Como é habitual, estou em regime de contenção de despesas. É uma dieta restrita, que consiste em gastar somente no que está previsto na coluna de gastos da PLANILHA, e assim mesmo com cortes. A PLANILHA foi elaborada por mim no mês passado, depois que eu ouvi dizer que a melhor maneira de não gastar é colocar no papel, de maneira bem objetiva e exaustiva, sua renda, as despesas fixas, as eventuais e as coisas que você deseja. Parece bem tolo, mas é um exercício bem interessante listar tudo, tudo o que você consome todos os dias de um mês, sem esquecer nada, inclusive o cafezinho free da máquina de café e os copos de água. É preciso anotar, anotar, anotar. E com tudo anotado, inclusive os produtos que desejei, percebi quão poucas são as minhas reais necessidades e a grande tolice que são os meus desejos de consumo. Trivial. As melhores coisas que você pode fazer muitas vezes são também as mais óbvias. Com a PLANILHA feita, percebi que posso passar muito bem sem ceder aos impulsos e à minha queda por gastos desnecessários.
Mas como nessa cidade não é de bom tom dizer que você está tentando economizar, eu digo que estou postergando gastos.
_Bom dia, vizinho - diz o meu vizinho, que é um cara simpático.
_Bom dia, vizinho - eu respondo.
_E aí, comprou aquela TV LCD? - ele pergunta.
_Não, ainda não, talvez no ano que vem - eu digo e realmente não consigo me lembrar de algum dia ter comentado alguma coisa sobre comprar TV com o vizinho.
_Está cheio de oferta. Se mudar de idéia, fale comigo - ele diz.
E só então me ocorre que o vizinho tem uma loja. E talvez seja de TVs.
_Pode deixar. Falo sim. No ano que vem.
E depois de deixar as crianças na escola, encontro um outro conhecido, com quem trabalhei há muito, muito tempo.
_E aí, Careca! Soube que está querendo mudar. Já fez negócio?
_Ainda não, acho que vou deixar para o ano que vem - eu digo, meio constrangido.
E eu realmente não me lembro de ter comentado com esse conhecido que tenho vontade de mudar. Aliás, eu não me lembro de ter comentado patavina com esse conhecido. Para falar a verdade, tinha uns dois anos que eu não via esse sujeito. O que está acontecendo?, eu pensei comigo. Estou sonambulando pela cidade com meus planos escancarados? Minha PLANILHA vazou na internet? Mas aí me recordo que esse conhecido havia mudado de ramo e virado corretor de imóveis.
E então chego no edifício meio burrinho onde eu trabalho e encontro o C3PO no elevador. Raios! Desde que passei a evitar a impressora, fazia um tempão que eu não encontrava o C3PO. Ele é o tipo de sujeito que faz muito bem não se encontrar. Mas sorte grande não pode durar muito, eu sei.
_Fala, Careca! Já comprou aquele carro que você queria?
_Não. Vou deixar para o ano que vem, esperar o imposto abaixar de novo.
_Rá!Rá! Não vai abaixar de novo.
_Como pode ter certeza?
_Um passarinho me contou.
_Foi o mesmo que fez esse ... trabalho no seu terno?
_Onde?
_Ombro esquerdo.
_Aaah! Meu terno novo - choramingou o C3PO.
E nessa hora eu até pensei em comprar milho e alpiste, em doar recursos para a sociedade protetora dos pombos, em fundar a ONG "Protejam as Fezes Que Caem do Céu". Decidi até registrar a possibilidade dessas doações na PLANILHA. Quem sabe no ano que vem?
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