Há muito tempo escrevi aqui que somente a letra da lei não adianta nada. Sem fiscalização, blitz, multa e cadeia, a lei seca iria chover no molhado.
É a educação, meu irmão
Todos estamos carecas de saber que esse é um problema central. Encontrar uma solução que fuja da valorização do professor não é uma solução.
O tigre branco
Sim, os indianos estão na moda. Mas esse livro do Aravind Adiga vale a pena. É super-engraçado.
Não sei o que acontece comigo. Toda vez que estou lendo alguma coisa engraçada e divertida fico sem vontade de escrever.
quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009
quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009
Vinte mil léguas submarinas
Trabalho duro
Apesar de ainda estar surfando na onda das mais de vinte mil visitas ao blog, hoje foi quarta-feira de cinzas, dia de trabalho duro. Depois das duas da tarde, fiquei organizando coisas para quinta e sexta.
Ivan Lessa, cadê você?
Tenho procurado as crônicas do Ivan Lessa, no site da BBC. Cadê o coroa? Ele é um velhinho chato pra caramba, com um olhar super-crítico para o País e o mundo. Por isso mesmo, é leitura indispensável. Ivan, sou seu fã. Volte.
Administrando expectativas
Sim, senhoras e senhores, apertem os cintos que a descida será longa.
Como tem caído avião, né?
É impressão minha ou aumentou o número de acidentes aéreos? Parece que todo dia agora cai um avião. E num instante já estamos saturados. Nem ligamos para os pilotos que fazem mágica e evitam centenas de mortos. Em matéria de heroísmo, nós somos olímpicos. Só nos interessa o medalha de ouro invicto. Não queremos saber do piloto que salva duzentos. Só aplaudimos o que não deixa nenhum se perder.
O melhor do carnaval
É cama.
Careca, quem você levaria para a Ilha de Páscoa?
Chocolates Kopennhagen, é claro.
Careca, como manter o sorriso no rosto nesses tempos de crise?
Pense nesses dias como os melhores da sua vida.
Careca, como encontrar o caminho da felicidade?
Me disseram que é fácil: basta seguir em frente, tomando cuidado para não bater o nariz.
Careca, por que você está fazendo perguntas para você mesmo?
Pô, os comentaristas do blog sumiram...
Apesar de ainda estar surfando na onda das mais de vinte mil visitas ao blog, hoje foi quarta-feira de cinzas, dia de trabalho duro. Depois das duas da tarde, fiquei organizando coisas para quinta e sexta.
Ivan Lessa, cadê você?
Tenho procurado as crônicas do Ivan Lessa, no site da BBC. Cadê o coroa? Ele é um velhinho chato pra caramba, com um olhar super-crítico para o País e o mundo. Por isso mesmo, é leitura indispensável. Ivan, sou seu fã. Volte.
Administrando expectativas
Sim, senhoras e senhores, apertem os cintos que a descida será longa.
Como tem caído avião, né?
É impressão minha ou aumentou o número de acidentes aéreos? Parece que todo dia agora cai um avião. E num instante já estamos saturados. Nem ligamos para os pilotos que fazem mágica e evitam centenas de mortos. Em matéria de heroísmo, nós somos olímpicos. Só nos interessa o medalha de ouro invicto. Não queremos saber do piloto que salva duzentos. Só aplaudimos o que não deixa nenhum se perder.
O melhor do carnaval
É cama.
Careca, quem você levaria para a Ilha de Páscoa?
Chocolates Kopennhagen, é claro.
Careca, como manter o sorriso no rosto nesses tempos de crise?
Pense nesses dias como os melhores da sua vida.
Careca, como encontrar o caminho da felicidade?
Me disseram que é fácil: basta seguir em frente, tomando cuidado para não bater o nariz.
Careca, por que você está fazendo perguntas para você mesmo?
Pô, os comentaristas do blog sumiram...
terça-feira, 24 de fevereiro de 2009
O cantor no banheiro 3
Um. A vida inteira eu fui obcecado com uma coisa de cada vez. Monomanias. Um time. Uma canção. Uma paixão. Um. Uma coisa de cada vez. É que para mim é quase impossível pensar mais de uma coisa de uma só vez. E eu queria que a minha vida fosse assim, linear como o pensamento. Lógica. Como a escrita de uma linha. Mas sempre foi diferente, é claro. Embora a cada instante das entrelinhas, só seja possível ser eu mesmo e um só. Ainda assim, a vida extravasa as minhas míseras capacidades. E sempre extravasou as minhas linhas. E por isso nunca fui só um. Embora sempre seja o que me escrevo. Mas é sempre diferente.
Outro dia estava folheando um livro da Taschen Editora. Era uma edição completa das obras de Van Gogh. Outra das minhas monomanias. Ao longo dos anos, já adquirir esse livro umas cinco vezes. Alguém me pede emprestado e ele desaparece. Em geral, é quando estou no meio de uma conclusão bastante animadora sobre a obra de Van Gogh. É como se o livro desaparecesse quando estou prestes a descobrir um sentido não somente para a vida de Van Gogh, mas também para a de Gauguin. E também para a minha. Embora eu não seja pintor. E nem mesmo seja artista. E nem me angustie tanto.
Fiquei muito tempo observando, por exemplo, os auto-retratos de Van Gogh neste livro. São dezenas de auto-retratos. A princípio eu considerei, erroneamente, que os inúmeros auto-retratos de Van Gogh derivassem de algum tipo de narcisismo. Uma espécie de monomania de si mesmo. Mas esse é o pensamento de um ignorante. Van Gogh era pobre. Não podia pagar modelos. Então pintava a si mesmo, olhando para um espelho. Às vezes, nem era um espelho. Era o reflexo na bacia dágua.
Assim, depois de muito tempo e observações, aperfeiçoei o meu juízo. Tantos auto-retratos derivavam da necessidade que Van Gogh sentia de pintar. Mais importante que o tema, o que importava era como ele estava se pintando. Mais importante que o como, era quando ele estava pintando. E mais importante que o como e o quando, eram as cores que Van Gogh estivesse usando. Céus! Mas isso só era possível descobrir depois de se ler algumas das mais de seiscentas cartas que ele trocou com o irmão caçula, Theo. E só depois disso, é que era possível saber que além da escolha absolutamente deliberada de cores, havia a grossura e a direção das pinceladas. Cada retrato ganha uma dimensão única, porque a cada um corresponde uma ou várias cartas, repletas de descrições e análises cuidadosas e de comparações com outros artistas e quadros, seguidas por comentários detalhados e sensatos do irmão Theo. E cada auto-retrato é a imagem fiel e fidedigna de Van Gogh.
Embora eu não tenha talento para a pintura, a vida de verdade, até mesmo a minha, é mais de uma. Ela é tantas vezes quanto os meus olhos que a observam. E em todas é diferente. Do mesmo modo, a verdade nunca é só uma. E um enredo é só um pretexto para se falar de qualquer coisa, menos daquilo que realmente nos aflige.
Foi com essas coisas na cabeça, debaixo do chuveiro, que outro dia, distraído, pude ouvir novamente o cantor no banheiro. Ele interpretou “O Sole Mio”. Eu só conhecia a versão do comercial da televisão: “Dá-me um corneto”. Foi uma bela interpretação. Ao final, terminei ajudando o cantor, com um assovio no refrão. Pelo duto da ventilação ouvi alguns aplausos de outros moradores. Tenho certeza de que alguém, lá no sexto andar, gritou : Bravo!
Outro dia estava folheando um livro da Taschen Editora. Era uma edição completa das obras de Van Gogh. Outra das minhas monomanias. Ao longo dos anos, já adquirir esse livro umas cinco vezes. Alguém me pede emprestado e ele desaparece. Em geral, é quando estou no meio de uma conclusão bastante animadora sobre a obra de Van Gogh. É como se o livro desaparecesse quando estou prestes a descobrir um sentido não somente para a vida de Van Gogh, mas também para a de Gauguin. E também para a minha. Embora eu não seja pintor. E nem mesmo seja artista. E nem me angustie tanto.
Fiquei muito tempo observando, por exemplo, os auto-retratos de Van Gogh neste livro. São dezenas de auto-retratos. A princípio eu considerei, erroneamente, que os inúmeros auto-retratos de Van Gogh derivassem de algum tipo de narcisismo. Uma espécie de monomania de si mesmo. Mas esse é o pensamento de um ignorante. Van Gogh era pobre. Não podia pagar modelos. Então pintava a si mesmo, olhando para um espelho. Às vezes, nem era um espelho. Era o reflexo na bacia dágua.
Assim, depois de muito tempo e observações, aperfeiçoei o meu juízo. Tantos auto-retratos derivavam da necessidade que Van Gogh sentia de pintar. Mais importante que o tema, o que importava era como ele estava se pintando. Mais importante que o como, era quando ele estava pintando. E mais importante que o como e o quando, eram as cores que Van Gogh estivesse usando. Céus! Mas isso só era possível descobrir depois de se ler algumas das mais de seiscentas cartas que ele trocou com o irmão caçula, Theo. E só depois disso, é que era possível saber que além da escolha absolutamente deliberada de cores, havia a grossura e a direção das pinceladas. Cada retrato ganha uma dimensão única, porque a cada um corresponde uma ou várias cartas, repletas de descrições e análises cuidadosas e de comparações com outros artistas e quadros, seguidas por comentários detalhados e sensatos do irmão Theo. E cada auto-retrato é a imagem fiel e fidedigna de Van Gogh.
Embora eu não tenha talento para a pintura, a vida de verdade, até mesmo a minha, é mais de uma. Ela é tantas vezes quanto os meus olhos que a observam. E em todas é diferente. Do mesmo modo, a verdade nunca é só uma. E um enredo é só um pretexto para se falar de qualquer coisa, menos daquilo que realmente nos aflige.
Foi com essas coisas na cabeça, debaixo do chuveiro, que outro dia, distraído, pude ouvir novamente o cantor no banheiro. Ele interpretou “O Sole Mio”. Eu só conhecia a versão do comercial da televisão: “Dá-me um corneto”. Foi uma bela interpretação. Ao final, terminei ajudando o cantor, com um assovio no refrão. Pelo duto da ventilação ouvi alguns aplausos de outros moradores. Tenho certeza de que alguém, lá no sexto andar, gritou : Bravo!
segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009
O cantor no banheiro 2
Ninguém liga a mínima para perdedores. Eu também não. Mesmo se a vitória acontecer numa disputa de músicas no banheiro. Não pensei mais na voz de ópera no banheiro. Assobia melhor quem assobia por último. Além disso, depois daquela discussão eu fiquei muito tempo sem sequer discordar da minha mulher. Fiquei sem mergulhar o rosto na pia, atento ao latejar nos tímpanos. E não prestei mais atenção a barulhos no banheiro.
Às vezes é possível superar algumas coisas com uma boa discussão. Na conversa. Outras vezes, quando os silêncios se tornam muito grandes, é melhor tentar outra coisa. Ou então desistir. O problema é que eu não gosto de desistir. E geralmente não desisto. Algumas pessoas chamam isso de teimosia. Eu mesmo chamo isso de burrice. Muitas vezes eu fui estúpido o bastante para continuar a fazer coisas que simplesmente não estavam mais dando certo. O mais incrível disso é que algumas dessas coisas, as mais importantes, de repente começavam a dar certo. Mas na maioria das vezes, essa teimosia terminava com a perda definitiva de algo que eu queria muito. Ou seja, as coisas aconteciam a despeito de qualquer coisa que eu fizesse. Às vezes eu tinha sorte. Era simples assim.
