desmontou uns esqueletos de dinossauros. Depois desenhou uns dois ou três dinos.

Deixou dois livros, um vídeo e a lista das coisas para falar separados, prontos para levar para a escola. Hoje, pela manhã, arrumou tudo na mochila.

Pelas fotos que eu pedi para a professora tirar, deve ter sido uma grande dino aula. Ele estava feliz como um T Rex após a refeição.

segunda-feira, 25 de abril de 2011

Até que enfim, é o começo

Tou!Pou!Tu-tou!

Estou soltando foguetes.

Terminou hoje, às nove e meia da noite, a grande reforma empreendida pela família Careca. Foram reformados três banheiros e uma área de serviço. Também tivemos uma troca de piso na cozinha e área de serviço, a colocação de duas portas de correr e um piso flutuante em três quartos e sala íntima. Também fizemos, de acordo com o roteiro, dois armários para os quartos das crianças, novos armários para a área de serviço e novas camas e bancadas de estudo. Fizemos exatamente o que foi planejado e pouca coisa saiu do script: trocamos a caixa dágua, o encanamento e a fiação elétrica da parte de cima da CASA.

Ficou super legal.

Os trabalhos de reforma tiveram início em dezembro de 2010. Foram exatos cem dias úteis trabalhados.

Bom, falta uma coisinha ou outra, mas dizem que uma reforma nunca termina, não é mesmo? (Só se for a sua, meu chapa, pois a reforma lá de CASA acabou hoje.)

Estes últimos dias fiquei absolutamente calmo e concentrado, sem nem um pingo de ansiedade.(Hoje fiquei balançando as chaves durante duas horas enquanto os caras da turma de montadores de armários tropeçavam uns nos outros. Também fiz caretas iguais às que o Dunga fazia para a turma da Globo durante a Copa do Mundo. Não me senti melhor por isso, só me senti idiota como um ex-técnico da canarinho.)

Estou super-bem. (Mas desenvolvi uma dupla personalidade parecida com imagem que eu tenho desse ex-técnico. Fico resmungando de vez em quando e tenho vontade de falar palavrões como se sofresse de síndrome de Tourette. Também fico puxando a camisa, solto perdigotos a cada duas palavras e fico pedindo roupas esdrúxulas para a minha filha.)

Sim, mas todas as neuras têm cura, ou não têm. O que importa é que ainda nesta semana estaremos dizendo adeus para o bom e velho apê e iniciando a experiência de viver numa CASA, com jardim, mangueira, jaboticabeira e um pé de limão-china no quintal. Sim, é uma CASA com maiúsculas e eu não sei viver sem hífen.

Espero poder transmitir aqui, para a minha kombi de leitores, as minhas impressões sobre essa mudança no caminho da minha vida.

Até que enfim, este é um novo começo.

domingo, 24 de abril de 2011

Máscara Baboo

Há vários anos vi uma exposição de arte africana no centro cultural do banco do Brasil. Eram peças de um museu alemão, que viajavam pelo mundo inteiro. Fiquei muito impressionado com as máscaras e com os tambores africanos. Na época fiquei muito tentado a comprar um conjunto de três máscaras, mas fiquei de pão-duragem. Os tambores eram gigantescos, não lembro de ter visto nada parecido. Não havia, é claro, tambores à venda. Depois disso, nunca mais vi daquelas máscaras. Perdi a oportunidade. O livro da exposição se esgotou rapidamente, não consegui comprar.

Uma outra exposição que vi em Brasília foi em comemoração ao centenário de imigração japonesa, com uma grande e fantástica mostra de roupas, artefatos e até uma liteira para carregar pessoas da realeza. Fiquei encantado com um monte de coisas, inclusive com o livro da exposição. Também vi máscaras japonesas fantásticas, algumas bem assustadoras. A memorabilia da exposição consistia só do livro com fotos da exposição, que infelizmente também se esgotou rapidamente. Entrei numa fila para comprar, os caras iriam encomendar e me telefonar quando o livro estivesse disponível. Quando ligaram, eu estava sem grana e abri mão da compra.

Há uns dois anos fui a uma feira de artesanato internacional no Gilberto Salomão, no Lago Sul. Encontrei um monte de máscaras africanas. Eram máscaras de animais. Encontrei um jaguar, uma zebra, uma girafa e um antílope. Comprei também quatro pequenas máscaras esculpidas, pintadas com graxa de sapato preta e vermelha. Custaram ridiculamente pouco. O sujeito de quem comprei dizia ser da Costa do Marfim. Na ocasião, vi duas belas máscaras grandes, em madeira. Cada uma custava o mesmo do que tudo o que já havia comprado.

Ao sair dali me arrependi de não ter comprado ao menos uma das máscaras. Era grande, feia, um pouco assustadora. Era diferente. Parecia uma mistura da face de um babuíno com a de um ser humano. O vendedor disse que era de uma tribo zulu da África do Sul. Eu acreditei.

Durante muito tempo mostrei a minha pequena coleção de máscaras africanas para os amigos que aparecem de vez em quando. Mas sempre achei que faltava alguma coisa.

Aí ontem eu fui numa feira internacional de artesanato. E lá estava o cara da Costa do Marfim. É um tipo meio inesquecível, como o índio tatuado de Moby Dick, Queequeg, o sujeito é um gigante negro, muito forte, de uma idade entre 50 e 60 anos, feio que dói. O rosto lembra as máscaras que vende, com os lábios grossos e um enorme nariz achatado. Obviamente, não se lembrava de mim. Dessa vez, quando eu perguntei disse que era do Senegal. A parede estava repleta de máscaras e no meio delas, em posição de destaque, lá estava a máscara zulu da África do Sul.

_E aquela ali, a máscara zulu, quanto custa?

_Aquela não é zulu, é baboo - ele disse.

_É de um babuíno?

_Não, é de povo baboo. É máscara de gente, humano.

