A vida nunca foi fácil para Max, o pastor alemão que era do meu irmão. Isso mesmo. Era.
Max era um cachorro legal, com pedigree, boa estirpe, mas indômito. O animal não gostava de cercas. Cavava buracos muito profundos. Soltava pelo. Odiava gatos. E de vez em quando subia, literalmente, no telhado. Mas tirante isso, era um excelente cachorro.
O que complicou tudo foram as subidas no telhado. Max subia em qualquer telhado. Sabe a primeira cena de Missão Impossível II, com o Tom Cruise escalando um paredão em ângulo negativo? Então. Aquilo é puro Max. Meu irmão uma vez o resgatou do telhado do vizinho. Por conta disso, Max ficou três meses internado num canil para um treinamento indolor de animais inquietos. Meus sobrinhos ficaram com muita saudade do bicho, mas o meu irmão resolveu estender o treinamento por mais um mês, só para garantir. Depois de cinco meses, Max voltaria para casa, mas aí foi a vez do treinador do cachorro sugerir um periodozinho extra, só para não deixar dúvidas.
_Doutor, já vi cachorro estouvado, mas esse Max ganha de qualquer um.
Após seis meses de internato e treinamento pacífico, à base de alimentação balanceada vegetariana e música new age, Max voltou para casa,aparentemente melhor.
De acordo com os meus sobrinhos, que adoravam Max, o cachorro tinha voltado mais manso que um cordeirinho e mais educado que um inglês recém-matriculado em Oxford.
_Tio, ele está até cumprimentando a gente, dando a pata - eles diziam.
_Claro, ele aprendeu até as quatro operações - eu completava.
_Não, tiô, é verdade.
_Eu acredito, eu acredito.
Mas não era verdade. Max fugiu uma porção de vezes. Arrebentou a cerca elétrica que deveria impedir que ele saísse. Subiu no telhado. Desceu no telhado do vizinho. Cavou um túnel atrás de ossos. Invadiu o quintal do vizinho atrás de um gato.
Max foi reinternado. Por mais quatro meses. Mas não deu certo. Foi o primeiro insucesso do internato. O dono do empreendimento pediu sigilo ao meu irmão.
_Poxa, Doutor. Em dez anos, o Max foi o primeiro e único cachorro que eu não consegui treinar. E ele fugiu um monte de vezes daqui, deu até desânimo.
Na última fuga, ele confessou, Max escapou pelo telhado do canil.
_Nunca tinha visto um cachorro fazer isso, Doutor. Quebrou umas vinte telhas. É um excelente cachorro, Doutor. Daria um excelente reprodutor. Mas não gosta de cerca. E nem de gatos. Conforme combinamos, eu não posso cobrar nada pelo treinamento, mas posso cobrar pelo prejuízo com o telhado.
Meu irmão propôs ao treinador que continuasse com o cachorro. Depois de muita negociação, o sujeito topou. Não sei como foi, meu irmão não se abriu. Mas ao que parece, Max foi trocado por um dobberman e mais uma compensação pelo telhado e futuras cercas. O dobberman é um bicho super obediente. Respeitador de cercas. Convive com gatos. Não gosta de cavar túneis. Não solta pelos. Não sobe em telhados.
_E o Max? - eu perguntei.
_Ele está bem, ele está bem - disse o meu irmão.
_E as crianças?
_Elas vão superar, vão superar.
_E você?
_Sabe, eu gostava um bocado daquele cachorro. Mas tenho que pensar no futuro. E no futuro, nós vamos mudar para uma casa ao lado de um hospital da rede Sarah. Já imaginou o Max invadindo o hospital? Os pacientes de cadeira de rodas fugindo? Pessoas manquitolando em desespero?
_Ele está bem, eles está bem - eu disse.
E deve estar mesmo.
4 comentários:
Gente, imagina o Max aqui em casa? Nós temos o péssimo hábio de ter cachorros e deixarmos eles serem todo o cachorro que eles quiserem ser.
Sun, tudo o que o Max quis ser ele já é: o Houdini dos cachorros.
Venho aqui, releio a história e morro de rir. E olha que é porque eu sou mega acostumada com cachorros, tenho tido eles desde que nasci.
Totó morreu, viva o novo Totó.
Longa vida. :)
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