domingo, 18 de maio de 2008

Cuidados com a caixa de ir embora




Eu já troquei de trabalho algumas vezes. É esquisito mudar de trabalho. Existem uma série de rituais a seguir. Não é só passar no departamento de pessoal e avisar, com certa antecedência. É preciso fazer um planejamento prévio. Sua mesa, por exemplo. É preciso esvaziar a mesa aos poucos. Sem pressa. Ou então você vai levar quilos e quilos de papéis para casa que ficarão esquecidos numa gaveta funda. Ou numa caixa de papelão. Aqui em casa tem algumas assim.

É. Eu aprendi na prática. Saí muitas vezes com muita pressa de lugares bacanas, onde passei alguns anos. Aí encaixotava as minhas coisas, a papelada das minhas gavetas, toda a tralha que eu via pela frente. E quando chegava em casa nem me dava ao trabalho de olhar resmas e resmas de papel. Não valem nada. Ninguém precisa disso.

Na verdade, não tem muita coisa para levar quando você sai de um trabalho. Fotos. Molduras. Certificados, se for o caso. Certidões. Nada consta. E pronto. Cabe tudo na mão. Você acha que nem vai precisar daquelas caixas de arquivo, amarelas, de plástico.

Uma pasta L, daquelas transparentes, dá conta do recado. Um pen drive, para copiar os e-mails. Algumas coisas que a gente sempre leva de casa e esquece de pegar de volta. E uma ou duas coisas do escritório que você surrupia, só para guardar de lembrança. Um grampeador. Um porta-clips. Um apontador de lápis, dos menores, com manivela.

Pensando bem, a caixa amarela será ótima para guardar tudo. Só não vai caber aquele pôster. Como que pôster? Aquele que você sempre quis pendurar na parede mas não teve coragem. Aquela camisa do seu time autografada. A foto da praia. Aquela mensagem bacana que um dia te iluminou.

Ah, você não é disso? Tudo bem, esquece o pôster. Se você conseguiu colocar tudo na pasta amarela então já é hora de dar o fora. Não enrola na hora de sair. Nada de despedidas grudentas. Dê adeus com os olhos. Nem fale nada. Só mexa a boca, desenhando as palavras: Tchau Pessoal. Saia como aqueles caras do cinema, quando estão nessa situação.Levante a caixa na altura do peito, estique o queixo e siga a ponta do seu nariz. Tente andar em linha reta e sem tropeçar em ninguém. Dispense quem estiver te seguindo com a sua clássica olhadela de cima para baixo. É você que está indo embora. Isso é uma coisa para se fazer sozinho. Mantenha o foco na ponta do seu nariz.

Mas aperte a mão daquela moça que sempre te ajudou. Seja educado. Dê um abraço no chapa que quebrava os teus galhos. O sujeito a quem você pedia para comprar alguma coisa, de vez em quando. Minta para aquele coroa gente boa que você vai aparecer para um cafezinho. Você não vai voltar. Talvez ligue, para perguntar se acharam aquele troço que você não encontra em lugar nenhum. Mas você não vai voltar. Nunca mais.

E quando você chegar em casa, todos os seus terrores estarão instalados. Todos os seus arrependimentos estarão fazendo força para te derrubar. Entre no chuveiro e tome uma ducha. Isso passa. Amanhã será um novo dia e um dia você encontrará outro lugar. Nem que leve mais de um ano. Passa rápido como o inferno.

6 comentários:

Anônimo disse...

Às vezes, fica difícil administrar a caixa que tá na cabeça da gente mesmo depois do adeus. É tanta coisa que não queríamos, que nos sufocava, mas tantas outras que sentiremos muita falta. Fases. Fazê o quê, né? Bola pra frente sempre.

Careca disse...

Uai, é isso aí, seguir a ponta do nariz.

Mwho disse...

Careca,
Eu não gosto de voltar a locais de trabalho antigos. Quanto às pessoas, só me lembro das que valem a pena. Não fico triste com a minha memória curta...
Abraço,

Mwho disse...

Careca,
Não gosto de voltar a antigos locais de trabalho. Só me lembro das pessoas que valem a pena. Não fico triste por ter a memória curta...
Um abraço,

Careca disse...

Mwho, mesma coisa. Abraço,

Careca disse...

Mwho, mesma coisa. Abraço,

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