Ele disse o preço e eu fiquei pechinchando. Pensei que a máscara poderia ficar legal, na sala reformada, junto com todas as outras bugigangas africanas. Mas depois pensei no monte de despesas extras que ainda terei neste mês e comecei a desistir da compra. O cara do Senegal percebeu e começou a baixar o preço, devagar. Chegamos ao ponto de equilíbrio, mas eu ainda vacilava quando a minha mulher chegou.

_Você não vai levar isso, vai? - ela disse.

_Isso o quê?

_Essa coisa feia aí.

_É uma máscara baboo africana, viajou milhares de quilômetros para chegar até aqui. É uma obra de arte.

_É horrível, isso sim.

_É do povo baboo, uma tribo feroz como os babuínos - disse o cara do Senegal.

Ele disse também que os homens do povo baboo eram muito respeitados em toda a África. E que as mulheres baboo não podiam fazer compras, só os maridos. Eu olhei para o sujeito e entreguei a máscara para ele, resignado. Mas antes que eu falasse qualquer coisa, ele disse:

_Para você, eu faço pela metade do preço.

_Então eu vou levar.

_Tem que passar graxa de sapato nela, de vez em quando - ele disse.

E agora, olhando a máscara com cuidado, tenho que concordar que ela é mesmo feia. Ainda assim, acho que vai ficar ótima em algum lugar.

sábado, 23 de abril de 2011

Cachorros não podem com chocolate

Eu aprendi na escola que os cachorros são bichos onívoros. Aprendi que além de comer de tudo, os cães adoram a comida que a gente come. Mas com o tempo tive que relativizar as duas noções.

Cachorros não comem de tudo. E podem detestar a comida que a gente come, especialmente se estamos falando de abobrinha recheada. Mas recentemente aprendi que os cachorros não podem comer chocolate. Foi um aprendizado bem apropriado para a época. De acordo com as informações lidas num jornal de academia de ginástica, uma barra de cinquenta gramas de chocolate meio amargo é o suficiente para liquidar um cãozinho de dez quilos. Ao que parece, os cães não conseguem digerir o chocolate e morrem em função da falência do fígado.

No mesmo jornal também aprendi que os gatos não podem tomar tylenol ou pequenas doses de paracetomol. O fígado deles não aguenta. Cachorros não morrem por causa do tylenol, mas não passam muito bem. Seres humanos também não podem tomar paracetomol e ingerir bebida alcoólica. Isso afeta o fígado.

O contrário também é válido. Ou seja, se você estiver com aquele ressacão de cerveja, não tome paracetomol que o estrago no fígado é violento. O melhor é beber água e esperar a dor de cabeça passar.

Portanto, fique de olho. E cuidado com aquela famosa brincadeira de esconder ovo da páscoa no quintal. A vítima pode ser o seu cachorro.

terça-feira, 19 de abril de 2011

Refeições inteligentes

Minha mãe costumava colocar um pé de chinelo numa cadeira vazia, ao meu lado, como motivação adicional para que eu comesse tudo o que havia no prato. Eu devia ser um chato para comer, pois aqui se faz, aqui se paga. Hoje tenho que ficar insistindo com as crianças para ver se elas também esvaziam os pratos.

Quando bebês, os dois eram comilões, mas agora ambos enrolam como podem para sair de fininho e escapar das refeições. Minha mãe e a mãe da minha mulher têm até hoje uma grande preocupação com a variedade, frescor e sabor da comida. Coisas que também procuramos reproduzir aqui em casa. A Rose é uma ótima cozinheira e a comida é bem saborosa, mesmo assim as crianças demoram muito e enrolam para almoçar e jantar.

Como já não é mais politicamente correto colocar um chinelo ao lado, numa cadeira vazia, para lembrar que uma motivação adicional poderá ser aplicada ao traseiro de quem não se alimentar direito, tenho de recorrer a outros expedientes. Um deles, que fez um sucesso extraordinário por umas duas semanas, foi a fantástica "máquina de bater no bumbum". Essa máquina maravilhosa seria importada dos Estêites, com o cartão de crédito internacional do papai aqui, eu dizia.

_Ela tem um sensor de garfadas e funciona automaticamente. Se você não comer direito, ela belisca o seu bumbum de leve. Se você enrolar e continuar sem comer, ela aplica uma palmada fraca. Se você insistir em não comer, ela aplica no mínimo três palmadas.

_Ah, paiê, isso não existe.

_Existe sim. Tem a pilha e tem a que liga na tomada. Acho que vou comprar a de tomada, que deve ter uma palmada mais forte. Essas coisas de pilha sempre são mais fracas.

_Mas aí é só tirar a máquina da tomada que ela desliga, paiê.

_Hum, é melhor ver se tem um modelo misto.

Mas eles ouviram que o governo aumentou o imposto de importação de produtos com cartão internacional e deixaram de acreditar nessa estória.

_Filha, deixa de enrolação na hora do almoço e trate de comer direito.

_Mas paiê, estou sem vontade de comer brócolis.

_Brócolis faz bem para o cérebro, deixa a gente mais inteligente.

_Mas eu já sou inteligente.

_Vai ficar mais inteligente ainda, ué.

_Se eu ficar mais inteligente eu vou ter dor de cabeça, paiê.

segunda-feira, 18 de abril de 2011

Assunto proibido

Não vou falar sobre obra.Não vou falar sobre obra.
Não vou falar sobre obra.Não vou falar sobre obra.
Não vou falar sobre obra.Não vou falar sobre obra.
Não vou falar sobre obra.Não vou falar sobre obra.
Não vou falar sobre obra.Não vou falar sobre obra.
Não vou falar sobre obra.Não vou falar sobre obra.
Não vou falar sobre obra.Não vou falar sobre obra.
Não vou falar sobre obra.Não vou falar sobre obra.
Não vou falar sobre obra.Não vou falar sobre obra.
Não vou falar sobre obra.Não vou falar sobre obra.
Não vou falar sobre obra.Não vou falar sobre obra.
Não vou falar sobre obra.Não vou falar sobre obra.
Não vou falar sobre obra.Não vou falar sobre obra.
Não vou falar sobre obra.Não vou falar sobre obra.
Não vou falar sobre obra.Não vou falar sobre obra.
Não vou falar sobre obra.Não vou falar sobre obra.
Não vou falar sobre obra.Não vou falar sobre obra.
Não vou falar sobre obra.Não vou falar sobre obra.
Não vou falar sobre obra.Não vou falar sobre obra.
Não vou falar sobre obra.Não vou falar sobre obra.
Não vou falar sobre obra.Não vou falar sobre obra.
Não vou falar sobre obra.Não vou falar sobre obra.
Não vou falar sobre obra.Não vou falar sobre obra.
Não vou falar sobre obra.Não vou falar sobre obra.

domingo, 17 de abril de 2011

Dois links legais

O primeiro link interessante é o que o PV me enviou:

1001 Discos

É lógico que é fundamental ouvir o disco e depois correr para ver se encontra o produto original.