“O que não mata engorda”. Eu tinha uma teoria antiga que derivava desse e de outros ditados populares. “Vaso ruim não quebra”. “Pau que nasce torto”. De alguma forma, isso havia se transformado numa certeza de que não adiantava tentar mudar. Não adiantava perseguir um sonho. Não adiantava tentar me reinventar. Não adiantava fazer nada. O mundo era grande demais e a inércia das coisas acabaria dando fim das coisas que teriam fim. Mesmo assim era importante não ficar parado. Não dar sopa. Não apressar as coisas ficando parado.
Então foi numa dessas vezes, em que eu achava que minha vida estava dando uma guinada para baixo, a despeito de todos os meus esforços em fazer as coisas certas darem certo, que eu voltei a escutar a voz de ópera no banheiro.
Lá estava ele, o cantor de ópera. Ele cantava uma ária bonita e alegre. Sou um analfabeto de música clássica. Mas aquilo só podia ser as “Bodas de Fígaro”, de Mozart. Eu conheço de ouvir em desenhos animados. Tentei assobiar “Yellow Submarine” novamente, mas acabei me deixando envolver pela interpretação do Fígaro. (continua)
P.S: Agradeço a todos. Vinte mil visitas em menos de dois anos!!! Foram cerca de 40 mil pageviews em 14 meses. E em pleno carnaval! Desse jeito vou ter que arrumar um caminhão-cegonha para as minhas kombis de leitores...
Às vezes é possível superar algumas coisas com uma boa discussão. Na conversa. Outras vezes, quando os silêncios se tornam muito grandes, é melhor tentar outra coisa. Ou então desistir. O problema é que eu não gosto de desistir. E geralmente não desisto. Algumas pessoas chamam isso de teimosia. Eu mesmo chamo isso de burrice. Muitas vezes eu fui estúpido o bastante para continuar a fazer coisas que simplesmente não estavam mais dando certo. O mais incrível disso é que algumas dessas coisas, as mais importantes, de repente começavam a dar certo. Mas na maioria das vezes, essa teimosia terminava com a perda definitiva de algo que eu queria muito. Ou seja, as coisas aconteciam a despeito de qualquer coisa que eu fizesse. Às vezes eu tinha sorte. Era simples assim.
“O que não mata engorda”. Eu tinha uma teoria antiga que derivava desse e de outros ditados populares. “Vaso ruim não quebra”. “Pau que nasce torto”. De alguma forma, isso havia se transformado numa certeza de que não adiantava tentar mudar. Não adiantava perseguir um sonho. Não adiantava tentar me reinventar. Não adiantava fazer nada. O mundo era grande demais e a inércia das coisas acabaria dando fim das coisas que teriam fim. Mesmo assim era importante não ficar parado. Não dar sopa. Não apressar as coisas ficando parado.
Então foi numa dessas vezes, em que eu achava que minha vida estava dando uma guinada para baixo, a despeito de todos os meus esforços em fazer as coisas certas darem certo, que eu voltei a escutar a voz de ópera no banheiro.
Lá estava ele, o cantor de ópera. Ele cantava uma ária bonita e alegre. Sou um analfabeto de música clássica. Mas aquilo só podia ser as “Bodas de Fígaro”, de Mozart. Eu conheço de ouvir em desenhos animados. Tentei assobiar “Yellow Submarine” novamente, mas acabei me deixando envolver pela interpretação do Fígaro. (continua)
P.S: Agradeço a todos. Vinte mil visitas em menos de dois anos!!! Foram cerca de 40 mil pageviews em 14 meses. E em pleno carnaval! Desse jeito vou ter que arrumar um caminhão-cegonha para as minhas kombis de leitores...
domingo, 22 de fevereiro de 2009
O cantor no banheiro I
Na primeira vez que percebi que havia um sujeito que cantava no banheiro eu havia brigado com minha mulher. Entrei para lavar o rosto. Na verdade, todas as vezes em que entro numa discussão meu rosto fica em brasa. Só consigo me sentir bem depois de mergulhar o rosto por alguns segundos na pia cheia de água. Quando faço isso e sinto o sangue diminuir o latejar nos meus ouvidos é que começo a me sentir melhor. Aí levanto a cabeça e retomo a respiração normal, devagar, até que o meu rosto fique com a cor de sempre.
Acho que eu sou meio cinza-pálido. E eu demoro a voltar a ficar dessa cor. Algumas vezes a sensação de latejar nos ouvidos demora pouco mais de alguns minutos para desaparecer. Em outras, o latejar é tão forte que mergulhar o rosto é quase um afogamento. Tenho que ficar muito tempo mergulhado.
O banheiro do prédio onde eu moro tem um vão no banheiro. É um duto de ventilação, bloqueado com uma espécie de persiana de alumínio. Por esse duto, é possível escutar sons de todos os apartamentos, embora seja difícil dizer de qual apartamento venha cada som. Pois como eu dizia, foi nessa vez, depois de uma discussão forte, que eu percebi a canção vindo da persiana de alumínio.
Em algum lugar do prédio, um homem cantava uma canção numa língua que eu não conheço direito. O duto contribuía para distorcer a voz e embolar as palavras. Era alguma coisa tola sendo dita de uma maneira agressiva. Parecia alemão. Talvez italiano, porque era sem sombra de dúvida, um trecho de ópera.
Sempre achei cantar no banheiro uma coisa natural. Desde pequeno me acostumei a cantar debaixo dágua. Ou dentro dágua, se tenho a sorte de estar numa banheira. Canto rock, solfejo. Mas na maior parte das vezes, canto Beatles. Acho que Beatles combina muito com um chuveiro. Mas ópera? Quem diabos iria cantar ópera no banheiro?
Eu ainda estava um pouco irritado com a discussão e acho que foi isso que desencadeou tudo. Comecei a assoviar alto dentro do banheiro. Só quando estava na metade da música é que percebi o quanto é difícil assoviar Yellow Submarine. Seja como for, a voz de ópera sumiu. Aguardei mais alguns minutos, até porque a minha cor ainda não tinha voltado ao seu normal. Depois saí do banheiro, tal qual um vencedor. (continua)
Acho que eu sou meio cinza-pálido. E eu demoro a voltar a ficar dessa cor. Algumas vezes a sensação de latejar nos ouvidos demora pouco mais de alguns minutos para desaparecer. Em outras, o latejar é tão forte que mergulhar o rosto é quase um afogamento. Tenho que ficar muito tempo mergulhado.
O banheiro do prédio onde eu moro tem um vão no banheiro. É um duto de ventilação, bloqueado com uma espécie de persiana de alumínio. Por esse duto, é possível escutar sons de todos os apartamentos, embora seja difícil dizer de qual apartamento venha cada som. Pois como eu dizia, foi nessa vez, depois de uma discussão forte, que eu percebi a canção vindo da persiana de alumínio.
Em algum lugar do prédio, um homem cantava uma canção numa língua que eu não conheço direito. O duto contribuía para distorcer a voz e embolar as palavras. Era alguma coisa tola sendo dita de uma maneira agressiva. Parecia alemão. Talvez italiano, porque era sem sombra de dúvida, um trecho de ópera.
Sempre achei cantar no banheiro uma coisa natural. Desde pequeno me acostumei a cantar debaixo dágua. Ou dentro dágua, se tenho a sorte de estar numa banheira. Canto rock, solfejo. Mas na maior parte das vezes, canto Beatles. Acho que Beatles combina muito com um chuveiro. Mas ópera? Quem diabos iria cantar ópera no banheiro?
Eu ainda estava um pouco irritado com a discussão e acho que foi isso que desencadeou tudo. Comecei a assoviar alto dentro do banheiro. Só quando estava na metade da música é que percebi o quanto é difícil assoviar Yellow Submarine. Seja como for, a voz de ópera sumiu. Aguardei mais alguns minutos, até porque a minha cor ainda não tinha voltado ao seu normal. Depois saí do banheiro, tal qual um vencedor. (continua)
sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009
Beladormicida na sexta gorda
Meu filho foi recebido pela professora na porta da sala. Ele estava com frio e cobriu a camiseta do Ben10 com o casaco padrão da escola. Uma menina vestida de sereia o arrastou pelo casaco para dentro da sala. Ele fez uma cara de assustado, mas se deixou arrastar.
Eu estou sentado com a minha princesa, bem de frente ao portão da escola. É sexta-feira de carnaval e a escola autorizou as crianças a trocar o uniforme por uma fantasia. Minha princesa está vestida de princesa cor-de-rosa, com luvas brancas até os cotovelos, tiara com pedras coloridas, travesseiro e tênis cor-de-rosa. É muito linda essa minha princesa. Nós estamos olhando para o portão, observando as fantasias das crianças. Ela me ajuda a identificar os personagens.
_Olha, paiê, aquela menina veio de Ariel.
_Tem muita sereia na sala do seu irmão, também. Aquele ali veio de abelhinha?
_Não, paiê. É um leão.
_Parece mais uma laranja. O rabo é verde.
_Olha, paiê, aquele veio de vampiro.
_Não, é o Darth Vader, esse eu conheço. E a menina de bolinhas, o que é?
_É uma joaninha, paiê.
_Olha, mais uma Ariel. Tem muita sereia, né, filha?
_É. E Branca-de-Neve. Cinderela. Pauérrengers. Homem-aranha. Batman. Ben10.
_Nossa, tem muito Ben10!
_É.
_Quando eu era pequeno tinha muito judoca, índio, pirata, jogador de futebol. Olha. Aquela menina veio de Índia!
_Não, paiê, ela está trocando de roupa.
Pura verdade. A mãe/babá ia atrás, ajeitando as coisas. A menina vestiu a fantasia enquanto andava. Se eu não tivesse visto, não acreditaria. Depois vieram um monte de índias de verdade, uma mulher-maravilha, duas barbies e uma Fiona/Shrek (tinha uma peruca verde).
_Aquela é uma Fiona, filha?
_Não, paiê, sereia.
_Tem muita sereia, né?
_Paiê, você está com fantasia de trabalho?
_E você, princesa, essa roupa é de Cinderela?
_Beladormicida, paiê!
Confesso que foi só então que entendi porque eu carregava um travesseiro.
Eu estou sentado com a minha princesa, bem de frente ao portão da escola. É sexta-feira de carnaval e a escola autorizou as crianças a trocar o uniforme por uma fantasia. Minha princesa está vestida de princesa cor-de-rosa, com luvas brancas até os cotovelos, tiara com pedras coloridas, travesseiro e tênis cor-de-rosa. É muito linda essa minha princesa. Nós estamos olhando para o portão, observando as fantasias das crianças. Ela me ajuda a identificar os personagens.
_Olha, paiê, aquela menina veio de Ariel.
_Tem muita sereia na sala do seu irmão, também. Aquele ali veio de abelhinha?
_Não, paiê. É um leão.
