terça-feira, 30 de dezembro de 2008
A todos os que aqui aportaram
Eu queria dizer uma coisa importante antes de fechar o ano.
Muito obrigado.
Tem sido muito fácil manter o blog sempre atualizado por causa de vocês, leitores da minha fiel Kombi de leitores. E pensar que comecei tudo isto com um Uno Mille.
Todos vocês deveriam realmente arrumar alguma coisa mais importante para fazer, mas já que estão por aqui poderiam ajudar com a louça? É sério. Recebemos um convidado grego aqui em casa e não sobrou muita coisa...
Não. É brincadeira. O piso da sala continua debaixo do tapete e estamos sem condições de recepcionar seres humanos, mesmo os de alto grau de parentesco. Além disso, estou economizando. É sério. Em 2009 já estabeleci uma meta de economia. Tudo pela metade.
A Patroa disse que eu já deixo tudo pela metade e que ao invés de prometer e não cumprir, eu deveria era me lembrar das minhas promessas. Prometo tentar me lembrar disso. Por enquanto, deixo o texto por aqui, conforme o prometido.
As sete curvas
Tive que viajar rapidamente com os meus pais e irmãs. Fiz o antigo papel de motorista do carro da família. E foi estranho perceber que, adultos, nós cinco ainda cabíamos num único carro. É bem verdade que meu irmão não estava. E ele ocupa um bom de espaço.
Fiquei reparando nas mudanças da estrada. A pista está duplicada no trajeto Brasília-Goiânia. As famosas Sete Curvas não existem mais. Agora são apenas seis. E são curvas suaves.
Era um dos pontos mais perigosos da viagem, especialmente se você estivesse dirigindo à noite. Sete curvas fechadas corcoveando um morro e desembocando numa cabeceira de ponte. Dezenas de pessoas morriam ali, todos os anos, em acidentes provocados pela imprudência de uns e pela engenharia perversa de outros. Agora os acidentes no local são raros.
A paisagem mudou radicalmente. Quase não existem mais trechos sem plantações. O campo perdeu o ar de abandono. As coisas parecem mais bem cuidadas. O interior do país parece melhor. Mas as pessoas me pareceram mais tristes, menos espontâneas.
Outro dia, conversando num boteco, um amigo comentou que nós queremos ser um país desenvolvido, com empregada em casa. Nós queremos eliminar desigualdades, desde que elas não interfiram com a nossa comodidade. Queremos ter juízo e manter a inocência.
Eu disse a ele que talvez fosse isso mesmo. Não tenho muita certeza de nada, hoje em dia. Na verdade, cuido da minha vida e dos meus da melhor maneira que posso. Sobre o resto, não tenho muito o que dizer.
Um outro amigo disse, em seguida, que não se importava de perder uma curva, se isso poupasse vidas.
Nesse instante, eu decidi que era hora de voltar para casa.
Fiquei reparando nas mudanças da estrada. A pista está duplicada no trajeto Brasília-Goiânia. As famosas Sete Curvas não existem mais. Agora são apenas seis. E são curvas suaves.
Era um dos pontos mais perigosos da viagem, especialmente se você estivesse dirigindo à noite. Sete curvas fechadas corcoveando um morro e desembocando numa cabeceira de ponte. Dezenas de pessoas morriam ali, todos os anos, em acidentes provocados pela imprudência de uns e pela engenharia perversa de outros. Agora os acidentes no local são raros.
A paisagem mudou radicalmente. Quase não existem mais trechos sem plantações. O campo perdeu o ar de abandono. As coisas parecem mais bem cuidadas. O interior do país parece melhor. Mas as pessoas me pareceram mais tristes, menos espontâneas.
Outro dia, conversando num boteco, um amigo comentou que nós queremos ser um país desenvolvido, com empregada em casa. Nós queremos eliminar desigualdades, desde que elas não interfiram com a nossa comodidade. Queremos ter juízo e manter a inocência.
Eu disse a ele que talvez fosse isso mesmo. Não tenho muita certeza de nada, hoje em dia. Na verdade, cuido da minha vida e dos meus da melhor maneira que posso. Sobre o resto, não tenho muito o que dizer.
Um outro amigo disse, em seguida, que não se importava de perder uma curva, se isso poupasse vidas.
Nesse instante, eu decidi que era hora de voltar para casa.
sábado, 27 de dezembro de 2008
Lego na manhã de sábado
A manhã de sábado foi dedicada à montagem de uma nave espacial de Guerra nas Estrelas, que custou a nós três, eu e as crianças, quase três horas de dedicação exclusiva. Foram horas bem despendidas. Eu e meus filhos desenvolvemos uma metodologia de montagem de Lego baseada em boas práticas internacionalmente reconhecidas: nós seguimos o manual à risca.
A metodologia demorou a ser assimilada, devo deixar claro. Sou meio avesso a ler manuais. E os meus filhos ainda não sabem ler. Por isso, os primeiros Legos foram montados com base no instinto. Devido ao número reduzidíssimo de peças, isso não produzia efeitos muito desastrosos. Exceto por uma vez, quando uma motoca ficou muito parecida com uma miniatura de máquina de lavar roupa. Para resolver esse problema foi que abri o manual e percebi que não era preciso saber ler para entender a coisa. O manual da Lego é super bem-feito, só com ilustrações.
À medida que as caixas foram aumentando, os manuais se tornaram indispensáveis. Hoje em dia, nós não bancamos mais os espertinhos. Nós sentamos em volta da mesa, separamos as peças por cores e começamos a montar. As crianças disputam o manual por alguns minutos, mas nada que uma boa divisão de tarefas não resolva.
_Filho, você vai olhar o manual e dizer quais são as peças da vez. Filha, você encontra as peças na mesa. Eu monto. Combinado? – eu digo, todo esperto.
_Não, eu é que vou montar. O Lego é meu – reclama o meu filho.
_Ok, eu leio o manual, a Princesa pega as peças e você monta – eu digo, pacificador.