O segundo link interessante é o que o blogo do Coturno está divulgando:

Petição

Nesse endereço, é possível assinar uma petição para mandar a Copa 2014 para a Inglaterra. Levando em consideração que temos planos de construir uma transamazônica para um trem-bala, pré-sal, usinas e mais um tantão de coisas que consumirão zilhões de reais, acho dispensável torrar bilhões em estádios de futebol.

O texto abaixo é o da petição. Dê uma olhada:

"To: Copa do Mundo
Eu quero que a Copa do Mundo 2014 vá para a Inglaterra

O Brasil não é o país do futebol. O país do futebol é a Inglaterra, pois foi lá que o esporte nasceu. Claro que o Brasil pode ter orgulho de ser um grande campeão mundial, mas isto não é motivo para que a Copa 2014 seja realizada aqui. Aliás, a única vez em que isto ocorreu, em 1950, sofremos uma derrota histórica. No entanto, o grande motivo para mandar a Copa de 2014 para a Inglaterra é que não temos dinheiro, não temos competência e não temos honestidade para realizar um evento deste porte.

O Brasil é o país da corrupção no futebol. A presidência da Confederação Brasileira de Futebol é praticamente vitalícia e nem com CPI, que comprovou dezenas de ilícitos, conseguiu ser mudada. Os clubes, na sua grande maioria, são dirigidos por políticos corruptos ou por agentes de jogadores, usados como currais eleitorais ou como fonte de bilionários negócios pessoais. A estrutura para a prática do futebol é um fiasco, tanto é que a realização da Copa está exigindo investimentos de mais de U$ 3 bilhões apenas em estádios. Tudo com financiamento a fundo perdido pelo BNDES ou dá para acreditar que os clubes, maiores devedores de INSS e FGTS, vão pagar estes empréstimos? E o BNDES vai fazer o quê com um estádio de futebol confiscado para pagamento de dívida?

Além disso, o Brasil não possui nem mesmo aeroportos decentes para receber os torcedores do mundo inteiro e, mesmo que o governo arranje dinheiro para construir e reformar, nenhum deles ficará pronto para 2014, segundo relatório do IPEA, órgão público federal. Este é apenas um exemplo. O custo para realizar a Copa do Mundo 2014 no Brasil está orçado em U$ 15 bilhões, sem contar com os U$ 30 bilhões destinados a construir um trem-bala para ligar São Paulo com o Rio de Janeiro, um projeto fadado à falência, por ser economicamente inviável. Aliás, o trem-bala também não ficará pronto para o evento.

O mais grave de tudo, no entanto, é que com a desculpa de agilizar as obras, o governo federal quer fazer todas as obras ao arrepio da lei, eliminando licitações e afrouxando a fiscalização. Será uma roubalheira generalizada. Lembram do Pan de 2007, que deveria custar R$ 400 milhões e acabou custando R$ 4 bilhões, sendo que até hoje o Tribunal de Contas da União não aprovou as contas? Senhores e senhoras, o custo orçado de U$ 25 bilhões acabará sendo de U$ 50 bilhões.

O Brasil é um país rico pela própria natureza, mas pobre, muito pobre pela ineficiência do seu governo, pela má gestão, pela corrupção. Temos 30 milhões de miseráveis. Temos 20 milhões de analfabetos. Temos 1 milhão de viciados em drogas. 50.000 brasileiros morrem por ano em acidentes nas péssimas estradas federais. Há mais de 100.000 assassinatos por ano. Não temos boas escolas. Não temos bons hospitais. Não temos penitenciárias suficientes. Não temos clínicas de recuperação de drogados. Não temos creches. Não temos, em resumo, U$ 25 bilhões,que acabarão sendo U$ 50 bilhões por causa da corrupção, para gastar em 30 dias de um evento esportivo.

Por isso, estamos lançando a campanha “Eu quero a Copa 2014 na Inglaterra”. A Inglaterra é o país que inventou o futebol. Está realizando os Jogos Olímpicos 2012 que, ao final deste ano, com seis meses de antecedência, vai entregar todas as obras exigidas e uma infra-estrutura espetacular. Lá está tudo pronto e não haverá prejuízos para o mundo do futebol. O Brasil tem outras prioridades. O Brasil precisa de escolas, não de estádios de futebol. O Brasil precisa de ônibus e metrô, não de trem-bala. O Brasil precisa de ferrovias, estradas,pontes, viadutos, ruas calçadas e asfaltadas. O Brasil precisa respeitar o dinheiro dos brasileiros, que pagam a maior carga tributária do mundo e os maiores juros do planeta. Vamos mandar a Copa do Mundo de 2014 para a Inglaterra.

Assine, divulgue, participe.


Do Blogueiro Coronel (coturnonoturno.blogspot.com) e seus Amigos"

sábado, 16 de abril de 2011

Miragens

"Em tempos de desligamento imediato, é preciso tomar cuidado com as miragens. Como você está sedento de emprego, para onde você olha é possível enxergar uma possibilidade de trabalho e renda. Esqueça. Essas coisas demoram a se materializar e não vão surgir do nada. Também não adianta ficar vigiando a sua conta no banco pela internet. Depósitos misteriosos de doadores anônimos não serão efetuados. Após um desligamento imediato, você está no deserto e sozinho por um tempo. Caminhe devagar e comece a sair dessa, aos poucos."

