terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

A Arma Zeta III

Roberto havia sumido mas eu ainda não tinha como saber disso. Não éramos amigos e eu o via raramente. Ele costumava passar longos períodos fora do apartamento, em viagens a trabalho. E eu não sabia nada sobre o que ele fazia. Na verdade, nunca havíamos trocado mais do que alguns cumprimentos na portaria, ao entrar e sair do elevador. Assim, eu só fui perceber que ele havia mesmo desaparecido alguns meses depois, quando voltava de um baile de Carnaval e vi outras pessoas no seu apartamento. Mais especificamente, vi Manoela vestida de índia, de tomara-que-caia e tanga de penas, cocar, arco, flechas, colares e pulseiras. Estava animada, dava pulinhos com os braços para cima. A-lá-lá-ô!

Aquele sorriso. Ver Manoela fez soar címbalos, tambores africanos, o grito original de Johnny Weissmuller, chocalhos, trombetas e um clarim em meus ouvidos. Era uma experiência multissensorial, sinestésica, dava água na boca e um aperto no coração. Naquele instante eu percebi que a paixão à primeira vista é um fenômeno que jamais poderá ser compreendido em sua plena magnitude e que nunca poderá ser induzida em laboratório, mesmo que se consigam estabelecer condições ideais de temperatura e pressão. A paixão à primeira vista só pode ser sentida. É uma epifania. É como acordar de madrugada em estado de pura alegria pelo simples fato de estar vivo. É o sentimento que estará sempre além de qualquer palavra, mesmo as engenhosamente organizadas em poemas sussurrados por anjos. É um raio. É pau. É pedra. É o fim do caminho. Manoela brilhava envolta em confete e serpentina e ao vê-la assim tão linda, desmaiei.

Um observador malicioso poderia dizer que eu desmaiei de forma calculada. Mas se isso aconteceu, foi o meu inconsciente que fez todos os cálculos e planejou tudo sozinho. Eu acordei sem saber de nada no sofá da sala do antigo apartamento do Roberto, que depois eu viria a saber que era da família de Manoela. E essa pessoa que agora tentava me afogar com um copo d´água, sem noção do que estava fazendo, eu viria a saber que era o seu Alencar, pai de Manoela.

_Está vivo, não disse? Se esbaldou no carnaval e veio desmaiar na porta de casa - ele disse, triunfante, para a filha. Eu sorri também, ainda grogue, para Manoela.

_Como é o seu nome? Onde você mora? Está sentindo alguma coisa? - disse Manoela.

Eu sorri novamente tentando lembrar qual tinha sido a primeira pergunta e organizando as respostas na ordem correta, mas quando abri a boca eu me confundi todo.

_Sinto muito. Aqui mesmo, no final do corredor - eu disse, apontando para o coração e depois para a porta aberta. Um reflexo forte me chamou a atenção. Ali, bem na frente do meu nariz sobre a mesa da sala do apartamento, brilhava uma coisa muito parecida com o meu velho revólver de brinquedo achado na rua. Minha surpresa foi ainda maior quando, vindo da cozinha, surgiu a mulher que meses antes havia procurado pelo Roberto.

_Não falei, Alencar? Eu te disse, Manoela! É o nosso vizinho que mora no outro lado do corredor.











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