terça-feira, 30 de setembro de 2008

Está difícil, esse calor

A língua, unida, jamais será vencida
Caramba, essa cidade está sob um calor infernal. E as madrugadas estão super-frias. Aprendi hoje que uma das poucas regras que a nova língua portuguesa unificada é a do hífen. Super-qualquer coisa deverá ser escrito com hífen. Hiper-mercado também. Dizem que as novas regras de português unido, jamais será vencido, cabem numa colinha de mão, fácil, fácil. Vai ser mole decorar. Super-mole.

Enchente de assunto
Estou passando por um terrível período de enchentes de temas. Quero falar sobre tanta coisa, que acabo iniciando um monte de coisas e deixando tudo pela metade. Aí depois fico com preguiça de retomar. Comecei nessa semana, por exemplo, um Moleskine com o tema "Monstros". Está ficando horrível.

domingo, 28 de setembro de 2008

A largada foi Massa

O Massa começou a estilingar e o Box da Ferrari cortou o meu barato. Acho que é a terceira vez que fazem o cara tropeçar, só nessa temporada. Isso estimula a minha paranóia. Acho que é sacanagem. Besteira, né? Mas afeta. E aí o resto do domingo ficou mais xoxo.

sábado, 27 de setembro de 2008

Sobre debates



Tudo que sei sobre debates pode ser resumido em uma única palavra: nada. Eu sou sentimental quanto a debates. Não uso a cabeça. Sou torcedor. É raro ver um debate onde eu já não tenha um lado definido, alguém para torcer. Mas, se isso acontece, se já não tenho um lado definido, acabo torcendo para quem está levando mais pancadas. E, no final, acabo por achar que os caras que estavam batendo estavam absolutamente certos.

Pode parecer contraditório, é verdade, mas é assim que funciona comigo. Durante o debate torço para o galinho branco, que é um galo bom, nunca fez mal a ninguém. Fico contra o galo preto, que é um galo perverso, batedor e sempre ganha por nocaute. Mas depois do debate, é preciso reconhecer que o galo preto é o melhor debatedor. Na clássica comparação com o futebol, debates são como finais da Libertadores da América. A gente torce para o time brasileiro, que acaba fazendo um papelão e depois somos obrigados a reconhecer que o Boca Juniors mereceu a vitória. Ou numa comparação metida a Wittgenstein, é como aquela figura do pato que vira coelho e do coelho que vira pato. No final, não é nada disso. É só um rabisco onde projetamos nossas próprias impressões.

Acho que sempre tive uma expectativa exagerada em relação a debates em rede nacional. Quando eu assisto, eu secretamente acredito que alguma coisa muito especial acontecerá. Nunca acontece. Nunca ouvi falar de debates onde candidatos, depois de duas horas de conversas, apertem as mãos e um deles resolva desistir da campanha porque o outro é bem melhor.

_Olha, bicho, você é dez, deu um show de bola, vou colaborar com a sua campanha – diria o vencido.

Ou então:

_Atendendo a pedidos do auditório, vou declarar meu voto ao meu adversário. E também vou mudar para o partido dele. Cara, você é bom demais – diria o derrotado.

Ou ainda:

_Caramba, xará, você sabe do que está falando e não vai desperdiçar dinheiro público. Eu só queria gastar dinheiro que não é meu e pendurar uns amigos em cabides – diria outro derrotado.

E pra encerrar:

_Amigo, vou falar para todo mundo lá de casa votar em você. Pessoal, esse cara aqui é demais, é político com p maiúsculo, dá até vergonha de chegar perto. Votem nele, sim.

É lógico que nada disso acontece. Mas eu fico na expectativa.

Eu gostaria que os debatedores não fossem meros captadores das opiniões que estão por aí, flutuando no ar. Por outro lado, se eles não conseguem captar nada, então o debate é uma droga. Sem ver o debate entre McCain e Obama, sei que o Obama venceu. Ele vencerá todos os debates, se não vacilar. Mas apenas um vacilo lhe custará tudo. Um erro e ele porá tudo a perder. Pois McCain irá explorar esse erro até torrar a paciência. Mas é por causa dessa possibilidade que ainda acho que a eleição nos EUA ainda não está garantida.

sexta-feira, 26 de setembro de 2008

O que é bom, muda

Nem sempre para melhor, mas é verdade. O hotmail mudou. E ficou esquisito. Diferente. E agora nem dá para manter a versão clássica. Mas não foi por isso que eu não postei, ontem. Aqui estava uma chuva de relâmpagos e trovões. E como eu vou precisar usar o computador nesse final de semana, nem quis arriscar a postar. Da última vez que fiz isso, perdi a fonte e quase morri de medo de ter perdido o PC.


Histórias para o pai dormir
Estive lendo um monte de historinhas para a minha filha dormir. E acabei ficando com o maior sono.

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

A volta do Monstro do Cabide



Quando chego em casa, os dois disputam a minha atenção com todas as forças. O menino vem mostrar as novidades, um corte no dedão, um esfolado na perna. É incrível a quantidade de hematomas e feridas que ele consegue produzir em si mesmo, em apenas doze horas. A menina corre para se esconder e brincar. Ela não coleciona machucados com tanto afinco, mas também não é uma santinha.

Hoje, logo que a Patroa chegou, a menina se machucou ao tentar reprisar, com ela, a brincadeira de se esconder de quem chega. Às vezes os dois querem se esconder e fogem em disparada, ao mesmo tempo, e acabam se chocando. É uma trapalhada comum, como se fosse uma brincadeira de barata voa. Eles repetem, repetem, repetem. Às vezes, essa rotina é cansativa. Mas na maior parte das vezes, se eu não encaro como rotina, as noites passam voando.

E quando a Patroa chega, é quase impossível conversar qualquer coisa. Os dois me abandonam depressa, só querem saber da mãe. Se eu estou cansado, eu me deixo ficar abandonado, no sofá. Já faz muito tempo que desisti de ver o noticiário da TV. Prefiro ler os jornais, na Internet. Se fico sabendo de alguma notícia importante ou interessante, vou buscar o canal de notícias. Mas, em geral, se fico na frente da TV é para acompanhar as crianças, colocar um vídeo, ver um desenho ou série legal, junto com eles. O absurdamente incrível é que não me sinto infantilizado.

Mais cedo, eu estava junto com a princesa e a Patroa no sofá, vendo um filme do Teletubbies. É terrível, eu sei, mas é inevitável. Os vídeos dos teletubbies são os filmes mais baratos que os criadores de vídeos já fizeram. A certa altura, um daqueles monstrinhos fala “De novo, de novo”, e eles repetem exatamente a mesma coisa que acabaram de mostrar. Desse modo, se um filme tem meia hora de duração, na verdade ele tem apenas dez minutos de cenas originais, com vinte minutos de repetição. Um horror, mas é a melhor coisa que inventaram para dar sono no ser humano. Com apenas dois minutos de filme, a princesinha já cochilava. Mais dois minutos e ela estava completamente apagada.

Eu fiquei admirando a minha menina, que agora tem quatro anos. Ela está bem comprida e tem muita pressa para falar. Às vezes engole as palavras. E hesita em escolher o tom de voz mais adequado para conversar. Eu e a Patroa combinamos de estimular uma fala de menina, para conter a voz de bonequinha mimada e engraçadinha. Ela gosta de fazer charme e está abusando da voz de dengosa. A Patroa diz que eu sou mais condescendente com ela do que jamais fui com o filho mais velho. Talvez seja verdade. Mas não me preocupo muito com isso. Também sei suavizar um bocado com o menino. Os dois têm uma grande capacidade de captar tendências maternas e paternas. Eles gostam de testar os limites o tempo todo. Encontrar um meio termo é bem difícil, às vezes. É bem mais cômodo ficar somente no papel de durão e sabe-tudo.

Mas comodismo também cansa. Por isso, depois de várias semanas sem aparecer, hoje eu trouxe de volta o Monstro do Cabide. Eu coloco um cabide nas costas, debaixo da camiseta, apago a luz e vou andando feito uma múmia manca pelo apartamento:

_Eu soou o moooonnnstro do cabiide. Do cabiiiiiideee!

E eles adoram fingir que ficam com medo. E depois correm feito zebras. Até que realmente ficam com medo, especialmente a menina, e então eu paro. Acendo a luz, tiro o cabide das costas, pisco os olhos com força e faço como o Doutor Banner, depois de deixar de ser o incrível Hulk:

_Nossa, onde estou? O que aconteceu? De quem será esse cabide? E o que ele está fazendo na minha mão? Será que esse cabide serve nas minhas costas, dentro da camisa? Será? Deixa eu ver. Oh, não! Estou me transformando! Será que vou virar monstro novamente? Socorro! Help!

E os dois desaparecem rapidamente enquanto apago a luz e digo, com voz bem cavernosa:

_Eu soou o moooonnnstro do cabiide. Do cabiiiiiideee!

