segunda-feira, 9 de junho de 2008

Almoço com as estrelas



Eu não gosto de comer em lanchonete e nem em restaurante. Eu gosto mesmo é de comer em casa, vendo as crianças. Eu e a Patroa estamos casados há mais de dez anos e o meu filho mais velho só tem cinco anos. Ou seja, tivemos cinco anos de casamento para desaprender o que é almoçar em casa, o que é tomar café da manhã, o que é horário de jantar. De fugir dos horários em que todo mundo come, bebe e dorme. Ficamos nessa bagunça um tempão, só curtindo a liberdade permissiva de mandar nos horários ao bel prazer.

É muito bom só precisar cuidar do seu horário. Ele é seu. Não é de ninguém mais. E você pode atrasar o almoço, um pouco. Você pode adiantar o jantar, um pouco. E pode até ficar sem almoçar ou jantar. Quem liga pra isso? É o seu horário, não é? Então eu comia muito sanduíche. E nem eu e nem a Patroa ligávamos a mínima para a esqualidez da nossa geladeira. Só tinha queijinho, cerveja, salame, provolone e parmesão. Coisas para um sanduba rápido, ingredientes para fondue e aperitivos rápidos. Ou seja, as coisas essenciais para quem não gosta de cozinhar e não come em casa.

Mas depois de cinco anos, tudo mudou. À medida que a gravidez da Patroa ia crescendo, nós começamos a encher a geladeira de provisões. E, junto com a geladeira, nós começamos a querer mudar de hábitos. A fazer compras de verdade, ao invés do supermercado de supérfluos dos jovens casais. Acabou-se o fandangos e o cheetos. Nós trocamos as fritas, pelas batatas, arroz, feijão, verduras, legumes, macarrão, ovos e carnes. E, de vez em quando, eu aparecia em casa, para o almoço.

Quando nasceu o primogênito, eu ainda enrolei um pouco. Não disciplinei os meus próprios horários, embora o bebê e a Patroa tivessem hora para tudo. Só havia um horário sagrado: dar banho no bebê. Do primeiro dia de vida, vigiando o umbigo, até os seis meses de idade, só eu que dei banho no primogênito. Depois, quando a princesa nasceu um ano e meio depois, nós dois, eu e a Patroa, achamos que era hora de disciplinar os horários. Combinamos de almoçar sempre em casa. Combinamos de observar a mastigação das crianças. De supervisionar a escovação.

Mas não cumprimos o combinado. Eu sempre tinha um compromisso na hora do almoço. Também dei banho na menina, mas não com a mesma exclusividade do menino. E, além disso, havia um monte de além dissos. O trânsito. A preguiça. O comodismo. A facilidade de almoçar na própria mesa de trabalho. A reunião que começaria sempre às duas horas da tarde, em ponto. A alimentação das crianças, que ainda era muito líquida. Os dentes das crianças, que ainda eram poucos e fáceis de limpar. Os dois, que ainda eram dois bebês. Os horários deles, que já estavam dentro dos horários, certinhos. E havia eu, que não queria complicações. Então nós postergamos a história de almoçar todos os dias em casa. Afinal de contas, é muito difícil conversar com bebês durante o almoço. E, principalmente, é muito difícil ficar limpo almoçando com bebês.

Enquanto isso, eu lia os artigos de especialistas nas revistas especializadas em criação. De peixes. De cães. De coelhos. De canários. E lá eles também ressaltavam o quanto as refeições são importantes para o desenvolvimento dos nadadores, dos corredores, dos voadores, dos bípedes, dos quadrúpedes, dos crustáceos, dos vegetais e de nós, seres humanos. Essas revistas especializadas são muito boas para tudo e não perdem a validade nas bancas de revistas. Pode reparar. Aí, no ano passado, os dois entraram na escola alternativa. E nós tivemos que reaprender tudo rapidinho. Café-da-manhã, almoço e jantar. Como deve ser.

As revistas especializadas, os especialistas em crianças, os psicólogos, os professores, os tribalistas, os alquimistas, os avós, as tias, os cupinchas e o porteiro do meu prédio sabem que é importante almoçar em casa. Muito embora os taxistas sejam absolutamente contrários ao almoço em casa. Taxista gosta é de ficar bodando na hora do almoço.

Depois que eu fiquei “disponível”, ficou bem mais fácil eu almoçar em casa todos os dias e olhar as crianças. E eu olhei. Às vezes, até cansar. Mas, no final, fiquei apaixonado pelos dois, pela maneira de cada um à mesa. Meu filho, por exemplo, é bem agitado. Ele senta. Cruza a perna sentado, que nem índio. Eu digo para sentar direito, mas às vezes eu me canso da minha própria insistência. Ele gosta de ficar com dois bonecos, um de cada lado do prato. E geralmente os dois bonecos vão lutar até a morte, com muitas onomatopéias, até que eu me irrite e comece a dar comida para ele, na boca. Minha filha, em outro e último exemplo, é parecida. A diferença é que as bonecas não lutam, mas cantam e dançam. É uma beleza. E cada refeição demora pelo menos uma hora, da primeira à última colherada.

Tudo isso é para dizer que hoje não almocei em casa. Foi esquisito e solitário à beça. Amanhã vou ver se almoço com as crianças.

4 comentários:

Rodrigo Carreiro disse...

Há anos consigui conciliar o trabalho com almoço em casa e... dá certo sim! Até cochilo pós-almoço rola hehehe

Careca disse...

Rodrigo, é isso aí Rodrigo. E hoje não teve problema, consegui almoçar com as crianças. Mas nada de cochilo!

Anônimo disse...

adorei o post e me identifiquei muito! Já que minhas crias tem quase a mesma idade! O fato é que quando cheguei a Brasília há 6 anos, o trânsito não me impedia de almoçar em casa...hoje em dia não posso dizer o mesmo! Além do quê, por aqui a refeição dura em média uma hora e meia, sobram quinze minutos para deixá-los no colégio e nos outros quinze voar de volta ao trabalho!
C´est la vie!!
Felicidades! :)))
Karla

Careca disse...

Karla, tudo de bom pra você também!:)

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