É assim que o meu especialista em emprego vive falando na minha cabeça. Ele me aconselha a encarar a situação de frente, mas um pouco de lado. Não importa que ele seja eu mesmo, esse cara às vezes diz umas coisas interessantes.

"Não acredite em tudo o que lhe dizem numa entrevista. Às vezes os entrevistadores são simplesmente otimistas, ou acordaram com o pé direito e não querem estragar o dia de ninguém. Existem entrevistadores que simpatizam com os míopes. Existem entrevistadores que só conseguiram o emprego de entrevistadores porque são extraordinariamente otimistas e bem-humorados. Existem entrevistadores que também fazem serviço voluntário no SOS Vida e confundem as atividades. As possibilidades são infinitas."

Foi assim que o meu especialista, dentro da minha mente, falou comigo, logo após uma entrevista que me pareceu especialmente bem sucedida. Talvez ele tenha razão, porque a pessoa não me ligou e nunca retornou as minhas ligações. Aliás, na última vez que liguei parecia que não era uma mensagem gravada, mas uma pessoa fingindo que era uma gravação.

_No momento não posso atender. Deixe seu recado após o bip. Isso é uma mensagem gravada - disse a voz no celular.

O que me deixou grilado foi esse final sobre a mensagem gravada.

"Não esmoreça. Coisas boas vão acontecer. Há uma luz no fim do túnel. Fique ligado. Amplie a sua network. Faça um MBA em marketing. Faça um MBA em Gerência de Processos. Faça um MBA em qualquer coisa. Distribua cartões, não fique parado. Dê uma polida no currículo. Vá à luta."

Essa é uma outra voz que aparece para me animar, de vez em quando. Obviamente, é a voz gentil e calma de uma odalisca. Se eu me concentro, consigo até ver o oásis onde ela lava, languidamente, os seus belos cabelos negros.

sexta-feira, 15 de abril de 2011

Não permitido

É meio repetitivo ficar falando sobre reforma e obra, mas ultimamente não consigo pensar em outra coisa. Nesse período de desligamento imediato, a obra se tornou a minha principal atividade. Então tenho que pensá-la e escrever sobre ela. É inevitável.

É lugar comum dizer que uma obra é uma novela interminável. Mas essa não é uma descrição muito boa para mim, porque eu gosto de novelas. Uma novela possui um clímax a cada capítulo e por se tornar envolvente e nos transmitir um mundo de emoções, não queremos que ela se acabe. Ansiamos pelo próximo capítulo, sofremos com as dores e amores dos personagens. Numa obra, pelo menos comigo, acontece muito pouco todos os dias e depois de duas semanas eu ficou louco para que tudo acabe.

Isso não acontece, é claro.

Numa novela muito boa, quando aparece a palavra "FIM" estamos às lágrimas. Se for uma novela da TV, no dia seguinte estaremos ali a postos para ver tudo de novo, para apreciar cada segundo do último capítulo novamente. Numa obra de reforma, eu fico tão ansioso para que tudo acabe que tenho vontade de distribuir pontapés.

Mas não faço isso, é claro.

E a obra também não acaba. Apesar de um cronograma bem traçado, com os compromissos bem explicados, assumidos e preparados, nenhum prazo foi cumprido. Todas as minhas entregas de serviços se atrasaram, por uma razão ou outra. Em geral, as razões apresentadas são horrorosas. Ruins de doer.

Os pintores, por exemplo, cansaram de adoecer os filhos e perder os ônibus. Os marceneiros jogaram a responsabilidade para a mudança climática e as fortes chuvas que atrapalharam a secagem da cola. Os gesseiros cumpriram os prazos, verdade seja dita, mas até hoje estou esperando a limpeza prometida. Os azulejistas estavam muito ocupados arrumando um outro serviço enquanto ainda trabalhavam para mim. Os caras da fiação elétrica são uns tipos orgulhosos, não se incomodaram em apresentar desculpas.

_Pô, vocês tiraram tudo das embalagens e disseram que terminariam ontem, hoje não apareceram e querem que eu acredite que vão vir amanhã, no sabadão? - eu disse, pelo celular.

_Seu Careca, minha religião não permite que eu trabalhe aos sábados - diz o trabalhador.

_Tudo bem, a minha religião só permite que eu toque em dinheiro para fazer pagamentos às terças-feiras - eu disse.

_Que religião é essa?

_Adventistas do Abre-te Sésamo.

_Nunca ouvi falar.

_É nova, já ouviu falar no Pastor Ênio ou no Pastor Beto - eu disse.

_Agora que você falou, acho que conheço os dois.

quinta-feira, 14 de abril de 2011

Um nota sobre o rodapé

Os caras estão montando os novos armários e camas das crianças. Eu vou xeretar e vejo que a cama está muito longe da parede, existe uma grande fresta entre a armação da cama e a parede. A fresta tem a espessura de um rodapé.

O marceneiro tem nome de cantor.

_Fábio Júnior, vai ficar uma fresta desse tamanho? Assim está muito feio.

_É a parede que está torta. O móvel foi feito no esquadro.

_Não dá para cortar o móvel? - eu disse.

_Se quiser, eu corto agora - ele disse.

_Não é assim. Não é isso que eu estou falando. Estou perguntando para você qual é a melhor solução para acabar ou diminuir essa fresta. O móvel está bonito, você fez um excelente trabalho e eu não quero estragar nada. Mas deixar como está não resolve o meu problema. A fresta continua. Qual é a melhor solução? É colar uma ripa? É o quê?

_Ripa? Deus me livre e guarde! Vai ficar um horror. E depõe contra a qualidade do meu trabalho. Ripa de jeito nenhum.

_E eu continuo com o meu problema. Tem como encostar mais o móvel na parede?

_Se você quiser, eu encosto. Mas vai ficar torto. Fora do esquadro. Se você quiser, eu encosto agora, mas vai ficar ruim. Mas é o cliente que tem razão. Se mandar entortar o móvel eu entorto, é só falar.