Eu sou pior que os Teletubbies. Eu repito sem que eles digam “de novo, de novo”. E as noites passam voando, voando.

terça-feira, 23 de setembro de 2008

Um gráfico para o Careca




Decidi fazer um gráfico sentimental. Numa reta, na vertical, eu coloquei um valor de felicidade, de um a cinco, e na horizontal, coloquei os meses do ano. Saiu uma curva esquisita, cheia de altos e baixos, mas com tendência de alta. Depois fiz um gráfico de tristezas em relação ao tempo. Também fiz como da outra vez, atribuindo um valor de tristeza, de um a cinco, para determinado mês. Deu uma curva com tendência de baixa. Aí juntei os dois gráficos e um não era o inverso do outro, não era uma curva espelhada. Era uma garatuja de altos e baixos, parecida com nada. Procurei deixar as duas bem equilibradas e de repente percebi que o número de alegrias suplantava, em muito, as minhas mais sombrias tristezas.

Agora pretendo fazer um gráfico da minha vida.

Vou começar pela minha curva de peso e altura. Com essa pronta, desde a mais tenra idade, cruzarei esse gráfico com as linhas tortas da minha puberdade. E depois, com esmero, vou misturar com as curvas mais suaves dos tempos já distantes, em que eu sonhava a cores. E ali, em preto, vermelho, azul, amarelo e branco, eu era melhor do que já tinha sido. Será um exercício, no mínimo, interessante. Depois vou resgatar linhas mais fortes, de desespero, que mantenho trancadas e longe das vistas. Essas curvas são perigosas, minhas senhoras, meus senhores. Não podem ver a luz do dia. Mantenho esses registros em segredo, trancados a ferro. Não passam de listas, dirão os incautos. Mas não se dá liberdade ao que nos dá medo.

Meio sem jeito, farei mais uma proeza. Vou descobrir um teorema, para acabar com a tristeza.



Nada me ocorre.

Não será agora, nem hoje, nem nunca.

Sou só um pobre Careca.

Que chato, que porre.

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

A primavera obscena do Careca



A ilustração acima sempre me vem à cabeça na primavera. Achava que tinha sido um colega de classe que inventara. Ele desenhava a silhueta feminina, colocava o V e depois finalizava com ERA. Na minha cachola, essa ilustração era uma alusão direta a Vera Fischer, a musa de todos nós, os seres humanos do sexo masculino. A Vera Fischer, a Luiza Brunet, a Isadora Ribeiro eram uma espécie de triunvirato da imaginação masculina naquela época. Outras faziam sucesso, também. Mas as três eram campeãs meio imbatíveis da minha seleção de musas juvenis, os anjos azuis dos meus sonhos de adolescente.

Pode parecer estranho que um filme de 1930, Der Blaue Engel, tenha aparecido de repente na minha cachola. Mas lembrei que em uma das cenas do clássico com Marlene Dietrich, um dos alunos do Professor que fica maluco tira uma foto do Anjo Azul de dentro do livro e sopra as peninhas que cobrem as partes pudendas de Marlene. Não se vê nada na tela, pois um corte de montagem mostra o rosto do aluno se deliciando com a imagem da moça do cabaré. Em seguida, pelo que me recordo, o Professor toma a fotografia do aluno para logo depois também ser hipnotizado pela fotografia. Lembro pouco desse filme, que aluguei em VHS há muitos e muitos anos. Lembro pouco da minha juventude. E geralmente não gosto de me lembrar dessa juventude e das suas primaveras.

É primavera. O Anjo Azul foi o único livro que tentei ler em alemão. É óbvio que não consegui. Acabei lendo em inglês. Eu estudei um ano no Goethe Institute, no período noturno, mas não consegui avançar muito. Foi uma época conturbada do início da minha vida adulta. É estranho como alguns períodos da vida da gente simplesmente desaparecem da memória. Nessa época eu queria fazer tantas coisas ao mesmo tempo que não conseguia fazer nada. Embora eu ainda seja um pouco assim. Eu queria, mas me esforçava apenas o necessário para não fracassar. É óbvio que isso não era o suficiente. Hoje, o alemão ainda parece uma língua decifrável para os meus ouvidos. Algum dia tentarei reaprender.

Muitos anos depois eu vi uma outra pessoa desenhar esse mesmo desenho daí de cima. E essa pessoa jurou que havia visto o próprio pai desenhar esse desenho e copiado a idéia. Depois, vi muitas outras pessoas fazendo o mesmo desenho. Mesmo assim, minha memória teima em apontar como autor original do desenho um amigo que nunca mais vi. Lembro daquele dia, na escola, quando ele caminhou até o quadro-negro e riscou com um giz amarelo esse desenho. Lembro também que ele me deu o giz amarelo e que logo em seguida todos voltaram repentinamente do recreio.

E só porque eu estava com o giz amarelo, todos pensaram que o desenho tinha sido feito por mim. Lembro que esta foi a primeira vez que fui obrigado a ir conversar com o responsável pela disciplina, o Irmão Hilário. Era um religioso que tinha esse nome, mas não era nada engraçado. Esse cara era um campeão de lançamento de perdigotos, era uma espécie de bedel da escola. E lembro que foi a primeira e única anotação que recebi na minha caderneta de estudante. Dizia que eu era sujeito a devaneios e tinha sido apanhado a desenhar obscenidades.

Precisei roubar uma gilette do barbeador do meu pai, daqueles de metal, de enroscar. Com todo o cuidado do mundo, eu gilettei uma única folha da caderneta. Naquela época, todos os alunos da escola tinham uma caderneta com foto, calendário para carimbo de presença, anotações, hino da escola, hinos diversos e mensagens. O corte ficou quase imperceptível. Depois eu peguei a página recortada, um pequeno retângulo, e queimei. Durante muito anos, fiquei sem desenhar obscenidades. Durante muitos anos fiquei sem desenhar nada.

domingo, 21 de setembro de 2008

Paintball



Eu estou com um hematoma no braço esquerdo. Foi uma bolinha de paintball que acertaram no meu braço, perto do meu ombro. Dói um pouco, brincar de paintball. Mas é ótimo acertar as bolinhas nos outros. As regras de paintball são muito simples, mas mesmo assim ninguém presta atenção. Eu só consegui guardar as regras de segurança: mantenha a máscara protetora o tempo todo e só tire a capa da arma de ar comprimido na área onde é permitido atirar. É uma sensação ótima, apontar, mirar e acertar bolas de tintas nos outros. Paintball é melhor do que estilingue com mamona, embora seja mais caro.

O hematoma no meu braço resultou de um descuido de dois segundos em que fiquei sob a mira de um cunhado e de um sobrinho. Os dois estavam me cercando de posições diferentes, a trinta ou vinte metros de distância. Eu estava atrás de um obstáculo, uma falsa parede feita por um retângulo de lona de um metro e meio de altura. A mais ou menos um metro de altura havia um rasgão na lona, de onde dava para mirar e mandar bolinhas nos adversários. As bolinhas eram arremessadas a duzentos quilômetros por hora por uma pistola de ar comprimido no formato de uma sub-metralhadora. O alcance da arma era de mais ou menos uns cinqüenta metros. De modo que, na área de tiro, não havia zona de escape. Se você vacilasse, levava tinta.

Felizmente, só levei um único tiro. Acertei pelo menos uns dez no meu cunhado. Três só na perna direita dele. Toda hora ele entrava atrás de uma falsa parede de lona que não protegia as pernas muito bem. Era um lugar que permitia alcançar uma espécie de torre, de onde se podia cobrir o campo inteiro. Mas não escondia as pernas direito. Não sei se a minha equipe ganhou. Sei que não fui eliminado. Brinquei por mais de uma hora e disparei duzentas bolinhas de tinta amarela. Suei em bicas, fiquei cansado, mas me diverti.

Não me senti politicamente incorreto. Também não me senti politicamente correto. Brinquei de verdade. E achei que os meus filhos iriam ficar chateados de só assistir, de longe, protegidos por duas telas, as batalhas de tinta do seu pai. Mas até que eles gostaram. A menina juntou um monte de bolas que não estouraram. E o garoto aproveitou para disparar algumas bolas de tinta, sob a minha supervisão superexagerada.

sábado, 20 de setembro de 2008

Sobre pesquisas e linguiças



Uma das coisas mais enchedoras de lingüiça que já inventaram é pesquisa. Qual não foi a minha surpresa, minha querida kombi de leitores, quando descobri que além do Careca que vos fala, três em cada cinco seres humanos gostariam de ser dubladores de desenhos animados.

Foi o que mostrou uma pesquisa feita no meu ambiente de trabalho, de acordo com os mais rígidos parâmetros de pesquisa, onde nenhuma informação pessoal é repassada a terceiros, a não ser que me dêem uma grana. Mas quem vai querer saber alguma coisa daquele bando de pés-rapados incluindo este barnabé que vos fala?

