quinta-feira, 21 de maio de 2009

Um pesadelo meu

Detesto ficar descalço. Isso aumenta a minha sensação de estar desprotegido, minha insegurança crônica. Mas, obviamente, eu acordei dentro daquele quarto branco e acolchoado. Eu estava vestido de branco, sem sapatos, sem meias. E as mangas da minha camisa de lona reforçada eram muito, muito compridas. Para evitar que eu tropeçasse, alguém muito gentil havia enrolado as mangas, cruzadas, em volta dos meus braços. As mangas estavam amarradas. Eu não estava confortável, mas conseguia respirar sem problemas.

Depois de algum tempo olhando para a porta, também acolchoada, eu percebo um orifício, do tamanho de um olho mágico. Com alguma dificuldade, eu me levanto e vou até a porta. É mesmo um olho mágico. Eu olho e vejo um quarto, muito parecido com o meu. De costas para mim, vejo um louco agachado junto à porta acolchoada, um grande e forte nó na camisa de lona.

Subitamente, o louco se afasta da porta. Está no centro do quarto. Ele treme e chora, desesperado. Tento adivinhar o que aconteceu, mas não consigo ver direito. E continuo sem ouvir som algum.

Tudo o que vejo é o louco, agachado de costas para a porta, de frente para mim.

Por um tempo, nada acontece. O louco do outro lado não chora. Subitamente, ele para um instante e aperta os olhos. Tenho a impressão que me vê. E abre a boca num grito longo para o qual estou surdo.

Estou confuso. Chego mesmo a pensar que o louco que vejo sou eu mesmo. Só para me desmentir, a porta do louco se abre. Três homens fantasiados de gorila entram, abruptamente. Eu grito para avisar o louco, esquecido de que ele não me escuta. Algo horrível está prestes a acontecer, posso apostar.

Um dos gorilas acerta um violento pontapé na cabeça do louco. Outro gorila chuta as suas pernas. O terceiro monstro acerta golpes repetidos no tronco.

Os homens-gorilas continuam a espancar o louco. Não ouço nada. É como se assistisse a um filme mudo e ultra-violento, com um olho só. Estou perplexo, mas tudo que penso é que a fantasia de gorila não tem nada de realista. Parece daquelas fantasias de filmes mudos de antigamente. A principal diferença é a cor. Não tem cor.

Mas agora as fantasias começam a ficar manchadas de vermelho.

Estou chorando de horror. Os homens-gorilas não têm piedade. Chutam e socam o maluco sem parar. De repente, se cansam. Ao terminarem, existe vermelho por toda parte. As máscaras dos gorilas estão respingadas.

Não consigo mais olhar. Estou de costas para a minha porta e o olho mágico.

Agora estou tremendo. E olho para a frente.

Subitamente, compreendo. Mas é tarde demais, a porta já se abre atrás de mim.

6 comentários:

Liliane Gusmao disse...

Poxa Careca, que horror de pesadelo!

Tomara que não seja recorrente, viu!

Agora to com medo de dormir e ter um desses também, com gorilas impiedosos espancadores... Sou muito influenciável e medrosa também!

Careca disse...

Liliane, é só um pesadelo. Sempre tenho um pesadelo quando começo a ler um Stephen King novo. E esse foi só uma relida de algumas páginas do velho e bom Pet `Sematery`...

Paulo Bono disse...

Vá se fuder, carecone. Pesadelo dos infernos, chapa.

grande abraço

Careca disse...

Bono, é fogo, o King. Abraços,

Anônimo disse...

Adorei o clima da história, acho que dá um curta legal. Na descrição deu pra ver a cor e a falta dela. O vermelho no final, e a certeza de que o protagonista é o próximo, dá arrepios. Um sonho visual e altamente psicanalítico! Quanto tem de ficção nessa história? Esse cara é você, ou é só um personagem?
Pensando bem, não responde não. Não quero saber.
Abração
Tina

Careca disse...

Tina, um grande abraço.

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