domingo, 21 de abril de 2013
Fábula
Selah Sue - This World
Minha filha me pediu para contar uma fábula e só consegui lembrar de imediato daquela do lobo e do cordeiro. O carneirinho está bebendo água na parte de baixo do córrego e o lobo está na parte mais alta. O malvado então reclama com o pequeno cordeiro, dizendo que ele está sujando a água. O pobre carneiro explica que aquilo não procede, que ele está na parte mais baixa do riacho, é impossível sujar a água. O lobo fica ainda com mais raiva do infante e diz que no dia anterior os pais dele também haviam sujado a água em que ele bebia. O cordeiro falou calmamente para o lobo que era um órfão de pai e mãe. Ambos haviam sido comidos por um lobo logo depois que ele nascera, o que já fazia algum tempo. O lobo a essa altura está muito próximo do cordeiro e pronto para dar o bote. Babando de ódio, diz para o carneirinho que se não foram os pais do garoto, foram seus avós que sujaram a água em que ele bebia. E quando o rapazinho se prepara para explicar que aquilo também era impossível, o lobo furioso salta sobre o infeliz e o devora. Minha filha arregalou os olhos e fez cara de choro.
_É uma fábula sobre a crueldade - eu procuro explicar. Nada que o carneiro falasse poderia acalmar a fúria do lobo. Ele estava determinado a matar o cordeirinho, porque é isso que os lobos fazem. Eles se alimentam dos carneiros. O que acontece na natureza é que os lobos simplesmente caçam os cordeiros e pronto. Na fábula, que é uma historinha com um ensinamento, uma moral, o carneiro ainda tenta conversar, o que só aumenta a fúria do lobo. Na natureza, o bichinho tentaria fugir tão logo sentisse o cheiro do lobo, é claro. Mas as fábulas são sempre um exagero do que existe na natureza, para mostrar a verdade com mais clareza. E o ensinamento dessa fábula é que não existe argumentação possível contra a violência. Em algumas situações, não adianta explicar e procurar conversar, o melhor que se pode fazer é guardar o fôlego para tentar fugir, o que pode ser muito difícil.
Depois disso minha filha continua assustada e com uma cara de choro maior ainda. Minha mulher, que assistiu a conversa, me dá um chute na canela por baixo da mesa e me olhou com aquela cara de "conserte isso agora, seu Mané".
Tento pensar numa saída melhor, numa explicação mais amena, ou numa maneira milagrosa de salvar o carneiro no último instante. Ou talvez numa maneira de suavizar o ensinamento, e quem sabe insinuar que o lobo engoliu o carneiro inteiro e que apareceu um caçador de última hora que matou o lobo e retirou o carneiro de dentro de sua barriga ainda inteiro em sua inocência. Mas é impossível.
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