_Parece mais uma laranja. O rabo é verde.
_Olha, paiê, aquele veio de vampiro.
_Não, é o Darth Vader, esse eu conheço. E a menina de bolinhas, o que é?
_É uma joaninha, paiê.
_Olha, mais uma Ariel. Tem muita sereia, né, filha?
_É. E Branca-de-Neve. Cinderela. Pauérrengers. Homem-aranha. Batman. Ben10.
_Nossa, tem muito Ben10!
_É.
_Quando eu era pequeno tinha muito judoca, índio, pirata, jogador de futebol. Olha. Aquela menina veio de Índia!
_Não, paiê, ela está trocando de roupa.
Pura verdade. A mãe/babá ia atrás, ajeitando as coisas. A menina vestiu a fantasia enquanto andava. Se eu não tivesse visto, não acreditaria. Depois vieram um monte de índias de verdade, uma mulher-maravilha, duas barbies e uma Fiona/Shrek (tinha uma peruca verde).
_Aquela é uma Fiona, filha?
_Não, paiê, sereia.
_Tem muita sereia, né?
_Paiê, você está com fantasia de trabalho?
_E você, princesa, essa roupa é de Cinderela?
_Beladormicida, paiê!
Confesso que foi só então que entendi porque eu carregava um travesseiro.
quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009
Tô me guardando pra quando o carnaval chegar
Eu gosto muito de ficar longe do carnaval. Pelo que eu me lembro, isso vem desde os meus quinze anos de idade. Não aconteceu nenhum trauma, nem nada. É que sempre fui um sujeito sem paciência de vestir um estereótipo. Não tenho samba no pé. Axé music me dá erisipela. Acho música de trio elétrico uma forma de tortura que começa pela fissura dos tímpanos. Marchinha, para mim, é sinal para arrumar as coisas e dar o fora, batendo o pé.
Além disso, detesto aquela falsa alegria, aquela ostentação de entusiasmo do carnaval. E não suporto mais a batucadinha. Todo brasileiro é metido a saber batucar, até eu já me meti a percursionista de caixa-de-fósforo. A ritmista de colher e garfo em beirada de copo e prato. Hoje não tolero mais o repique do timbal, a pancada do pandeiro e a gravidade do atabaque. Quero distância até do pé-de-pato mangalô, as tradicionais três batidas na madeira. Para mim, o melhor carnaval é estar longe da folia, do ziriguidum, do ilê, do alá-lá-ô.
Por isso, foi com perplexidade que outro dia me peguei assobiando um samba-enredo. Os dedos indicadores apontando para o alto. Só consegui interromper a avalanche sambista depois de beliscar a minha própria bochecha, durante o estribilho da bateria. Cacilda! Aumentei a minha auto-vigilância, procurei o anti-contágio carnavalesco. Passei a escutar só os clássicos do rock no automóvel. Led, Who, Stones, Guns, Metallica, Queen, Beatles, Raulzito, só coisa boa.
Passaram-se duas semanas e não aconteceu mais nada. Me julguei curado. Tudo não teria passado de uma leve intoxicação.
Então, ó minha Kombi de leitores, tive uma recaída fenomenal. Na sexta da semana passada, durante todo o dia, meu cérebro fez repinique com o clássico Bumbum-paticundum-bungurundum. Fiquei com um eco do grito de guerra do Neguinho da Beija-Flor ecoando nos meus ouvidos: Olha a Portela aí, minha gente!Ma-du-rei-rei-rá!
Para me concentrar no trabalho, tratei de organizar um arquivo morto que, um dia depois da crise, precisará ser ressuscitado. Mas esse trabalho envolvente, acolhedor, favoreceu, de algum modo, a germinação e efervescência de pequenos e antigos sambas de Caetano e Chico Buarque na minha cabeça. Caramba! Era como se alguém tivesse enfiado um sonrisal de sambas no meu ouvido e todos eles começassem a espumar dentro da minha cachola. Vai passar nessa avenida um samba popular, com samba, suor e cerveja, um dia, página feliz da nossa história, atrás do trio elétrico....
É lógico que reagi com doses estratosféricas de rock, jazz, blues, bossa nova e até mesmo MPB. Mas não deu certo. Quando eu estava quase bom, lá vinha o Neguinho: Olha o nosso samba aí, gente! E imediatamente a minha mente era povoada por um desfile interminável dos carnavais vividos, vistos e imaginados da minha vida. Todas as mulheres fantásticas. Toda a nudez não castigada. Todos os desejos e prazeres loucos sonhados para os carnavais que não pulei, que pulei pouco e que agora já não dá mais para pular.
Desde então, tenho evitado ligar o rádio. Também estou dando um tempo na TV. E só agora estou me dando conta de que isso é como no samba do Chico. No fundo, estou me guardando pra quando o carnaval chegar.
Além disso, detesto aquela falsa alegria, aquela ostentação de entusiasmo do carnaval. E não suporto mais a batucadinha. Todo brasileiro é metido a saber batucar, até eu já me meti a percursionista de caixa-de-fósforo. A ritmista de colher e garfo em beirada de copo e prato. Hoje não tolero mais o repique do timbal, a pancada do pandeiro e a gravidade do atabaque. Quero distância até do pé-de-pato mangalô, as tradicionais três batidas na madeira. Para mim, o melhor carnaval é estar longe da folia, do ziriguidum, do ilê, do alá-lá-ô.
Por isso, foi com perplexidade que outro dia me peguei assobiando um samba-enredo. Os dedos indicadores apontando para o alto. Só consegui interromper a avalanche sambista depois de beliscar a minha própria bochecha, durante o estribilho da bateria. Cacilda! Aumentei a minha auto-vigilância, procurei o anti-contágio carnavalesco. Passei a escutar só os clássicos do rock no automóvel. Led, Who, Stones, Guns, Metallica, Queen, Beatles, Raulzito, só coisa boa.
Passaram-se duas semanas e não aconteceu mais nada. Me julguei curado. Tudo não teria passado de uma leve intoxicação.
Então, ó minha Kombi de leitores, tive uma recaída fenomenal. Na sexta da semana passada, durante todo o dia, meu cérebro fez repinique com o clássico Bumbum-paticundum-bungurundum. Fiquei com um eco do grito de guerra do Neguinho da Beija-Flor ecoando nos meus ouvidos: Olha a Portela aí, minha gente!Ma-du-rei-rei-rá!
Para me concentrar no trabalho, tratei de organizar um arquivo morto que, um dia depois da crise, precisará ser ressuscitado. Mas esse trabalho envolvente, acolhedor, favoreceu, de algum modo, a germinação e efervescência de pequenos e antigos sambas de Caetano e Chico Buarque na minha cabeça. Caramba! Era como se alguém tivesse enfiado um sonrisal de sambas no meu ouvido e todos eles começassem a espumar dentro da minha cachola. Vai passar nessa avenida um samba popular, com samba, suor e cerveja, um dia, página feliz da nossa história, atrás do trio elétrico....
É lógico que reagi com doses estratosféricas de rock, jazz, blues, bossa nova e até mesmo MPB. Mas não deu certo. Quando eu estava quase bom, lá vinha o Neguinho: Olha o nosso samba aí, gente! E imediatamente a minha mente era povoada por um desfile interminável dos carnavais vividos, vistos e imaginados da minha vida. Todas as mulheres fantásticas. Toda a nudez não castigada. Todos os desejos e prazeres loucos sonhados para os carnavais que não pulei, que pulei pouco e que agora já não dá mais para pular.
Desde então, tenho evitado ligar o rádio. Também estou dando um tempo na TV. E só agora estou me dando conta de que isso é como no samba do Chico. No fundo, estou me guardando pra quando o carnaval chegar.
quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009
terça-feira, 17 de fevereiro de 2009
Não deixe ninguém bater em você
Um menino chutou a perna da minha filha de quatro anos na segunda-feira, na escola. Vi a marca roxa à noite.
_O que aconteceu, minha princesa? – eu perguntei, reprimindo um terrível desejo de vingança.
_Nada. Foi só um menino que me chutou, paiê.
_Como nada? E como é esse menino? Você gritou? Você chamou a professora? Pediu socorro?
_Não, paiê, socorro é só para quando a gente está em perigo!
_Mas um menino chutando você é uma situação de perigo. Tem que gritar, correr, fugir. Não pode levar chute sem fazer nada.
_Eu fiz, paiê. Eu chorei. E pedi desculpa.
_Pediu desculpas? Ai que ódio! Você levou um chute, sofreu uma agressão. Não tem nada que pedir desculpas. Mas será que ninguém ajudou? Ai que vontade de beliscar esse menino. Merecia um cascudo! Tinha que deixar ele de castigo! Meninos malvados têm que ser castigados. Você sabe o nome dele? Que raiva! E porque ele chutou você?
_Paiê, eu puxei o cabelo dele.
_Tomara que tenha doído muito...aahn... você puxou o cabelo dele antes ou depois dele chutar você, filha?
_Ele ia me chutar, paiê.
_Defesa por antecipação, filha.
_Paiê, eu também pisei no pé dele.
_Hum. Foi com força?
_Foi, paiê. Mas eu chutei ele também.
_Ai. Na canela?
_Não, no pirulú.
_Jesus!
_...
_ Sabe, filha, não é legal brigar na escola.
_Eu sei, paiê.
_O que aconteceu, minha princesa? – eu perguntei, reprimindo um terrível desejo de vingança.
_Nada. Foi só um menino que me chutou, paiê.
_Como nada? E como é esse menino? Você gritou? Você chamou a professora? Pediu socorro?
_Não, paiê, socorro é só para quando a gente está em perigo!
_Mas um menino chutando você é uma situação de perigo. Tem que gritar, correr, fugir. Não pode levar chute sem fazer nada.
_Eu fiz, paiê. Eu chorei. E pedi desculpa.
_Pediu desculpas? Ai que ódio! Você levou um chute, sofreu uma agressão. Não tem nada que pedir desculpas. Mas será que ninguém ajudou? Ai que vontade de beliscar esse menino. Merecia um cascudo! Tinha que deixar ele de castigo! Meninos malvados têm que ser castigados. Você sabe o nome dele? Que raiva! E porque ele chutou você?
_Paiê, eu puxei o cabelo dele.
_Tomara que tenha doído muito...aahn... você puxou o cabelo dele antes ou depois dele chutar você, filha?
_Ele ia me chutar, paiê.
_Defesa por antecipação, filha.
_Paiê, eu também pisei no pé dele.
_Hum. Foi com força?
_Foi, paiê. Mas eu chutei ele também.
_Ai. Na canela?
_Não, no pirulú.
_Jesus!
_...
_ Sabe, filha, não é legal brigar na escola.
_Eu sei, paiê.
segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009
Hombre
Um dos filmes mais terríveis estrelados pelo Paul Newman chama-se Hombre. É um faroeste típico dos anos sessenta. O roteiro é do Elmore Leonard, excelente escritor, e o diretor é Martin Ritt, que dirigiu fitas excelentes.
Mas Hombre é um tiro no pé.
Paul é um mestiço indígena que aparece tostado de sol e com uma improvável peruca loura. É um papel ridículo, cheio de cenas patéticas. O roteiro parece ter sido feito pelo Elmore Leonard depois de uma noite de bebedeira grossa. Newman deve falar três ou quatro frases no filme inteiro. Mesmo assim, Paul Newman empresta uma dignidade única para aquele personagem.