_Não, eu é que vou montar – reclama a minha filha.
_Meninas não sabem montar Lego – emenda o menino.
_Peraí, peraí. Meninas sabem fazer tudo o que os meninos sabem fazer – eu digo, tentando eliminar o preconceito de gênero na raiz.
_Não, pai, meninas não sabem montar Lego.
_Claro que sabem, filho.
_É, sabem sim – diz a minha filha.
_Não sabem. Meninas são “ruins” de Lego. É ruim, hem?
_Meninos é que são.
_Meninas.
_Me-ni-nos – diz a Princesa, geniosa.
_Muito bem, para acabar a briga e começar logo, vamos dividir as tarefas. Eu leio o manual, eu pego as peças e eu monto.
_Mas pai, assim você faz tudo!! – eles protestam.
_Tá bom, tá bom. Você, filho, lê o manual. E você, filha, pega as peças. Combinado?
_E quem vai montar? – pergunta o meu filho, ressabiado.
_Cada hora é um. A gente vai revezar, cada um faz uma página.
_Primeiro, eu! – grita a menina.
_Não, eu começo! – berra o filhote.
_Peraí, peraí...
A nave ficou super bonita. Embora eu não me lembre de ver nada parecido em nenhum filme da série. Por outro lado, todo mundo sabe que George Lucas é um gênio, e se a nave ainda não apareceu, um dia ainda irá aparecer em um novo filme da série.
Mas agora estou pensando. Deveriam ampliar os manuais dos Legos. Eles deveriam vir com instruções para os pais.
quinta-feira, 25 de dezembro de 2008
Quadrado, bola, triângulo
Meu filho adora jogar video-game. Como somos uma família super-ajustada e reguladora, nós limitamos o número de horas que ele pode jogar. São duas horas por dia, no máximo. De preferência, uma hora por período. Como ele está de férias e a Patroa também, fica fácil controlar. De vez em quando eu chego em casa depois do trabalho e lá está ele à minha espera.
_Pai, economizei as minhas duas horas para jogar Play com você. Vamos? – e me olha com a cara de pidão mais bem elaborada que eu já vi. Sabe aquela cena de Shreck dois, quando o Gato de Botas faz aquela cara de “por favor” ? Pois é melhor. Mal comparando, ele faz a mesma cara de bichos de estimação nas gaiolas de lojas de animais. É um pedido de adoção, aquela cara. Então eu também não resisto. Jogo o paletó em cima da cadeira e corro para o quarto, onde jogamos duas horas de video-game marcadas no relógio da Patroa. Mesmo se quiséssemos não poderíamos jogar mais. A Patroa é implacável.
Foi com o meu filho que aprendi a importância da seqüência de comandos no controle do video-game. Em diversos jogos, a seqüência tem um significado especial, que torna o herói ou heroína do game capaz de realizar golpes e movimentos espetaculares. Depois que aprendi essa verdade essencial dos controles de games, minha vida sofreu um salto qualitativo. Eu sei que posso passar para fases mais adiantadas e espetaculares. Eu sinto que posso saltar, atirar, rolar e fazer mais em menos tempo, gastando menos vida. Mas será que é possível economizar vida? E o que é que vou fazer com essa vida extra no fim do jogo?
Deixa pra lá. Filosofia e videogame não combinam direito. Quando se juntam, o estômago embrulha. Talvez seja uma questão de configuração. E nos games, a configuração faz toda a diferença.
No controle do videogame do meu filho, existem os seguintes símbolos: quadrado, bola, xis e triângulo. Em geral, o Xis é o controle dos golpes ou dos saltos. O quadrado é um movimento especial, abaixar ou curvar. Bola, em geral, significa acelerar para frente. Mas nada disso é regra. Às vezes a configuração é totalmente diferente, pois você sempre pode personalizar os comandos de acordo com a sua própria vontade. É por isso que as seqüências são tão importantes. A ordem dos fatores, nesse caso, faz toda a diferença.
Num dos jogos favoritos do meu filho, um dos mais extraordinários é o comando “bola-quadrado”. Parece simples, mas apertar o polegar direito no botão da esquerda e depois no botão da direita, rapidamente, nem sempre é uma tarefa fácil. Esse comando produz efeitos espetaculares nos games. Os heróis aplicam golpes secretos, descobrem segredos, desfrutam de vantagens incomensuráveis quando você, com esse breve comando, altera o destino do seu personagem.
Desde que aprendi essas coisas básicas, eu me sinto capaz de realizar grandes feitos fora dos games. Só preciso me lembrar da seqüência correta. Ultimamente, tenho insistido muito com o quadrado, triângulo, quadrado e quadrado. Graças a esse comando, sou capaz de correr de um lado para outro, sem parecer ofegante e sem chegar atrasado. Tem me mantido vivo, o que já é grande coisa.
_Pai, economizei as minhas duas horas para jogar Play com você. Vamos? – e me olha com a cara de pidão mais bem elaborada que eu já vi. Sabe aquela cena de Shreck dois, quando o Gato de Botas faz aquela cara de “por favor” ? Pois é melhor. Mal comparando, ele faz a mesma cara de bichos de estimação nas gaiolas de lojas de animais. É um pedido de adoção, aquela cara. Então eu também não resisto. Jogo o paletó em cima da cadeira e corro para o quarto, onde jogamos duas horas de video-game marcadas no relógio da Patroa. Mesmo se quiséssemos não poderíamos jogar mais. A Patroa é implacável.
Foi com o meu filho que aprendi a importância da seqüência de comandos no controle do video-game. Em diversos jogos, a seqüência tem um significado especial, que torna o herói ou heroína do game capaz de realizar golpes e movimentos espetaculares. Depois que aprendi essa verdade essencial dos controles de games, minha vida sofreu um salto qualitativo. Eu sei que posso passar para fases mais adiantadas e espetaculares. Eu sinto que posso saltar, atirar, rolar e fazer mais em menos tempo, gastando menos vida. Mas será que é possível economizar vida? E o que é que vou fazer com essa vida extra no fim do jogo?