_Calma, calma, estou conversando, quero ver com você qual é a melhor solução. E não quero tirar o móvel do esquadro, longe de mim. O que eu não quero é uma fresta enorme entre o móvel e a parede. O que você sugere?

_Se você quiser, eu corto o móvel no formato do rodapé. Vai ficar bem colado na parede. É só falar.

_Não, não é legal. Se um dia eu quiser tirar o móvel daqui, ele estará recortado no formato do rodapé. O melhor é manter o móvel do jeito que está. E também não vou mexer na parede. Não tem outra solução? - eu disse.

_Bom, só se a gente recortar o rodapé...

_Boa idéia, Fábio Júnior. Excelente idéia.

quarta-feira, 13 de abril de 2011

A bandeira em chamas

Estamos vivendo dias loucos, muito loucos.

Hoje um sujeito subiu no mastro da bandeira, em Brasília, e botou fogo.

Enquanto Sarney exerce os seus podres poderes, a Presidenta vai à China e o ministro do bigode irrevogável diz que uma grande empresa chinesa vai montar uma fábrica de tablets aqui, no Brasil. Deve ser porque temos mão-de-obra mais barata, trabalhadores mais preparados, infra-estrutura excelente e uma carga de impostos que deixa outros países no chinelo.

FHC, o único ex-presidente que faz a oposição subir pelas tamancas no telhado, escreve um artigo sensacional e a turma cai de pau.

Bolsonaro, o Tião Gavião dos GLS, Negros, ìndios e cafusos, diz que não escuta muito bem e que não entende as perguntas dos GLS, negros, índios e pessoas que ele não tolera.

A inflação está aumentando.

A oferta de crédito está diminuindo.

Os impostos estão aumentando.

As idéias de jerico estão aumentando e o trem bala vai à sanção presidencial.

A UnB submergiu de vez. Os estudantes foram obrigados a suspender os trotes obscenos e o consumo de bebidas e drogas porque o campus foi arrasado por esgoto pluvial.

O Brasil continua a querer ter assento permanente no Conselho de Defesa da ONU. Mas por enquanto só pode assistir às reuniões em pé, no cantinho, e calado.

O IPEA diz que nove estádios de futebol não ficarão prontos para a Copa. Noves fora, nada.

Três meses depois da tragédia, centenas continuam em abrigos improvisados em Teresópolis.

Aparece um vídeo do assassino de crianças do Realengo. Eu não quero e não vou ver.

terça-feira, 12 de abril de 2011

Um banquinho

Nestes dias estou me esmerando nos pequenos fazeres. Instalei chuveiros, porta-toalhas, papeleiros e acertei alguns detalhes na reforma. Comprei um tal de Zapp, que dizem ser uma maravilha para acertar rejunte. Fiquei com medo de acertarem um cano nos banheiros reformados e não deixei que fizessem alguns furos. Depois disso tratei de arrumar uns ganchos de colar. Minha mulher não gostou dos modelos que encontrei e tratamos de procurar um porta-toalhas de pressão. Encontramos um até bonitinho, mas ele não fica grudado muito tempo e não aguenta uma toalha molhada. Não funcionou. Arrumei um adesivo super-super-grudento para usar com o porta-toalhas de pressão, mas estou com medo de usar. E se manchar o porcelanato?

O piso ficou pronto. É uma imitação de madeira, ficou bem bonito. Mas o meu ciúmes do piso é enorme. Quando os caras foram instalar os espelhos nos banheiros eu fiz um sermão de dez minutos sobre a importância de se pisar de leve em pisos recém-instalados. Funcionou. Os caras andaram com o maior cuidado.

Também desenvolvi uma pequena mania de limpeza na obra. Mesmo assim, a quantidade de entulho e pó é uma coisa impressionante. O número de sacos plásticos que aparecem a todo instante também é uma coisa do outro mundo. Os caras da obra adoram sacos plásticos e refrigerantes. Devo ter enchido pelo menos um conteiner só de garrafas pet. Os caras da obra detestam segundas. O índice de faltas na segunda-feira é incrível. Os caras da obra ficam escutando música o dia inteiro no telefone celular. Eles adoram o brega romântico. Acho insuportável.

Algumas coisas da obra exigiram ação rápida. Tem chovido muito por aqui e a chuva tem provocado muitos estragos.

Juntei alguma madeira também. Resto de obra. E por causa disso comprei uma plaina. É uma ferramenta muito interessante, essa plaina. É lógico que eu não sabia usar uma. Então baixei um vídeo na internet com uma hora de aula sobre a plaina. Assisti duas vezes e aprendi alguma coisa. Amanhã vou testar a plaina em algumas tábuas.

Na quinta-feira, se a pintura terminar mesmo nesta quarta-feira, será possível iniciar a limpeza. Não vejo a hora de acabar. Mas é preciso cautela e muita calma nessa hora. Fiz uma lista das coisas que ainda faltam e ela não é pequena. São pequenas coisas que não podem deixar de ser feitas.

Fiquei tão absorvido com essas coisas que não comprei um presente para a minha mulher. Nós havíamos combinado que neste ano não haveria presentes, que o aniversário de casamento seria comemorado com o fim da obra. Eu sabia que mesmo assim ela iria comprar um presente para mim e que eu deveria ter encontrado uma maneira de comprar um presente para ela. Mas acabei comprando uma plaina.

O meu plano é fazer um banquinho para que ela possa esticar as pernas e descansar um pouco. Vou usar umas tábuas e tocos da obra. Será um banquinho de apoio, baixo, com aquelas pernas parecidas com bandeirinhas de São João. Talvez eu pinte de amarelo.

Não, vou pintar de vermelho. Amanhã vou sair e comprar uma lata de tinta vermelho escuro.

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Um novo emprego para o papai

Durante o café-da-manhã:

_Pai, você já arrumou um novo trabalho?

_Ainda não, filho.

_Então eu já sei de um novo emprego perfeito para você! - disse o menino.

_É mesmo?

_Pai, você vai ser um astronauta! Vai trabalhar na lua, no espaço sideral!

_Hum, parece bom - eu disse.

_Não vai, não, paiê! É muito longe - disse a menina.

