domingo, 2 de dezembro de 2012
Vencedora invicta
Arctic Monkeys - Reckless Serenade
Viajamos rapidamente neste final de semana. Fomos até a pequena cidade onde nasci. Continua pequena. Talvez um pouco menor a cada vez que a visito com as minhas lembranças ainda mais desbotadas. O motivo da viagem foi o aniversário de um primo em segundo grau. Talvez em algum momento tenha me passado pela cabeça a idéia de fazer uma peregrinação às minhas origens, para mostrar aos meus filhos os locais das minhas lembranças de infância mais remotas. Mas choveu o tempo inteiro e a viagem foi um bocado cansativa, então mostrei poucas coisas. Mostrei a praça do coreto. A praça do fórum, onde ainda existe um banco doado pelo meu pai. A praça do mercado. A antiga praça das fontes. O pequeno estádio de futebol e o cemitério ao lado, duas igrejas e as casas dos meus tios, tias e avós. Talvez por causa da chuva fina, foi uma turnê apressada pelos locais, com marcha reduzida mas sem parar o carro nem uma só vez. As crianças simplesmente não pareceram interessadas.
_Aquela era a casa da sua bisavó, que depois ficou com a tia de Uberlândia. A casinha ao lado era do meu tio doido. Ele morou aí por mais de vinte anos - eu disse.
As crianças não fizeram nenhum comentário. Pelo retrovisor, eu podia ver que estavam um pouco despontadas. As casas eram bem humildes e não estavam em boas condições. Com as praças também não foi muito diferente. Elas não viram a menor graça na praça do mercado, na praça das fontes e nem na praça do coreto. Nesta última eu também fiquei desapontado. A praça do coreto era uma das favoritas da minha infância. Parecia gigantesca e cercada de árvores ainda mais gigantescas. Agora as árvores gigantes haviam sumido e o pequeno coreto parecia incapaz de abrigar as trinta ou mais crianças do meu tempo de menino.
_Era a melhor praça do mundo para se brincar de pique-esconde e também de polícia e ladrão - eu disse.
Mas as crianças não viam da mesma maneira, dava para notar. Até que ao passarmos por uma rua estreita, de muros altos, vi uma grande mangueira, a maior de todas que eu jamais me lembrara de ter visto na minha cidade. Parei o carro e todos ficamos de nariz grudado nas janelas observando a árvore.
_Eu já subi nessa mangueira - eu disse. Os dois me olharam com admiração genuína.
_E aquele ali é o grande cedro - eu disse, apontando para uma árvore ao lado da mangueira. Tinha um tronco muito alto e reto. Seria preciso pelo menos quatro pessoas de mãos dadas para abraçar o tronco na altura em que o víamos, acima do muro.
_Você já subiu nele? - eles disseram.
_Não, ninguém nunca conseguiu subir naquela árvore - eu disse.
E todos nós ficamos olhando para o grande cedro com o silêncio respeitoso com que, até mesmo sem querer, reverenciamos os vencedores invictos.
Talvez essa visita rápida aos locais da minha infância fique mesmo no resíduo brumoso das lembranças que não cultivamos. Mas tenho certeza de que as crianças se lembrarão da enorme árvore da minha infância, a única que foi gigantesca e assim permaneceu, invencível.
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