Perguntei para quatro colegas de trabalho se eles gostariam de fazer alguma voz num desenho animado da Hanna Barbera, Disney ou Pixar. Dois responderam que sim. Dois responderam que não. Eu perguntei para mim mesmo e eu respondi que sim. Ou seja, três em cada cinco pés-rapados gostariam de ter feito uma voz qualquer de desenho animado.

Prosseguindo com a minha sanha pesquisadora, eu perguntei para os dois que gostariam de ter feito voz de desenho animado:
_E qual voz você gostaria de ter feito?
_Donald – disse um.
_Donald – disse o outro.
_Donald – disse o terceiro, que havia dito que não gostaria de ter feito voz de desenho animado.
_Scooby-Doo – disse o quarto sujeito, que também disse que não gostaria de ter dublado desenho animado.
Olhei para esses dois malas complicadores de pesquisas e fingi que não tinha escutado nada.
_Narrador do Papa-léguas – eu disse, o que é a mais pura verdade.

E assim, anunciei a estatística de que dois em cada três pretensos dubladores de desenhos animados gostariam de ter feito a voz do Donald. E, de maneira surpreendente, dada a profundidade e dificuldade da dublagem, a pesquisa mostrou que um em cada três pretensos dubladores gostariam de ter feito a voz do narrador dos desenhos do Papa-léguas e do Lobo Bobo. A voz do narrador é a que traduz as tabuletas e palavras das caixas de coisas que o Lobo arruma: Perigo, Cuidado – túnel ou ACME – Capa de morcego voador para caçadas rápidas, ACME – Catapulta gigante, etc.

Os caras dos cubículos começaram então a imitar as vozes mais engraçadas que já tinham ouvido nos desenhos animados, minha querida Kombi. E juro que só por isso eu já estaria bem feliz hoje. Mas acontece que olhei para o horizonte e depois dessa série de bobagens eu tive certeza absoluta de que iria chover. E choveu. Por causa disso, aqui estou eu falando mais bobagem ainda. E de tanto falar bobagem, fui falar mais algumas lá no blog da Franka, o Frankamente, que está super-hilário. Confira.

quinta-feira, 18 de setembro de 2008

Para se dar bem na reunião de planejamento




Fique calado.
Não se pronuncie.
Faça caras e bocas inteligentes.
Fique firme mesmo que lhe apontem o dedo e lhe dirijam uma pergunta direta, à socapa.
Para a pessoa que fez a pergunta, se ela não for Chefe ou Chefa, responda com um meio sorriso intrigante.
Isso, como se fosse a cena final de um filme cabeça.
Imagine a câmera fechando um close no seu rosto e todo o seu meio sorriso a encher uma tela.
No último instante, um dente brilha.
O canino reluz.
Fim.

Mais uma que não venci



De vez em quando eu recebo umas demandas estranhas, de responder coisas que não sei. Às vezes é uma pergunta. Já disse aqui que não sou de deixar pergunta sem resposta. Outras vezes, não são perguntas no sentido exato da palavra. Muitas vezes nem chegam a ser orações, frases com verbos. Não são frases que terminam com interrogação. São mais frases com reticências, daquelas convidativas, como se fossem espaços pontilhados para a gente completar com a palavra que fizer mais sentido. Existem pessoas mestras em fazer esse tipo de frase. E no trabalho, todos os meus Chefes e Chefas parecem saber fazer essas frases.

Aliás, parece que é isso que distingue as pessoas entre Chefes e Índios. Se você é capaz de fazer uma ou mais pessoas se darem ao trabalho de completar suas frases, você é Chefe, poderá se tornar um Touro Sentado. Agora, se você não passa de um mero completador de frases alheias, você sempre será um Caiapó Nhá-nhã-nhãin Renegado, sujeito a ser queimado num ponto de ônibus.

Não pense que é fácil deixar frases por completar. Em primeiro lugar, isso exige uma capacidade de embromação fantástica. Em segundo lugar, nem tem segundo lugar. Além de embromar (verbo que vem do bromato de potássio, a química que faz o pão inchar) legal, o ser humano que faz os outros completar suas reticências tem que exercitar algum tipo de poder. Esse poder pode ser qualquer tipo de poder. Tende a ficar mais poderoso o Chefe que exercita diariamente seus Índios na arte de completar frases, ainda que mal ajambradas Para ser perfeito, esse exercício deve começar como se o Chefe ou Chefa não quisesse nada, só bater um papo. A título de conversa mole, o Chefe ou Chefa começa a falar uma coisa qualquer e deixa essa coisa no ar, pendurada numas reticências. Essa coisa deve parecer complexa, mas na verdade ser bastante simples. De preferência deve-se começar por nomes de pessoas, filmes, artistas ou diretores de cinema que todo mundo conhece. Exemplo: Rapaz, outro dia eu vi um filme sensacional do Fernando ..........., aquele, que dirigiu Tropa de .......... .

E aí, para preencher os espaços em branco, o Chefe ou Chefa deve olhar para os outros Índios com aquele olhar entre o desprezo e essa-é-a-sua-chance-de-manter-o-seu-emprego e esperar a resposta certa. Eu não resisto. Eu caio nessa jogada todas as vezes. Eu fico olhando para os outros Índios começando a suar e quando percebo estou abrindo a boca, com as respostas em cada espaço vazio. E o meu problema não é esse. Não é cair nessa jogada. Quem está na chuva é para se molhar, então eu falo mesmo. O meu problema é que eu falo em primeiro lugar, como se estivesse no programa “Qual é a música?” , tendo que dar a resposta com apenas três notas, valendo todo o cacife. E falo bobagem.

E ultimamente, isso vem ocorrendo no trabalho, por causa de um sujeito que eu vou chamar aqui de Ronnie Von. Pelo que sei, o Ronnie foi o mega super campeão do Qualé a Música?, do Sílvio Santos. Pois no trabalho, esse Ronnie está quase sempre ao meu lado quando o Chefe começa o seu exercício matinal de fazer com que nós, os Índios, completemos frases geniais antes de seguirmos para os cubículos. Essa, aliás, é uma boa rotina para uma organização. É tão boa quanto ginástica forçada, tai chi chuan e eletrochoque. E ultimamente, Ronnie tem sido mais rápido e mais certeiro do que eu. Em todo e qualquer assunto. Até nas frases de aquecimento do Chefe.

Por conta disso, pretendo mudar o meu consumo de leituras e ouvituras. Vou procurar ler o que o Chefe costuma ler e me ligar alguns temas e sons. Mas não vou aderir a tudo, como já percebi que o Ronnie fez. Jamais hei de preferir câmbio automático. Não curto times do interior paranaense. Não entro em fila do Almodóvar. Não me meto a falar latim. Detesto expressões chulas em inglês. Paciência. Não se pode vencer todas.

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Um estouro de curtas


Uma crise na minha bolha
É extraordinário o número de avisos que todos nós recebemos, de todos os lados, sobre a possibilidade de estouro da bolha. As pombas começaram a carregar ramos de oliveira depois de cento e vinte dias sem chuva. As abelhas começaram a desaparecer, de todos os lugares. Uma baleia encalhou numa praia, na Austrália. Os cães fizeram amizade com gatas vadias. Começou a chover granizo em Minas Gerais e em Kuala Lumpur, dia sim e dia não. Um brasileiro voltou a ter chances de ser campeão na F1. E meu joelho esquerdo começou a doer horrores, desde uma sexta-feira de junho. Como sempre, apelei para o meu velho senso prático para desqualificar esses indicativos sólidos de algo estava para acontecer no velho reino da Babilônia. E nada fiz. Tivesse sido eu mais atento e sábio, poderia ao menos ter mandado uma carta aos irmãozinhos Lehman.


Cartinha que não mandei
Hello, Brothers, convém diminuir essa mania de querer ganhar sem fazer nada. Isso não está certo. Tudo bem, todo mundo quer encontrar um tesouro enterrado na areia. Mas esse negócio de enterrar areia e sair vendendo mapa não pode acabar bem. Eu não entendo nada de finanças e nem de derivativos, mas sei que entro pelo cano toda vez que eu pago caro por uma coisa que não vale nada e ainda assim não recebo coisa nenhuma. Sou, realmente, um sujeito tolo, que não sabe ganhar dinheiro, mas não sou maluco de queimar notas sem fumar charuto. Sempre me falaram da economia globalizada, mas nunca tive coragem de tirar dinheiro da poupança para investir fora das contas a pagar e do supermercado. Admiro esses gringos valentes, que chegam aqui com seus dólares suados e investem em empresas que não conseguem apresentar um balancete. São tipos assim que conquistaram o mundo, mas perderam até as cuecas. Enfim, se cuidem, Manés.


Ah, as possibilidades
Talvez, se eu tivesse mandado essa cartinha singela, conseguisse salvar os Brothers. Talvez, se eu tivesse mandado essa cartinha singela, a história do mundo teria sido diferente. Mas é totalmente provável que não fizesse a mínima diferença. Como não fez diferença aquele sinal evidente de estouro da bolha que aconteceu comigo na segunda-feira do mês passado.