Deixa pra lá. Filosofia e videogame não combinam direito. Quando se juntam, o estômago embrulha. Talvez seja uma questão de configuração. E nos games, a configuração faz toda a diferença.
No controle do videogame do meu filho, existem os seguintes símbolos: quadrado, bola, xis e triângulo. Em geral, o Xis é o controle dos golpes ou dos saltos. O quadrado é um movimento especial, abaixar ou curvar. Bola, em geral, significa acelerar para frente. Mas nada disso é regra. Às vezes a configuração é totalmente diferente, pois você sempre pode personalizar os comandos de acordo com a sua própria vontade. É por isso que as seqüências são tão importantes. A ordem dos fatores, nesse caso, faz toda a diferença.
Num dos jogos favoritos do meu filho, um dos mais extraordinários é o comando “bola-quadrado”. Parece simples, mas apertar o polegar direito no botão da esquerda e depois no botão da direita, rapidamente, nem sempre é uma tarefa fácil. Esse comando produz efeitos espetaculares nos games. Os heróis aplicam golpes secretos, descobrem segredos, desfrutam de vantagens incomensuráveis quando você, com esse breve comando, altera o destino do seu personagem.
Desde que aprendi essas coisas básicas, eu me sinto capaz de realizar grandes feitos fora dos games. Só preciso me lembrar da seqüência correta. Ultimamente, tenho insistido muito com o quadrado, triângulo, quadrado e quadrado. Graças a esse comando, sou capaz de correr de um lado para outro, sem parecer ofegante e sem chegar atrasado. Tem me mantido vivo, o que já é grande coisa.
quarta-feira, 24 de dezembro de 2008
Feliz Natal
terça-feira, 23 de dezembro de 2008
Por quê blogo eu?
Oh, sim, já faz mais de um ano que comecei o blog. E não sei se você já reparou, mas esse blog ainda não mudou. Tenho uma preguiça de reformar coisas, você nem imagina. Não se trata de um diário, embora também seja um diário. Com uma diferença bem importante. O blog não é fechado, não é secreto. E diários, a maioria deles, costumam guardar segredos, tratam de assuntos secretos.
Não guardo segredos aqui. Mas procuro não falar deles. E talvez isso interfira um pouco na escolha de assunto, na hora de escrever sobre qualquer coisa. No diário de papel, em que já quase não escrevo mais e que mantenho off-line, as coisas que escrevo são as que mais procuro esconder. E não é bem um caderno de segredos. É mais um bloco de rascunhos inconfessáveis. É quase ininteligível. Listas de coisas. Tarefas. Um verso ou outro que me assalta. Observações sobre pessoas. Rabiscos, desenhos, grafismos. É um exercício de não ter medo. De escrever sobre o que me aflige, para deixar de ser aflito.
Não guardo livros escritos em gavetas. Simplesmente não me lembro mais deles. Um dia, quem sabe, vou revirar um armário e encontrarei ali um manuscrito feito por mim mesmo, de um escritor que inventei. Embora seja pouco provável. O papel é o meu amigo cego, surdo e mudo. E analfabeto. O diário é feito para que nós nos inventemos. E o diário, por enquanto, é só para os meus olhos.
O blog é uma espécie de reinvenção pública da escritura. Inventa-se uma persona que bloga. E com isso, abre-se um espaço de considerações abertas, observadas por alguns curiosos, teimosos. O blog é como se fosse um diário de salão, escrito sob os olhos dos outros e para os outros. Eu diria mais. O blog é um exercício público de escrevinhação, de escrita.
Mas não tenho certeza. Não sei muito de blogs. Isso tudo é palpite. Vivo num tempo de poucas certezas e muitas dúvidas. E é mais cômodo não ter certeza. E também viver cercado de clichês e buscas rápidas por todos os lados.
Como qualquer pessoa, de qualquer geração, acredito que a minha foi a que passou pela mais sensacional série de transformações da história da humanidade. O que é besteira. Mas é legal pensar nisso assim mesmo, como um privilégio.
Sei que há uma chama. E às vezes ela está em mim. E às vezes, no outro, na outra. Em coisas que leio. Numa foto. No vento. No almoço gostoso que almocei hoje. Há uma chama. E às vezes não é nem uma chama, é só uma fagulha. Mas é essa centelha que move o melhor que há no mundo. Aí descubro a resposta. É pela fagulha que eu escrevo. Pela sensação de estar vivo. E é mesmo um privilégio.
Não guardo segredos aqui. Mas procuro não falar deles. E talvez isso interfira um pouco na escolha de assunto, na hora de escrever sobre qualquer coisa. No diário de papel, em que já quase não escrevo mais e que mantenho off-line, as coisas que escrevo são as que mais procuro esconder. E não é bem um caderno de segredos. É mais um bloco de rascunhos inconfessáveis. É quase ininteligível. Listas de coisas. Tarefas. Um verso ou outro que me assalta. Observações sobre pessoas. Rabiscos, desenhos, grafismos. É um exercício de não ter medo. De escrever sobre o que me aflige, para deixar de ser aflito.
Não guardo livros escritos em gavetas. Simplesmente não me lembro mais deles. Um dia, quem sabe, vou revirar um armário e encontrarei ali um manuscrito feito por mim mesmo, de um escritor que inventei. Embora seja pouco provável. O papel é o meu amigo cego, surdo e mudo. E analfabeto. O diário é feito para que nós nos inventemos. E o diário, por enquanto, é só para os meus olhos.
O blog é uma espécie de reinvenção pública da escritura. Inventa-se uma persona que bloga. E com isso, abre-se um espaço de considerações abertas, observadas por alguns curiosos, teimosos. O blog é como se fosse um diário de salão, escrito sob os olhos dos outros e para os outros. Eu diria mais. O blog é um exercício público de escrevinhação, de escrita.