Todas as poucas vezes que eu assisti a esse filme, quase sempre de madrugada, com insônia, sempre me peguei chorando de raiva e pena do Paul Newman. Raiva porque é um papel ridículo e eu achava que ele deveria ter tido o bom senso de descartar aquele papel desabonador. Pena porque talvez ele até tenha tentado se livrar daquela coisa, mas pode não ter conseguido. Vai ver que, como qualquer ser humano, ele também tinha suas contas para pagar. Devia favores. Tinha umas pendências para quitar.
De qualquer modo, Hombre é um título do qual sempre me lembro quando tenho que engolir sapos.
Mas Hombre é um tiro no pé.
Paul é um mestiço indígena que aparece tostado de sol e com uma improvável peruca loura. É um papel ridículo, cheio de cenas patéticas. O roteiro parece ter sido feito pelo Elmore Leonard depois de uma noite de bebedeira grossa. Newman deve falar três ou quatro frases no filme inteiro. Mesmo assim, Paul Newman empresta uma dignidade única para aquele personagem.
Todas as poucas vezes que eu assisti a esse filme, quase sempre de madrugada, com insônia, sempre me peguei chorando de raiva e pena do Paul Newman. Raiva porque é um papel ridículo e eu achava que ele deveria ter tido o bom senso de descartar aquele papel desabonador. Pena porque talvez ele até tenha tentado se livrar daquela coisa, mas pode não ter conseguido. Vai ver que, como qualquer ser humano, ele também tinha suas contas para pagar. Devia favores. Tinha umas pendências para quitar.
De qualquer modo, Hombre é um título do qual sempre me lembro quando tenho que engolir sapos.
domingo, 15 de fevereiro de 2009
Marselheza
Tem um sujeito no trabalho que eu mentalmente apelidei de Alonzanfan. Ele é metido a falar francês. Não entendo nada do que ele fala.
Outro dia pregaram uma peça no Alonzanfan. Ele chegou no cubículo e simplesmente não havia nada. Todos os porta-retratos do Alonzanfan haviam desaparecido. Todos os posters do Alonzanfan tinham sumido. Todas as folhas e papéis do cara tinham escafedido. E também sumiram com o PC e o teclado do Alonzanfan.
Ele primeiro achou que eu tinha aprontado aquilo. As pessoas cismam com os carecas, já me acostumei. Depois ele foi ver com o Mister Flowers. E aí começou a chegar gente de todos os lugares da empresa. O Alonzanfan quase chorando. Aí todo mundo cantou parabéns pra você.
O Alonzanfan ficou aliviado. Era só uma brincadeira do Flowers.
De vez em quando, sem querer, eu assobio baixinho perto do Alonzanfan. É a Marselheza.
Outro dia pregaram uma peça no Alonzanfan. Ele chegou no cubículo e simplesmente não havia nada. Todos os porta-retratos do Alonzanfan haviam desaparecido. Todos os posters do Alonzanfan tinham sumido. Todas as folhas e papéis do cara tinham escafedido. E também sumiram com o PC e o teclado do Alonzanfan.
Ele primeiro achou que eu tinha aprontado aquilo. As pessoas cismam com os carecas, já me acostumei. Depois ele foi ver com o Mister Flowers. E aí começou a chegar gente de todos os lugares da empresa. O Alonzanfan quase chorando. Aí todo mundo cantou parabéns pra você.
O Alonzanfan ficou aliviado. Era só uma brincadeira do Flowers.
De vez em quando, sem querer, eu assobio baixinho perto do Alonzanfan. É a Marselheza.
sábado, 14 de fevereiro de 2009
Dedicatória
Fui encontrado por um livro do Chuck Palahniuk neste sábado. Eu já havia passado pela prateleira do C e do P. Foi por isso que o livro dele , chamado Diário, me chamou a atenção. Alguém, definitivamente, havia mudado o livro de lugar. Ele estava no meio de uma prateleira com livros que começam em T, entre uma biografia de Tupac Shackur e um livro do Tristan Tzara.
Só para ter certeza, fui com o livro até o P. Não havia nenhum livro do Palahniuk. Fui no C, idem. Na letra D tinha um monte de Diários, mas nenhum do Chuck. Que estante mais bagunçada, eu pensei. Os livros estão colocados em ordem analfabética por autor e/ou por ordem alfabética do título. Ou seja, se eu estivesse procurando por esse livro, jamais o encontraria. Chamei um funcionário da loja.
_Meu amigo, essa estante é organizada por autor ou pelo título? – eu perguntei.
_O senhor está procurando qual livro? – ele sorriu, contente por me responder com uma pergunta. Vendedor adora responder com pergunta.
_Eu perguntei primeiro. O senhor poderia me responder? – eu disse, sorrindo de volta. Sou campeão de sorriso falso.
_É claro, meu senhor. E qual é o livro que o senhor gostaria de encontrar? – ele insistiu.
_Será que eu encontro um livro igual a esse? – eu retruquei, mostrando o livro do Kurt.
_O senhor está brincando? – ele manteve o sorriso.
_Tenho cara de brincalhão? – redargui.(Um dia, há muito tempo, eu jurei que iria usar esse verbo no pretérito perfeito)
_O livro é igual a esse, certo? – disparou.
_Que horas são? – indaguei, fugindo pela tagente. Tem vendedor que é muito bom nesse game.
Li a orelha do livro. Decidi levar porque ele, o livro, passou nos dois test-drive de livros que eu faço toda vez que estou sem ter certeza de que quero comprar. Primeiro, é lógico, faço a leitura cuidadosa da primeira página. Curta, simpática, um estímulo à curiosidade essa primeira página. Não era tão sensacional quanto a primeira página de On the road, nem tão belo quanto o primeiro parágrafo de O Grande Gatsby. Mas também era bacana.
Em seguida, passei para o segundo test-drive do Careca. Procurei a dedicatória. E lá estava ela, perfeita. Raramente você encontra uma dedicatória tão simples e bonita. Raramente, você encontra tanta expressividade numa única frase. E é incrível como uma simples frase, única, consegue fazer você pensar tanto.
Eu sou péssimo em dedicatórias. Sou ruim para fazer qualquer tipo de dedicatória. Mas se algum dia eu fizer uma dedicatória de livro, vai ser uma bem parecida com aquela do Chuck, em Diários. (Dedicatória é o tipo de coisa que não se encontra fácil no google, pessoal. Legal, né?)
"Para meu avô, Joseph Tallent, que me disse para ser o que eu quisesse."
Só para ter certeza, fui com o livro até o P. Não havia nenhum livro do Palahniuk. Fui no C, idem. Na letra D tinha um monte de Diários, mas nenhum do Chuck. Que estante mais bagunçada, eu pensei. Os livros estão colocados em ordem analfabética por autor e/ou por ordem alfabética do título. Ou seja, se eu estivesse procurando por esse livro, jamais o encontraria. Chamei um funcionário da loja.
_Meu amigo, essa estante é organizada por autor ou pelo título? – eu perguntei.
_O senhor está procurando qual livro? – ele sorriu, contente por me responder com uma pergunta. Vendedor adora responder com pergunta.
_Eu perguntei primeiro. O senhor poderia me responder? – eu disse, sorrindo de volta. Sou campeão de sorriso falso.
_É claro, meu senhor. E qual é o livro que o senhor gostaria de encontrar? – ele insistiu.
_Será que eu encontro um livro igual a esse? – eu retruquei, mostrando o livro do Kurt.
_O senhor está brincando? – ele manteve o sorriso.
_Tenho cara de brincalhão? – redargui.(Um dia, há muito tempo, eu jurei que iria usar esse verbo no pretérito perfeito)
_O livro é igual a esse, certo? – disparou.
_Que horas são? – indaguei, fugindo pela tagente. Tem vendedor que é muito bom nesse game.
Li a orelha do livro. Decidi levar porque ele, o livro, passou nos dois test-drive de livros que eu faço toda vez que estou sem ter certeza de que quero comprar. Primeiro, é lógico, faço a leitura cuidadosa da primeira página. Curta, simpática, um estímulo à curiosidade essa primeira página. Não era tão sensacional quanto a primeira página de On the road, nem tão belo quanto o primeiro parágrafo de O Grande Gatsby. Mas também era bacana.
Em seguida, passei para o segundo test-drive do Careca. Procurei a dedicatória. E lá estava ela, perfeita. Raramente você encontra uma dedicatória tão simples e bonita. Raramente, você encontra tanta expressividade numa única frase. E é incrível como uma simples frase, única, consegue fazer você pensar tanto.
Eu sou péssimo em dedicatórias. Sou ruim para fazer qualquer tipo de dedicatória. Mas se algum dia eu fizer uma dedicatória de livro, vai ser uma bem parecida com aquela do Chuck, em Diários. (Dedicatória é o tipo de coisa que não se encontra fácil no google, pessoal. Legal, né?)
"Para meu avô, Joseph Tallent, que me disse para ser o que eu quisesse."
sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009
Baixou a xenofobia no Careca
Boicote a Suíça, já!
Eles fazem bons relógios, queijos, canivetes e chocolate. Aqui em casa decidimos boicotar os mais famosos produtos suíços. Até porque já tenho um relógio Mondaine e meu canivete é de aço mineiro. Quanto ao chocolate, estamos em regime permanente de contenção de despesas até que o meu cabelo volte a nascer onde já não nasce. E o queijo? Está caro, meu amigo, de qualquer nacionalidade.
Boicote a Itália, já!
Também resolvemos boicotar a Itália. Já faz mais de uma semana que não comemos pizza. Quem dera os políticos desse país seguissem o nosso exemplo!
Boicote os EUA, já!
Neste ano, tendo em vista o caso Maddox, o caso Fred-May, o caso Fred-Vilma, os Flintstones e os Simpsons, não iremos para a nossa tradicional viagem astral à Disney. Mas, se sobrar um troco, tentaremos participar de um partida de poker naquele famoso cassino de Uau-Straight Flush.
Boicote a China, já!
Sim, embora isso não faça a menor diferença.
Boicote o Vaticano, já!
Pelo menos até que mandem embora a guarda Suíça.
Boicote a França, já!
Porque o presidente interrompeu a carreira de uma belíssima cantora.
Boicote a Dinamarca, já!
Há algo de...
E assim por diante.
Eles fazem bons relógios, queijos, canivetes e chocolate. Aqui em casa decidimos boicotar os mais famosos produtos suíços. Até porque já tenho um relógio Mondaine e meu canivete é de aço mineiro. Quanto ao chocolate, estamos em regime permanente de contenção de despesas até que o meu cabelo volte a nascer onde já não nasce. E o queijo? Está caro, meu amigo, de qualquer nacionalidade.
Boicote a Itália, já!
Também resolvemos boicotar a Itália. Já faz mais de uma semana que não comemos pizza. Quem dera os políticos desse país seguissem o nosso exemplo!
Boicote os EUA, já!