Numa segunda-feira de agosto
Tive um encontro com C3PO, o mala da impressora onde eu trabalho. Um sinal evidente, evidentíssimo, de que o mar não estava para peixe e os céus estavam iniciando uma guerra estelar contra a humanidade. Na semana passada, novo encontro com C3PO, novamente na impressora. É uma impressora,xerox, scanner, fax, telefone, modem, tudo em uma. O C3PO estava xerocando a própria mão umas duzentas vezes. Ele colocava as duas mãos sobre a mesa de xerox e acionava o “copy” com o queixo. Percebi, com uma rápida olhada, que ele procurava escrever uma mensagem xerox utilizando a língua dos sinais. Uma boa idéia, a do C3PO. Para mandar uma mensagem forte para o C3PO eu só precisaria de um único xerox, de uma só mão e com apenas um dedo em riste. Mas depois desse encontro não vi mais o C3PO. Quisera aquele sujeito escabroso estivesse escrevendo o testamento com as xerox das mãos. Mas, em se tratando do C3PO, isso seria sorte demais.

terça-feira, 16 de setembro de 2008

A crise chegou e não se fala em defenestração




Ninguém, ninguém fala nisso.

Obviamente, o óbvio
É sempre bom começar uma coisa nova pelo começo. Não comece pelo fim. Nem pelo meio. Comece pelo começo. Não comece com coisas velhas. Comece coisas novas com coisas que ainda estão no início. É bem difícil.

Mais sobre o que vale menos
Quando as coisas começam a perder valor, não perca a cabeça. Venda a bom preço.

Um suco de uva, por favor
Sim, bem gelado.

A Rádio Careca está no ar
Coloquei algumas versões diferentes de “Love is a losing game”, todas cantadas pela Amy Winehouse. Essa música e a cantora me emocionam profundamente. Quem não quiser saber nada disso, pode sintonizar Moloko – Fun for me. Tem uns Metallica velhos também, para os headbangers.

Pessoal, estou sentindo as pilhas fracas
Preciso reciclar a minha capacidade de consumo. Preciso ouvir umas coisas novas. Descobrir uma nova banda sensacional. Outra cantora dilacerante. Preciso de um novo diretor de cinema genial para cultuar. De uma equipe de atletas fenomenal para elogiar. Preciso ver uns desenhos novos, curtir alguma coisa legal. Acho que vou comprar uma revista em quadrinhos nova. Cacilda! Acho que pintou a Crise da Meia Idade Adiantada. Ela é meio chulé, essa Crise.

Imagine se estivéssemos em 1929
O cheiro de café queimado estaria entrando pelas narinas de todo o país. Estaríamos queimando borracha. Jogaríamos açúcar nos rios. Daríamos leite aos porcos. Deixaríamos os grãos para as galinhas se fartarem. E, no final, todos iríamos acompanhar as pequenas holandesas a caminhar para o pântano. Estouro de bolha de bolsa, se você pensar bem, é como a menstruação das mocinhas, a cada geração chega mais cedo. Fazendo as contas, essa chegou com pelo menos onze anos de antecedência. Desde que eu me entendo por gente, todo ano se fala em Crise Braba. Dois bancos gigantescos e centenários quebraram e não se fala nem em suicídio. E agora que ela , a Crise Braba, chegou, não vi ninguém pular das janelas. Parece que ninguém gosta mais de drama. E onde estão as filas de sopão? Os concursos de dança de resistência? Tudo está tão nhém-nhém. No final, essa grande Crise Braba não é lá essas coisas.

Enterrando o que o gato não quer mais enterrar
É preciso, é preciso. Onde foi que eu deixei aquela pá?

E por enquanto é só, pe-pe-pessoal!

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Algumas notas sem música




O fim está próximo
Está bem perto, mesmo, acredite. De acordo com o Cabeça, dá para sentir o bafo gélido no pescoço.
_Como é, Cabeça? – eu perguntei. É muito raro ver uma escada tão bem colocada como essa. Eu estranho e acho que é pegadinha reversa.
_Dá para sentir o bafo gélido no pescoço – repete ele, desavisado.
_E ele foi carinhoso, Cabeça? – eu pergunto, fazendo cara inocente.
Essa Lei Seca não fez bem ao Cabeça. Ele desabituou. Agora, bastam umas cervejas e o cara abaixa a guarda. Tudo bem, a bolsa cai lá fora, mas é preciso estar atento e forte, não temos tempo de temer a morte.
_Você gostava de jogar em qual posição, hein Cabeça? – pergunta o Rodrigo, com um leve sorriso irônico no canto da boca. O Rodrigo nunca sacaneia ninguém. E se o Rodrigo começa a sacanear é um sinal claro de que a vaca já voltou do brejo e caiu na calçada, muerta.
_Zagueiro – responde o Cabeça. É inacreditável. O que está acontecendo com meu amigo Cabeça?
_Sempre recuado e levando bola nas costas – eu digo e levanto porque brincadeira tem limite.

O ladrão de almas foi ao aniversário
Fui sentar perto do meu amigo Feijó, que eu não via há alguns decênios. O Feijó estava com a Esposa e também com o filho. O Feijó me copiou e batizou o filho dele com o mesmo nome do meu primogênito. Uma vez falei isso para o Helinho. Sábio, Hélio Carlos me alertou que o nome do meu filho vem sendo usado há mais de dois mil anos. Além disso, é um nome muito em voga desde que Guttenberg inventou uma maneira mais barata e rápida de fabricar livros.
_Careca, nossa amizade não é afetada pela falta de convívio. Estamos sintonizados. Faz um decênio que a gente não se vê, mas parece que foi ontem – disse Feijó.
Embora essa conversa tivesse um tom de quarto zagueiro, me senti na obrigação de concordar. O Feijó é artista. É fotógrafo. E ele é que nem os caras que sabem tocar violão. Nunca leva o instrumento de trabalho para uma festa. E eu acabei por esquecer de tirar uma foto dele com o herdeiro e a Esposa. Eu não sou artista. Estou sempre com a minha caneta. E ando com um bloquinho. Fiz diversas anotações durante a festa. Veja abaixo.

Notas da festa
Lembrar de levar um rango para o porteiro. Beba água. Não fique só na cerveja. Evite polêmicas. Não vá pagar mico. Beba água. Não fique só (hic) na cerveja. Lembrar de comer. Beba. (hic) Cer-ve-ja! Cer-ve-ja! Levante e respire. Res-pi-re. Vá buscar cerveja.

Crise - A locomotiva vem em nossa direção
Pessoal, vamos organizar a coisa. Na frente e em primeiro lugar, as mulheres e as crianças. Por favor, vamos evitar o pânico e agir com educação. Nesse cenário de Titanic, o melhor é manter a fleuma e tocar o violino enquanto der.

Não olhe agora, mas os ratos estão pulando fora
Os ratos cometem muitos erros. Mas dizem que nunca erram quando o barco afunda. Também, quando erram, afundam e ninguém fica sabendo.

O problema é quando o barco é do tamanho do mundo.

Tudo tem a sua hora
Por hoje, a minha é agora. Apago a luz e saio de fininho, à francesa. Bié

domingo, 14 de setembro de 2008

Estou curtindo essas notas curtas


Como foi a festa da minha princesa
Foi só uma reunião de família. E foi bem, obrigado.Repeti novamente a estratégia já registrada de esquecer o aparelho de som na festa da minha princesa, que completou quatro anos nesse sábado. Descobri há algum tempo, que as melhores festas de criança são aquelas onde é possível conversar sem querer berrar mais que o ilariê. E na hora de cantar parabéns, as pessoas soltam mais a voz, fica super bonito. Foi muito boa a festa. Vou contar as coisas que aconteceram no decorrer da semana. Já adianto que eu sou um pai super coruja.

A voz de Heráclito Stronger
Alguém disse que ele fala como se tivesse engolido uma tuba. Alguém disse que ele também parece ter engolido uma tuba. Eu acho que ele parece que vai desengolir uma tuba. Não presto muita atenção no que ele fala. Desde os tempos do Romeu, acho tuba um saco. Beu dariz endupiu, dirrependi.

O melhor escritor que li no mês passado
Tibor Fischer. Disparado, é o melhor escritor da atualidade. Entre na livraria e diga em alto e bom som:
_ Quero comprar um livro do Tibor Fischer. Agora. Tibor, preciso do Tibor! Tragam ele para mim. A gangue do pensamento. Viagem ao fundo da sala. Adoro morrer. Um palmo abaixo. O colecionador de colecionadores. Tibor Fischer. Tragam ele, agora!!!
Só pare quando o livreiro trouxer um exemplar de um livro do Tibor Fischer. Qualquer um. E se ficar viciado, não venha me agradecer.