Mas não tenho certeza. Não sei muito de blogs. Isso tudo é palpite. Vivo num tempo de poucas certezas e muitas dúvidas. E é mais cômodo não ter certeza. E também viver cercado de clichês e buscas rápidas por todos os lados.
Como qualquer pessoa, de qualquer geração, acredito que a minha foi a que passou pela mais sensacional série de transformações da história da humanidade. O que é besteira. Mas é legal pensar nisso assim mesmo, como um privilégio.
Sei que há uma chama. E às vezes ela está em mim. E às vezes, no outro, na outra. Em coisas que leio. Numa foto. No vento. No almoço gostoso que almocei hoje. Há uma chama. E às vezes não é nem uma chama, é só uma fagulha. Mas é essa centelha que move o melhor que há no mundo. Aí descubro a resposta. É pela fagulha que eu escrevo. Pela sensação de estar vivo. E é mesmo um privilégio.
segunda-feira, 22 de dezembro de 2008
O pé que fia
Minha mãe costuma usar a expressão “fiar o pé”. Geralmente é só para os meninos homens, os netos. É uma expressão corriqueira, que ouço desde que eu mesmo era um menino e vivia correndo de um lado para outro da casa. Em geral, à cata de uma desforra qualquer contra um irmão ou primo mais velho.
Fiar o pé é sinônimo de inquietude.Mas não tem muito a ver com correria. Fiar é uma coisa que só é possível fazer deitado, ou sentado. É que meninos são especialmente inquietos na hora de dormir. Quando se deitam sozinhos. Ou em grupos, com primos e primas por perto. Não, isso aí é sinônimo de bagunça e confusão na certa. Ao invés de gritar “boa noite Jim Bob, boa noite Mary Ellen, boa noite, John Boy”, e fechar os olhos debaixo das cobertas que nem os Waltons, aquele monte de meninos fica lutando com e contra os travesseiros. E os mais quietos, no mínimo, fiam o pé. Ou seja, ficam esfregando os pés debaixo do cobertor, como se estivessem pisando no pedal da roda de fiar.
Eu sou um especialista em fiação de pé. Fio muito.
Sinto um frio absurdo nos meus pés. Eles são magros, magros e finos. E, para completar o quadro friorento da minha base de sustentação, minhas unhas encravam. Desconfio que seja por causa do meu hábito de fiar. Os pés. E ultimamente eu tenho fiado muito esses meus pés, como se ainda fosse menino. A verdade é que anda fazendo um frio gostoso, desses de esticar a permanência na cama. Mas ainda não estou de recesso e não há jeito de prolongar a estadia. Mesmo assim, fio. Os pés.
Meus filhos também estão muito fiados, nesses dias de frio. O mais velho às vezes vem procurar a gente, no meio da noite. Ele é silencioso. Quando eu percebo, ele já está cavando um espaço no meio da cama, onde é mais quentinho e aconchegante. E ele não é bobo nem nada, traz o próprio travesseiro e cobertor. Mesmo assim, fia. Ele está sempre com os pés gelados e mesmo assim não suporta usar meias para dormir. Diferentemente do pai dele, que sou eu, ele consegue dormir com os pés frios. Eu às vezes até coloco duas meias para dormir. Sei que não é muito elegante. E nem, de acordo com a Patroa, sexy. Mas é quentinho.
Minha filha não é muito de fiar. Ela está sempre de meias e consegue manter os pés mais quentinhos. Mas nessas madrugadas, às vezes eu a escuto reclamar, lá na cama dela. Ela gosta de meias mas detesta cobertores, que atira para longe, enquanto ainda dorme. Minha filha dorme no quarto mais quente da casa, sempre de pijama de flanela e meias, mas mesmo assim, às vezes ela reclama do frio. E com o canto do olho, eu vejo o vulto da Patroa se levantar para acalentar a menina. Às vezes, depende do frio, ela termina a noite por lá, abraçada à filhota.
O que é bom, pois o meu filho precisa de muito espaço na cama. Em geral, ele abre uma clareira graças uma série bem aplicada de cotoveladas nas minhas costelas. Também é muito bom com joelhadas, chutes e pontapés. Se algum dia ele fizer carreira com artes marciais terá sido graças a essas madrugadas friorentas e às minhas costelas doloridas.
Então ficamos assim. Eu, de um lado da cama, me protegendo dos golpes discretos e indiscretos de um futuro Chuck Norris. E do outro, com os pés gelados, meu filho, que também exercita golpes de cotovelo e fia os pés.
Lá, no quarto mais quente, mãe e filha dormem tranquilamente, aconchegadas. Eu, às vezes, acordo à noite e vou olhar as duas. Dormem como anjos. Os pés não fiam.
Fiar o pé é sinônimo de inquietude.Mas não tem muito a ver com correria. Fiar é uma coisa que só é possível fazer deitado, ou sentado. É que meninos são especialmente inquietos na hora de dormir. Quando se deitam sozinhos. Ou em grupos, com primos e primas por perto. Não, isso aí é sinônimo de bagunça e confusão na certa. Ao invés de gritar “boa noite Jim Bob, boa noite Mary Ellen, boa noite, John Boy”, e fechar os olhos debaixo das cobertas que nem os Waltons, aquele monte de meninos fica lutando com e contra os travesseiros. E os mais quietos, no mínimo, fiam o pé. Ou seja, ficam esfregando os pés debaixo do cobertor, como se estivessem pisando no pedal da roda de fiar.
Eu sou um especialista em fiação de pé. Fio muito.
Sinto um frio absurdo nos meus pés. Eles são magros, magros e finos. E, para completar o quadro friorento da minha base de sustentação, minhas unhas encravam. Desconfio que seja por causa do meu hábito de fiar. Os pés. E ultimamente eu tenho fiado muito esses meus pés, como se ainda fosse menino. A verdade é que anda fazendo um frio gostoso, desses de esticar a permanência na cama. Mas ainda não estou de recesso e não há jeito de prolongar a estadia. Mesmo assim, fio. Os pés.
