domingo, 23 de junho de 2013

No domingo, fui ao enterro 1


Nunca ouvi falar de estudo sociológico em cemitério, mas se eu fosse sociólogo eu começaria uma tese sobre a realidade brasileira examinando com lupa a maneira como nos despedimos dos nossos mortos. Hoje acompanhei minha mãe ao enterro da tia de uns primos meus, três irmãos que vivem no interior do Tocantins. A mulher morreu após complicações decorrentes de uma hemodiálise feita dois dias antes do falecimento. As pessoas têm poucas informações, ninguém sabe direito o que aconteceu, mas todos se queixam de que o sofrimento foi muito grande. Mas essa notícia só tive depois, eu me atropelo. Meus primos ainda não haviam chegado ao velório e eu fiquei perambulando pelo cemitério. Não é uma coisa que me agrada muito, mas eram umas três e meia da tarde e outros três enterros estavam acontecendo. Como não havia lugar para estacionar, deixei minha mãe onde se realizam os velórios e tratei de encontrar um lugar seguro para deixar o carro. A faixa estreita do cemitério de Sobradinho estava ainda mais estreita porque havia carros estacionados dos dois lados. Estacionei longe e fui perambulando pelos enterros, para encontrar minha mãe. No enterro mais próximo de onde estacionei, no meio da terra vermelha, a cova aberta com muita poeira o caixão estava sendo baixado, com a ajuda de cordas. As pessoas estavam em prantos e muito tristes. Havia crianças com chinelos, moças com blusas tomara-que-caia e calças apertadas - uma delas com uma garrafa de coca-cola numa sacola plástica, um pastor com sapatos sujos de terra e roupa preta bem desgastada. Grandes coroas de flores, parecidas com cocares indígenas com uma faixa de rainha de escola de samba, estavam próximas ao caixão. Não havia ninguém com a roupa de domingo, por assim dizer. Usar a roupa de domingo em meio àquela poeira, o gramado ressecado e sem vida, os túmulos descuidados e sem manutenção do cemitério seria um risco desnecessário. Uma ventania súbita reforçou o meu palpite, me cobrindo de pó vermelho. Descido o caixão, dois sujeitos pobre e desleixadamente uniformizados puxaram as cordas. Rapidamente as pessoas se dispersaram, pois a ventania aumentava. No velório seguinte, ainda sem ter encontrado a minha mãe, uma grande multidão se aglomerava numa salinha minúscula, onde só cabia o caixão e algumas pessoas em pé. As poucas cadeiras disponíveis, enfileiradas em duas paredes, estavam tomadas por velhinhas com uma aparência muito cansada. No terceiro e último velório, também cheio de gente, encontrei minha mãe que me apresentou a parentes distantes. Meus primos ainda não haviam chegado. A pequena sala de velório estava repleta de pessoas. Como nos outros dois enterros, não havia ninguém com a roupa da domingo.

Descobri um banco na sombra e (continua)

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