Jeff Koons sabe se divertir
O olhar matreiro da Mona Lisa não me engana. Da Vinci sabia se divertir.
Picasso, curtiu muito, aquele campeão da arte. Salvador Dali também, com suas loucuras engraçadíssimas. Jackson Pollock, que morreu em 1956, com apenas 44 anos, sempre me pareceu acabrunhado. Acho que se tivesse se divertido mais, se não tivesse querido provar que podia controlar o “dripping”, teria rido mais à toa. Agora, esse gozador do Jeff Koons é de matar de rir, com magnífica exposição no Louvre.

Hoje é domingo, mas já estou um caco
“Cantemos felizes, a canção do dia, hoje é sexta-feira, dia de alegria.
A escola nos ensina, que devemos estudar, o estudo é nossa vida, estudemos a cantar.
Cantemos felizes, a canção do dia, hoje é sexta-feira, dia de alegria.”
Não, minha querida Kombi de leitores. Ainda não enlouqueci. Hoje estou igual ao impermeável do Batman. Ou pior. Queria que já fosse sexta-feira. Foi uma trabalheira sem fim, o sábado, mas a minha Princesa adorou. Então estamos todos muito felizes, mas cansados.

Meu filho também gostou da festa
Em geral, os meninos ficam um pouco enciumados das festas dos outros meninos. Aqui em casa é assim e meus filhos não são diferentes. Mas ontem, na festa da irmã, meu primogênito de cinco anos de idade estava super-feliz também. Além de ter brincado como nunca, ele ganhou três, isso mesmo, minha Kombi de leitores, três bonecos dos alienígenas do Ben10.
_Puxa vida, Tia, estou super mega alegrado! Estou um bilhão de feliz! – e tascou um monte de beijos na minha irmã.
E eu também fiquei super feliz e orgulhoso de um filho que faz agradecimentos tão legais. E os dentes dele, já estão legais.

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

Outra leva de curtas


Sábado no dentista
Meu filho estava pulando na beira da piscina, ontem. Já não posso mais acompanhá-los na natação. Então é a empregada-governanta-babá-cozinheira-faz-tudo-mão-na-roda da Rose que quebra mais esse galho. E a Rose disse que ele caiu e bateu o queixo no chão. E a pancada foi forte, pois os dois dentes da frente da mandíbula superior cravaram no lábio inferior, por dentro. Ficou a marca dos dois dentes. A Rose disse que sangrou um bocado. E eu vi a base dos dois dentes da frente. E a base está com uma fina linha preta. É valente, meu filho. Diz que não dói, mas faz careta quando bebe água. Já estou com um nome de dentista na manga. Sábado de manhã, vai ser dia de dentista.

Sobre o terrorismo
“I think we all know what they are trying to do—they are trying to use the slaughter of innocent people to cow us, to frighten us out of doing the things that we want to do, to try to stop us going about our business as normal as we are entitled to do.
And they should not and must not succeed. When they try to intimidate us, we will not be intimidated.
When they try to change our country or our way of life by these methods we will not be changed.
When they try to divide our people, or weaken our resolve, we will not be divided, and our resolve will hold firm.
We will hold by our spirit and dignity and by a quiet and true strength that is in the British people that our values will outlast theirs.
The purpose of terrorism is just that—it is to terrorize people and we will not be terrorized.”

O discurso acima foi feito na noite de 7 de julho de 2005, pelo então Primeiro Ministro inglês, Tony Blair. Naquele dia, quatro pessoas se fizeram explodir. Três no metrô e uma num ônibus double-decker. Mais de cinqüenta pessoas foram mortas pelas explosões e outras 500 foram seriamente feridas. Nesse único dia, o número de vítimas foi maior do que o registrado em vários anos de terrorismo e bombas do IRA. Depois do 11 de setembro, esse é um discurso que eu faço questão de lembrar.

Onde é que eu estou?
Um dia, daqui a muito tempo, alguém vai encontrar os livros que estavam na minha estante. E se alguém folhear os livros, esperando encontrar notas de dólares escondidas entre as páginas, vai ter uma surpresa. Ao invés de La plata, vai encontrar pedaços de papel higiênico. É com um quadrado de Neve, sem cheiro e super macio, que eu marco os livros que eu leio. Eu geralmente começo a ler um livro no banheiro, você sabe. É o lugar mais relativamente tranqüilo daqui de casa. Até as seis e meia da manhã e depois, das onze e meia à meia-noite. Só uma hora por dia. E pensar que eu já pensei em ser leitor profissional.

Vamos a la playa
Vamos. Vamos. Vamos. Mas no ano que vem. Nesse ano não vai dar.

Meu novo moleskine
Comprei um bem bonito. Sketchbook de bolso. Só que não cabe no bolso. Tenho que carregar na mão. Meu cunhado me viu e falou assim:
_Abençoa a gente, pastor?
É um gozador, esse meu cunhado. Falei pra ele, com aquele tom de ora pro nobis de monge beneditino:
_Vá-pro-raio-que-te-partaaaa-aaaaaaaaamém!
Ando meio sem humor para cunhado.

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

Mais curtinhas de onde vieram as outras

Franka não gosta de prolixos
Vou passar a escrever mais coisas curtas. Sei que a Franka vai gostar. Ela prefere postes curtos, já reparei. Ela só comenta post curtinho. É bem verdade que eu tenho mania de ser prolixo. Algumas pessoas já me falaram que eu sou prolixo pacas. Prolixo, aliás, é uma palavra tão feia que parece estimular uma economia de palavras. Qualquer um fica com medo de falar e escrever muito. Fico imaginando as minhas palavras escorrendo para o ralo, sendo ensacadas em plástico preto. Aí vem um caminhão e pegao os prolixos para jogar tudo num aterro. E aí eu saio correndo atrás do caminhão, porque no meio da bagunça, joguei fora umas palavras legais, que não posso perder. Tenho alguma admiração pelas pessoas que falam muito. Eu não tenho saliva para tanto. Mas as pessoas que falam muito me cansam um pouco, é verdade.

Uma colega durona
No trabalho, do outro lado da minha baia, tenho uma colega durona. Ela já foi marinheira. Deu duas voltas ao mundo. Eu escutei ela conversar com alguém da diretoria da escola de inglês do filho.
_É da diretoria? Olha aí, sou Fulana e meu filho, o Fulaninho, perdeu o livro de inglês. Eu não acho esse livro em lugar nenhum. Estou procurando há duas semanas. E a professora está constrangendo o meu filho na sala de aula. Avisa para ela que eu não vou tolerar isso. É. Não quero que meu filho fique sendo pressionado porque está sem o livro. Ele perdeu, caramba. Estava dentro de uma mochila. Ele perdeu a mochila, o livro, os games, tudo. Ou furtaram ele. Não sei. Ele só tem oito anos e não quer falar sobre isso. E ele já disse que não encontra o livro para a professora. Eu já disse para a professora. Mandei um bilhete. E essa moça não pode ficar dizendo “que coisa feia, todos os coleguinhas com livro e só você que não traz”. Ora, faça o favor. Não vou admitir isso. Vou tirar o menino dessa escola se ele continuar a sofrer esse tipo de pressão. É. Tem uma escola de inglês em cada esquina. Diz para ela agora, que é para parar com isso. Vou ligar de novo daqui a cinco minutos para ver se você já falou com a professora.
E cinco minutos depois ela ligou. Parece que falaram com a professora.

Bolsa acumula perda de 24% no ano
Mas só se fala em bolsa? A carteira também registra perdas de 80% a 90% todos os dias. O acumulado do ano é um prejuízo só. Dá pra mais de mil por cento, sem contar as gorjetas.

Cresce número de famílias chefiadas por mulheres
Lá em casa somos pioneiros desse tipo de chefiança. Somos uma família onde as mulheres mandam e os homens dizem “siiim, beem, tá bom, beem”, iguais às ovelhinhas de presépio.

Obama é do Barack-o!
Obama, deixa eu ir, Obama, eu vou só
Obama, deixa eu ir, para o sertão do Caicó

Comercial favorito
O primeiro aviso, é uma coceirinha.
O segundo aviso, é seu próprio pente.
Quando os seus cabelos começam a cair, não passe ridículo.
Use logo Capiloton - para a saúde dos seus cabelos.
Um produto: Bozzano!

A dieta de Steve “Metaleiro” Jobs
Primeiro ele fez o pessoal ralar até emagrecer o laptop. Ficou levinho, levinho. Aí ele inventou uma dieta para o Ipod Nano, que também perdeu um monte de peso. Ficou fininho, fininho. E dizem que satisfaz. O bolso do Steve, porém, está cada vez mais pesado. Heavy e vil metal.