Meus filhos também estão muito fiados, nesses dias de frio. O mais velho às vezes vem procurar a gente, no meio da noite. Ele é silencioso. Quando eu percebo, ele já está cavando um espaço no meio da cama, onde é mais quentinho e aconchegante. E ele não é bobo nem nada, traz o próprio travesseiro e cobertor. Mesmo assim, fia. Ele está sempre com os pés gelados e mesmo assim não suporta usar meias para dormir. Diferentemente do pai dele, que sou eu, ele consegue dormir com os pés frios. Eu às vezes até coloco duas meias para dormir. Sei que não é muito elegante. E nem, de acordo com a Patroa, sexy. Mas é quentinho.
Minha filha não é muito de fiar. Ela está sempre de meias e consegue manter os pés mais quentinhos. Mas nessas madrugadas, às vezes eu a escuto reclamar, lá na cama dela. Ela gosta de meias mas detesta cobertores, que atira para longe, enquanto ainda dorme. Minha filha dorme no quarto mais quente da casa, sempre de pijama de flanela e meias, mas mesmo assim, às vezes ela reclama do frio. E com o canto do olho, eu vejo o vulto da Patroa se levantar para acalentar a menina. Às vezes, depende do frio, ela termina a noite por lá, abraçada à filhota.
O que é bom, pois o meu filho precisa de muito espaço na cama. Em geral, ele abre uma clareira graças uma série bem aplicada de cotoveladas nas minhas costelas. Também é muito bom com joelhadas, chutes e pontapés. Se algum dia ele fizer carreira com artes marciais terá sido graças a essas madrugadas friorentas e às minhas costelas doloridas.
Então ficamos assim. Eu, de um lado da cama, me protegendo dos golpes discretos e indiscretos de um futuro Chuck Norris. E do outro, com os pés gelados, meu filho, que também exercita golpes de cotovelo e fia os pés.
Lá, no quarto mais quente, mãe e filha dormem tranquilamente, aconchegadas. Eu, às vezes, acordo à noite e vou olhar as duas. Dormem como anjos. Os pés não fiam.
sábado, 20 de dezembro de 2008
A Mensagem de Natal do Careca
Eu pensei em fazer uma mensagem bem curta. Mas que fosse profunda e carregasse muito significado. Eram essencialmente as coisas boas que desejava para todo mundo. Bem estar é lugar comum, é onde originalidade não importa. Mesmo assim, todas as coisas que escrevi ficaram piegas e meio bobas ou meio exageradas. Ou então, quando eu conseguia uma frase mais despojada, ela ficava parecida com a plataforma política de Woodstock: saúde, paz e amor. Só faltava o rock´n´roll. Quer dizer, não é por aí.
Então eu tentei de novo. Eu sou um cara comum. Eu também já ouvi Ouro de Tolo, do Raul Seixas, numa biboca na beira da estrada. Eu também já vi posters do Roberto Carlos na parede de um bar, no interior do país. E eu também já ouvi o John Lennon cantar o Natal enquanto chovia em algum lugar. E depois, contei a contagem regressiva na frente da TV, corri para a varanda para ver os fogos. E quase sempre faço isso, todos os anos, mas é sempre diferente. É sempre especial.
Principalmente porque a gente quer que seja especial.
Se há uma época em que todos nós ansiamos por coisas boas e pelo bem é agora. Quando dez mil monges oram pela paz. Quando milhões anseiam por mais alegria e felicidade. É nessa época. Eu também duvido um pouco. Fico meio ressabiado. Mas no final não resisto. Até para não quebrar a corrente. Para não ser uma antena cósmica deslocada. Para não se um mala estraga-prazeres. E também porque eu sou pó do mesmo pó.
Eu também corro para a varanda e olho para cima, procuro ver a estrela brilhar. E quando eu olho, eu também faço como você, desejo o bem para as pessoas que eu amo. E nessa hora eu tenho certeza absoluta, não há uma sombra de dúvida no meu coração, de que as coisas boas vão acontecer para vocês, meus irmãos e minhas irmãs.
Então eu tentei de novo. Eu sou um cara comum. Eu também já ouvi Ouro de Tolo, do Raul Seixas, numa biboca na beira da estrada. Eu também já vi posters do Roberto Carlos na parede de um bar, no interior do país. E eu também já ouvi o John Lennon cantar o Natal enquanto chovia em algum lugar. E depois, contei a contagem regressiva na frente da TV, corri para a varanda para ver os fogos. E quase sempre faço isso, todos os anos, mas é sempre diferente. É sempre especial.
Principalmente porque a gente quer que seja especial.
Se há uma época em que todos nós ansiamos por coisas boas e pelo bem é agora. Quando dez mil monges oram pela paz. Quando milhões anseiam por mais alegria e felicidade. É nessa época. Eu também duvido um pouco. Fico meio ressabiado. Mas no final não resisto. Até para não quebrar a corrente. Para não ser uma antena cósmica deslocada. Para não se um mala estraga-prazeres. E também porque eu sou pó do mesmo pó.
Eu também corro para a varanda e olho para cima, procuro ver a estrela brilhar. E quando eu olho, eu também faço como você, desejo o bem para as pessoas que eu amo. E nessa hora eu tenho certeza absoluta, não há uma sombra de dúvida no meu coração, de que as coisas boas vão acontecer para vocês, meus irmãos e minhas irmãs.
sexta-feira, 19 de dezembro de 2008
As noites estão mais curtas
É verdade. Toda noite agora tem muita coisa para fazer. E fora de casa. Exatamente no meu horário de blogar. Ontem, por exemplo, minha irmã organizou um jantar. Todos fomos. E quando voltamos já era quase meia-noite. Hoje, acabo de voltar da Esplanada, onde uma gigantesca árvore de Natal brilha para todos os lados. Ficou muito bonita aquela árvore, as crianças adoraram. E também amaram a coisas que viram por lá. Mas agora estou só a capa do Batman. Não dá para pensar. Boa noite.
terça-feira, 16 de dezembro de 2008
O estranho no ninho
Outro dia uma pessoa no trabalho contou que desceu, de rappel, uma queda dágua em Foz do Iguaçu. Outro cara disse que já havia escalado uma montanha, super-alta, não sei aonde. Um terceiro, já meio grisalho, disse que estava se preparando para a sua quinta maratona. Aí todos olharam para mim. Eu olhei para trás de mim. E aí, para não ficar sem falar nada, eu disse:
_Eu gosto mesmo é de playstation2!
