Eu estava lendo um livro do Rubem Fonseca. Num dos contos ele diz alguma coisa sobre apagar as coisas que você escreve. Sobre não deixar registros. Sobre não escrever.
Acho que não consigo. E também não tenho muita certeza de que é isso mesmo. De que esse é o estágio desejável. Nem mesmo tenho certeza de que existe um estágio desejável. Mas estou embolando tudo, vou tentar começar do início.
Eu ouvi falar de uma coisa chamada processualismo. É um tipo de arte onde o resultado final é o que menos importa. O importante é o processo intricado que o artista inventa para fazer o objeto artístico. O Youtube está cheio de artista assim. O cara pega uma caixa de papelão e desenha uma silhueta de uma cabeça com capacete em cartolina. Depois cola pedras e objetos de metal na silhueta. Coloca pó de metal somente na silhueta, onde seria o capacete. Enche as laterais de areia. Cola tudo. Passa fita adesiva. Depois fita crepe.
A coisa fica pesada à beça. Aí ele leva para tirar raio x. Quando ele sai do raio x ele destrói a peça, a marretadas. Varre o lixo e joga na lixeira. A única coisa que sobrou é o raio X. E até que fica legal, aquela silhueta de pessoa com capacete. E então o cara tira um xerox do Raio X. Pega uma tesoura e recorta o Raio X. Tudo o que sobrou daquele objeto é uma xerox. Então o cara pega o papel, dobra, põe no envelope e diz que vai mandar para um sujeito chamado Ali, que mora em Timbuctu, no meio do deserto africano.
_Ali, quando você receber isso, queime! – é a única coisa que está escrita.
Não sou processualista, sou muito preguiçoso e pouco metódico para isso. Mas gosto de fazer o que eu chamo de exercícios de poesia. O exercício consiste, principalmente, em riscar coisas.
Risque a melhor coisa que você escreveu no dia. Apague. Abandone o que você considera precioso na melhor história que você acha que precisa contar em versos. Depois comece tudo de novo, sem aquela frase. É assim que se consegue o lugar vago da frase certa. Por mais que você apague, ela continuará a brilhar na sua mente. E embora ela não tenha sido registrada, escrita, ela estará lá, impressa entre outras linhas, brilhando na sua mente, como a casca dourada de uma mexirica muito doce.
É extraordinário. É como a frase sobre os amputados, que dizem sentir dor na perna que já perderam. Como é possível sentir o que não está ali? É só fazendo o exercício que se percebe que é possível. Mas o Rubem Fonseca é diferente. Ele ampliou o estágio do exercício. Ele sugere que exista alguém que faça isso com a vida. Como um verso do Manoel Bandeira que eu li há muito tempo.
2 comentários:
Careca,
Gostei desse processualismo!
Visceral mesmo.
O cara tem prazer no processo e em privar os demais de sua criação...
Muito doido...
Abraço,
Mwho.
Mwho, é uma corrente forte, esse processualismo. Tem uma outra que é muito louca, em ilustração, que é chamada de pop surrealismo. Ali, em http://www.illustrationmundo.com
você encontra muito. Um abraço,
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