terça-feira, 21 de outubro de 2008

A indução das vinganças saudáveis

É sábado. Eu e o Cabeça saímos para almoçar, perto de casa. A Patroa e a Esposa do Cabeça também foram, um pouco mais tarde. As duas são psicólogas e gostam de conversar em psicologês.

Eu e o Cabeça preferimos beber chopp. É mais seguro. Nós falamos de filmes, músicas, livros, futebol, fórmula um, capas de revistas e das páginas centrais de revistas. Eu peço notícias dos amigos que eu vejo raramente e dos que eu não vejo. É um pequeno círculo de amigos que considero “para a vida inteira”. Fico meses sem encontrar algumas dessas pessoas, às vezes, anos. E quando encontro, a conexão é imediata. Num instante estamos antenados e batendo papos sensacionais.

Não saio muito. E o Cabeça possui uma intensa vida social. É um autêntico arroz de festa, o Cabeça. Aparece em tudo quanto é coluna social. Aperta mão de governador. Beija primeira-dama, o cara é importante. Eu sou o avesso. Na verdade, minha vida social está restrita a uma saída noturna, de vez em quando, e aos domingos na casa de um dos avós. O almoço de sábado com os amigos é a minha principal atividade social. Às vezes, isso parece pouco. Pensando bem, é pouco mesmo. Mas é fácil se contentar com pouco, quando se é preguiçoso como eu.

Aí fazemos uma pausa sobre o livro que estou lendo, A Guerra de Wittgenstein. É um bom livro. Olho para o lado e escuto um pedaço de uma frase.
_... a indução das pequenas vinganças saudáveis – diz a Esposa do Cabeça.
_Caramba, que coisa terrível de se fazer – eu digo, intrometido. Como estou fora do ramo do curandeirismo, eu fico numa boa para dar palpites sobre a maneira como os pacientes, cobaias e divanistas devem ser tratados. A Esposa do Cabeça acha graça.
_As vinganças saudáveis são muito científicas – ela me informa.
_Eu acredito – eu digo. Em geral, eu só me estendo muito sobre o que não sei absolutamente nada. Mas dessa vez eu preferi ficar calado.
_Careca, você considera a vingança uma coisa saudável? – pergunta a Esposa do Cabeça.
_Não e sim. Não considero saudável fazer uma pessoa se sentir mal. Mas também acredito que ao fazer o bem, o que é saudável, é possível fazer mal a uma pessoa, o que é péssimo.
_Por exemplo?
_Eu sou o gênio da lâmpada e você me faz dois pedidos. O primeiro pedido é “uma piscina grande, bem funda”. E o segundo é “encha a piscina de dinheiro”.
_ E que mal há nisso?
_Um bando de malucos desocupados descobre a sua piscina de dinheiro e decide que a grana deverá ser distribuída para os mais pobres, ou seja, eles mesmos. A sua piscina de grana provoca inflação descontrolada e o dinheiro não vale mais nada, as pessoas voltam a preferir a troca de mercadorias. Todos os pobres se voltam contra os ricos e os primeiros a ir para o paredão são os donos de piscinas. Antes de ser trucidada pela turba, você tenta destruir a lâmpada do gênio...
_Já chega!
_Fazer o bem é como escovar dentes de crocodilo. Você tem que ser meio louco e tomar muito cuidado – eu encerro.
O Cabeça pede mais uma rodada de chopps.
_Não sabia que você falava embromês – diz o Cabeça.
_É só pra desenferrujar.

4 comentários:

Anônimo disse...

Parabéns pra você, nesta data querida!!! Muitas felicidades, muitos anos de vida!!! ... e risadas e conversas e serenidade e prazer e leituras e mil coisas legais e bacanas que há no âmago do S.H.!!!

Rodrigo Carreiro disse...

Você discorreu perfeitamente sobre economia, vingança e embromation. Mestre!

Careca disse...

Mairavilhosa, mil salutes e thankyous do mais profundo âmago S.H.!:)

Careca disse...

Rodrigo, valeu, a gente aprende muito sobre embromation com um blog. Abs, :)

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