domingo, 11 de maio de 2008

O melhor de minha mãe



Minha mãe é uma mulher bonita. Nunca foi miss, de vencer concurso, mas sempre foi bonita. Tem o sorriso bonito, os dentes alinhados e brancos. Meu pai conta que os dois se apaixonaram quando trabalhavam no comércio. Meu pai trabalhava numa farmácia. Minha mãe, numa loja de tecidos. As lojas ficavam de frente uma para a outra. Uma rua estreita os separava. Os dois ficavam atrás dos respectivos balcões. Meu pai com uma farmacopéia de fundo.E minha mãe com todos os panos, de todas as cores, às suas costas. Fico imaginando meu pai a observar, ansioso e apaixonado, a vendedora da loja da frente.

Minha mãe é uma mulher forte. Tem fibra. Ela se firma na fortaleza da sua fé. Tem calos nos joelhos, de rezar todas as noites, os braços em cruz. Os dedos separam as contas do terço. Tem orgulho da sua crença em Deus, que nos quer todos santos. E trata todo mundo com franqueza. Tem uma inclinação tão forte a pensar que o ser humano é bom, por natureza, que às vezes parece ingênua. Do que não sabe, guarda silêncio. E se fala do que não conhece, confessa ignorância, com humildade. Foi minha mãe que me ensinou a não ter vergonha de perguntar. A agradecer quando alguém me ensina uma coisa nova. Embora eu ainda precise aprender sempre mais sobre gratidão.

Minha mãe me ensinou a chamar os mais velhos de Senhor e Senhora. Foi com ela que eu percebi que o respeito começa na ponta da lingua, nasce junto com a palavra.

Minha mãe trabalha sempre. Nunca vi minha mãe ociosa, na preguiça. Está sempre fazendo alguma coisa. É cozinheira de mão-cheia. Também é jardineira. Costureira. Bordadeira. Pintora. Desenhista. Doceira. E aprende rápido a fazer qualquer coisa. Quando começou a ficar complicado andar de ônibus nessa cidade, ela aprendeu a dirigir. Tinha a minha idade de hoje quando começou a auto-escola. Aprendeu a costurar e a manobrar máquinas complicadas. Overlock. Vestiu todos nós, com suas habilidades. Fez até vestido de noiva. Quando vou visitá-la, minha mãe está sempre com alguma coisa no colo. Um tricô. Um crochê. De repente se levanta e vai conferir uma panela no fogo.

Minha mãe é uma guerreira. Ela lutou contra um câncer e perdeu um seio nessa luta. Mas venceu a guerra. Faz força para não deixar que a vida que eu levo não me afaste mais, não contribua para que nos afastemos uns dos outros. Mantém controle rigoroso das datas importantes, dos aniversários que não posso esquecer, da lembrança que não posso deixar de lembrar. Ela é comandante dos meus pedidos de desculpas. É juíza dos meus conhecimentos. E me faz ligar para dizer um alô, fazer um convite e garantir a presença de alguém que eu não posso deixar de lado. Minha mãe é avalista dos meus pedidos de ajuda. Fiadora das minhas dívidas de gratidão. Muitas vezes, é ela quem agradece por mim. Ela sempre me defende das minhas mesquinharias.

Minha mãe tem o choro mais triste do mundo. E quisera não tê-la feito chorar. Mas o que está feito, está feito. Também veio dela não deixar ninguém me fazer carregar todas as culpas e bandeiras que querem me fazer carregar. Herdei ainda uma certa intolerância com a falsidade.

Minha mãe sempre foi mestra em me consolar. Mas não é super. Nunca quis ser. Recentemente, caiu e quebrou o pulso. Ficou com o braço na tipóia, algumas semanas. Mas agora já está bem, cheia de coisas no colo para terminar. Cheia de panelas para cuidar.

Mas o melhor da minha mãe é a sua coragem. Ela enfrenta os desafios com um sorriso na boca. Ela não hesita em arregaçar as mangas. E num instante está pronta para começar um novo projeto de socorro. Ele é muito boa em ajudar as pessoas. Ela é gente fina, minha mãe. Todo mundo que a conhece vira fã. E quando eu tenho uma dúvida, sobre uma coisa importante, vou até a minha mãe e peço conselho:

_Mãe, o que a Senhora acha?

E ela sorri com seus dentes bonitos. Lá no fundo dos olhos escuros brilha a resposta de uma aprovação. E se ela fecha os olhos eu sei que é não, antes dela responder. Minha mãe tem respostas modestas e sábias.

O mundo está cheio de mãe tristinha, que fica no cantinho, não incomoda ninguém. Mas a minha mãe não é assim não. Está mais para mulher valente, corajosa, de risada farta e gostosa. Sou fã da minha mãe.

8 comentários:

Mwho disse...

Bonito texto! Um belo presente de dia das mães. Não deixe de imprimir e dar para ela ler e guardar! Não perca a oportunidade de lhe prestar uma grande homenagem! Abração,

Careca disse...

Mwho, abração.

Anônimo disse...

Esse texto, Careca, é uma obra-prima. Te garanto que é muito bom sentir essa felicidade de leitor quando li suas palavras. Eu fiquei muito feliz. Sei que você pode até pensar: "ã?". Mas é isso mesmo. É genial e nos faz continuar acreditando em muita coisa boa. Muito obrigada.

Careca disse...

Uai, de novo, eu é que agradeço as palavras generosas.

anna disse...

que ótima forma de descrever seu afeto.
o texto vai bem além das habilidades da mamy e personalidade.
é ela dentro de você.

Careca disse...

Anna, obrigado pelo comentário. :)

Maína Junqueira disse...

Virei fã da sua mãe.
Queria ser uma mãe assim como ela. Esse ser forte, ativo e sábio.
Benza Deus!

Careca disse...

M.J., benza!

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