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

A escuta do Careca



Nessa terra fantástica, se ninguém grampear o seu telefone, você não é ninguém. Aqui, nessa cidade, os grampos são símbolos de status. As pessoas se encontram nos elevadores dos edifícios mais chiques e comentam umas com as outras:
_Descobri três grampos nos telefones de casa. No trabalho eu nem conto. O único liberado era o Iphone, que comprei na semana passada. Mas até sexta-feira “eles” grampeiam.
_O meu já foi grampeado. Aliás, o meu blackberry tem tanto grampo que eu chamo ele de “blackpiercing”.
_Eu tenho grampo até no celular da empregada – diz um outro, orgulhoso.
_Dia sim, dia não, me grampeiam – fala um sujeito estranho, de sobrancelhas feitas.
_Ih, comigo é todo dia – diz outro sujeito, revirando os olhos igual à Dona Bella, da Escolinha do Professor Raimundo (Só pensa na-qui-lo).
_Eu só compro telefone pré-grampeado.
_Eu também. Se não fizer aquele barulhinho de grampo eu chamo a manutenção técnica e eles providenciam ao menos um grampinho estepe, imediatamente.
_Eu gosto de grampos discretos, para falar a verdade.
_Isso não existe. Grampo que é grampo tem que fazer um clic, ou outro.
_Já foi assim, mas não é mais. Hoje em dia, existem grampos super discretos, com acordes harmônicos em MP3.

Só eu fico calado, no meio dessas conversas. Não tenho paciência. Se alguém algum dia grampear o telefone do Careca só vai escutar conversa em código.

_Alô, já foi?
_Tô indo.
_Vai pegar?
_Vou.
_Então, tá, beijo.
_Beijo.

Se alguém achar que é grana, eu agradeço os pensamentos positivos.
Ou então:
_Benhê, tudo ok por aí?
_Tudo.
_Beijo.
_Smack.

Se alguém achar que é uma combinação perversa de sexo e Lei de Gerson, eu diria que é excesso de imaginação. Aí, um dos caras metidos a importantes do elevador vira para mim e pergunta:
_Nunca te grampearam?
_Nem pensar, bicho, comigo é na porrada – eu digo, exatamente como diria o Natal, meu amigo de fé, meu irmão, camarada.
Depois disso, pelo menos quando estou perto, não se fala mais de grampo no elevador.

terça-feira, 9 de setembro de 2008

Um monte de notas curtas

Levei o PC para consertar ontem. Aí fui escrever a caneta, em papel. E em papel, eu só escrevo coisa curtinha. Olha aí.


O desejo de ser intelectual do Careca

Passou. Meu desejo de ser intelectual já tinha mais ou menos uns 15 segundos. Aí eu vi uma propaganda de um Portable Playstation II, com o FIFA Soccer 2007 e desencanei. Passou, passou. E então eu voltei a me sentir melhor e mais feliz. Ser intelectual é muito triste. Tem que pensar. É difícil. Não vale o esforço, ser intelectual. E tem muita gente boa na concorrência. Também não vale a pena ser anti-intelectual. Tem muita gente que confunde isso com apologia à burrice, o que é bem diferente. Os apologistas da burrice nascem a cada segundo que passa, olha aí, já nasceu um monte desde que você começou a ler o parágrafo. Todos não vêem a hora de virar candidato.



Mais sobre a Tonga da Mironga do Kabuletê

Vinícius estava de porre em Itapuã. A língua estava tão seca e embolada que ele não conseguia falar coisa nenhuma. Estava incompreensível. Então ele pediu uma água de coco para Naninha, a filha de um legítimo compositor baiano. A menina entendeu errado e ficou tão ofendida que tentou acertar a cabeça de Vinícius com a moringa de barro. Mas acertou o toquinho do Toquinho. Desde então, Toquinho desenha, numa folha qualquer, um desenho amarelo...



Se você disser que eu desafino

Tem toda razão. Sou um dos caras mais desafinados que já passaram pela face da Terra. Eu desafino tanto que um dia fui desconvidado para cantar num karaokê. Eu tinha acabado de iniciar “Alô, alô, marciano” quando alguém gritou lá do fundo:

_No momento, não posso atender. Deixe o recado após o bip!



Cantando na chuva

Estou com vontade de cantar na chuva. Mas é preciso que chova. E com o soleil que está fazendo, é bem provável que não chova. Aliás, nem tem nuvem no céu.



Momento inesquecível ao som de Tim Maia I

“Na madrugada a vitrola rolando um blues

Tocando B. B. King sem parar

Eu sinto por dentro uma força vibrando uma luz

A energia que emana de todo prazer”



_Mas não era “trocando de biquíni sem parar”?

_É, Careca, você errou. A letra certa é “trocando de biquíni sem parar”.



Momento inesquecível ao som de Tim Maia II



“Na madrugada a vitrola rolando um blues

Trocando de biquíni sem parar

Eu sinto por dentro uma força vibrando uma luz

A energia que emana de todo prazer”



_Agora sim.

O grande crash do Careca e a nudez

Não foi culpa minha, galera. Eu tentei. Mas no domingo à noite, o micro simplesmente havia partido desta para outra. Quando cheguei em casa, tudo funcionava, menos o HD. E ao invés de ficar dando murro em ponta de faca, relaxei, abri uma lata de refrigerante e fui assistir TV com a Patroa. No domingo à tarde, eu passei umas três horas pulando com as crianças na piscina, o que provocou um sono imediato nas pequenas criaturas. Às sete e trinta, quando voltamos da casa dos avós, elas estavam dormindo muito bem, obrigado. E o computador não funcionou. Devido ao cheiro característico de fio torrado, intuí que a fonte tinha queimado. Vive queimando coisa aqui em casa.

_Ué, não vai escrever? – a Patroa perguntou, assim que me sentei ao lado dela, no sofá da sala. Fazia pelo menos uns quarenta domingos que eu não me sentava na sala à noite, para ver TV. Ela nem levantou os olhos, concentrada, enquanto fazia as alças das lembrancinhas que serão distribuídas na festa da princesa, no próximo sábado. As meninas vão ganhar bolsinhas lindas, cor-de-rosa, cheias de guéri-guéri e lacinhos. Os meninos vão ganhar sacolas de pirata bem machos, com caveiras e tudo.

_Deu pau no micro – eu disse, olhando para a televisão. Estava passando um filme dublado. Desacostumei de ver filme dublado. Comecei a ficar aturdido com a desconexão lábio-vocal. Além disso, algumas vozes, visivelmente não combinavam.

_Que filme bom é esse, benhê? – eu aprendi a fazer perguntas para a Patroa há muito tempo.
_É o único filme dublado que está passando. Se eu tirar o olho da costura, espeto o dedo e não consigo terminar as lembrancinhas – explica a Patroa.
_Essa TV tem um som bom, né, benhê? Eu também gosto muito de escutar TV. É melhor que escutar rádio, né? – continuei a importunar.
_Tudo bem, pode mudar de canal.
_Acho que eu vou ver o jogo da Seleção Brasileira de Futebol contra El Chile. Você se importa?
_Não, pode mudar – ela disse, ainda super concentrada no trabalho manual.

E foi assim, minha querida Kombi de leitores, que eu passei a noite do domingo. Com preguiça.

Confesso que senti um enorme remorso por não estar preenchendo o blog com informações tão relevantes quanto essas que vocês acabaram de ler.

Mas desencanei.

Confesso que pensei muito em contar a piada que rolou na hora do almoço de domingo, depois que as mulheres e as crianças estavam distantes da mesa. Aí parei de pensar e resolvi contar mesmo. Leia abaixo.

Dois compadres estavam bem sossegados, fumando seus respectivos
cigarros. Um deles pergunta pro outro:
- Compadre, o quê que você acha desse negócio de nudez?
- Acho bom, ué!
O outro ficou assim, pensativo. E perguntou de novo:
- Você acha bom por causa de quê, compadre?
- Ué! É mió nudeis du que nu nosso...

sábado, 6 de setembro de 2008

O toque de Sadim

Há uma época certa para tudo na vida, já me disseram. Mas já me disseram que um pedaço de pano de chão era pura seda e eu acreditei. Por isso, eu teimo em achar que não é nada disso. Não há tempo certo para nada. Somos todos aprendizes de nossas próprias existências efêmeras.

Houve uma época em que eu achava que eu tinha o Toque de Sadim. É Midas, ao contrário.

Eu conseguia transformar ouro em qualquer coisa sem valor. Eu tinha boas idéias, mas elas não produziam resultado algum.

Acho que evoluí um pouco. Mas aí volto a vacilar e fico achando que Sadim voltou. Ela e a minha insegurança, Isa. Essa dupla me azucrina um bocado.

O sábado passou rápido demais. Não fiz nem metade das coisas que deveria ter feito.
E estou morrendo de sono.

Terei de me estender mais no domingo e na segunda.

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

Vai melzinho aí, doutor?



