quinta-feira, 10 de julho de 2008

“Pida” e embromação



Eu demorei muito a descobrir o que é “pida”. Antes de você colocar no Google e fazer uma busca, desde já aviso que essa é uma palavra que faz parte do vocabulário exclusivo da Família Careca. Foi uma palavra que o meu filho inventou, quando tinha uns três anos. “Pida” foi também uma das primeiras palavras que a minha filha aprendeu a falar. Entre os dois, o significado dessa combinação de quatro letras jamais foi um mistério. Para mim e para a Patroa, foi preciso um esforço hercúleo para descobrir.

Durante uns três meses, os dois falaram de “Pida” prá lá, “Pida” prá cá. E como havia muito mais coisas para pensar, eu geralmente me esquecia de perguntar o que era “Pida”. Ou quando perguntava, não prestava atenção na resposta. Às vezes a gente pergunta as coisas para os meninos só por perguntar, não guarda as respostas direito. Ou a coisa entra por um ouvido e sai pelo outro. A cabeça tem preguiça de segurar as palavras e colar significado.

Estou enrolando um bocado, eu sei. Descobri que boa parte do prazer de ler vem da arte de enrolar. Da divagação, como diz o Dostoievsky. Da digressão, como diz o Salinger. Eu, que sou só um blogueiro, chamo de “embroma”, corruptela de “embromation”.

Existem milhares de pessoas que passam a vida na maior “embroma”, sem fazer nada de significativo. Pessoas como eu. E invariavelmente somos nós, os “embromadores”, os irresponsáveis pelas coisas boas da vida. É. Não escrevi errado não. Nós somos irresponsáveis. Um bom embromador nunca é responsável por nada. Mas eu perco o fio e a meada.

Pois um dia, não me lembro exatamente quando, o meu filho me perguntou porque a gente não tinha “Pida”. Achei que ele estava fanho, com o nariz entupido. Como o árabe que apresenta as cinco filhas: Esta é Velha, esta é Feia, esta é Bela, esta é Linda e Estefânia! Mas não. Ele falava sério.

_“Pida”, pai! Eu queria ter uma “Pida”! – ele insistiu.

_Eu também, meu filho. Eu também queria ter uma “Pida” novinha, brilhante – ensaiei, procurando ganhar tempo e mais pistas.

_E grande. Eu queria uma “Pida” bem grande! – ele disse, medindo uma distância da cabeça.

_É, quanto maior, melhor a “Pida” é! E o vovô e a vovó? Será que eles também gostariam de ter “Pida”? – arrisquei.

_Mas é claro!- ele sorriu, feliz por eu estar compreendendo.

_E todo mundo com “Pida” pode correr à vontade! – eu arrisquei, de novo.

_Não, pai. A “Pida” é pra nadar – ele disse, decepcionado.

_Igual à tartaruga? – perguntei, satisfeito com a pista.

_Igual ao tubarão! – ele arrematou, colocando a mão sobre a cabeça.

“Pida” é a barbatana do tubarão. Aquele triângulo assustador que aparece em cima da água, antes do ataque. Ele é um predador, esse meu filho. E quando entramos na piscina, ele sempre finge que tem uma “Pida”.

4 comentários:

Mwho disse...

Careca,
Li até o fim tentando adivinhar o que era "Pida" e não consegui. Nem depois de saber a resposta, consegui entender o porquê...
Investigue. Fiquei curioso...
Abraço,
Mwho.

Paulo Bono disse...

se todas embromações fosse assim, leve, curtida, cotidiana, sem pretensões e, ao mesmo, do caralho.

abraço, careca.

*rapaz, quando vier à Bahia, não peça sardinha. vá de moqueca de peixe, com dendê. é uma coisa diabólica. muito bom.

Careca disse...

Mwho, banquei o Sherlock, mas não descobri nada. Parece uma palavra que ele mesmo inventou e colou na barbatana do tubarão...

Careca disse...

Bono, na próxima, vou tratar de experimentar essa moqueca!

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