terça-feira, 12 de março de 2013
Taxi Driver
Taxi Driver
Todo mundo tem uma história de táxi. Já peguei táxis com excelentes técnicos de futebol, economistas de primeira grandeza e fenomenais cientistas políticos. Muitos deles não apenas dominavam estas três áreas ao mesmo tempo, como também eram peritos em engenharia de trânsito, planos de contingência para tsunamis e medidas para conter o uso de artefatos nucleares em barganhas comerciais internacionais.
Eu tenho duas histórias de Táxi Driver. A primeira foi há muitos anos, quando eu e a minha mulher fomos passar a lua-de-mel em Fortaleza. Chegamos num vôo de madrugada, classe econômica. Eu vestia o terno do casamento(sem a gravata) e minha mulher ainda estava com os cabelos arrumados para a cerimônia, que tinha acontecido algumas horas mais cedo. Era um penteado super-requintado, com algumas pérolas cuidadosamente presas em lugares estratégicos, formando um coque. Assim que pegamos a bagagem e saímos para o salão, fomos pegos de surpresa pelo bafo calorento de Fortal, um sopro capas de provocar sudorese instantânea. Na sequência surreal, fomos abordados por um sujeito barbudinho vestido com um implausível casaco Adidas, iguais àqueles que o Fidel Castro faz propaganda. Três listas nas mangas. O sujeito perguntou se a gente precisava de táxi e ingenuamente eu disse que sim. Imaginei que ele estava de casaco porque o carro teria um belo ar condicionado, mas esta não foi a primeira vez que a minha lógica de Sherlock goiano me apunhalou brutalmente na traquéia. Paguei língua em pensamento e me arrependi amargamente assim que vi o carro. Era velho, com uma pintura muito ruim(verde), movido a gás e o banco traseiro estava com um terrível cheiro de mofo. Mas eu já havia combinado a corrida e estávamos loucos para chegar ao hotel.
O motorista arrancou sem cantar os pneus, o calhambeque era bem silencioso. Seguíamos para uma estadia num hotel na avenida beira-mar, presente de casamento da minha irmã mais velha. A capital cearense era um breu acalorado, não havia nem sombra de ar condicionado no carro e por isso eu quis abrir as janelas.
_Não, não é seguro - disse o arremedo de Fidel. E tratou de falar dos mais recentes e tenebrosos crimes acontecidos com turistas nos táxis naquela Fortaleza do final dos anos 90. Fiquei arrepiado. Minha mulher também ficou bastante assustada e durante todo o tempo ficamos de mãos dadas, em silêncio, ouvindo a interminável descrição dos crimes pelo motorista.
_Mas comigo vocês não precisam se preocupar - ele acrescentou, logo depois de nos contar que a polícia havia descoberto que a maioria dos crimes contra os turistas estava sendo cometida por uma quadrilha cruel de taxistas, que usavam peixeiras enormes para matar suas vítimas.
_E você? Anda com uma peixeira? - eu perguntei, lá no banco de trás. E imediatamente me arrependi, mas já era tarde demais, eu já havia feito a pergunta. O taxista diminuiu a velocidade e se inclinou para abrir o porta-luvas. Puxou uma peixeira de um tamanho impossível para o porta-luvas.
_Só uso para defesa pessoal - ele disse. Meu coração batia muito forte quando, em seguida, o táxi fez uma curva abrupta e pude contemplar a avenida beira-mar. Puutz.
Chegamos ao hotel em menos de cinco minutos depois da exibição da peixeira. Passamos boa parte do que restava da noite desmanchando o penteado da minha mulher, que estava cansada dos grampos, pérolas e do laquê. Só conseguimos relaxar depois de um glorioso banho de banheira bem morna.
A minha outra história de taxi é mais curtinha. Aconteceu quando ainda morava no velho apê, em Brasília. Meu carro havia quebrado e eu precisava ir correndo para o trabalho. Corri para a entrada da quadra, onde ainda existe um ponto de táxi. Havia três carros parados.
_Toca para a Esplanada - eu disse, olhando para o relógio e sentando no banco de passageiros, no primeiro carro da fila.
_Senhor, o táxi está reservado - disse um dos três taxistas que jogavam dominó numa mesinha ao lado.
Desci, fui até o segundo táxi e fiz a mesma coisa.
_Senhor, o táxi está reservado - disse outro taxista.
Antes que eu abrisse a porta do último carro, o taxista disse que ele também estava reservado. Estranhamente, esse taxista também usava um casaco Adidas verde. Eu olhava nervoso para o relógio. Minha reunião ultra-mega-super-importante começaria em alguns minutos.
_Peraí, eu disse, essa reserva está em nome de quem?
_Alexandre.
-Roberto.
_Otávio - disse o motorista do último carro da fila.
_Sou eu. Otávio sou eu, foi minha mulher que ligou - menti. Descaradamente. Humilhantemente. Menti.
O taxista de casaco Adidas se levantou e num instante saímos dali. Quando entramos na Esplanada eu resolvi dizer a verdade.
_Olha, eu não sou o Otávio. É que hoje não posso chegar atrasado nessa reunião de jeito nenhum.
_Tudo bem.
_Você já sabia, não é?
_É uma brincadeira antiga. As pessoas quase sempre escolhem o último carro, a não ser que a reserva seja do Alexandre. A maioria escolhe o carro do Otávio. Uns poucos arriscam o Roberto. Mas ninguém escolhe o carro do Alexandre.
Depois disso, nunca mais voltei ao ponto de táxi da quadra.
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