segunda-feira, 24 de novembro de 2008

A primeira resenha de livro velho

Parece que fiz há anos, essa resenha. Minha memória é muito ruim.

"Eu sabia que estava aqui em casa, em algum lugar. E antes que eu quisesse procurar, esse livro apareceu na minha frente, como aqueles anúncios de Natal que parecem aumentar o volume da televisão automaticamente. A Gramática da Vida, o compêndio ilustrado de citações de filósofos pré-socráticos e outros pensadores desprezados pela academia. Um livro raro que encontrei num sebinho que havia perto de casa, hoje transformado em restaurante para milionários.

Trata-se de um livro fantástico. Quase mítico. Encontrei o livro esfrangalhado, sem a capa e com algumas páginas faltando. Também existem páginas mofadas, meio queimadas e com frases riscadas, a carvão ou lápis de cor. Mas é um bom livro. Nunca descobri quem escreveu essa coisa, ou a editora que o publicou. E a julgar pela quantidade de anotações a caneta, lápis, nanquim, canetinha hidrocor e giz, muita gente deve ter estudado esse livro com afinco. Eu mesmo, se não fosse tão alérgico a mofo, teria estudado mais esse maravilhoso compêndio. O conteúdo é esplêndido, mas as ilustrações são horrorosas.

Aprender a linguagem da vida requer esforço continuado. A gramática de bem viver está sempre mudando e precisamos estar atentos para as regras que surgem de repente, para que não vivamos mal. Acho que já houve um tempo em que as normas do bem viver não pareciam mudar tão rapidamente. Mas, hoje em dia, é só piscar os olhos e parece que você está desafinado com a gramática e acaba por confundir as coisas. Não é só o que se come, o que se veste, o que se calça. Também não é o que você usa no cabelo, o que passa na pele para se proteger. Bem viver é uma ciência que exige coração, cabeça, estômago e sestércios.

Um regra simples do bem viver, que fica logo no início da Gramática, foi estabelecida por Clodo, o Vesgo, ainda em 2453 A.C. . “Respire bem fundo”, disse o sábio grego. Conta a história que Clodo, o Vesgo, era um oficial espartano que havia debandado para Atenas porque gostava de espiar os outros com o canto do olho, o que acabou por deixá-lo meio enviesado. Não se sabe se o viés era para a direita ou para a esquerda, mas Clodo era visivelmente não alinhado. De qualquer modo, por mais que você despreze os pré-socráticos, é importante respirar bem fundo antes de fazer qualquer coisa. Clodo sabia que falava uma coisa muito inspiradora.

Nesse sentido, a Gramática da Vida ultrapassa os usos e costumes, ela é mais visceral, importa mais para o seu intestino e seus pulmões. Tem mais relação com o seu coração e com o sangue que pulsa nas suas veias. Essa parte estrutural, vamos dizer assim, muda pouco ou não muda. A essência do bem viver está nessa estrutura, que vem sendo descrita com rigor desde que os homens usavam aquelas sandálias gregas de trançar e togas. Aliás, e aqui não vai qualquer preconceito, as togas são bem confortáveis. Mas aquelas sandálias, que eram muito chiques em Atenas e Roma, eu não seria capaz de usar nem se fosse obrigado, mesmo em baile de carnaval. Até porque não vou a um baile de carnaval desde que completei vinte anos.

Então? Bom, é isso mesmo. Os gregos estavam certos. Os pré-socráticos também. Mas quem se importa? Aliás, já estou começando a espirrar. Esse livro já começa a me dar erisipela. E as ilustrações, caramba, que horror!"

2 comentários:

Sunflower disse...

Os gregos SEMPRE estão certos.

beijas

Careca disse...

Sunflower, de vez em quando eles também pisavam no gládio. Não dá para acertar sempre.

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