Neste ano, tendo em vista o caso Maddox, o caso Fred-May, o caso Fred-Vilma, os Flintstones e os Simpsons, não iremos para a nossa tradicional viagem astral à Disney. Mas, se sobrar um troco, tentaremos participar de um partida de poker naquele famoso cassino de Uau-Straight Flush.
Boicote a China, já!
Sim, embora isso não faça a menor diferença.
Boicote o Vaticano, já!
Pelo menos até que mandem embora a guarda Suíça.
Boicote a França, já!
Porque o presidente interrompeu a carreira de uma belíssima cantora.
Boicote a Dinamarca, já!
Há algo de...
E assim por diante.
quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009
Chove chuva, chove sem parar
Hoje, por volta das duas da tarde, caiu um chuvaréu danado. Eu voltava do almoço corrido, de casa para o trabalho. Não havia como sair do carro. Fiquei quarenta minutos esperando o aguaceiro diminuir. Finalmente, a chuva amainou e o careca aqui resolveu se arriscar. Saí. Chuva fina, super-legal. No minuto seguinte, o caldo engrossou de vez e um ônibus quase pôs tudo a perder com uma passagem rápida sobre uma poça próxima. Por milagre, não fui encharcado.
Na entrada do edifício meio-burrinho onde eu trabalho tinha um artefato novo. Um porta plástico para ensacar guarda-chuvas. E eu estava de guarda-chuva. Ensaquei o guarda-chuva e todo mundo que esperava o elevador ficou me olhando. Cacilda, eu pensei, o que foi que eu fiz de errado? Imediatamente olhei para atrás de mim, já com um olhar de reprovação estampado no rosto. Mas não havia ninguém atrás de mim. Cacilda, quem estava dando o fora era eu. Mas o que é que eu fiz de errado?
Saco, guarda-chuva, tudo ok. Aí olhei para o guarda-chuva ensacado novamente. E na ponta, uma espécie de bolha de água já havia se formado. E pensando bem, aquela bolha era bem esquisita, parecia uma... parecia uma...enorme e gigantesca ponta de preservativo usado.
Envergonhado, puxei um pouco o saco plástico para ver se alterava aquela forma grotesca. E a camisinha, digo, o plástico estourou.
E meus sapatos encharcados chiaram quando entrei no elevador e depois quando eu saí, durante todo o percurso no corredor até o meu cubículo.
Na entrada do edifício meio-burrinho onde eu trabalho tinha um artefato novo. Um porta plástico para ensacar guarda-chuvas. E eu estava de guarda-chuva. Ensaquei o guarda-chuva e todo mundo que esperava o elevador ficou me olhando. Cacilda, eu pensei, o que foi que eu fiz de errado? Imediatamente olhei para atrás de mim, já com um olhar de reprovação estampado no rosto. Mas não havia ninguém atrás de mim. Cacilda, quem estava dando o fora era eu. Mas o que é que eu fiz de errado?
Saco, guarda-chuva, tudo ok. Aí olhei para o guarda-chuva ensacado novamente. E na ponta, uma espécie de bolha de água já havia se formado. E pensando bem, aquela bolha era bem esquisita, parecia uma... parecia uma...enorme e gigantesca ponta de preservativo usado.
Envergonhado, puxei um pouco o saco plástico para ver se alterava aquela forma grotesca. E a camisinha, digo, o plástico estourou.
E meus sapatos encharcados chiaram quando entrei no elevador e depois quando eu saí, durante todo o percurso no corredor até o meu cubículo.
quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009
Cunhambebe
A primeira impressão
Em toda a minha vida, sempre causei uma péssima primeira impressão. Quase sempre também causo uma péssima segunda impressão. Lá pela terceira, a coisa começa a melhorar ou piora de vez. Às vezes eu colaboro para a impressão ruim que causo. Tenho um gênio difícil. Às vezes tento corrigir, o que só piora as coisas. E, por fim, muitas vezes fico simplesmente desinteressado em melhorar ou piorar a impressão. Seja o que tiver de ser. Quem viver, verá. Maktub.
_Catatuia! – eu digo, bem alto.
Cunhambebe, o canibal
Quando eu era menino, ouvi falar pela primeira vez da Confederação dos Tamoios. Depois, ouvi falar de Tibiriçá. Érico Veríssimo o trata como herói em série de livros para crianças. Mas aí, passou um tempo, ninguém mais falou disso. Outro dia encontrei na estante um livro do Antônio Torres, sobre Cunhambebe, o maior dos guerreiros tupinambás do Brasil dos anos 1500. Esse índio fez gato e sapato dos portugueses no Brasil colonial. E nesse livro, Tibiriçá não é flor que se cheire, é um traidor. Mas em Hans Staden, até Tibiriçá é legal. Cunhambebe é que não é traçado com elogios.
A importância de ser Ernesto
Não sei quase nada da história desse país. E meus heróis brasileiros, conto nos dedos. Acho isso muito ruim. Faz parecer que só demos mancada, desde a descoberta. Faz parecer que há algo errado neste país tropical, algo entranhado nas veias do povo, que vem da terra. Me recuso a acreditar nisso. Aqui tem coisas boas e tem coisas ruins. E acredito que existem mais coisas boas do que ruins.
Trote
Vejo os meninos rirem de um desenho animado que mostra um coelho levando um trote de monstro azul. Eu também acho engraçado. Mas nunca achei trote muito engraçado. Na verdade, acho que não gosto de trapaças, de enganações.
Os malas de TI
No trabalho, um amigo meu me perguntou um dia como eu fazia para ser bem atendido pelos caras da tecnologia da informação. Eu não escondi a minha surpresa.
_Bem atendido? Esses caras são uns malas sem rodinha. Demora pelo menos uma semana para que um chamado meu seja atendido.
Um dos caras de TI ouviu. Passou a demorar um mês para que atendessem a um chamado do papai aqui. Tentei reverter a situação. Fiquei no corredor, na tocaia. Quando os caras de TI chegavam perto eu falava alto que os “caras de TI sabem o que fazem”. Não colou. Eles perceberam a impostura. Hoje, depois de um mês e meio da abertura de chamado, fui atendido. Mesmo assim, não consegui acesso ao banco.
terça-feira, 10 de fevereiro de 2009
Agora é que são elas
Tem hora que é super-difícil tomar uma decisão. Nessas horas, eu sempre lembro de músicas, especialmente das que eu escutava quando era criança. Tinha uma cantora italiana, chamada Gigliola Cinquettti, que cantava “Non ho l'età”(Não tenho idade). Meu pai tinha o EP com a canção e um dia, há milênios, me explicou que a música falava de uma moça que não tinha idade para estar apaixonada. Nô-nô-lê-tá, Nô-nô-lê-tá, per amari a ti, é a única coisa de que me lembro. Na minha cabeça, eu misturo essa música com o baião que fala da menina que enjoa da boneca, “ela só quer saber de namorar”. Aí, quando eu olho, está lá a pessoa esperando eu tomar uma decisão.
_Hum? – eu digo, compenetrado nas músicas que assolam a minha cabeça.
_Pois é, doutor, é a crédito, né?
_Vocês dividem em quantas vezes?
_Olha doutor, é produto em promoção. Mas dá pra fazer em até quatro vezes sem juros.
_E com juros?
Aí é a vez do cara pensar. Mas ele está com mais pressa do que eu.
_Quatro vezes é o máximo, doutor.
_Tudo bem, deixa eu pensar. Hum, talvez em quatro parcelas – e eu continuo com a música na cabeça. Nô-nô-lê-tá. Nô-nô-lê-tááá. Não é nem a coisa em si que é difícil. É só a tomada de decisão, que fica emperrada, como se fosse uma marcha presa no câmbio.
_E aí, doutor?
_Hum? (Nô-nô-lê-tá. Nô-nô-lê-tááá.).
_Faz em quatro parcelas mesmo?
_ Nô-nô-nãããooo. Não vou levar. Desisti. Essa crise, sabe como ééé...
_Mas doutor, essa gravata é italiana! Está em promoção, com 40 por cento de dês-con-to! E em qua-tro vê-zes, doutor!
_É italiana, né?
_E em quatro parcelas! À vista, eu faço pela metade do preço...
E aí eu lembro daquela música, com o Renato Russo, la solitudinê...
segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009
Hoje é rapidinho
Sim, são três letrinhas
Essa música, na voz da Marisa Monte, é uma das prediletas da minha filha de quatro anos. E também minha. Faz parte de um excelente CD que a Patroa ganhou e fica no carro dela. Só que o carro dela quebrou.
Mulheres são de Vênus
E lá em Vênus elas não precisam pedir para o frentista olhar a água do radiador, calibrar os pneus e nem conferir o óleo.
Coelho mau, coelho mau
Meu mau-humor agora dura mais de quarenta e oito horas, numa boa. Lembra daquela pilha do coelhinho baterista? Meu mau-humor ganha.
Oxalá, Oxalá
Uma das expressões que eu nunca consegui encaixar no meio de uma conversa é “Oxalá”. Acho bacana.
Essa música, na voz da Marisa Monte, é uma das prediletas da minha filha de quatro anos. E também minha. Faz parte de um excelente CD que a Patroa ganhou e fica no carro dela. Só que o carro dela quebrou.
Mulheres são de Vênus
E lá em Vênus elas não precisam pedir para o frentista olhar a água do radiador, calibrar os pneus e nem conferir o óleo.
Coelho mau, coelho mau
Meu mau-humor agora dura mais de quarenta e oito horas, numa boa. Lembra daquela pilha do coelhinho baterista? Meu mau-humor ganha.
Oxalá, Oxalá
Uma das expressões que eu nunca consegui encaixar no meio de uma conversa é “Oxalá”. Acho bacana.
sábado, 7 de fevereiro de 2009
O crítico do hall
Há um ano, eu estava tomando muito café. Eu entrava nas ante-salas e ficava esperando uma eternidade. Aí, de repente, a secretária se lembrava de ser gentil. Era sempre uma secretária diferente. Também era sempre um lugar diferente. Só eu estava igual. Eu levava o currículo. Tinha feito a barba na véspera. Estava de terno e gravata. E a secretária, quando se lembrava de ser gentil, me oferecia um café. Eu sempre aceitava. Me disseram que não é bom começar uma entrevista recusando alguma coisa. Eu acreditei.
Além disso, eu sempre usei a xícara de café como um teste de nervosismo. Se eu estivesse nervoso, minhas mãos tremeriam e eu teria que usar as duas mãos para segurar a xícara. A mesma coisa com a água. Nunca recuso a água que me oferecem. Tem alguma coisa a ver com aquele famoso ditado: Nunca diga desta água não beberei. Eu não digo. E aceito a água.
Lembro que na primeira vez, em janeiro, eu estava tremendo um pouco. Fazia tempo que não fazia uma entrevista. A secretária notou. Não demonstrou a menor simpatia. Na verdade, tentou disfarçar um leve sorriso, que eu tomei por desdém. Por causa disso, nem bebi o café todo. E até pensei em recusar a água. Mas o ditado é forte. Ele ecoou na minha cabeça. Fiz uma péssima entrevista por causa daquele sorriso. E quando eu saí da sala de entrevista, não pude evitar um olhar raivoso para a secretária. Ela fingiu que não viu.
