segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Segunda-feira, dia 17 de outubro

Uma chuva bem fininha e constante se prolongou durante todo o dia. Fiquei cansado de olhar o horizonte e senti vontade de desenhar. Agora fico atento a essas vontades e aproveito bastante. Copiei a lápis os pássaros à óleo do Albert Eckhout, o pintor holandês que desenhou o Brasil dos anos 1600. Desenhei até cansar de desenhar e foi bem divertido. Primeiro por saber que ainda posso, que ainda sei traçar a linha fina com o lápis e com a lapiseira grafite 0.5 mm. Depois por ainda me sentir inebriado por rabiscar o papel. Com um lápis na mão, acelero todos os relógios do mundo e nem percebo.

As crianças não foram para a escola porque estão resfriadas e cansadas de toda a agitação da semana da criança. Meu filho tinha prova de inglês e estudou um pouco comigo. Ele é esperto e faz tudo rapidamente. Tão rápido que se esquece de algumas letras. A manhã acabou em um segundo e almoçamos bem.

À tarde, mais pássaros de Eckhout, resolvi encher um caderno com eles. Decidi atualizar o blog de desenhos, mas estou sem paciência para scanear os cadernos. Amanhã farei isso, sem falta, minto para mim mesmo. Segunda-feira de idéias. Muitas idéias. E a lembrança de um conto da Patricia Highsmith sobre o sujeito que escrevia romances enormes na cabeça. Não me lembro como acaba, mas é uma história triste.

Lembro de novo daquele velho conto do Norman Mailer, que li dentro do volume "A maior coisa do mundo", da editora Nova Fronteira, sobre o escritor que briga com a namorada. O conto se chama "O Caderno de Notas" e na verdade não é sobre a briga do casal, mas sobre o fato das brigas entre os dois serem inevitáveis. A namorada passa metade do conto se queixando do escritor, que aceita tudo com suavidade e gentileza, ele não quer saber de confusão. Não, a única coisa que ele não consegue controlar é a vontade de anotar no caderno de notas aquela idéia que surge durante a briga com a namorada. Sim, ela fica furiosa quando percebe que ele está escrevendo, porque todas as suas queixas têm relação com o fato dele precisar se desligar dela para escrever. E no final o escritor sai correndo atrás da mulher, para explicar tudo a ela, feliz por ter conseguido anotar tudo direitinho no seu fiel caderno de notas.

Evito me aproximar dos livros da estante, porque senão mergulho em um livro e adeus dia. Corro de volta para o meu caderno de desenhos e fico ali, imaginando histórias do tempo do Brasil dos holandeses. Caio em devaneios, eu me deslumbro com a beleza dos pássaros. Sempre gostei de desenhar pássaros. Houve um tempo em que sonhava muito que voava. Hoje não sonho mais. Lembro que nos sonhos eu tinha um truque para levitar e flutuar e só depois, com a força do pensamento eu me movimentava no ar. Era tão estranho, porque não havia velocidade nesse voar, era o vento que me levava. Eu apenas condensava e descondensava. Às vezes fico um dia inteiro assim, a cabeça nas nuvens imaginando histórias enormes que se desintegram assim que me aproximo do teclado.

Para evitar atrasos, mantenho o computador ligado o dia inteiro. Às vezes, vou correndo para o teclado para capturar um pensamento depressa, depressa, mas é tarde demais. Hoje, serão só os desenhos. E só quando paro é que vejo que são muitos e que é por isso que estou cansado.

2 comentários:

Paulo Bono disse...

Careca,
Queria também colocar meus dias no papel. Não sairia nada tão prazeroso quanto seus escritos, mas, enfim.

abraço

Careca disse...

Que nada, Bono, seus escritos também são muito legais. Abç,

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