sexta-feira, 2 de maio de 2008

Sobre alguns escritores



Não sei muita coisa sobre os escritores que eu adoro. Também tenho uma preguiça enorme de ler biografia. Aí invento um pouco.
Isaac Bashevis Singer escrevia todos os dias. Em iídiche. Quando ganhou o Nobel em 1978 disse que iria comprar outra máquina de escrever com parte do dinheiro. Usava a mesma máquina havia 40 anos. Morreu em 1991. E escreveu todos os dias. Ele disse, diversas vezes, que a melhor amiga de um escritor é a cesta de lixo. Escrevia e reescrevia.
Knut Hansum também. O Nobel de “A Fome” era distraído. Esqueceu o prêmio num elevador. Tiveram que ir devolver a ele no hotel, mas chegaram muito tempo antes. Ele ainda estava voltando. A pé. Estava de roupas novas. Tinha demorado pois havia parado numa loja para devolver o smoking alugado. A loja era longe à beça. E um funcionário da loja havia mandado queimar as roupas usadas e velhas de Hansum. Foi um problema porque Knut não tinha dinheiro nem para uma cueca.
Gorki escrevia quando dava na veneta. Mas sempre com raiva. Tinha uma nota de 50 dólares na carteira. Na Berlim da hiperinflação, os restaurantes não tinham troco. Gorki comia de graça dizendo que voltaria no dia seguinte. Ele não voltava. Gorki também mudava de bairro todos os meses. Usava a mesma nota para não pagar aluguel. Um dia Henry Miller foi para Berlim. Miller também escrevia todos os dias. Ele pegou a nota de Gorki emprestada. Mas teve a má sorte de entrar num restaurante onde a nota foi reconhecida e apreendida. Gorki jamais o perdoou. Miller não ligou a mínima.
Saint-Exupery gostava muito de escrever. Mas tinha preguiça. Gostava mesmo era de voar. Foi abatido em 1944 por um piloto alemão perto de Marselha. O piloto Horst Rippert guardou segredo por mais de 40 anos de que havia sido ele que matara o escritor. E Rippert disse também que havia se tornado piloto por causa dos livros de Saint-Exupery.
Hemingway escrevia oitocentas palavras todos os dias. Palavras revisadas. Como ele só aproveitava um terço do que escrevia diariamente, dá para imaginar que Hemingway escrevia, no mínimo, uma três mil palavras por dia. Como ele fazia isso depois de tanto uísque? Depois de tantas touradas e pescarias? Não tenho a menor idéia.
John Steinbeck escrevia bem à beça. Fitzgerald também foi um campeão de datilografia e literatura. Bem antes dele, Balzac escrevia deitado. Mark Twain também. Kafka escrevia e queimava. Depois escrevia de novo e pedia para o Max Brodie queimar. O Max falava assim: Tá bom, Kafka, vou queimar. Mas não queimava. Um dia Kafka desconfiou e falou assim: Pô, Max, você está mentindo. Aí o Max disse que aquilo era um absurdo e mostrou um monte de cinzas para o Kafka. Ele ficou tão envergonhado que desejou se transformar numa barata, na hora. Aí correu para casa e mudou a história da literatura mundial.
Dostoiévsky não contava quantas palavras escrevia por dia. E ele só escrevia quando não estava jogando. Ele jogava muito, o Dostoiévsky. Mesmo assim, ninguém jamais escreveu como ele. John Irving também não conta as palavras. Mas é um escritor compulsivo. Que vira noites e noites escrevendo. Jim Dodge, Lawrence Block, David Goodis, Hammett, Canetti, Raymond Carver e Tibor Fischer não contam ou não contavam, mas fazem ou faziam questão de escrever todos os dias.
Dizem que Scliar, Millôr e Rubem Fonseca também escrevem todos os dias. E João Ubaldo, o melhor de todos, escreve até dormir e dorme até começar a escrever.

Nem penso em me comparar com essa turma. Longe de mim.

Sempre escrevi coisas para consumo rápido. Listas de compras. Algumas poesias. Bobagens. Mesmo assim, guardo uns escritos. Outro dia achei umas coisas que escrevi há uns cinco, seis anos. Eram escritos úteis, tinham serventia. Muitas listas. Informavam. Criticavam. Mas eram muito aborrecidos, esses escritos. Pretensiosos. Fiquei com sono e meio deprimido. No meio dessas coisas havia um texto curto, sobre um chefe que eu tinha. Era divertido. Dei umas boas risadas. Era um texto que eu tinha escrito para mim. Para que eu não me esquecesse. E também, é lógico, para que outra pessoa, se o lesse, soubesse como era aquele chefe. Ou soubesse como eu via aquela pessoa. Não importa. Eu já tinha esquecido que aquele cara tinha sido meu chefe. Aliás, eu já tinha esquecido quem era aquele cara, só me lembrei depois que li. Acho que é por isso que continuo a catar milho e a colocar essas coisas no blog. Minha memória é uma droga.

6 comentários:

Rodrigo Carreiro disse...

Essas idéias são realmente muito interessantes, mas faltou alguns escritores: kerouac, Machado de Assis, Jorge Amado, Gabriel Garcia Marquez, etc etc
Como será que eles escreviam? heheh

Careca disse...

Rodrigo,
faltou uma estante grande cheia. Um dia volto a isso. Um abraço,

Paulo Bono disse...

textos como esse, Careca, me lembram que eu preciso ler mais. ler. ler. ler. mesmo que não goste. mesmo que não queria procurar outro título do mesmo autor. mas preciso ler.

bem, aqui na web, leio seus textos. e gosto muito.

abraço

Careca disse...

Paulo,
eu também preciso. E é recíproco, também gosto muito dos seus textos.
Um abraço,

Mwho disse...

Careca,
Por que você não publica o texto sobre o seu antigo chefe?
Fiquei curioso...
Um abraço,

Careca disse...

Mwho,
vou publicar. Aguarde.

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