terça-feira, 3 de junho de 2008

Capuccino com chocolate



Máquinas sempre me deslumbraram. Tenho um fascínio enorme por engenhocas e geringonças. É um deslumbramento que vem de longe, de muito tempo. Acho que começou com a máquina de escrever do meu pai. Ele a comprou, usada, lá pelos anos 50. Todos nós a usamos furiosamente em trabalhos escolares e universitários até meados da década de oitenta. A engenhoca é de 1943. Assim como o meu pai, eu desenvolvi um relacionamento emocional com essa máquina de escrever. Tenho enorme carinho por ela. Foi com ela que desenvolvi a vontade e a disciplina de escrever sempre, não importa o que aconteça.

Eu gostava do barulho da máquina. Gostava do modo de avançar as linhas, uma pancada leve numa manivela, que fazia o cilindro girar. Eu usava sempre um papel carbono, em quase tudo o que escrevia. Guardava cópias das cartas. Dos contos. Dos discursos exaltados. Das análises “brilhantes”.

Depois, quando eu estava me achando escritor, meu pai chegou em casa com uma máquina nova, uma Olivetti portátil, que hoje também guardo em casa. Foi um dos presentes mais emocionantes que já ganhei. As duas máquinas estão, lado a lado, na estante da sala. Viraram dois bibelôs manuseáveis. As crianças ficam teclando para se divertir. É o contrário de escrever como punição. E elas nem se preocupam em colocar papel nas máquinas. Se bem que eu acho que nunca mostrei como funcionam as máquinas. As fitas de tinta estão ressecadas. Os discos nem giram direito. De vez em quando, eu destravo as teclas, passo um pano para tirar o excesso de poeira. Uma vez eu até comprei um limpa-tipos, para uma limpeza mais radical. Mas acabei nem fazendo a tal limpeza.

Toda essa embromação é para dizer que demorou um dia para que eu ficasse operacional, com telefone, pc e mesa.

Assim que cheguei ao novo local de trabalho fiquei observando as máquinas e engenhocas. Para começar, ganhei um crachá eletrônico, que permite o acesso aos elevadores e a uma série de portas em diferentes andares, mas não a todos. Meu crachá não é do tipo A. Acho que é tipo B ou C. Pelo que eu reparei, há uma pequena marca colorida que indica se você é alguém para tirar o chapéu ou só um mané como eu. Essa distinção também vale para a Intranet e a Internet. Como as coisas demoravam, eu observei as impressoras, os fax, as copiadoras, as tudo-em-uma, os telefones sem identificadores de chamada. Tudo simples e funcional. O grande filtro com água. A copa, com um pequeno micro-ondas. Observei tudo. Até encontrar com a super-máquina especial demais xuxu-beleza.

A máquina fica no canto de um cubículo, perto da entrada dos banheiros. É maravilhosa. Toda em cinza, com uma cúpula em acrílico transparente. Dá para ver os perfeitos e inteiros grãos torrados de café. Oferece oito opções, bem servidas num copinho especial, com plástico mais grosso, que não deixa queimar os dedos. Estou experimentando duas opções por período. Meu preferido é um cappucino com chocolate.

Com aquele copo de café quentinho na mão, eu me sinto superimportante. Também tenho sido bem tratado.

Divido um “cubi”(é pequeno demais para se chamar cubículo) com outras três pessoas. Tenho direito a um quadrado de estante e a um armário pequeno com três gavetas e chave. Estou de costas para a pequena janela, que dá para um shopping e muitas avenidas. Uma mensagem de boas-vindas na Intranet assegura a todos que estou naquele andar provisoriamente. Daqui a algum tempo, acho que vou subir mais três andares. Se eu subir quatro andares estarei junto com os bambambans. Mas isso é muito pouco provável. Estão arrumando um espaço especial para aquele careca, dizem os caras da informática. Torço para que seja um cubículo maior, com todas as letras, com uma janela só para mim. Isso também é pouco provável. Não importa. Acho que ficaria contente até com uma cadeira debaixo de uma escada com goteiras.

Estou feliz feito pinto no lixo. Talvez eu possa até tomar três capuccinos por período, se eu começar a usar as escadas, ao invés do elevador. Não. Está bom assim.

8 comentários:

Mairavilhosa disse...

Vamos tomar então um porre de capuccinos com chocolate... melhor, capuccinos com chocolate e chops... mais melhor de bom ainda, tudo que você quiser e aguentar no dia.. fiquei feliz demais também!!!(ficamos!!!)

Rodrigo Carreiro disse...

Essas máquinas de café são maravilhas do homem! Eu com uma dessa em casa não ia dar certo. O café sai perfeito!

Mwho disse...

Careca,
Escada pode estragar o joelho!
Vá de elevador no começo...
E ainda tem a possibilidade de enjoar do capuccino, né?
Abração,

Anônimo disse...

Um dia, lá na minha infância, eu perguntei pra minha mãe se santos existiam mesmo, porque eu tava precisando muito pedir uma coisa. E ela me respondeu que era pra eu pedir com firmeza e honestidade no coração. E que eu pedisse algo justo, que iria acontecer. Não sou fervorosa, política ou religiosamente falando, mas tenho lá minhas crenças. Ela diz que trabalho dignifica e é, de alguma forma, o caminho pra driblar a velhice. Além de pagar as contas, né. Adoro um pingado, hein. Com pão com manteiga! Muito boa sorte e muita saúde. abração

Careca disse...

Mwho, experimentei a escada hoje. É muito, muito cansativo. Vou de elevador. Abração,

Careca disse...

Uai, os santos existem, sim. Mas acho que estou ruim de drible, pois a velhice já me encontrou e de vez em quando me dá umas bengaladas. Um abração,

Careca disse...

Mairavilhosa, é uma boa idéia, com limão e gelo!

Careca disse...

Rodrigo, já experimentei seis tipos até agora. Todos excelentes!

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