Os caras continuaram a contar vantagem. Um disse que só gostava de tomar uísque doze anos. Declamou nome e descrição de uísque. Outro disse que o negócio dele era chardonay. E falou de vinhos brancos chilenos, australianos, americanos e alemães. O terceiro, grisalho, só bebia vinho tinto. Também só faltou declamar poesia. Aí todos olharam para mim. Eu olhei para os lados e disse que tomava cerveja, mas só se estivesse gelada.
_Cerveja quente eu só tomo quando não tem gelada – eu disse, com convicção. Não recebi sequer um olhar de aprovação. Um dos caras, o que havia descido a cachoeira pendurado numa corda, chegou a balançar a cabeça, em franco e claro sinal de que havia achado a minha observação uma completa bobagem.
Os caras começaram a falar de automóveis. Um era fã de SUV. Outro sonhava com Ferraris. E o outro só queria saber de utilitários fora de estrada e jeeps. Aí dois deles olharam para mim. Eu nem precisei olhar para o cara do rappel. Ele já havia desistido de me incluir na conversa.
_Bom, carro pra mim é só um meio de transporte – eu disse. Mas os caras não sentiram firmeza, deu pra ver nos olhos dos dois. Para o cara do rappel eu nem olhei.
E foi o cara do rappel que puxou um novo assunto. Música. O sujeito é fã de música clássica. Sabia tudo. O outro era fã de jazz. Conhecia todos os discos da Blue Note. O terceiro adora MPB e samba. Conhecia os palcos e os bastidores da música brasileira. E eu?
_Eu gosto de rock´n´roll, mas sem radicalismos. Curto um pouco de tudo – eu falei, para horror dos meus interlocutores. Eles me olhavam como se eu estivesse com a gripe aviária. Eles faziam caras e bocas em sinal de desapreço. Depois dessa, o cara do rappel, que gosta de música clássica, passou a fazer ouvidos de Beethoven para o que eu dizia.
No Rio, um deles disse que era Flamengo. E falou a escalação do rubro-negro por ano, a partir de 1980. Outro disse que era Fluminense. Fez a mesma coisa: lembrou de cabeça, nome por nome dos times das últimas três décadas.E o terceiro disse que era Botafogo ou Vasco, não me lembro. E falou um monte de nomes. E você, Careca?
_América, mas não lembro nome de jogador.
Ao mudar radicalmente de assunto, o cara do rappel ficou quase de costas para mim. E anunciou que o negócio dele era investir em imóveis. Ele reformava e depois vendia, pelo dobro do preço. O outro comprava e vendia carros usados. Mesma coisa, comprava por x e vendia pelo dobro. O terceiro só investia em ações, mas deixou claro que a crise financeira havia passado ao largo. Comprava por x, e vendia super bem, ele não tinha do que reclamar.
_Fiu! – eu assobiei, sem querer.
E então os caras começaram a falar de política. Mas não pude acompanhar o diálogo, porque me lembrei que precisava revisar um memorando de três linhas. Quando voltei, os caras já tinham ido embora. Às vezes, eu tenho a impressão de que eu teria sido escolhido, na assembléia de ratos, para colocar o guizo no gato.
segunda-feira, 15 de dezembro de 2008
Bandêidi do Careca
O melhor e mais efetivo termômetro para o sucesso é a gôndola. Pode ser a prateleira do supermercado, da quitanda, da banca de revistas. As gôndolas mais refinadas, os termômetros mais precisos e acurados, são as prateleiras da farmácia. Foi lá que eu vi, depois que a Patroa me mostrou, os magníficos band-aids assinados, desenhados, dirigidos e coreografados pelo Alexandre Hercovitch. De acordo com o cara da farmácia, vende muito bem. Só perde para o band-aid da Hello Kitty.
Pensando nisso, em fazer sucesso e vender mais que pacote de Gogos em banca de revista, eu decidi fazer o Bandêidi do Careca. Tracei uma estratégia de sucesso. Pra começar, bolei um produto bonito, que pretende deixar pessoas machucadas de bom humor, sem perder a compostura. O bandêidi do Careca servirá para pequenas feridas abertas e arranhões na superfície do amor-próprio de qualquer ser humano, seja ele famoso ou anônimo. De fácil aplicação e grande utilidade, o bandêidi do Careca terá também o endereço deste blog que vos fala, para lembrar aos esquecidos que eu estou na Internet.
Pensei também em outros produtos que poderiam carregar a marca do Careca. Logicamente, a linha de higiene e perfumaria quase completa. Tirei o papel higiênico e os lenços de papel por razões óbvias. Mantive o perfume. O creme de barbear. A loção pós-barba. O sabão. O shampoo? Nesse, fiquei em dúvida, acho que poderia confundir o consumidor. Para finalizar a gôndola da farmácia, os produtos com o design do Careca: a palmilha do Careca; a calçadeira do Careca; o barbeador Mach 3 do Careca; a escova de dentes do Careca; a esponja, a saboneteira, o tapete de Box e a espetacular toalha do Careca. Nesse último e felpudo item, estaria estampada a minha sensacional Careca. No meu delírio, já vejo atrizes globais e capas da Playboy enroladas na minha Careca, digo, na minha toalha, digo, nas praias desse Brasil cheio de praias.
