segunda-feira, 1 de outubro de 2012
Mandruvá de camadas
Monophonics - "Thinking Black"
Em casa, minha mãe gostava de usar a expressão "mandruvá de camada". Mandruvá é uma lagarta de mariposa. É grande e marrom, com a cabeça e listas escuras. A mariposa tem a cabeça grande, as asas têm manchas que parecem olhos de coruja. O mandruvá costuma atacar as folhas de coqueiros. Eles se juntam às dezenas, uns sobre os outros, formando grossas camadas de lagartas. Os bichos comem sem parar e fazem uma sujeira danada com seus dejetos. É uma coisa impressionante de se ver, mas o sentido exato da expressão sempre me escapou. Entendo como uma coisa que não deveria estar acontecendo, mas devido à própria natureza da coisa, acaba por inevitavelmente acontecer. O jeito é se conformar, mas sem reserva moral, o fato de você deixar que aconteça continua sendo vergonhoso. É algo como permitir a um porco chafurdar na lama. Ou estimular um alcoólatra a beber. Bom, pelo menos é assim que eu entendo.
Já vi muito mandruvá de camada. No interior, nas pequenas cidades, nas fazendas dos parentes e amigos, era comum dar de cara com um coqueiro coberto de lagartas. Às vezes, à noite, o barulho dos bichos comendo podia ficar alto, bem parecido com um periquito comendo sementes. Mas na cidade, até já havia me esquecido dos mandruvás. Tinha mesmo, até hoje à noite, quando vi uma grande fila de lagartas descendo pela parede da pérgula. Naturalmente chamei as crianças e a minha mulher para testemunharem a cena, porque sei que esse é o tipo de coisa que um casal amigo, lá da Bahia, gosta de dizer que é exagero meu, quando não diz que é mentira mesmo, na lata.
Pois todos daqui de casa viram os mandruvás descendo a parede igual a uma fila de elefantes indianos, uma lagarta com a cabeça no bumbum da lagarta da frente. As lagartas se esticavam pela parede inteira, aparentemente abandonando um dos coqueiros para seguir até o outro.
_Nossa, que horror! - disse a minha mulher.
_Uau, paiê, podemos ficar com elas? - disse a minha filha.
_Ninguém toca nas lagartas, elas podem ser venenosas - disse o meu filho.
_Au - disse o Rafa.
Depois de uma votação simbólica, decidimos pelo extermínio dos mandruvás, apesar do protesto veemente das crianças.
_Elas estão acabando com o coqueiro. O que vocês preferem? Lagartas ou coqueiros?
_Lagartas! Lagartas! Lar-gatas!
_Lar-gatas!
Varri as lagartas da parede e as crianças desistiram de protestar. Contei trinta e oito lagartas. RIP.
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