sábado, 9 de agosto de 2008
Aprender a ficar na minha
Obviamente, eu, que tenho opinião sobre quase tudo, tenho uma grande dificuldade em ficar calado. E eu fico olhando para a minha filha, de três anos, e observo que ela também possui uma grande dificuldade em manter silêncio por 45 segundos. Ela é uma linda pequena tagarela. E talvez tenha puxado um pouco dessa tagarelice de mim.
Eu fico calado mais tempo, isso é verdade. Sigo os ditados: quem fala demais, dá bom dia a cavalo; em boca aberta, entra mosquito. Geralmente, só abro a boca e solto uma enxurrada de palavras se uma pessoa me faz uma pergunta qualquer. Eu contei aqui outro dia da pergunta sobre investimentos no mercado de ações. Enrolo como posso. E ultimamente andam me fazendo muitas perguntas. E eu tenho a cara de pau de responder todas. É terrível.
Metodologia SWOT? É comigo mesmo. Western Spaghetti? Sei tudo sobre Sérgio Leone, Clint Eastwood e Ennio Morriconi. A melhor maneira de esfolar uma ovelha? Simples. Engraxar sapatos de camurça? Mole. Escovar dentes de jacaré? Intrigante. Construir piscinas? O fundamento é essencial. Pentear orangotangos? Com o produto certo, sem problema. Receita de sucesso? Sei traçar cenários positivos e negativos. Receita de bolo de mandioca? É, essa é difícil. Lá vou eu...
Mas existem situações em que as pessoas fazem as perguntas e eu começo a gaguejar. Clã-cla-cla-cla-ro. Claro. Dá para ver no ato que eu estou chutando “el bico”. Que eu não entendo patavina do que está sendo perguntado e que sequer sei começar a enrolar. Que a minha total deficiência no tema, misturada com a minha incapacidade de não responder uma pergunta, me obriga a cacarejar.
Nessas horas, às vezes eu queria sofrer só de sudorese, ao invés dessa “Síndrome de Parabolicamará”. Há quem prefira denominar essa mania de não deixar pergunta em branco, sem resposta, de “Mal de Boquirroto”. Mas eu prefiro chamar de “Assuntose”. Trata-se, na verdade, de uma compulsão para falar devido a uma pré-disposição à bobajada, inerente ao ser humano.
Quando não sei patavina e não vejo riscos em falar uma enrolação, minha “Assuntose” se manifesta. Gaguejo mas falo às pampas. Felizmente, minha “Assuntose” é limitada a alguns ambientes onde sinto que posso me sentir levemente relaxado. Ela não se manifesta em ambientes formais, que exigem um mínimo de raciocínio crítico. Nesses locais e nesses momentos, sou atacado pelo mais terrível dos males, o “Mutismo Solene”. Trata-se de uma incapacidade total de articular qualquer coisa inteligível que tenha uma ou mais sílabas. Fico completamente afônico, embora comece a suar profusamente e a piscar mais do que batida de asa de beija-flor. Os óculos impedem que as pessoas vejam as minhas pálpebras baterem recordes de velocidade e estou sempre de camiseta por baixo da camisa. Quase ninguém nota.
Para minha felicidade, o “Mutismo Solene” é um mal súbito muito pouco compreendido e geralmente interpretado a favor do indivíduo que sofre disso. Outro dia, por exemplo, encontrei o Chefe no elevador. Todo mundo do trabalho estava no elevador. Ele é gente boa, o Chefe. E ele me fez uma pergunta, depois dos cumprimentos e bom dias:
_E o Copom, hein? Acha que vão subir os juros de novo? – ele disse, muito sério.
E eu o encarei, sob o mais imediato e perplexo ataque de “Mutismo Solene” de que já me dei conta. Completamente mudo, paralisado e absorto em absorver o meu suor e a piscar em volume mais baixo, observei o cara que manda em mim. Franzi a testa, com medo de que o suor acumulado começasse a escorrer sobre as minhas sobrancelhas e eu ficasse com os olhos ardendo. Ele sorriu, interpretando a minha testa franzida como uma resposta perspicaz e perfeitamente adequada a tema tão complexo. Sei tanto do BACEN quanto da cadeia do DNA e dos mitocôndrias.
_Eu mesmo não diria nada melhor do que isso – disse o Chefe.
Ele me deu um tapa no ombro, parternalisticamente. Deu uma risada, desejou bom dia novamente, disse continue o bom trabalho e saiu. Quando todos voltaram a respirar, percebi que havia um misto de respeito e despeito entre os colegas, ali no elevador. Olhando para o espelho, percebi a minha testa franzida, longa, se fundindo à minha careca. Parecia mesmo uma expressão inteligente. Mas o Chefe, pô, o Chefe desceu no andar errado.
(Caramba, a Franka fez um super post gentil e bacana, mas tenho que ir para a festa da minha amiga. Amanhã, vou responder com o carinho necessário. Até!)
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2 comentários:
Careca,
Não ligue para o despeito dos colegas no elevador! O seu silêncio foi a coisa mais sensata naquele momento! Nem os caras do COPOM pensam do mesmo jeito...
Mwho, tinha um conhecido nosso que era do COPOM, não sei se continua. Ele é um gênio economista. Nunca entendi nada do que ele falava em economês. Nem quando ele falava bem devagar.
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