_Mas vai ser legal e eu vou poder usar macacão e capacete - eu disse.

_Não, paiê, por favor, eu vou ficar com saudades!- disse a menina.

_É, pai, é melhor pensar em outra coisa - disse o menino.

_Você também vai sentir saudades? - eu disse.

_Um pouco. É que a mamãe não gosta quando você viaja - ele disse.

_É, paiê, é melhor você ser bombeiro - disse a menina.

_Hum, vai ser legal, vou poder usar macacão e capacete - eu disse.

domingo, 10 de abril de 2011

Sábado almoçamos bem

Neste sábado, eu, minha mulher, o Cabeça e a Mulher do Cabeça fomos almoçar num restaurante espanhol. Estávamos em busca de um prato simples e delicioso, que experimentamos há uns dois ou três anos numa feira no parque de exposições da cidade. Era uma feira gaúcha, mas na área de alimentação havia restaurantes de todos os tipos. Lembro que no dia estávamos meio cansados de carne e resolvemos aproveitar uma oferta de lagostins, com arroz com açafrão e cogumelos.

Os pratos foram feitos na hora por um sujeito meio gordinho e careca. Ele usou apenas azeite virgem e um pouquinho de vinho branco para fazer os lagostins. O arroz também foi feito rapidamente, requentado numa frigideira de barro. Nem eu nem o Cabeça levamos fé naquele prato, assim que o sujeito serviu. Mas foi uma experiência maravilhosa. Não conseguimos parar de comer. Ao final do almoço, depois de termos comido todos os lagostins que havia, o cozinheiro puxou conversa.

_Estamos pensando em abrir um restaurante aqui em Brasília. O que vocês acham?

Apoiamos a idéia entusiasticamente, é claro. O sujeito me estendeu um cartão. O nome dele é Luiz Reyes. O nome do restaurante é La Plancha. O Cabeça me cutucou e disse que esse é um dos restaurantes mais tradicionais do Rio, com gente fazendo fila para entrar com seis meses de antecedência. É uma fama merecida.

Ontem, finalmente, nós fomos lá e repetimos a experiência. Foi um reencontro magnífico e aperfeiçoado. Além de lagostins, também tivemos lagostas e camarões. O arroz com açafrão e cogumelos também estava delicioso. O período de mastigação e deglutição durou cerca de duas horas.

Só de lembrar do almoço eu me sinto melhor, mais bonito, mais inteligente e mais forte. São coisas assim que renovam a esperança no futuro da humanidade.

sexta-feira, 8 de abril de 2011

Um manequim

Encontrei outro dia, na banca de revistas, um boneco articulado para desenho. É o primeiro fascículo de uma série que ensina a desenhar mangás, os quadrinhos japoneses. Apesar de gostar de mangás, não estou interessado em desenhá-los, mas gostei do manequim e comprei. Está sobre a mesa do computador e as crianças adoram inventar posições malucas para ele.

Meu filho torce e retorce as partes dos braços e pernas do boneco, conseguindo articular poses impossíveis. Minha filha olha e organiza o manequim. Ela prefere posições de dança, mais equilibradas, os braços e pernas esticados, as articulações das mãos e braços formando arcos, como as bailarinas.

Um de cada vez, eles se aproximam quando estou no computador e começam a mexer com o manequim. Querem ver se tenho ciúmes do objeto novo. Eu finjo que tenho, senão acaba logo a graça da brincadeira.

_Por favor, não mexa no manequim - eu digo, com voz séria.

Eles obedecem. Mas antes querem deixar o boneco numa pose bem bacana.

_E aí, pai? Gostou dessa pose? - disse o meu filho.

_Parece que ele caiu e quebrou o pé - eu disse.

_Não, ele sabe cair. Foi só uma torção, ele vai voltar a andar - ele disse.

_Só se for de muletas, ou cadeira de rodas - eu disse.

_Pai, não tem graça - ele disse.

Minutos depois minha filha se aproximou.

_Paiê, gostou dessa pose? - ela disse.

_É bem bonita. Parece que ela está pegando uma coisa em cima de um armário.

_Não, paiê. Ela está dançando.

_Tem certeza de que ela não está comendo uvas?

_Paiê, não tem graça.

Mas é engraçada essa pose. Ainda agora, o manequim está sobre a mesa. As duas pernas esticadas, uma para frente outra pra trás, como se desse um salto perfeito. Os braços estão armados em arco, a cabeça levemente inclinada. Rafael, o cãozinho shi-tsu da minha filha, começa a rosnar para o manequim.

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Sobre o terror na escola

O que aconteceu na escola do Realengo, no Rio de Janeiro, foi abominável. Uma das coisas das quais me envergonho de ter pensado, quando lia as notícias sobre alguns atentados e atiradores alucinados que matavam crianças nas escolas em outros países, é de que felizmente estávamos livres disso por aqui. É uma presunção tola, porque ninguém está imune ao terror e ao horror. Também me envergonho de não ter prestado muito atenção nessas notícias, sempre em lugares tão distantes da minha vida e do meu cotidiano.

Sem querer fazer disso uma desculpa, boa parte da minha desatenção a essas notícias resulta da maneira previsível como as autoridades e a mídia tratam dos temas trágicos.

As autoridades lamentam e, de um modo deprimente, tratam de tirar o corpo fora, buscando uma isenção total de responsabilidade sobre o ocorrido. No Brasil, esse fenômeno é ainda mais agudo, porque as autoridades muitas vezes tratam de jogar a responsabilidade sobre as vítimas. Isso vale para previsíveis e perfeitamente evitáveis desastres provocados pela chuva, para os anuais deslizamentos de terra, para os extraordinários números de mortos em acidentes em estradas intransitáveis, para os eventuais desastres aéreos, terrestres e aquáticos que ocorrem por falhas humanas somadas a uma falta absoluta de mecanismos de controle, da ausência espetacular de fiscalização e da preguiça enorme de implantar uma infra-estrutura adequada.

