A tradição começou quando ainda éramos solteiros. Uma vez por mês, sempre aos sábados, nos encontrávamos na casa do Niltão para tomar muita cerveja, colocar o papo em dia, descobrir as novidades, que eram sempre muitas, dos amigos dos tempos da universidade. O Niltão estava aprendendo a cozinhar e era ousado como só os iniciantes podem ser. Fejoada, rabada, buxada, costela, salmão, lula, camarão na moranga, pato, galo, peru, pernil, tutu, galinha d´angola, e qualquer coisa pesada, lenta e difícil de cozinhar foram os pratos que ele aprendeu a dominar. Éramos cobaias felizes desse aprendizado, que hoje já é maestria.
Com o passar dos anos, e já se passaram muitos, os casamentos aconteceram, as crianças nasceram e os almoços no Niltão começaram a se tornar mais raros. Não por vontade dele, é claro. A verdade é que ele cansou de insistir com alguns. Até mesmo comigo, depois que a caçula nasceu.
Lembro que ele ligava na véspera, como sempre, e mandava o convite.
_Alô, você também. Amanhã tem baixo lá em casa. Leva birita.
E eu dizia que não, que as crianças vão dar trabalho, que elas ainda estão muito pequenas e uma série de lamúrias de pai velho e bobo. Um dia o Niltão, com sua sabedoria e fino trato, cortou as frescuras.
_Deixa de fazer doce e traga a patroa e os moleques. Aqui está cheio de brinquedos e tem um quarto só para bagunçar.
Tanta perspicácia mexeu com os meus sentimentos. E eu voltei a freqüentar o almoço do Niltão. Eu e outros desgarrados e desgarradas. E voltei a ter informações sobre os amigos do tempo em que éramos jovens e íamos mudar o mundo. A cada vez que vou a um almoço no Niltão, eu comprovo. Minha geração é um sucesso.
Alguns dos casados se separaram, outros se amancebaram e um mudou a opção sexual. Meus colegas da universidade têm a sexualidade resolvida.
Fulano foi ser DJ na Escócia, Beltrano está em Sidney trabalhando de copeiro num hotel e a Sicrana, quem diria, casou com um banqueiro alemão babaca e mora em Munique. E o Glauco, lembra do Glaucoma!, se deu bem, casou com um baú e mora em Paris. Meus colegas de universidade são internacionalizados.
Aquela menina que dizia ser atriz ficou grávida de gêmeos de um senador. O Tavinho virou escritor e já publicou quatro biografias de deputados. A Samantha brigou com a Tabatha e voltou a fazer publicidade para partidos políticos. O Bicola, aquele que escondia cola na caneta, foi candidato por um partido nanico e hoje está atolado em dívidas. Meus colegas de universidade são politicamente corretos.
O Juca, irmão do Quincas, passou dois dias preso em Cartagena. A Samara, prima da namorada do Niltão, teria morrido se não fosse uma injeção de glicose. A Cráudia salvou o Piu do uísque, mas teve que beber tudo sozinha. A sativa teria matado o Michelangelo, se ele não tivesse sido atropelado enquanto cheirava a duodécima carreira do dia. E o Bituca, que tinha mania de procurar pontas em cinzeiros, fez tratamento com laser e agora só vasculha o porta-luvas dos carros dos amigos. Como se vê, meus colegas de universidade também gostam de rock´n´roll.
Agora eu não perco nenhum almoço no Niltão. Ás vezes ligo para ele, sugerindo algum prato leve.
_ Alô, você. Que tal um cassoulê para amanhã?
_ Comida de mocinha. Macho come é joelho de porco. Topa?
_Lógico. Vou levar uma de alambique que o meu avô deixou de herança.
_Traz limão também.
E eu vou dormir feliz da vida, porque sábado terei um senhor almoço no Niltão.
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