domingo, 5 de agosto de 2012

Batima



Malia - Solitude

Neste almoço de aniversário em que fomos no sábado, vi um desenho que o Cabeça fez quando tinha uns 5 anos. Era o Batman. O Cabeça desenhou a máscara, uma boca mostrando dentes, o morcego no peito, as luvas com as mãos armadas em soco. O desenho a lápis mostrava ainda os pés calçados em botas que se cruzavam igual àquele passo bêbado do Jânio Quadros na foto famosa. Com capricho, ele também desenhou a capa com pontas terminando em pontas agudas. Para que não houvesse nenhuma dúvida sobre a identidade daquele herói, o Cabeça escreveu BATIMA na parte de cima da folha, quase igual ao título da capa da revista em quadrinhos em que certamente se inspirou.

O desenho foi entregue pela irmã do Cabeça, que o resgatou de algum fundo de gaveta em Recife. Junto com o BATIMA havia mais alguns desenhos em folhas pautadas de cadernetas e também de cadernos. Eram só umas três ou quatro folhas meio amareladas e um pouco ressecadas. Estavam dentro de uma pasta elástica também antiga, meio deformada pelo tempo. Em outra folha, o Cabeça também desenhou uma enorme cabeça do BATIMA com os dentes bem exagerados e pontudos, como se o herói estivesse dando um enorme sorriso sarcástico para assustar os bandidos e malfeitores. Podia ser também que o BATIMA tivesse se transformado num vampiro para punir os ladrões e vigaristas, não dava para saber.

Os desenhos não estavam assinados e não havia nenhum nome identificando as folhas. Mas na época, de acordo com a irmã, só o Cabeça era alfabetizado e poderia ter escrito alguma coisa nas folhas.

Minha mãe guardou durante anos seus desenhos de escola. Um dia, numa mudança, ela juntou os cadernos, alguns deles bem embolorados, para jogar fora. Deixou no lugar da lixeira do prédio. Na época, os prédios tinham tubos nos andares para despejar o lixo dos apartamentos. Os sacos de lixo despencavam por ali e estouravam lá embaixo, na área da lixeira das garagens. O sistema era ruim, atraía uma profusão de insetos e roedores, as lixeiras eram horrorosas e fétidas, e por isso os tubos de lixo acabaram lacrados. Foi a minha sorte, porque se os tubos ainda funcionassem, os cadernos teriam sido atirados por ali. Ou talvez não, sempre deixamos os jornais e revistas empilhados para e amarrados para os catadores de papel.

O que importa é que vi os cadernos no lixo e recolhi todos os que vi. Hoje muitos daqueles desenhos estão emoldurados e enfeitam as paredes da casa dos meus pais. Gosto de todos eles. Sempre acho comovente ver desenhos feitos por crianças. Guardo dezenas das garatujas e rabiscos feitos pelos meus filhos numa pasta. Sempre peço que coloquem a data e o nome. Um dia vamos olhar juntos aquelas folhas e tentar lembrar desses tempos de agora. Às vezes tenho a impressão que o máximo que podemos fazer é cultivar bons momentos para colher algumas poucas lembranças.


À noite, eu e minha mulher fomos assistir ao novo filme do Batman.

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