Depois da décima entrevista, a coisa começa virar rotina. Você já olha a secretária sem muita consideração. Calcula rapidamente a idade das senhoras pelo coque, observa as unhas e as roupas. E dá um jeito de ver os sapatos da secretária. É possível descobrir tudo de uma empresa só olhando para os sapatos da secretária. Você também faz uma avaliação mais criteriosa das cadeiras da ante-sala. Observa o tapete. Vê se a mesa de centro combina com o resto da mobília. E depois critica os quadros das paredes.
_Caramba! Quem pintou esse quadro?
_Hã?
_Esse quadro amarelo aqui.
_Foi o filho do chefe – e aqui se acendeu o sinal de alerta do aranha.
_Um neo-psicodélico maravilhoso! E a moldura é simplesmente perfeita! Valoriza as cores e realça a temática. Esse cara vai longe.
_Você acha?
_Sim. (Ele deveria estudar pintura bem longe daqui. E estudar muito – eu pensava).
_Hã? – ela perguntou, como se estivesse escutando eu pensar alto.
Dei de ombros.
_Já vi fraldas mais bonitas - eu disse, olhando para a secretária. Um brilho de malícia cintilou naqueles olhos de meia-idade. Ela sorriu um sorriso divertido.
Então pegou o telefone e pediu para o garçom trazer café e água. Não sei se foi coincidência, mas as entrevistas começaram a ficar mais longas depois daquele dia.
Além disso, eu sempre usei a xícara de café como um teste de nervosismo. Se eu estivesse nervoso, minhas mãos tremeriam e eu teria que usar as duas mãos para segurar a xícara. A mesma coisa com a água. Nunca recuso a água que me oferecem. Tem alguma coisa a ver com aquele famoso ditado: Nunca diga desta água não beberei. Eu não digo. E aceito a água.
Lembro que na primeira vez, em janeiro, eu estava tremendo um pouco. Fazia tempo que não fazia uma entrevista. A secretária notou. Não demonstrou a menor simpatia. Na verdade, tentou disfarçar um leve sorriso, que eu tomei por desdém. Por causa disso, nem bebi o café todo. E até pensei em recusar a água. Mas o ditado é forte. Ele ecoou na minha cabeça. Fiz uma péssima entrevista por causa daquele sorriso. E quando eu saí da sala de entrevista, não pude evitar um olhar raivoso para a secretária. Ela fingiu que não viu.
Depois da décima entrevista, a coisa começa virar rotina. Você já olha a secretária sem muita consideração. Calcula rapidamente a idade das senhoras pelo coque, observa as unhas e as roupas. E dá um jeito de ver os sapatos da secretária. É possível descobrir tudo de uma empresa só olhando para os sapatos da secretária. Você também faz uma avaliação mais criteriosa das cadeiras da ante-sala. Observa o tapete. Vê se a mesa de centro combina com o resto da mobília. E depois critica os quadros das paredes.
_Caramba! Quem pintou esse quadro?
_Hã?
_Esse quadro amarelo aqui.
_Foi o filho do chefe – e aqui se acendeu o sinal de alerta do aranha.
_Um neo-psicodélico maravilhoso! E a moldura é simplesmente perfeita! Valoriza as cores e realça a temática. Esse cara vai longe.
_Você acha?
_Sim. (Ele deveria estudar pintura bem longe daqui. E estudar muito – eu pensava).
_Hã? – ela perguntou, como se estivesse escutando eu pensar alto.
Dei de ombros.
_Já vi fraldas mais bonitas - eu disse, olhando para a secretária. Um brilho de malícia cintilou naqueles olhos de meia-idade. Ela sorriu um sorriso divertido.
Então pegou o telefone e pediu para o garçom trazer café e água. Não sei se foi coincidência, mas as entrevistas começaram a ficar mais longas depois daquele dia.
sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009
O sábado é hoje
O sábado é hoje
Ainda bem.
Porrada no Geni
Lembro de um sujeito metido a filósofo que gostava de conversar potocas comigo. O cara era brasileiro, mas dizia ser de um daqueles países da Europa que ninguém sabe direito onde fica. Ele procurava maneiras de complicar as coisas mais simples. Era difícil prestar atenção no sujeito. Era um maluco muito chato. Em geral, ele puxava conversa no ponto de carona da faculdade. O nome dele de verdade eu esqueci. Mas todo mundo chamava ele de Geni.
_É sério - ele dizia. Eu sempre cismei com “não pretendo fazer nada.” Se o sujeito “não pretende”, então ele acabará por fazer alguma coisa.
_Hã?
_ Parece confuso, né? Examine com outro verbo. As pessoas dizem: Eu não quero fazer nada. Ora, se não querem fazer alguma coisa, então não farão. Se não querem fazer nada, primeiro não querem, e se não querem, então não têm vontade nenhuma de fazer ou de não fazer alguma coisa. Por exemplo: eu não quero água. Então eu recuso água. Se eu não quero nada, eu recuso fazer nada. Entendeu?
_Geni, vá encher outro.
_Não, você não entendeu. Você é como a maioria dos bípedes sem plumas. Você se recusa a observar um problema em busca de uma solução.
_Geni, vá alugar outro cara.
_É mais uma apedeuta. Faça o favor de me tratar com obséquios e solicitudes.
_Geni, eu vou quebrar as tuas fuças se você insistir com esse papo.
_Qualé Careca? Estou só brincando.
Geni vivia levando porrada no ponto de carona. Eu nunca bati no Geni. Fiquei só na ameaça. Mas hoje me arrependo. Um sujeito que consegue ficar mais de vinte anos na sua memória como uma mala sem alça e sem rodinhas merece, no mínimo, um monte de tabefes.
Por quê me arrasto a seus pés?
Às vezes eu escuto umas músicas do Rei Roberto e fico pensando se existem pessoas daquele jeito. E aí me lembro que sim. E até vejo a mim mesmo em algumas músicas. É por isso que o rei é o rei.
Ainda bem.
Porrada no Geni
Lembro de um sujeito metido a filósofo que gostava de conversar potocas comigo. O cara era brasileiro, mas dizia ser de um daqueles países da Europa que ninguém sabe direito onde fica. Ele procurava maneiras de complicar as coisas mais simples. Era difícil prestar atenção no sujeito. Era um maluco muito chato. Em geral, ele puxava conversa no ponto de carona da faculdade. O nome dele de verdade eu esqueci. Mas todo mundo chamava ele de Geni.
_É sério - ele dizia. Eu sempre cismei com “não pretendo fazer nada.” Se o sujeito “não pretende”, então ele acabará por fazer alguma coisa.
_Hã?
_ Parece confuso, né? Examine com outro verbo. As pessoas dizem: Eu não quero fazer nada. Ora, se não querem fazer alguma coisa, então não farão. Se não querem fazer nada, primeiro não querem, e se não querem, então não têm vontade nenhuma de fazer ou de não fazer alguma coisa. Por exemplo: eu não quero água. Então eu recuso água. Se eu não quero nada, eu recuso fazer nada. Entendeu?
_Geni, vá encher outro.
_Não, você não entendeu. Você é como a maioria dos bípedes sem plumas. Você se recusa a observar um problema em busca de uma solução.
_Geni, vá alugar outro cara.
_É mais uma apedeuta. Faça o favor de me tratar com obséquios e solicitudes.
_Geni, eu vou quebrar as tuas fuças se você insistir com esse papo.
_Qualé Careca? Estou só brincando.
Geni vivia levando porrada no ponto de carona. Eu nunca bati no Geni. Fiquei só na ameaça. Mas hoje me arrependo. Um sujeito que consegue ficar mais de vinte anos na sua memória como uma mala sem alça e sem rodinhas merece, no mínimo, um monte de tabefes.
Por quê me arrasto a seus pés?
Às vezes eu escuto umas músicas do Rei Roberto e fico pensando se existem pessoas daquele jeito. E aí me lembro que sim. E até vejo a mim mesmo em algumas músicas. É por isso que o rei é o rei.
quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009
Um modelo de futuro diferente
Outro dia fiz uma busca de imagens na Internet sobre o futuro. E é gozado como é velha a nossa imagem de futuro. Quase tudo remonta a Júlio Verne. E.R. Burroughs(Tarzan e John Carter no Planeta Marte) e Metrópolis. Ali estão elas, as cidades gigantes verticalizadas, sem um pingo de verde, com intenso trânsito de máquinas voadoras e sem lugar para nós, formigas humanas. Só nos resta o subterrâneo, as catacumbas, o lodo e a lama.
Também é velho o nosso imaginário do pós-apocalipse. É quase sempre a mesma coisa. Depois de esgotarmos o planeta, estaremos em guerra. O repovoamento é quase impossível, porque uma nova espécie surgiu para suplantar a raça humana. Além disso, somos incorrigíveis. Tratamos de detonar o planeta rapidinho.
Não me lembro de jamais ter lido uma ficção futurística que não fosse apocalíptica. Tudo bem, os escritores estão cobertos de razão, o futuro não promete ser muito cor-de-rosa. Mas, pô, isso tem que ser unanimidade? Se existem ficcionistas polianas, por quê não existem ficcionistas futurísticos polianas? E repare que há décadas que estamos nesse baixo astral para o porvir.
A verdade, como já disse o Renato Russo, é que o futuro não é mais como era antigamente. Bem muito antigamente. Quando ainda se falava em terra do leite e do mel e isso nos bastava. Exatamente na época em que os caras que falavam isso, se escondiam em catacumbas. Gozado, né?
O mais estranho dessa espécie de ciclo, é que volta e meia, a gente lê uma história metida a futurística onde o sujeito volta para o passado pré-histórico. E lá nos confins do passado, algo que veio do futuro nos levará para a nossa caminhada histórica de seres humanos.
Super-clichêa. O neanderthal que passa por uma dobra temporal e chega ao presente. O sujeito que veio do futuro e ninguém acredita, passa por maluco metido a profeta, a Cassandra incapaz de deter o que está escrito nas estrelas.
Uma vez, li numa história em quadrinhos do Superpateta que a história é imutável. Achei super-legal. O Pateta comia uns super-amendoins e voltava para o passado. Mesmo sendo Super, ele se machucava o tempo todo, pois sequer as folhas da grama ele poderia curvar, no passado. Nesse mesmo gibi, o Superpateta ia para o futuro. E lá era o contrário. O futuro era totalmente inconstante. Onde havia floresta, no instante seguinte, era cidade. Rios secavam num piscar de olhos. Até o super começa a ficar mole, a bambear e a se dissolver, feito uma onda eletromagnética. Tudo era instável, pois o futuro é só uma possibilidade intangível entre zilhões de possibilidades. Pateta só consegue escapar porque um superamendoim germina milagrosamente rápido no futuro.
Até hoje tento encontrar essa história fantástica em sebos de quadrinhos. Em poucas páginas, o personagem de Walt Disney moldou a minha idéia de futuro numa algazarra de possibilidades infinitas. Nós seres humanos, somos iguais ao cachorro Pateta. Teremos sorte se encontrarmos alguns amendoins pela frente.
Também é velho o nosso imaginário do pós-apocalipse. É quase sempre a mesma coisa. Depois de esgotarmos o planeta, estaremos em guerra. O repovoamento é quase impossível, porque uma nova espécie surgiu para suplantar a raça humana. Além disso, somos incorrigíveis. Tratamos de detonar o planeta rapidinho.
