Quase todo sábado/domingo tem festa de aniversário de algum coleguinha das crianças. Em algumas, quando existe uma rede de proteção de pais conhecidos e colegas, é possível deixar as crianças e voltar horas depois. Mas na maioria das vezes é melhor ficar junto da meninada. Foi o que aconteceu neste domingo. Fiquei com os dois numa festinha de uma antiga colega, do tempo em que as crianças frequentavam uma escola muito mais alternativa.
O salão de festas ficava no térreo e era um pouco apertado. Havia uma cama elástica e um brinquedo de luta de "cotonetes". Achei estranho, porque o aniversário era de uma menina de oito anos. Meu filho achou ótimo e não quis brincar de outra coisa. Minha filha completou umas 15 entradas no pula-pula.
Para não ficar muito entediado de ficar só olhando a criançada se divertindo, acabei por sentar à mesa com um grupo de pais desconhecidos. A mãe da aniversariante fez a gentileza de me apresentar a todos, mas não guardei o nome de ninguém. Tenho certeza de que todos esqueceram o meu nome assim que ele deixou de ser pronunciado.
Senti falta do meu caderno de desenhos assim que as apresentações foram feitas. Eu sempre ando com um caderno de desenhos nos aniversários, assim posso ficar sozinho e desenhar numa boa. Mas desta vez não teve jeito, tive que ficar prestando atenção em conversa de festinha.
Tenho o maior preconceito com as conversas de festinha. Elas invariavelmente tratam dois assuntos: crianças e especulação imobiliária. Na hora em que eu cheguei, o tema das crianças já estava minguado. O quente era a coqueluche imoviliária. Em Brasília, todos parecem saber o valor do metro quadrado de onde moram. Em toda festa é possível encontrar pelo menos um especialista em mercado de imóveis. Nessa festa, tinha um exatamente ao meu lado. O cara puxou conversa.
_Eu sou incorporador - ele disse.
_Bacana, eu sou católico, mas sou muito relapso, faz tempo que eu não vou à missa - eu disse.
O sujeito começou a conversar seriamente sobre o mercado imobiliário. As outras pessoas da mesa ficaram alvoraçadas. Algumas pediram dicas de investimento. Outras falaram de graves complicações em reformas, geradas pela falta de mão-de-obra qualificada. Eu fiquei calado. O sujeito me estendeu um cartão, só para o caso de algum dia eu precisar de um incorporador. Coloquei o cartão no bolso.
Um velhinho ao fundo, olhava para a mesa, tristonho. Ele estava com um lado do rosto bastante machucado. Depois eu soube que tinha mais de oitenta anos e havia levando um tombo na rua, na noite anterior à festa.
_Um porteiro o socorreu. Ele deu o maior trabalho, porque não queria ser levado ao hospital. Levou seis pontos no rosto, imagine - contou a filha do velhinho.
Uma mulher da mesa me confidencia que sua filha havia feito uma coisa horrível na noite anterior.
_Ela abriu o presente que daríamos para a aniversariante. Disse que tinha certeza de que a menina detestaria o presente. Eu a repreendi e disse para ela que isso era muito grave. Ela está de castigo, sem balas e doces por um mês. Também disse a ela que não fizesse isso nunca mais. Você acha que fui muito severa?
Eu disse que não. Depois eu vi a menina que abriu o presente da outra. Ela estava comendo balas e doces.
Na hora de ir embora, depois de cantar os parabéns, minha filha quis lutar de "cotonetes". Mas eu não quis esperar.
2 comentários:
torturaaaaaa
Leila, é dureza.
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