Acidentes domésticos acontecem todos os dias. E ontem à noite aconteceu um, lá em casa. Não se preocupe, ninguém se machucou. Como todos da minha Kombi de leitores bem sabem, sou um pai super-paranóico. Oscilo entre a super-proteção e o relaxamento na hora errada, seguido de um sentimento de culpa, gagueira, febre alta e tosse.
Foi assim. Ao chegar em casa, as crianças estavam disputando quem conseguia gritar mais alto para chamar a minha atenção. Elas fazem isso de vez em quando. É natural. É, inclusive, uma evolução. Antigamente, ao chegar em casa eles pulavam sobre os meus sapatos e ficavam sentados, cada um agarrado a uma perna. Eu tinha que sacudir as pernas com força para me livrar de um de cada vez. Xô!
Uma vez molhei os sapatos depois de uma chuva forte. Desde então, eles desistiram de sentar sobre os meus pés. Em compensação, adotaram a tática de ganhar a minha atenção no grito.
_Crianças, por favor! – eu berrei, assim que consegui tirar a gravata.
Os dois me olharam, olhos arregalados.
_Eu vou virar o Monstro do Cabide, mas daqui a pouco. Preciso ir ao banheiro e trocar de roupa. Tá legal?
E esse foi o meu erro. Adulto não pode encerrar diálogo com criança com uma pergunta. Isso, na cabeça dos pequenos dinossauros, significa que você não tem certeza do que está dizendo e que poderá ser convencido com uns berros bem dados durante frases rápidas.
_Paiê, vamos jogar Ben10?
_Não, hoje é dia de vídeo – berrou a menina.
E começou a bagunça de novo. Fui até o banheiro, apesar do protesto das crianças, e consegui mais ou menos dois minutos de sossego com a porta trancada. Até que o casal de Iguanodontes começou a esmurrar a porta do banheiro. Isso me irrita, um pouco.
Sem camisa e de moleton, balancei uma toalha de rosto, branca, e saí do banheiro.
_Paz, ugh, paz. Mim ser índio legal. Vamos conversar sem dar pancada na porta. Ugh.
Mas eles estavam elétricos. Não conseguiam ficar quietos. Aí percebi que a janela da sala estava aberta. Uma corrente de ar estava deixando o ambiente bem gelado e seco. Fechei a janela e fiz a proposta mais marota do mundo.
_Hoje vamos ter sessão de cinema. Todo mundo de pijama, que eu vou fazer pipoca!!
Em noite de “sessão de cinema”, faço pipoca, ponho o vídeo, esticamos edredons no sofá e nos acabamos de comer pipoca vendo o vídeo. É super-legal.
E ia ser mesmo. Já havíamos escolhido um DVD, depois de uma votação apertada em que eu, o voto Minerva, votei duas vezes para estimular o irmão mais velho a deixar a irmã mais nova vencer ao menos daquela vez. Tudo certo. Era só pegar os edredons e ir para o sofá.
Meu filho pegou o edredon dele, no quarto, e levou até o sofá. E a minha filha também fez questão que carregar o edredon dela. Só que no canto do caminho, onde eu achei que não havia perigo, havia uma mesinha de vidro pequena, redonda, com pé em círculo.
Só escutei o barulho. Corri até a sala e lá estava a minha menina, ainda segurando o edredon, olhando para os estilhaços da mesinha. Eu a levantei e carreguei para o sofá, num check-up instantâneo de que nada havia acontecido com ela. Era a mesinha de vidro predileta da minha mulher, um xodó dos tempos do casório.
Mesmo depois que eu garanti que não tinha importância, ela chorou por uns cinco minutos, o soluço forte, de tirar o fôlego. O stress foi tão grande que ela dormiu uns dez minutos depois que eu varri todos os cacos de vidro da mesinha. E meu filho dormiu rápido também.
Às nove da noite, eu estava sozinho, as crianças dormindo bem aquecidas. E eu nem quis assistir a história do elefante que sabia voar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário