quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Na frente dos bois, o carro



Hoje, na saída da escola, meu filho abraçou um dos amigos e chorou. Fez um discurso de despedida. Disse que ia sentir saudades do amigo. Que demoraria para encontrá-lo novamente. Nas últimas duas semanas, ele vem se despedindo dos amigos da escola alternativa todos os dias. Abraça. Chora. Faz discurso. Aí dá aquele tapinha de “toca aqui” e sai, esfregando os olhos. Às vezes, quando o cara é amigo do peito, bem chegado, ele também dá tapinhas nas costas e sai atordoado, como se tivesse perdido aquele round. Outras vezes, ele fala “valeu, amigo”, e sai, de cabeça erguida, cesta de três pontos.

Minha filha assiste a tudo, emocionada. Ela é emotiva, como eu. Choramos juntos vendo Wall-E, embora eu tenha disfarçado direitinho. Na escola, ela disfarça a emoção. Eu também. Ninguém merece ver um pai velho e piegas. Por isso, em geral, eu fico apressando os dois.

_E aí? É pra hoje? Vambora, gente! Cadê o sapato? Pô, sumiu o sapato! Não? Então por quê está descalço? Procura o sapato. E a camisa? Cadê a camisa? Perdeu a camisa? Ah. Tá na mochila. E cadê a mochila? Pô, filho, nunca está de sapato e sempre perde a mochila. Aí fica difícil. Vamos lá, vamos procurar – e saio para rodar o pátio, olhar o galpão.

Felizmente, a escola alternativa é pequena.
Mas hoje eu fiz diferente.

_Filho, seu amigo vai lá pra casa, esqueceu? Vocês vão passar a tarde inteira brincando. Não precisa despedir agora.

_Ah, é mesmo – ele diz e imediatamente abre um sorriso. O amigo também fica contente, também tinha esquecido do combinado. Os dois enxugam as lágrimas com as costas das mãos.

_ Vamos lá, me ajuda a encontrar a sandália e a mochila. E cadê a sua camisa? Não, não precisa colocar. Tá um calor danado.

Minha filha acha graça.

_Pai, esses dois são malucos. Choram à toa – e ela também enxuga uma lágrima no canto do olho.

Sexta-feira será o último dia de aula do semestre na escola alternativa. Tem festa programada. Vai ser um chitãozinho danado. E chororó também.

Depois fico pensando. É estranho como a gente tem mania de antecipar as emoções. De sofrer por antecipação. Até saudade se antecipa, às vezes. E de repente, a coisa passa e a gente nem sente.

2 comentários:

Sunflower disse...

Não, careca.

Estranho é a gente sentir e esconder.
Estranho é a gente sentir e TER que esconder, porque um dia, um filho da puta sem sentimentos vai se aproveitar disso.

Enquanto ele poder sentir e poder falar, deixa.

beijas

P.S: eu também morri de chorar vendo o Wall-e.

Careca disse...

Sunflower, eu deixo. Aliás, mando muito pouco aqui em casa. Mas sou bom em obedecer.:)

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