segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008

PRF multa 600 por causa da lei seca nas estradas federais

A medida provisória que proíbe a venda de bebidas alcoólicas nos estabelecimentos às margens das rodovias federais é uma cortina de fumaça para as péssimas condições das rodovias federais e para a eterna omissão do governo em fiscalizar.

Nos feriados, milhares de brasileiros morrem nas estradas horrorosas que se constroem ou que se reformam por aí. (É absurdamente ridícula e sem explicação decente a diferença de qualidade entre a estrada privatizada e a estrada sem pedágio). Milhares de pessoas morrem nas estradas do país principalmente porque elas estão em péssimas condições. A bebida é a causa número um de acidentes, está certo, quem sou eu para desmentir pesquisas, as estatísticas e o bom senso. Mas sem ver o questionário que fazem às vítimas de acidentes, eu diria que o péssimo estado das rodovias é a causa número dois, número três e número quatro.

Você pode até ironizar que os bêbados não conseguem desviar dos buracos e acabam fazendo besteira. Pode dizer que os caras ficam tão cheios de mel que acham que podem andar reto nas curvas e flutuar sobre as cabeceiras esburacadas das pontes. É lógico que os bêbados e os calhambeques provocam a maioria dos acidentes. Assim como é lógico que os pilotos são os responsáveis pela maioria dos acidentes aéreos. Se eles biritassem antes dos vôos, com certeza o número de acidentes aumentaria. E no ar não tem buraco nem asfalto deformado. Ora bolas. Essa conversinha não melhora a situação das estradas e nem altera o fato de que sem motorista, sem veículo e sem estrada não existiriam acidentes. Veja bem. A existência ou não de garrafa, em última análise, não altera o conjunto mínimo relacionado a acidente. É ele. E não a garrafa. E nem o buraco. E nem só o carro mil. Mas se a estrada estiver uma porcaria, fica muito difícil desviar dos conjuntos de bêbados, das crateras e das carroças que infestam as estradas.


Aposto que você, como eu e a maioria absoluta dos brasileiros, não entra no carro com a família e encara uma estrada bêbado feito um gambá. E aposto que se você viaja de ônibus, como a maioria dos seres humanos desse país, você acha super normal aproveitar a parada obrigatória para uma refeição e acompanhar a dita cuja de uma cervejota, bem gelada. Eu acho. Sempre achei. Eu e os milhares de sujeitos que constroem os restaurantes de beira de estrada no país. Eu e os milhões de homens e mulheres que entram e consomem refeições, refrigerantes ou uma cervejinha antes de voltar para a estrada. No banco do ônibus, no banco de passageiro, no banco de trás do carro de passeio.


Aí vem o governo federal e, como sempre, quer resolver a manchete negativa na base da medida provisória. Proíbe a venda de bebidas alcoólicas nos estabelecimentos à beira das rodovias federais. É a lei seca no carnaval. A Polícia Rodoviária , louca para mostrar serviço e garantir aumento salarial, multa 600(Os atônitos que não conseguiram tirar o estoque da vista dos “fiscais” a tempo pagarão R$1.500,00 cada um). E é aqui que está o pulo do gato da MP. A polícia vai fiscalizar, gente. É isso que assusta motorista bebum. É ver o carro da polícia na beira da estrada. É pensar na possibilidade de ser parado a qualquer momento. O número de vítimas irá diminuir, com certeza, por causa do alarde de que a polícia irá fiscalizar.

E nesse ponto você pode até fazer uma intervenção à moda governista e dizer que a MP servirá para salvar vidas. Não, só irá parecer que terá servido para isso. A MP será uma cortina de fumaça porque as estradas continuarão ruins, os policiais continuarão sem policiar (a última vez que vi uma blitz nas estradas foi em 1998) e muita gente continuará a morrer nos outros feriados. As vidas terão sido salvas pelo barulho em torno da lei seca. Os motoristas que se embriagam continuarão a encher os cornos, pois vão comprar cachaça na biboca da beira da estrada ou vão levar suas próprias garrafas. A MP terá contribuído para estimular a venda ilegal de birita às margens das rodovias, para estimular a “caixinha”, a “vista grossa” e o “lava-mão”? Com certeza.

Depois que a fumaça passar poucas pessoas terão uma visão clara sobre o que aconteceu. Os milhares de comerciantes que terão deixado de vender as cervejas para os passageiros de ônibus sentirão a diferença no fluxo de caixa. Mas nem todo mundo é comerciante. E todos os conceitos de cidadania e de limites da governança estarão mais nebulosos do antes. É assim que o Estado burocrático e mandão vai se intrometendo cada vez mais na vida dos cidadãos. Com medidas que parecem boas, mas que são inócuas ou exigem uma fiscalização intensa ou uma grande conscientização preliminar para dar certo. É por isso que se diz por aí que de boas intenções o inferno está cheio.

P.S.: Fui almoçar num shopping que fica a 200 metros de uma rodovia federal que corta essa cidade. Um cartaz avisava a todos que o estabelecimento estava sujeito a multa caso vendesse ou ofertasse bebidas alcoólicas. Hilário.

Nenhum comentário:

Frase do dia