Eu não sei. Essa pergunta eu venho me fazendo há alguns dias. Meu filho tem apenas quatro anos e estuda numa escola meio alternativa. Os professores parecem ter chegado de Woodstock a pé, embora estejam na faixa entre 25 e 30 anos. Minha mulher fez questão de matriculá-lo nessa escola porque um dos primos estudava ali. O primo agora já saiu. Meu filho continua lá. E eu quero que ele saia. Mas na queda de braço com a mãe eu perco.
Escolas alternativas são ótimas, mas dão um trabalho danado para os pais. Por mais que você se julgue moderninho e capaz de se adaptar rapidamente, uma escola alternativa coloca seus planos e convicções no chinelo. Para início de conversa, seu filho começa a saber e falar mais gírias do que você. Ele vai usar expressões que você sequer imaginou existir com expertise e naturalidade. Deixará você de boca aberta. E olha que você sempre foi um tarado por gírias. “Tá maluco”, “É doido” e “Irado, véio” se tornarão rapidamente pedaços indissociáveis de qualquer exposição verbal que ele fizer. Até na hora de escovar os dentes. “Escova irada, essa, maluco, ó!”.
Além disso, seu filho apresentará algumas diferenças físicas fundamentais em relação aos meninos que freqüentam escolas tradicionais, a começar das solas dos pés. As solas dos pés dos meninos das escolas alternativas são mais grossas, duras e encardidas do que o couro velho da parte de baixo dos cachorros flatulentos. As mãos desses meninos também são mais esfoladas, arranhadas e calejadas do que as dos meninos acostumados a ficar grudados na televisão e no vídeo-game. O meu filho também gruda na tv, mas as mãos dele são ferramentas de trabalho experimentadas em texturas diversas. Nunca encontrei uma unha limpa e inteira. Meninos de escolas alternativas são mais despojados, rijos, estouvados e brutos. Costumam resolver as diferenças na hora, com grande rapidez de raciocínio e articulação de argumentos. Se nada disso der certo, resolvem na base do tapa e da porrada pura e simples, sem crueldade.
Professores, na visão desses meninos, são seres que os auxiliam a descobrir as potencialidades adjacentes aos seus pequenos organismos e proximidades. Os professores também são vistos como aqueles cabeludos e cabeludas de roupas coloridas e chinelos que saem da escola, depois do portão, para fumar uns cigarros no intervalo. Aliás, eles não entendem bem o que é intervalo, pois as atividades na sala são tão divertidas quanto as de fora da sala de aula. Quando você pergunta se eles aprenderam alguma coisa naquele dia, eles respondem que se divertiram bastante. E aprenderam também, é verdade, dou o braço a torcer.
Os meninos de escolas alternativas geralmente têm uma mãe fixa e pais sobressalentes. Os sobressalentes se revezam para levar as crianças à escola e a volta costuma ser por conta das mães. Talvez por isso, autoridade seja uma coisa tão difícil de ser exercida sobre os meninos dessas escolas. Eles começam a acreditar que são seres que vieram ao planeta para tornar a vida dos seus pais mais prazerosa e bela, que eles são as únicas coisas que realmente importam para esses sujeitos, que o aprendizado deles é para que sejam mais humanos e compreensivos e não pequenas máquinas de ler e calcular e que portanto, poderão fazer qualquer coisa que a mamãe e o papai de plantão vão aceitar. Isso não está muito longe da verdade, mas você perde pontos se não fizer eles duvidarem dessas coisas pelo menos algumas vezes por dia. Sobretudo, você deve deixar bem claro que os vizinhos, o síndico, os outros pais e o resto da humanidade não vão aceitar nada disso. Por isso, dê logo um peteleco na orelha dele para que ele se comporte.
Os meninos de escolas alternativas são mais bagunceiros, arteiros e não conseguem ficar de sapato, tênis ou chinelos entre quatro paredes ou longe delas. Calçados, para esses pequenos índios, são itens de uso restrito a emergências, que devem ser mantidos nos cantos das salas. Ainda assim, os meninos de escolas alternativas me parecem ser mais felizes e também me fazem lembrar melhor de quando eu ia para a escola e não havia tanta regra para seguir. Eu vejo os outros pobrezinhos, indo para a escola cabisbaixos, desmanchando os sorrisos em uniformes apertados, curvando os pés para dentro dos sapatos e meias. Meias. Meninos de escolas alternativas não usam. Só usam cuecas quando as sungas estão molhadas. Esses meninos são valentes e costumam rosnar para os cachorros chatos dos vizinhos. São curiosos e têm ouvido de tuberculosos. Eles se recordam de diálogos inteiros dos desenhos favoritos, incluindo aí as onomatopéias e sons de ambientação. Pau!Tèeeem!Créu! Não brigue com a patroa na frente dos meninos . Haverá sempre um para dizer “Relaxa, véio, abrace e beije ela. Faça amor, não faça a guerra.”
Mas nada disso responde a pergunta. O que fazer quando seu filho apanha na escola?(continua)
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