Naturalmente, espero ser convidado por uma grande empresa multinacional para lançar essa linha de produtos em escala local, regional, nacional e internacional. E vice-versa. Para o lançamento mundial do band-aid, aliás, pretendo localizar o jornalista iraquiano que jogou o sapato no Bush. O comercial aproveitaria as coletivas do Bush: truques eletrônicos fariam o jornalista atirar os sapatos no Bush no Iraque, em Paris, em Berlim, na Muralha da China, em Nova York, na Casa Branca e alhures. Pensando bem, nem precisaria de truque. No encerramento, sim, um truque eletrônico faria com que o jornalista grudasse, com gentileza, um bandêidi no Bush. Mas se eu não encontrar o jornalista iraquiano, poderia ser um palhaço qualquer.
Caso nenhuma grande empresa multinacional manifeste interesse, esperarei uns dois dias por uma média empresa. E depois, por uma pequena. E assim sucessivamente até chegar no Zé Carlos, que é o dono do verdurão que fica aqui, perto de casa. O Zé Carlos tem uma máquina de fazer sacolas plásticas, que ele comprou usada, muito usada e que funciona num puxadinho que ele tem lá no terreno dele, em Samambaia. Ele me disse que a máquina é o bicho e estampa qualquer estampa que eu quiser nas sacolas e em qualquer produto que tenha plástico. E bandêidi, minha querida Kombi de leitores e leitoras, bandêidi tem uma espécie de plástico.
Os cangurus voltaram
Um casal de amigos do Careca acaba de voltar da Austrália, onde passaram muitas e ótimas com as lindas filhas. Sejam bem-vindos!
sábado, 13 de dezembro de 2008
Atolei na sexta-feira
A empresa aproveitou a sexta-feira para fazer uma reunião geral de planejamento estratégico e congraçamento. Achei que ia ser um martírio. Mas para minha surpresa, teve momentos muito legais. A reunião foi num hotel-fazenda perto da cidade. E ao invés de palestras, todo mundo foi chamado a participar de brincadeiras e jogos. Como no meu grupo só tinha índio e índia, as pessoas ficaram à vontade. No final, a equipe conquistou uma honrosa colocação intermediária, do tipo que não fede e não cheira, o que foi muito bom.
Depois das brincadeiras, teve uma palestra mais séria. E para encerrar, o congraçamento. Ganhei um livro do amigo-oculto, o que também foi ótimo. Para completar, resolvi voltar para casa. A estrada estava meio escorregadia, mas bem transitável. Num único ponto havia um barreiro. E foi lá, quase no finalzinho do barro, que este humilde Careca ficou atolado no meio do caminho. Com a ajuda de seres humanos bem bacanas, saí até que depressa do barro, mas me sujei todo. E o carro também.
Para falar a verdade, eu empurrei o carro, mas quem tirou o Ford da lama foi uma mulher, uma excelente motorista a quem tenho que tirar o chapéu. Foi por causa do atoleiro, ó meus leitores e leitores da Kombi do Careca, que ontem não escrevi a minha tradicional e noturna mensagem olvidável do Careca. Peço desculpas.
Depois das brincadeiras, teve uma palestra mais séria. E para encerrar, o congraçamento. Ganhei um livro do amigo-oculto, o que também foi ótimo. Para completar, resolvi voltar para casa. A estrada estava meio escorregadia, mas bem transitável. Num único ponto havia um barreiro. E foi lá, quase no finalzinho do barro, que este humilde Careca ficou atolado no meio do caminho. Com a ajuda de seres humanos bem bacanas, saí até que depressa do barro, mas me sujei todo. E o carro também.
Para falar a verdade, eu empurrei o carro, mas quem tirou o Ford da lama foi uma mulher, uma excelente motorista a quem tenho que tirar o chapéu. Foi por causa do atoleiro, ó meus leitores e leitores da Kombi do Careca, que ontem não escrevi a minha tradicional e noturna mensagem olvidável do Careca. Peço desculpas.
quinta-feira, 11 de dezembro de 2008
Um fim para o urubu
Outro dia, enquanto eu fuçava uma estante na casa do meu pai, encontrei o primeiro livro que guardo na minha memória: “Aqui estão eles”. É um livro que em que a Disney apresenta a turma do Mickey para a meninada. A lombada está meio gasta, tem umas páginas remendadas com durex amarelado, mas ainda é possível ler e ver os desenhos sem problemas. Sobretudo, é possível ver as marcas dos dedos das crianças que manusearam aquela peça. É impossível reconhecer qualquer marca pessoal. Todo mundo, até hoje, vive pegando aquele livro.
No mesmo dia, encontrei um livro de contos tradicionais do país. Não é aquele organizado pelo Câmara Cascudo, que era um estudioso dos bons. O livro que está na estante do meu pai é mais antigo e menos pretensioso. Por isso mesmo, talvez seja muito melhor. É lá que está a história da Festa no Céu, que explica porque a pele do sapo é toda “remendada”. Nessa história sim, eu encontro as marcas dos meus, e somente dos meus, dedos. Porque eu não deixava ninguém chegar perto desse livro. Tenho ciúmes dele até hoje.
Lembro de ter decorado essa história ainda pela boca da minha mãe, antes de começar a ler e reler a Festa no Céu dezenas de vezes. E lembro de ter marcado a página do livro macerando a folha. Ela está quase furada. Eu sempre insistia em começar a ler o livro por aquela história do sapo que teve a audácia de ir à festa das aves nas nuvens, escondido na viola do urubu.
O final da história sempre me impressionava muito. O sapo volta para a viola do urubu e fica todo enrolado, lá no fundo. O urubu descobre o sapo e, sem piedade, sacode a viola e joga o sapo lá de cima. Ploft! O sapo cai em cima das pedras do leito de um rio. “Felizmente, Nossa Senhora viu o que aconteceu e remendou o bicho. É por isso que os sapos possuem uns desenhos estranhos nas costas”. – é mais ou menos o que está escrito, na minha memória.
Mais do que Cachinhos Dourados, “A Festa no Céu” foi uma das histórias mais educativas que já tive o prazer de ler. Para mim, sempre foi uma lição de limite. E um guia óbvio de sobrevivência na impostura. Lembro de, quando criança, procurar encontrar finais diferentes para a história.