Eu estava de carro, voltando de uma reunião de trabalho para o meu cúbi (é pequeno demais para ser chamado de coisa maior, estou pensando em reduzir o nome ainda mais). E lá estão eles, senhoras e senhores, os malabaristas do semáforo. Está um calor infernal na cidade que Niemeyer projetou. Só posso imaginá-lo gigantesco, com uma enorme lupa numa das mãos, focalizando os raios solares sobre a minha cabeça. Zut. Estou torrado. Zut. Aquele cara também. Zut. O raio solar atinge um dos malabaristas. Zut. O fogo dos céus desce sobre nossas cabeças.

Algo, definitivamente, está acontecendo com o clima global. Não é só o derretimento das calotas polares. É o esquentamento universal que está nos tirando do sério. Está torrando o nosso senso de humor. Cara, não se consegue nem pensar direito.

E definitivamente, pensar é algo que esses dois sujeitos não parecem estar fazendo. Esses dois sujeitos estão em outro semáforo. E estão correndo feito doidos para distribuir balinhas. São dois baleiros lunáticos. Quando o calor é infernal todos os semáforos ficam vermelhos só para você, já reparou? Eu estou ali, suando em bicas, dentro do automóvel. Mas talvez eu deva explicar porque os vidros estão fechados. Então vou começar de novo, se você não se importar.

Eu outro dia estava descendo a avenida chamada Eixo Monumental, que desemboca na Esplanada dos Ministérios. São seis pistas num único sentido. E eu estava com um calor danado, vidros abertos, imaginando o Gigante Niemeyer com uma lupa bem grandona torrando os seres humanos que decidiram viver nessa cidade. E logo depois do primeiro viaduto, justo quando estava quase passando debaixo da rodoviária do Plano Piloto, o semáforo fechou. Enquanto eu observava as cores vivas do semáforo e o horizonte dessa pátria mãe gentil, escutei uma voz quase na minha nuca.

_Vai melzinho aí, doutor?
_Mas é claro!! – eu respondi, imediatamente, já sacando a notinha de dois reais que deixo enrolada no console, para evitar surpresas e mal-entendidos nos estacionamentos.

Eu também tenho sempre umas moedas de 1 ao alcance dos dedos para evitar dissabores, no porta-trecos da porta. São essas coisinhas que salvam vidas. E quando um ser humano pergunta na sua nuca se você quer melzinho, o melhor é aceitar logo e puxar o trocado. Desde esse dia, não importa o calor e o fato de não haver ar condicionado no carro, eu chego no semáforo com os vidros fechados.
Hoje, portanto, eu voltava para o meu cúbi quando reparei no estranho balé dos baleiros maníacos no semáforo dos infernos. Eram dois, os malucos. Eles, sob o sol escaldante do Planalto Central, distribuíam dois pacotes de balas grampeadas com bilhetes nos carros parados. Definitivamente, eu não iria abrir o vidro para pegar balinha de jeito nenhum. E ninguém abriu os vidros de maneira nenhuma. E os baleiros maníacos vieram correndo e retiraram todas as balinhas. Menos uma. Uma moça, lá na frente, pegou os pacotes grampeados, a dois reais. Fiz as contas depressa. Vamos supor que eles conseguissem distribuir vinte duplas de balinhas, a dois reais, a cada sinal fechado. Com a taxa de sucesso de cinco por cento a cada cinco minutos e considerando quatro metros percorridos para cada carro, cada um faturaria 24 mangos a cada hora, ou a cada mil metros percorridos. Em outras palavras, a cada cinco quilômetros, os baleiros maníacos , juntos, iriam faturar 240 mangos. Em uma semana, 1680.

Depois de uma semana, no entanto, a taxa de sucesso se reduziria para um por cento. Até que a dupla bolasse uma estratégia nova.

Depois, à noite, voltando para casa, eu vi a baleira do semáforo da rodoviária, no sentido rodoviária –Torre de TV. Tem uns dez anos que ela vende balas no semáforo. E eu comprava chicletes dela, uma vez por semana. Mas agora, depois do episódio do melzinho, deixei de comprar.

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

A máquina de costura da Patroa



Um dia um amigo me falou que eu escrevo muito pouco sobre a Patroa. E escrevo muito sobre mim. É verdade. E vai continuar sendo assim. Eu tenho muito ciúme da Patroa. E, estranhamente, não tenho ciúmes de mim. Por isso, foi com relutância que eu escrevi o título acima, que trata de um objeto de consumo da minha companheira, mãe dos meus filhos e mulher da minha vida, a Patroa. Acho admirável a capacidade que ela possui de não ligar muito para os meus defeitos. Mas uma vez eu abusei. Estendi uma caneta e uma folha de papel A4 para ela e falei para ela escrever todos os meus defeitos ali. Depois de meia hora de intensa atividade, quando eu já tinha esquecido do meu próprio pedido, ela se aproximou com a folha totalmente preenchida, frente e verso.
_Acho que eu vou precisar de uma resma – ela falou. Gostei tanto que me casei com ela.
Uma resma. Rá! E eu nem tenho tanto defeito assim. É verdade que estranhei o estranho senso de humor da Patroa. Meu cartão de vacinas, por exemplo, ela só havia pedido para dar uma olhada uma única vez, até uma semana antes do casamento. Achei legal da parte dela. Mas na véspera de casar ela se aproximou de mim, quando eu revisava a lista de convidados pela nonagésima vez, e perguntou se eu havia me lembrado de tomar a vacina de febre amarela. Como eu disse que não, ela fez uma cara terrível e depois falou para mim:
_ Então cancela tudo, não vou mais casar! Você nem é vacinado! Onde já se viu, eu, casar com um cara que não é vacinado contra a febre amarela?! Nem pensar! Vamos cancelar!
_Você está falando sério?, eu perguntei, cauteloso. Eu tinha acabado de encontrar um tio, o Tio Alaor, que não havia recebido nenhum convite. E nem dava tempo de mandar mais. Talvez fosse bom nem mencionar. Afinal, o tio era dela. E foi o primeiro japonês com o nome de Alaor de que tive notícia. E ela estava querendo cancelar o casamento.
_Não, claro que não. Depois da lua-de-mel você vacina, bobinho! – ela disse, só para me tranqüilizar. Na verdade, por precaução, eu me vacinei contra a febre amarela um pouco antes da noite de núpcias, depois de contar a ela que foi impossível encontrar o Tio Alaor.
_Por que você não me disse antes?! – ela perguntou, furiosa.
_Porque eu não achei importante, amorzículo!
_Não achou importante? Não achou importante? Eu deixei a vacina da febre amarela passar e você vem me falar que o meu tio Alaor, o melhor tio do mundo, não é importante? Cancela!
_Benzinho, veja bem...
Anos e anos de estudos profundos da cabala, dos discursos de Rui Barbosa, das canções de Raul Seixas e do hermetismo da canção “Na Tonga da Mironga do Kabuletê” me auxiliaram naquele momento. Mas eu só consegui convencê-la a não cancelar tudo porque fui até a clínica de vacinas, me vacinei e mostrei o cartão de vacina. Lá em casa tem poucos quadros, um deles é o cartão de vacinas, que mandei emoldurar. Desde aquele dia, que está gravado na aliança, na certidão de casamento e que eu vivo escrevendo na palma da mão para acessar a conta do banco, eu soube que o casamento é uma coisa estabelecida sobre respostas certas para as perguntas mais cabeludas que você possa imaginar.
A Patroa também é a única mulher que não se importa de dividir um hambúrguer comigo, inclusive a parte que eu cubro de maionese, ketchup e mostarda. São essas pequenas coisas que fazem a diferença num relacionamento. Outra pequena coisa grande, eu descobri agora, depois de mais de dez anos de casado: a Patroa gosta de costurar. É sério. E para comemorar essa gostação de costura, as habilidades de haute couture, essa vocação pret a porter, ela resolveu comprar uma mini-máquina de costura. É bonitinha a maquinazinha. Mas faz um barulho infernal. Agora, por exemplo, eu estou aqui, fazendo o meu teléco, teléco, teléco para o blog. E a Patroa ganha longe com o barulho de big bang que a maquininha faz. Um dia, tenho certeza, meu teclado e aquela máquina estarão ali, lado a lado, dividindo a parede com o cartão da vacina contra a febre amarela, perfeitamente emoldurados. E aqui em casa, eu digo em alto e bom som, ninguém costura pra fora.

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Uma carta para o Careca no futuro



Segui a idéia número dois da Keri Smith. Escrevi uma carta para mim mesmo no futuro.
Reproduzo aqui no blog, mas a carta de verdade está dentro de um envelope onde escrevi “FAVOR SÓ ABRIR EM 2015”.

Oi, Careca, sou eu, ou seja, você mesmo no passado.

É super difícil falar comigo mesmo na terceira pessoa, não sei como o Pelé consegue.

