domingo, 21 de fevereiro de 2010

Mais uma janela se abre

A fada dos dentes terá que passar mais uma vez aqui em casa. Durante o café da manhã, meu filho exibiu o outro dente da frente, que também balançou durante várias semanas antes de deixar o posto. O primeiro dente da frente ele mesmo havia retirado com orgulho e satisfação durante as férias na praia, depois de pegar um jacaré. Hoje ele estava conversando comigo quando simplesmente parou e puxou o dente fora.

Na verdade, o dia não começou muito bem para ele. Ele esqueceu o dever de casa em algum lugar e a minha mulher, que é a mãe dele, já havia passado uma boa meia hora com ele tratando de bons conselhos sobre responsabilidade e obrigações. Eu mantive o silêncio desejável nessas horas. E quando ele olhava para mim com aquele olhar de pedido urgente de socorro eu fazia cara de paisagem.

Talvez isso tenha relação com o filme "The Road" que vi ontem à noite. É baseado na novela do Cormac McCarthy, que ganhou o Pulitzer de 2007. É um filme com cenário apocalíptico. Um pai e um filho tentam sobreviver num mundo futuro onde tudo se acabou e as pessoas se dividem em canibais ou não canibais. Pai e filho viajam para o sul, em busca do litoral. Cormac fala de Deus, de amor, esperança e de vida para o filho no meio de um cenário desesperador. O final me deixou sem sono até as duas da manhã.

Filmes assim costumam abaixar a minha auto-estima e auto-confiança. E me deixam com pensamentos estranhos.

Agora eu tiro do bolso da bermuda o pequeno dente da frente, enrolado em guardanapo de papel. É perfeito, não há sinal de deterioração. Não há uma mancha preta, nem um furinho inadequado. É um dente bonito. Acho que na minha infância os dentes de leite não se perdiam assim. Tenho a lembrança de dentes escuros e meio roídos que desapareciam em linhas amarradas. Mas este é um dente perfeito.

E mesmo assim, aqui está ele, sobre um pedaço de guardanapo de papel.

Escrever é descascar cebolas. Talvez toda essa situação seja mais uma metáfora. Alguma coisa sobre cumprir a sua missão com total retidão e sair de lado, para o que está por vir. Talvez o dente tenha sido tirado apenas para desviar a atenção do dever de casa. Ou foram apenas coincidências.

Talvez não seja nada disso. Foi só um dente que caiu.

2 comentários:

Guilhermino disse...

Já pensou em fazer um pingente para sua esposa ?

Careca disse...

Guilhermino, é uma boa idéia, valeu!

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