Não me lembro de jamais ter lido uma ficção futurística que não fosse apocalíptica. Tudo bem, os escritores estão cobertos de razão, o futuro não promete ser muito cor-de-rosa. Mas, pô, isso tem que ser unanimidade? Se existem ficcionistas polianas, por quê não existem ficcionistas futurísticos polianas? E repare que há décadas que estamos nesse baixo astral para o porvir.
A verdade, como já disse o Renato Russo, é que o futuro não é mais como era antigamente. Bem muito antigamente. Quando ainda se falava em terra do leite e do mel e isso nos bastava. Exatamente na época em que os caras que falavam isso, se escondiam em catacumbas. Gozado, né?
O mais estranho dessa espécie de ciclo, é que volta e meia, a gente lê uma história metida a futurística onde o sujeito volta para o passado pré-histórico. E lá nos confins do passado, algo que veio do futuro nos levará para a nossa caminhada histórica de seres humanos.
Super-clichêa. O neanderthal que passa por uma dobra temporal e chega ao presente. O sujeito que veio do futuro e ninguém acredita, passa por maluco metido a profeta, a Cassandra incapaz de deter o que está escrito nas estrelas.
Uma vez, li numa história em quadrinhos do Superpateta que a história é imutável. Achei super-legal. O Pateta comia uns super-amendoins e voltava para o passado. Mesmo sendo Super, ele se machucava o tempo todo, pois sequer as folhas da grama ele poderia curvar, no passado. Nesse mesmo gibi, o Superpateta ia para o futuro. E lá era o contrário. O futuro era totalmente inconstante. Onde havia floresta, no instante seguinte, era cidade. Rios secavam num piscar de olhos. Até o super começa a ficar mole, a bambear e a se dissolver, feito uma onda eletromagnética. Tudo era instável, pois o futuro é só uma possibilidade intangível entre zilhões de possibilidades. Pateta só consegue escapar porque um superamendoim germina milagrosamente rápido no futuro.
Até hoje tento encontrar essa história fantástica em sebos de quadrinhos. Em poucas páginas, o personagem de Walt Disney moldou a minha idéia de futuro numa algazarra de possibilidades infinitas. Nós seres humanos, somos iguais ao cachorro Pateta. Teremos sorte se encontrarmos alguns amendoins pela frente.
quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009
A praça não é dele, nem nossa
Leio nos jornais que o Oscar Niemeyer desistiu daquela praça. Antes apelou para argumento de autoridade, desqualificou outros arquitetos, desqualificou quem não é arquiteto, elogiou os arquitetos amigos que o apoiaram. Primeiro disse que a briga estava boa, mas que achava melhor uma comissão de notáveis tratar do assunto. Aí, de repente, desistiu. Achei ótimo. Para encerrar esse assunto, eu gostaria de dizer que acho o Niemeyer um cara genial. Ele faz bonito. Ele faz tudo redondo, curvo e enterrado no chão. É o rei da parede curva. Não sou entendido, mas sei, as paredes curvas exigem mais fundação e ferragens, mão-de-obra, material de acabamento, mais tudo, inclusive tubulação e iluminação. A área útil interna é diminuída pela curvatura das paredes e influi em quase tudo, dos móveis à qualidade da limpeza. Tente limpar a poeira de um cantinho da parede interna. Monte um andaime para limpar a parte externa de uma bola e você vai entender a coisa. Além disso, em obra que tem muito buraco e concreto armado, o dinheiro desce pelo ralo.
A vida inteira ON foi glorificado e acho merecido. Aqui se faz, aqui se paga. Mas continuo achando as praças do ON sem sombra, sem banco, sem banheiro, sem lugar para ficar, sem grama, sem árvore e um saco. Se não fosse o Jânio Quadros, que botou um pombal-pregador-de-roupa gigantesco na Praça dos Três Poderes, lá, nem pombo tinha.
Mega hit
A mesma praça, o mesmo banco, as mesmas flores, o mesmo jardim, tudo é igual, mas estou triste, porque não tenho, você perto de mim. (Valdir Franco, se não me engano)
Torrando na Esplanada
A Esplanada dos Ministérios, se você nunca passou por lá, é um lugar que não dá para andar a pé, a não ser bem cedinho. O sol é inclemente e quase não tem sombra em lugar nenhum. Não há nada de interessante na caminhada.
Quando projetaram a Esplanada deviam ter em mente Raskolnikov e o assassinato de barnabés octagenários. Só é possível chegar de carro. A pé também se vai, mas é como atravessar o deserto. O táxi vai te custar uma fortuna. Existem poucas paradas de ônibus. Assim, se você tiver que ir a um Ministério próximo à parada, sorte sua. Se não, pegue um lotação.
Desde a era Collor, que acabou com o transporte coletivo gratuito para os servidores da Esplanada, não existe lugar para estacionar depois das oito e meia da manhã. Brasília tem péssima fama nacional, de ser um penduricalho de empregos públicos. Mas isso é apenas parte da verdade. Primeiro, porque até hoje cerca de 450 mil servidores públicos federais da ativa estão lotados no Rio de Janeiro. Brasília tem cerca de 500 mil servidores federais na ativa. E a maioria dos barnabés rala. Além disso, a cidade tombada está condenada a um afunilamento logístico. A Esplanada, incluindo os anexos e adjacências, do Congresso até o Ministério Público, abriga cerca de 300 mil pessoas. Não há transporte público decente. E todos os percursos convergem para a Esplanada. Às nove da manhã, se você estiver de helicóptero, tire uma foto. Você verá todas as ruas e avenidas coalhadas de carros descendo para a Esplanada. De cima, é bem bacana. No meio dos carros, é um saco. É mais ou menos assim o meu apreço e desapreço com o ON.
Mega hit 2
Eu queria ser John Lennon
um minuto só,
pra ficar no toca-disco
e você me ouvir,
Eu queria ser a chuva
que molhou seu corpo
pra saber o gosto que você sentiu,
quando um pingo frio
no seu corpo caiu.
Eu queria ser aquele espelho
no seu quarto,
pois nele você sempre olha
antes de ir dormir.
(Odair José - com certeza)
A vida inteira ON foi glorificado e acho merecido. Aqui se faz, aqui se paga. Mas continuo achando as praças do ON sem sombra, sem banco, sem banheiro, sem lugar para ficar, sem grama, sem árvore e um saco. Se não fosse o Jânio Quadros, que botou um pombal-pregador-de-roupa gigantesco na Praça dos Três Poderes, lá, nem pombo tinha.
Mega hit
A mesma praça, o mesmo banco, as mesmas flores, o mesmo jardim, tudo é igual, mas estou triste, porque não tenho, você perto de mim. (Valdir Franco, se não me engano)
Torrando na Esplanada
A Esplanada dos Ministérios, se você nunca passou por lá, é um lugar que não dá para andar a pé, a não ser bem cedinho. O sol é inclemente e quase não tem sombra em lugar nenhum. Não há nada de interessante na caminhada.
Quando projetaram a Esplanada deviam ter em mente Raskolnikov e o assassinato de barnabés octagenários. Só é possível chegar de carro. A pé também se vai, mas é como atravessar o deserto. O táxi vai te custar uma fortuna. Existem poucas paradas de ônibus. Assim, se você tiver que ir a um Ministério próximo à parada, sorte sua. Se não, pegue um lotação.
Desde a era Collor, que acabou com o transporte coletivo gratuito para os servidores da Esplanada, não existe lugar para estacionar depois das oito e meia da manhã. Brasília tem péssima fama nacional, de ser um penduricalho de empregos públicos. Mas isso é apenas parte da verdade. Primeiro, porque até hoje cerca de 450 mil servidores públicos federais da ativa estão lotados no Rio de Janeiro. Brasília tem cerca de 500 mil servidores federais na ativa. E a maioria dos barnabés rala. Além disso, a cidade tombada está condenada a um afunilamento logístico. A Esplanada, incluindo os anexos e adjacências, do Congresso até o Ministério Público, abriga cerca de 300 mil pessoas. Não há transporte público decente. E todos os percursos convergem para a Esplanada. Às nove da manhã, se você estiver de helicóptero, tire uma foto. Você verá todas as ruas e avenidas coalhadas de carros descendo para a Esplanada. De cima, é bem bacana. No meio dos carros, é um saco. É mais ou menos assim o meu apreço e desapreço com o ON.
Mega hit 2
Eu queria ser John Lennon
um minuto só,
pra ficar no toca-disco
e você me ouvir,
Eu queria ser a chuva
que molhou seu corpo
pra saber o gosto que você sentiu,
quando um pingo frio
no seu corpo caiu.
Eu queria ser aquele espelho
no seu quarto,
pois nele você sempre olha
antes de ir dormir.
(Odair José - com certeza)
terça-feira, 3 de fevereiro de 2009
O bom de fevereiro
Existem meses bons e uns meses que dão vontade de chorar. Isso varia muito. Tem gente que é bom de dezembro. Tem gente que é bom de janeiro. Outros são bons o ano inteiro, mas péssimos nas férias. Tem uns sujeitos que são bons de não fazer nada em qualquer época do ano. Mas nunca conheci ninguém muito bom de fevereiro. Eu, por exemplo, acho fevereiro mediano. É tipo não fede e nem cheira, mas não chega a ser tanto. A melhor coisa de fevereiro é que é curto. É por isso, principalmente, que tenho uma leve simpatia por fevereiro.
As coisas mais surpreendentes não costumam acontecer no mês de fevereiro. É um mês bem chinfrim de acontecimentos. Fevereiro é o mês da volta às rotinas. E isso às vezes, bem raramente, pode ser interessante. Veja a volta às aulas, por exemplo. É uma coisa legal, voltar às aulas. Mas tem gente que tem vontade de chorar só com a perspectiva de entrar numa sala de aula. Eu, por exemplo, não tenho essas frescuras. O que me dá vontade de chorar é o fato de abandonar travesseiro e colchão nos horários que eles estão mais confortáveis.
Mesmo assim, posso dizer que eu curti a volta das crianças às aulas. Elas curtiram mais ou menos. Primeiro porque trocaram de escola. Criança não gosta muito de mudar de escola. Aliás, algumas detestam. As minhas, no início, acharam ruim. Mas nem tanto. De qualquer forma, aproveitando o fato de que elas são pequenas, indefesas e incapazes de mover ações judiciais, eu e a Patroa resolvemos que elas iriam sair da escola alternativa.
_E foram para uma escola convencional, mainstream? – você deve estar se perguntando.
Sim, eu também me fiz a mesma pergunta quando a Patroa topou a mudança de escola. Mas a verdade é que elas foram para outra escola alternativa, só que um pouco mais longe do que a escola em que estavam no ano passado.
_Sim, querida –eu disse para a Patroa – parece bem lógico trocar uma escola alternativa por outra escola mais alternativa. Ainda mais que essa escola também é mais distante de casa e do meu e do seu local de trabalho. Facilita muito. Ainda mais quando essa distância é o dobro da outra distância que, aliás, já era considerada uma maratona.
Na verdade, a escola é longe pra dedéu. E por causa disso, as crianças têm que dormir e acordar mais cedo, senão todo mundo chega atrasado na escola e no trabalho.
