Era Manoela. Ela não estava mais fantasiada e mesmo examinando-a criteriosamente eu não sentia vontade de desmaiar. Ela continuava linda de camiseta branca e jeans, mas eu não sentia nenhuma vertigem. Ao invés de paixão, talvez tenha sido apenas um problema glicêmico qualquer, eu pensei. Abri a porta e ela me estendeu o enfeite de mesa.
_Oi. Está melhor? Esqueceu seu brinquedo lá em casa - ela disse, estendendo o que eu ainda não sabia que era a Arma Zeta.
_Ué, como isso foi parar lá? - eu disse.
_Estava com você, minha mãe encontrou no bolso da sua fantasia de padre - disse Manoela.
Eu disse bacana, ok, muito obrigado, você me ajudaram muito, enquanto eu verificava mais uma vez, só para ter certeza, de que não havia mesmo nenhum bolso na minha fantasia de Fradim. Manoela já havia dado uma volta completa na sala e iniciara uma revista pela cozinha e quartos.
_Você está sozinho? - ela disse.
_Estou. Meus pais foram passar o Carnaval na praia, eles não gostam mais de bagunça.
_Meu pai também não gosta. Mas a minha mãe é bem foliã, acho que ela gosta mais do que eu.
_Vocês estão saindo juntas?
_Não. Ela tem a turma dela e eu tenho a minha. A turma dela é meio barra pesada, os caras piram - ela disse.
_Como assim?
_São uns coroas muito malucos, eles se acabam - disse Manoela.
Eu tentei imaginar um bando de coroas pulando o carnaval, sem muito sucesso. Eu não tenho a menor idéia de como eles se divertem.
_Estou brincando, ela também fica em casa - ela disse.
_Onde você comprou? - ela apontou para o brinquedo na minha mão.
_Não comprei. Encontrei esse troço quando era menino. Parece uma daquelas armas de filme de ficção científica, não é?
_Você sabe como funciona?
_Não tem gatilho. Acho que nunca teve.
_Não precisa de gatilho - disse Manoela.
Mais uma vez, é preciso encontrar um jeito de introduzir música incidental em cenas da vida real. Naquele instante, eu deveria ter escutado o barulho do meu coração, tambores e cordas agudas, um violino vibrando bem alto, como acontece nas cenas em que subitamente aparece um tubarão, ou que o mergulhador percebe a existência de uma moréia. Manoela estava com o brinquedo na mão direita, mas ele agora parecia estranhamente metálico e sólido. A única diferença é que um pequeno orifício havia surgido na ponta do cano, bop.
_É melhor você se abaixar - disse Manoela.
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