Mas vamos lá:

Oi, Careca, você deve estar pensando no que é que eu estava pensando quando escrevi essa carta. Para variar, em coisa nenhuma em especial. Hoje, dia 03 de setembro de 2008, você ainda é de uma confusão mental digna de um esquizofrênico. É incrível a quantidade de coisas que ficam lhe escapando da cachola. Você tem a capacidade de concentração de um babuíno faminto. Tudo atrai a sua atenção e você termina poucas coisas que inicia. Na prateleira que existe perto do computador há metade de um modelo de barco de madeira que você começou a construir em 2006. A última vez que você abriu a caixa desse barco foi quando você decidiu que as crianças já estavam maduras o suficiente para conviver com um pouco de serragem. Mas quando elas começaram a espirrar feito doidas, você percebeu que não entende nada de maturidade infantil.

Hoje seu filho ficou super-feliz porque você trouxe dois amigos da escola para brincar com ele. E sua filha também ficou mega contente, porque você trouxe uma amiga da escola para brincar com ela. No total, cinco crianças passaram a tarde inteira no apartamento e fizeram uma bagunça gigantesca. Você só curtiu um pedaço dessa brincadeira durante o almoço, porque teve que voltar rapidinho para o trabalho. À noite, eles esperaram para brincar com você. E os dois fizeram desenhos legais. Seu filho desenhou ele mesmo brincando de video game no computador, você mandando ele parar, a mãe isolada numa ilha deserta, a irmã chorando porque também queria brincar de video game mas ninguém deixou. O desenho está no envelope. Confira o modo como ele desenhou as letras do nome. Eu também fiquei orgulhoso. O outro desenho é da sua filha. Ela desenhou as duas professoras da escola alternativa. E repare como ela já sabe desenhar todas as seis letras do nome dela. E o mais engraçado é que ela desenha as letras da esquerda para a direita e depois da direita para a esquerda. Para ela não importa. Para mim também não. É uma linda princesa inteligente e sabida.

Eu pensei em colocar uma foto da Patroa com as crianças, mas o envelope estava ficando muito pesado. Hoje você comprou uma edição especial das Aventuras de Groo, do Aragonés. Guardou sem ler no meio da sua coleção de revistas em quadrinhos não abertas. Elas devem valer um bocado aí, em 2015. Ou então não valem nada. E você ficou sem ler as revistas de pura burrice e preguiça.

Hoje você comeu um sanduíche de presunto e queijo no café da manhã. Seu almoço foi um bife maravilhoso, junto com cinco crianças. Também tinha milho, batata cozida, arroz e feijão, uma salada perfeita, com tudo, xuxu e vagem. As crianças comeram super bem.

A Patroa está ralando um bocado no trabalho. E está costurando centenas de lembrancinhas para o aniversário da princesa. Você também se esforça. Mas acho que fica devendo. Todo mundo tem sido super legal contigo, com poucas exceções.

Acho que você cria expectativas demais. Numa boa. Você poderia ser bem mais feliz se não ligasse tanto para o que não tem importância.

Tomara que você esteja vivo. Sinceramente, é extraordinário que você tenha chegado até aqui, quanto mais aí. Eu gosto de você. E você devia se preservar mais. Parece que sua batata está assando, Careca.

Ó, se você ler essa carta, então escreva outra, para abrir em 2025.

terça-feira, 2 de setembro de 2008

Como desfazer uma tatuagem



Existem coisas que eu não sei fazer. Foi difícil admitir isso. Teve uma época que eu achava que devia saber fazer tudo. E muito bem feito. Eu achava que isso me destacaria. Eu achava que se eu soubesse fazer tudo, sempre teria uma coisa para fazer.

Mas aí eu cansei. Eu descobri, em primeiro lugar, que eu não dou conta de aprender tudo. Na verdade, eu descobri que existem trocentas coisas que eu não quero aprender e nem quero pensar a respeito. Mas existem outras trocentas de que eu sei muito pouco e quero aprender bem mais.

Um exemplo de coisa que eu não quero aprender mais?

Morte. Não quero aprender mais sobre morte. Sobre violência.

Também não dá para não saber nada. É preciso saber muita coisa para não ficar muito exposto e vulnerável. E hoje acho que sei um bocado, o suficiente para me proteger. Posso até estar enganado, posso vir a me arrepender, mas realmente não me interesso mais tanto por sobrevivência num mundo desértico. Teve uma época que eu tinha muito pesadelo de fim do mundo. Tive muitos daqueles sonhos ruins, em que eu seria um dos poucos sobreviventes da hecatombe da Terra. Eu seria uma espécie de Robinson Crusoé, saqueando supermercados num planeta sem gente. Fazendo provisões, coletando alimentos não perecíveis, me preparando para a minha hora final.

Também não quero mais saber de procastinação. Já fui um campeão de procastinação. Eu adiava até ida ao banheiro. Hoje não adio mais. Evito postergações. Procuro ir direto ao ponto. Não gosto de deixar coisas acumularem. Procuro viver mais o presente.

Nem sempre consigo, mas tento. E às vezes isso me torna muito imediatista. É difícil ter equilíbrio. É difícil.

Existem dezenas de coisas novas que despertam o meu interesse. Eu não tenho tatuagem, mas tenho vontade de fazer uma. E depois tenho vontade de ter tido uma tatuagem. Essa tatuagem eu apagaria mais tarde, porque eu me cansaria do que ela representava. E aí eu quero saber porque eu apagaria essa tatuagem. O que teria feito eu marcar a minha pele com alguma coisa? E o que teria acontecido para que eu quisesse apagar aquela marca?

Acho que as pessoas costumam tatuar a pele por amor, para fazer uma homenagem, para gravar uma lembrança. E há quem se tatue só porque acha bonito.

Tem tatuagem que eu acho bonita. Gosto mais até das antigas e simples. Âncora. Anzol. Brasão de time de futebol. Barco a vela. Sereia. Dançarina de hula. Caveira. Morte.

Às vezes, tudo parece pedaço do mesmo círculo. E a gente que sabe mais das coisas não sabe com a cabeça, mas com o coração.

Eu queria ter uma tatuagem de pássaro. Nem precisava ser colorida. Mas um dia, eu tenho certeza, eu apagaria aquele pássaro da minha pele.

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Caraca, Careca!



Evito falar palavrões em casa. Não é puritanismo. É porque acho feio. Tá bom, é puritanismo, também. Às vezes eu gostaria de ter a liberdade vocabular do Cabeça, por exemplo. Mas tenho certeza de que não conseguiria encaixar tantos palavrões entre os verbos e os predicados que nem ele. Assim como os cariocas conseguiram inventar uma frase inteira (ó u auê aí, ô!) só com vogais, o Cabeça já conseguiu também a proeza de inventar uma frase longa só com palavrões com mais de três sílabas (é impublicável, é impublicável, pô!). Melhor do que ele com palavrões, só o Humberto, que faz tempo que não vejo.

Talvez esteja com saudades do Humberto, mas não me entenda mal. O Humberto é amigo, mas é terrível para dizer palavrões. E ele também insulta com o olhar. Lembra do Costinha? Pois o nariz do Costinha já era um insulto engraçado. O olhar do Humberto também. A diferença é que não era engraçado. O olhar do Humberto, especialmente para as mulheres, era um insulto e ponto. E o Humberto tinha uma semana de namoradas, lembra? Uma mulher pra cada dia da semana. E algumas até sabiam uma das outras. Uma vez uma amiga me disse que o Humberto tinha o olhar cafajeste mais assustador que já vira num homem.

_Sabe aquela moça, do Mike Tyson? Eu não vi o olhar do Mike Tyson, mas deve ter sido um olhar igual ao do Humberto. Você já reparou?
_Não - eu menti. Eu exagerei para a minha amiga e disse que homem só olha outro homem no olho em exame de vista ou em briga. Se olhar e não sair na porrada é paquera.
_É sério, Careca?
_Não, claro que não. Mas eu lembro do olhar do Mike Tyson em início de luta e entendo o que você quer dizer.
_Um dia eu ainda dou uma porrada no Humberto, Careca! – disse essa minha amiga.

E depois disso, foi com naturalidade que um dia flagrei essa minha amiga com o Humberto. O Humberto me disse, quando ela foi ao banheiro, que estava reordenando a semana e achava que essa amiga daria uma excelente Quinta-feira.

_Hoje é quarta-feira, Humberto!
_Pois então, quarta é dia de testes para quinta-feira! – ele disse, e rimos juntos.

O Humberto era um canalha simpático, falava palavrão à beça e acho que a mulherada canalha gostava da canalhice dele. E ele dizia palavrão sempre que passava uma mulher bonita. Mas ele dizia também as maiores bobagens do mundo, e às vezes as mulheres achavam graça.

_Olha só a lapa #$#$#@@4 desse capô de fusca! É o remédio que eu procuro para a minha insônia! Te dou casa, comida e roupa lavada, meu amor! Vem conhecer a biblioteca do meu criado-mudo!

E às vezes, o Humberto dizia as maiores sacanagens sem dizer um único palavrão.
_Eu pratico sexo seguro, de com força!

Um dia, minha amiga realmente deu uma porrada no Humberto. Entre todas as quintas-feiras, ela foi a mais bonita.

Frase do dia