Então, na segunda-feira, eu e a Patroa, cada um com um filhote diferente num carro diferente, fomos levar as crianças para o primeiro dia de aula, na mesma escola. Cacilda! Essa escola alternativa além de longe pra dedéu é super-maior que a antiga escola alternativa. Então fica cheio de pais e meninos e meninas na frente da escola, uma loucura! E eu fico agoniado. Eu tenho pavor de multidões desde que perdi os meus óculos durante a micarecandanga, no final dos anos oitenta. Na ocasião, fui atropelado por uma manada de zebus bebuns vestidos com um abadá da então desconhecida Daniela Mercury. Aquela Micarê foi o meu hello, goodbye para a Axé Music.
Por isso, eu respirei fundo, apertei a mão do meu filho primogênito e encarei a entrada da escola. Primeiro dia de aula é uma coisa que remete seu coração aos próprios atropelos. Ao me aproximar dos portões, eu vi a mim mesmo há duzentos anos, quando eu tremi na frente dos portões da escola no meu primeiro dia de aula. Suei frio. Mas disfarcei legal. Meu filho hesitou ao ver o estranho corredor de grades na entrada da escola. E parou.
_Sabe, pai, eu gostava mais da outra escola..- disse o meu filhote.
_Era mais perto. Mas vamos dar uma chance para essa escola. De repente, ela é uma escola bem gostável. E aqui não tocam axé music.
Depois, já em casa, os dois estavam radiantes. Até que começou bem, esse fevereiro.
segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009
Um diretor de cinema para minha vida
É só uma hipótese. Vamos dizer que, um dia, alguém resolvesse fazer um filme sobre a minha vida. Em se tratando de filme nacional, tudo é possível. Já filmaram coisas piores, e, além disso, tenho certeza de que um filme sobre a minha vida seria tão ou mais inteligível quanto “Terra em Transe” ou “O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro”.
Se bem que esses dois filmes não valem. Qualquer filme é tão ou mais inteligível que as obras-primas de Gláuber Rocha, aquele gênio espertalhão. Gláuber foi o cineasta que inventou o “cinema-nau-fragô” de resenha comentada. (Tem um monte de “wave”, “new wave” mas ninguém fala da “wrong wave”, “onda errada”, “bola fora”, “bad surf” e estilos furados inventados na mesma época)
Não importa. Para o bom espectador do estilo “onda má-perversa-destruidora” do Gláuber, você tem que ler a entrevista do diretor, o roteiro do diretor, os comentários sobre cada plano do filme feito pelo diretor e também acompanhar a vida e a obra do diretor para entender o que diabos ele está falando. É lógico que mesmo fazendo tudo isso, você jamais conseguirá entender patavina, porque o Gláuber era mais chegado num hermetismo que o próprio Hermeto Paschoal, que é albino, gênio, toca todos os instrumentos da orquestra e mais uns porquinhos.
Pois então. Do que é que eu estava falando mesmo? Ah, sim. Do filme da minha vida. Bom, se eu pudesse escolher diretor eu escolheria o Gláuber ou o Jabor. Nenhum dos dois gosta de uma narrativa linear e minha vida é uma barafunda complicada, um novelo de lã de lhama bagunçado por animais silvestres. Mas, como nenhum dos dois gênios brasileiros está na ativa, tentaria os estrangeiros.
Minha primeira opção seria Martin Scorcese. O cara é bom de épico. E minha vida, sem sombra de dúvida, daria um filme épico. Cecil B. de Mille faria um novo Crepúsculo com os meus crepúsculos. Minha vida é um quadrúpede iluminado, igual ao que ofereceram para os troianos. Além disso, minha memória das coisas é em preto-e-branco, estou sempre acima do meu peso ideal e já quebraram o meu nariz com um soco.
Mas Robert de Niro já está um pouco velho, então Di Caprio teria que raspar a cabeça para o papel-título.
Se Scorcese estivesse muito ocupado, tentaria Almodóvar. Sim, porque minha vida às vezes parece uma tragicomédia novelesca e nonsense, bem brega. Caso Almodóvar não quisesse filmar novamente com Antonio Banderas – que teria que raspar a cabeça , haveria ainda mais uma alternativa: o inigualável Robert Rodrigues.
Rodrigues é um super-diretor de efeitos especiais canhestros, uma coisa de que a minha vida está cheia. Quero dizer, o último porre com efeitos especiais que eu tomei foi no aniversário do Cabeça. Na ocasião, os efeitos capricharam nos roncos canhestros. Tanto que a Patroa me mandou dormir na sala, no que obedeci, é claro, que eu não sou besta. Onde eu estava? Pois sim, em Robert Rodrigues.
Seria uma ótima opção, Robert Rodrigues. Até porque ele transita bem pelos mais diferentes gêneros do cinema. Huummm! Vou reconstruir a frase. Rodrigues é capaz de filmar com a mesma competência o trágico, o cômico, o romântico, o épico e o besteirol mais rasteiro de que já se teve notícia. Ou seja, a história da minha vida. Mas George Clooney teria que raspar a cabeça, é claro!
Se bem que esses dois filmes não valem. Qualquer filme é tão ou mais inteligível que as obras-primas de Gláuber Rocha, aquele gênio espertalhão. Gláuber foi o cineasta que inventou o “cinema-nau-fragô” de resenha comentada. (Tem um monte de “wave”, “new wave” mas ninguém fala da “wrong wave”, “onda errada”, “bola fora”, “bad surf” e estilos furados inventados na mesma época)
Não importa. Para o bom espectador do estilo “onda má-perversa-destruidora” do Gláuber, você tem que ler a entrevista do diretor, o roteiro do diretor, os comentários sobre cada plano do filme feito pelo diretor e também acompanhar a vida e a obra do diretor para entender o que diabos ele está falando. É lógico que mesmo fazendo tudo isso, você jamais conseguirá entender patavina, porque o Gláuber era mais chegado num hermetismo que o próprio Hermeto Paschoal, que é albino, gênio, toca todos os instrumentos da orquestra e mais uns porquinhos.
Pois então. Do que é que eu estava falando mesmo? Ah, sim. Do filme da minha vida. Bom, se eu pudesse escolher diretor eu escolheria o Gláuber ou o Jabor. Nenhum dos dois gosta de uma narrativa linear e minha vida é uma barafunda complicada, um novelo de lã de lhama bagunçado por animais silvestres. Mas, como nenhum dos dois gênios brasileiros está na ativa, tentaria os estrangeiros.
Minha primeira opção seria Martin Scorcese. O cara é bom de épico. E minha vida, sem sombra de dúvida, daria um filme épico. Cecil B. de Mille faria um novo Crepúsculo com os meus crepúsculos. Minha vida é um quadrúpede iluminado, igual ao que ofereceram para os troianos. Além disso, minha memória das coisas é em preto-e-branco, estou sempre acima do meu peso ideal e já quebraram o meu nariz com um soco.
Mas Robert de Niro já está um pouco velho, então Di Caprio teria que raspar a cabeça para o papel-título.
Se Scorcese estivesse muito ocupado, tentaria Almodóvar. Sim, porque minha vida às vezes parece uma tragicomédia novelesca e nonsense, bem brega. Caso Almodóvar não quisesse filmar novamente com Antonio Banderas – que teria que raspar a cabeça , haveria ainda mais uma alternativa: o inigualável Robert Rodrigues.
Rodrigues é um super-diretor de efeitos especiais canhestros, uma coisa de que a minha vida está cheia. Quero dizer, o último porre com efeitos especiais que eu tomei foi no aniversário do Cabeça. Na ocasião, os efeitos capricharam nos roncos canhestros. Tanto que a Patroa me mandou dormir na sala, no que obedeci, é claro, que eu não sou besta. Onde eu estava? Pois sim, em Robert Rodrigues.
Seria uma ótima opção, Robert Rodrigues. Até porque ele transita bem pelos mais diferentes gêneros do cinema. Huummm! Vou reconstruir a frase. Rodrigues é capaz de filmar com a mesma competência o trágico, o cômico, o romântico, o épico e o besteirol mais rasteiro de que já se teve notícia. Ou seja, a história da minha vida. Mas George Clooney teria que raspar a cabeça, é claro!
domingo, 1 de fevereiro de 2009
Respondendo pesquisa adoidado
_Aqui estou eu! – eu respondo, sempre que me chamam.
Sempre respondo. Não gosto de deixar pergunta sem resposta. Então respondo até pesquisa de posto de gasolina. É uma mania que eu tenho.
_Você está satisfeito com os serviços que prestamos? – pergunta o questionário do posto.
_Não, o serviço de vocês é uma indecência – eu respondo.
E explico no questionário que os frentistas sempre tentam colocar mais do que a bomba automática já colocou. Que o calibrador nunca coloca a tampinha de volta no pito do pneu calibrado. Que nunca nenhum ser humano oferece uma lavada de pára-brisa, tenho sempre que pedir. E que, desde que um imbecil não fechou a tampa do radiador corretamente no ano passado, fiquei paranóico e agora tenho que conferir pessoalmente se a tampa está fechada.
As moças, geralmente são moças, perguntam no telefone se eu me incomodaria de responder a uma pesquisa. Eu sempre digo que tudo bem, não tem problema. E respondo. As moças ficam felizes, no início.
_O senhor é o fulano de tal?
_Sim, sou eu mesmo.
_O senhor foi selecionado para receber um novo cartão de crédito...?
_Devem estar loucos. Estou devendo até pro barbeiro.
_Er. Um momento senhor. O senhor é fulano de tal, que mora no endereço tal?
_Sim, sou eu, o fulano de tal. Ainda bem que vocês ligaram pra me dar outro cartão. Aquele outro estourou rapidinho...
_...
_Pessoas legais como vocês caem do céu, sabia. Já cansei de pedir dinheiro em banco e nunca me emprestam. Agora, cartão de crédito é diferente. Dá pra usar um tempão, sem pagar nada. Já está gravando, moça?
_...clic.
Os caras, geralmente são homens, das assinaturas de jornais também fazem perguntas. Eles gostam de ser mais informais.
_Por quê você deixou de assinar o Globo/JB/Folha/Estado/Correio/JBSB?
_Ah, eu não deixei de assinar. Foram vocês que pararam de mandar os jornais. Eu assinei todos os que recebi.
_Desculpe, não entendi.
_Vou explicar, preste atenção. Eu assinei o jornal até vocês cancelarem a assinatura. E isso aconteceu porque cortaram o meu cartão de crédito. O que é um absurdo. Sou um cidadão como outro qualquer. Não é porque deixei de pagar umas contas que tenho menos direito à informação do que...
_...clic.
Por último, tem a pesquisa de opinião sobre o governo. Sempre ligam para mim. É sempre uma voz assexuada, mais profissional e mecânica. Parece uma maldita gravação.
_Prezado senhor, esta é uma pesquisa de avaliação da atual administração ...
_Sim, eu acho esse governo muitcho bom. Esse homem é bom demais.
_Mas eu ainda não perguntei nada, senhor.
_Você tem o celular dele? É que eu tenho um primo que está precisando de uma colocação, sabe? Sabe fazer o serviço de escritório, tem experiência...
_...clic.
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