A mídia contribui para que tudo fique como está, sem solução alguma, porque é da sua natureza nos saturar de informações até que percamos o interesse pelo assunto. Mais do que nos ajudar a compreender e a nos mobilizar para evitar tragédias, a mídia nos mobiliza e aglutina em comoção para a ação imediata. A tragédia é transformada em espetáculo, com heróis escolhidos, cenas tocantes, emoções à flor da pele. Esse excesso de espetacularizações, essa cachoeira sucessiva de fatos sobre fatos fantásticos, tem pelo menos um lado positivo: nos ajuda a superar e esquecer histórias de terror e horror. Nos ajuda a seguir com a vida.

Os brasileiros mais uma vez estão de luto, especialmente os do Rio de Janeiro. Ultimamente e infelizmente é a dor das tragédias que nos tem irmanado.

quarta-feira, 6 de abril de 2011

Até de sete pontos

A necessidade é a mãe da humildade. Quando você precisa de alguém para pendurar uma multa de trânsito, não dá para ficar pensando em orgulho besta. O melhor a fazer é correr e pegar o telefone. Foi o que eu fiz. O primeiro da lista foi o Cabeça.

_Big Head, amigo de fé, meu irmão, camarada, estou precisando de um favorzão. Tem como você assumir uma multinha de trânsito? São só quatro pontos. E a minha mulher está pendurada. Pode quebrar essa?

_Claro, pode mandar - disse o Cabeça.

_Valeu mesmo. Mas antes vou checar se você pode pegar esse fardo. Fala aí o número do registro e a data de nascimento...

Com as informações do Cabeça eu rapidamente entrei na internet e fiz a consulta da habilitação no site do Detran.

_Big, obrigado, mas você também está pendurado. Não vai rolar. Agradeço a disposição, mas talvez você possa conversar com algum amigo para assumir uma das suas multas. Sua mãe ainda dirige? Então, liga pra ela, vê se ela pode aliviar uma das muitas...

_Não são minhas. São da minha mulher - disse o Cabeça.

_Claro, claro. Tem até de sete pontos, Big. É coisa forte.

_Não são minhas, estou dizendo. Ela é que estava dirigindo o carro - disse o Cabeça.

_Com certeza, com certeza. Tem duas no mesmo dia, com um intervalo de meia hora - eu disse.

_Eu sei, eu sei. Eu avisei pra ela ir devagar - disse o Cabeça.

_E o pior é que foi outro dia mesmo, Big. Vai demorar a zerar esses pontos.

_É uma droga - ele disse.

_Bom, valeu mesmo. Tchau - eu disse, e desliguei.

Caramba, eu pensei, o Cabeça vai ter que fazer um exercício igual ao meu. Repassei novamente a minha cardeneta de telefones e chamei o PV.

_PV, ser humano, como é que você está de multas?

_Putz, Careca, estou até a tampa. Minha mãe me ajudou um bocado para eu conseguir espaço para renovar a carteira. Agora estou pendurado de novo.

_Pediu pra mais alguém, dos amigos?

_Careca, está todo mundo na mesma. Só não liguei para o Guina.

_É bom saber. Tentei o Cabeça, mas ele também está pendurado - eu disse.

_É, ouvi dizer que ele tem até de sete pontos. É triste - disse o PV.

E depois que o PV desligou, eu tentei o Guina.

_Fala, Careca, tudo bem?

_Mais ou menos. Guina, meu amigo, como você está no departamento de multas?

_Cheio. A cada dia surge um novo pardal num local insuspeito nessa cidade. É preciso cuidado total nos lugares mais retos e vazios do Distrito Federal. E onde for possível esconder um pardal, lá haverá um. Onde houver descida, há pardal. Mas nas proximidades de hospitais, faixas de pedestres e pontos de ônibus é impossível encontrar se um pardal.

_É a indústria da multa, Guina. Bom, eu ia pedir pra você assumir uns quatro pontinhos, mas está impossível, não é?

_Completamente. E nem tente o Cabeça. Ouvi dizer que ele está até com uma de sete pontos. Coisa feia.

E depois o Guina me falou que está "grávido" junto com a namorada e que o exame de translucência nucal foi ótimo.

Minha quarta tentativa foi o Rodrigão.

_Rodrigão? Como vai essa força? Vem cá, meu irmão, você pode ficar com quatro pontos pra mim?

_Cabeça?

_Não, é o Careca.

_Pô, pensei que era o Cabeça. Ouvi dizer que ele está até com multa de sete pontos.

Desliguei quase em seguida. A minha sorte é que ainda tenho um monte de amigos para ligar.

segunda-feira, 4 de abril de 2011

Muito além do sorriso da Mona Lisa


Comecei dois novos projetos. O primeiro é encher um moleskine de versões da Mona Lisa. Já fiz algumas, que gostei muito. Existem detalhes muito interessantes na Mona Lisa, além do sorriso. Acho os olhos extraordinários, a figura parece que não leva o pintor muito a sério. É um olhar meio de esguelha, mais irônico do que o sorriso. Os cabelos também são diferentes. Da Vinci misturou os cabelos com uma redinha. É possível ver mechas onduladas, mas o cabelo também é liso. Às vezes tenho a impressão de que não é uma touca que existe atrás da cabeça da Mona Lisa, mas um outro retrato, que Da Vinci escondeu. De qualquer forma, há uma diferença de cor bem nítida no alto da cabeça da Mona. O nariz é uma preciosidade. É do tipo batatinha e extraordinariamente comprido. A testa é enorme. O queixo duplo também parece uma maldade com a retratada.

A boca é realmente especial, tem um sorriso bacana. Mas são os lábios que chamam a minha atenção. Eles não estão pintados, só existe uma sugestão de lábios. A posição do corpo também é estranha, porque o ombro equilibra um xale ou manto de um jeito esquisito, Mona parece se apoiar num braço de cadeira, mas a verdade é que eu não consigo imaginar o braço esquerdo da retratada. Nas mãos, Da Vinci repete o truque dos lábios e somente sugere a existência de unhas. O mindinho e o polegar da mão direita de Lisa também são esquisitos, parecem compridos demais. O dedo mínimo da outra mão também parece grande demais.

