quarta-feira, 27 de março de 2013

Pochete



Ocote Soul Sounds - Agua Santa

Tenho orgulho de muitas coisas. Coisas bestas, todas elas, mas que me deixam de peito cheio de ter vivido e experimentado. Em algum lugar da estante, por exemplo, está o meu diploma de datilografia. É uma coisa à tôa, não é nada, não é nada e não é nada mesmo. Mas tenho orgulho. Estudei na Escola Bennett, que ficava em cima de uma loja de couros, perto da lanchonete do Murakami. Treinava à noite. Fiz uma das melhores provas de velocidade da minha turma. Tudo bem, era uma turma cheia de disléxicos, mesmo assim foi um bom tempo.

Outra coisa que me deixa orgulhoso é trocar courinho de torneira. Troço besta, né? Troco rapidinho, sei o macete para encaixar o courinho novo. Também tenho orgulho de saber que o nome certo do courinho é carrapeta, mas na loja ninguém vai saber disso. O melhor é falar courinho. Quer mais um? Sei assobiar. Milhões de pessoas em todo o mundo sabem assobiar. Mas eu sei assobiar Brasileirinho, o que me deixa todo faceiro. Também sei que assoviar e assobiar é a mesma coisa. Não é pra qualquer um, hein?

É lógico que também tenho vergonha de algumas coisas. Não é nada de pinta, nem verruga, nem perna mais curta que a outra. Tenho tudo isso, é claro, mas não me incomodo. Os problemas são os dedos mínimos dos pés, os dedinhos. Por alguma razão obscura, meus dedos são meio balofos e calosos. As unhas desses dedos são pequeninas, as menores que tenho. Definitivamente, meus dedos estão fora do padrão de beleza atual. É como comparar as pinturas com as mulheres calipígias e aquela Miss Bumbum que tirou fotos na Torre Eiffell. Meus dedos levam a pior.

Também tenho vergonha de ter usado pochete durante uns três ou quatro anos, antes de casar. Muita gente considera isso imperdoável. Alguns amigos me sacaneiam por isso até hoje. Minha mulher mesmo ameaçou terminar comigo se eu continuasse a usar a minha primeira e única pochete. Era linda, a minha pochete. E cabia muita coisa. Minha mulher disse que eu tinha que optar, ou ela, ou a minha pochete. Não hesitei. Desde aquele dia, nunca mais usei a Ritinha. Sim, é o nome da minha pochete. Não tive coragem de jogá-la fora. Pensei em vender ou dar de presente a alguém, mas depois percebi que não poderia dar a Ritinha para outra pessoa. Sentiria ciúmes. Então envolvi a pochete em papel de seda e guardei numa caixa. Ficou lá durante anos e anos.

Por que estou falando nisso? Ontem encontrei a caixa e a pobre Ritinha. Todo mundo sabe que a moda vem e vai, vai e vem. Quem sabe?

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