Outras coisas que acho legais na Mona Lisa são os detalhes do vestido. A manga do vestido que cobre o braço direito tem muito mais detalhes que o outro, apesar de estar mais "afastado" do olho. Também é possível perceber alguns detalhes interessantes do mosaico que enfeita o vestido, na altura da sugestão da cavidade entre os seios da Mona Lisa. Parecem círculos e números.

Assim que tiver mais alguns prontos, colocarei no meu blog de desenhos, O Careca no caminho, que está precisando ser atualizado.

Meu outro projeto é retomar a edição de O Melhor do Caminho do Careca, a prometida coletânea do blog, que agora não tenho desculpa para não preparar.

E você, da minha kombi de leitores, pode me ajudar muito. Basta me dizer qual é o post que você quer ver numa coletânea do Careca.

Obrigado.

sábado, 2 de abril de 2011

O Careca chegou tarde - Preconceito

Cheguei tarde e não consegui me concentrar. Continuo amanhã.

Minha mulher levou as crianças para um show no teatro, no centro de convenções. Fui deixá-los de carro, porque lá o estacionamento é um breu. A capital do país tem um excelente centro de convenções, mas o estacionamento é mal iluminado e chega a ser ridículo de tão pequeno. O centro fica ao lado do estádio coberto e próximo ao estádio que está sendo destruído. É, eles começaram a destruir o estádio que nunca foi concluído para construir o novo.

É extraordínário que a cidade queira ser palco de jogos da copa do mundo quando não existem estacionamentos e nem infra-estrutura de transporte público decentes para se chegar a esses locais. A iluminação é péssima. Banheiros públicos não existem nas proximidades. Se não fossem os vendedores ambulantes, não haveria água e nem comida para as multidões dos eventos, porque as lanchonetes internas são minúsculas, precárias e cobram os olhos da cara por qualquer coisa. Se chover, não existe a menor possibilidade de não ficar encharcado. Durante o dia, uma caminhada de cem metros sob o sol do Planalto nesta área equivale a andar dois quilômetros no deserto.


Fizemos mil e uma recomendações para que ninguém se perdesse. Nem havia uma multidão tão grande assim, mas eu tenho pavor de pensar na possibilidade de uma criança perdida.

_Andem de mãos dadas. Atenção - eu disse.

A entrada do centro de convenções ainda segue a lógica da Brasília para 250 mil habitantes. É pequena. Uma fila de carros para deixar as pessoas se afunila em poucos minutos. Felizmente, chegamos com 25 minutos de antecedência e com os ingressos comprados há duas semanas. Mesmo assim, demorou. Com tudo certo, fizemos as recomendações de segurança novamente e minha mulher desceu com as crianças.

Duas horas mais tarde, minha mulher e as crianças me esperam do lado de fora do centro de convenções, junto com outras mães e crianças. Poucos carros, muitos ambulantes e uma escuridão geral. Não vi nenhum policial na área.

_O show foi excelente - disse a minha mulher. Encontramos um monte de crianças da escola. Quase não tinha pais. Só mães.

Eu não disse nada.

_Uma amiga minha da universidade encontrou uma menina de três anos.

_Sério? - eu disse.

_A menina ficou o show quase todo com ela. Não ficou assustada.

_Minha nossa! A mãe devia estar desesperada - eu disse.

_Era um pai. Quase no final eles interromperam o show, puseram o pai no palco para ver se achavam a criança. O pai que perdeu a menina estava com uma outra no colo, quase da mesma idade. O sujeito chorou de alegria quando abraçou a menina.

_Que espetáculo! Que mico! - eu disse.

-Uma mulher do meu lado comentou comigo que esse tipo de coisa só acontece com pai.

_Mas só em teatros. As mães perdem crianças nos shoppings - eu disse.

sexta-feira, 1 de abril de 2011

Muito louco, coisa de doido e louco de pedra

Ouvi no blog da Franka uma entrevista em que um sujeito diz "muito louco" o tempo todo. Fiquei ligado. Uma vez trabalhei com uma figura que dizia "coisa de doido" a todo instante. Era uma figura bem inteligente. Quando a conheci, essa pessoa ainda não falava "coisa de doido" o tempo inteiro. Em compensação, usava um monte de expressões e frases clichês. Ela falava "vis a vis", "iminente", "imprescindível" e também gostava muito de "fundamental". Às vezes, conseguia encaixar as quatro prediletas num mesmo diálogo, mas era raro.

Um dia, essa pessoa simplesmente parou de usar essas quatro expressões. Parece que trocou tudo por "coisa de doido". Numa mesma frase, ela encaixava até quatro vezes "coisa de doido" ou pequenas variações, tipo "que loucura","troço maluco", "uma doideira", "insano" e "pinel".

Essa pessoa era muito importante, então ninguém fazia piadinha com o fato dela usar diversas variações amalucadas da mesma expressão. Pelo contrário, muitas pessoas passavam a usar as mesmas expressões quando conversavam com essa pessoa importante e poderosa. Eu também entrava nessa.

_Mas o que você está dizendo é uma loucura! - dizia essa pessoa importante.

_Um loucura das grandes - eu dizia.

_Não é possível, gente, isso é uma doideira! Doideira - ela dizia.

_É uma maluquice, mas está aí, escrito com todas as letras - eu dizia.

_Nossa, gente, é coisa de louco, isso - ela dizia.

_Totalmente louca - eu dizia.

_Gente, que coisa insana - ela dizia.

_É uma piração geral - eu dizia.

_É, é uma maluquice - ela dizia.

_Coisa de alienado internado no pinel - eu dizia.

_De maluco que come sabão - ela dizia.

_De gente que rasga dinheiro - eu dizia.

E assim ia, sem repetições, até eu cansar.

Um dia, quando comentávamos uma notícia de jornal, essa pessoa poderosa e importante disse:

_Essa notícia é coisa de louco de pedra - ela disse.

_É uma doideira - ela disse.

_É uma insanidade, você não acha? - ela disse.

_Acho perfeitamente normal - eu disse.

Depois disso conversamos muito pouco.

Frase do dia