Se eu fosse o sapo, jamais voltaria na mesma viola. Teria voltado com uma garça. Pegado carona com um pelicano. Se eu fosse o sapo, teria me disfarçado de papagaio, que é verde e brincalhão, e ninguém repara. Se eu fosse o sapo, teria enchido o papo de ar e descido do céu, flutuando como um balão.
Mas e os desenhos nas costas? As escapadas alternativas acabariam com o sentido da história. Do mesmo modo, se os pais do Tarzan não morressem, ele não poderia ser o Rei dos Macacos. Mesmo assim, eu torcia para que os pais do Tarzan não morressem. Torcia para que a kriptonita não machucasse o Super-Homem, só daquela vez. E torcia para que os vilões dos meus heróis não levassem a melhor no início, mesmo sabendo que perderiam no final.
No fundo, o que mais me fascinava na Festa no Céu era a sua maravilhosa explicação para os desenhos nas costas dos sapos. Então, mesmo que na minha cabeça de menino eu escapasse liso e solto da Festa no Céu, eu pedia para Nossa Senhora fazer uns desenhos legais, umas tatuagens bacanas no meu couro de sapo. Isso explicava todos os desenhos.
E logo depois de ter as costas cobertas de hieróglifos e mensagens secretas do Céu, eu falava para Nossa Senhora, com a maior inocência fingida do mundo, como quem não quer saber de nada, muito menos de vingança:
_Santa, sabe aquele urubu? Aquele, que toca viola...
No mesmo dia, encontrei um livro de contos tradicionais do país. Não é aquele organizado pelo Câmara Cascudo, que era um estudioso dos bons. O livro que está na estante do meu pai é mais antigo e menos pretensioso. Por isso mesmo, talvez seja muito melhor. É lá que está a história da Festa no Céu, que explica porque a pele do sapo é toda “remendada”. Nessa história sim, eu encontro as marcas dos meus, e somente dos meus, dedos. Porque eu não deixava ninguém chegar perto desse livro. Tenho ciúmes dele até hoje.
Lembro de ter decorado essa história ainda pela boca da minha mãe, antes de começar a ler e reler a Festa no Céu dezenas de vezes. E lembro de ter marcado a página do livro macerando a folha. Ela está quase furada. Eu sempre insistia em começar a ler o livro por aquela história do sapo que teve a audácia de ir à festa das aves nas nuvens, escondido na viola do urubu.
O final da história sempre me impressionava muito. O sapo volta para a viola do urubu e fica todo enrolado, lá no fundo. O urubu descobre o sapo e, sem piedade, sacode a viola e joga o sapo lá de cima. Ploft! O sapo cai em cima das pedras do leito de um rio. “Felizmente, Nossa Senhora viu o que aconteceu e remendou o bicho. É por isso que os sapos possuem uns desenhos estranhos nas costas”. – é mais ou menos o que está escrito, na minha memória.
Mais do que Cachinhos Dourados, “A Festa no Céu” foi uma das histórias mais educativas que já tive o prazer de ler. Para mim, sempre foi uma lição de limite. E um guia óbvio de sobrevivência na impostura. Lembro de, quando criança, procurar encontrar finais diferentes para a história.
Se eu fosse o sapo, jamais voltaria na mesma viola. Teria voltado com uma garça. Pegado carona com um pelicano. Se eu fosse o sapo, teria me disfarçado de papagaio, que é verde e brincalhão, e ninguém repara. Se eu fosse o sapo, teria enchido o papo de ar e descido do céu, flutuando como um balão.
Mas e os desenhos nas costas? As escapadas alternativas acabariam com o sentido da história. Do mesmo modo, se os pais do Tarzan não morressem, ele não poderia ser o Rei dos Macacos. Mesmo assim, eu torcia para que os pais do Tarzan não morressem. Torcia para que a kriptonita não machucasse o Super-Homem, só daquela vez. E torcia para que os vilões dos meus heróis não levassem a melhor no início, mesmo sabendo que perderiam no final.
No fundo, o que mais me fascinava na Festa no Céu era a sua maravilhosa explicação para os desenhos nas costas dos sapos. Então, mesmo que na minha cabeça de menino eu escapasse liso e solto da Festa no Céu, eu pedia para Nossa Senhora fazer uns desenhos legais, umas tatuagens bacanas no meu couro de sapo. Isso explicava todos os desenhos.
E logo depois de ter as costas cobertas de hieróglifos e mensagens secretas do Céu, eu falava para Nossa Senhora, com a maior inocência fingida do mundo, como quem não quer saber de nada, muito menos de vingança:
_Santa, sabe aquele urubu? Aquele, que toca viola...
quarta-feira, 10 de dezembro de 2008
Na frente dos bois, o carro
Hoje, na saída da escola, meu filho abraçou um dos amigos e chorou. Fez um discurso de despedida. Disse que ia sentir saudades do amigo. Que demoraria para encontrá-lo novamente. Nas últimas duas semanas, ele vem se despedindo dos amigos da escola alternativa todos os dias. Abraça. Chora. Faz discurso. Aí dá aquele tapinha de “toca aqui” e sai, esfregando os olhos. Às vezes, quando o cara é amigo do peito, bem chegado, ele também dá tapinhas nas costas e sai atordoado, como se tivesse perdido aquele round. Outras vezes, ele fala “valeu, amigo”, e sai, de cabeça erguida, cesta de três pontos.
Minha filha assiste a tudo, emocionada. Ela é emotiva, como eu. Choramos juntos vendo Wall-E, embora eu tenha disfarçado direitinho. Na escola, ela disfarça a emoção. Eu também. Ninguém merece ver um pai velho e piegas. Por isso, em geral, eu fico apressando os dois.
_E aí? É pra hoje? Vambora, gente! Cadê o sapato? Pô, sumiu o sapato! Não? Então por quê está descalço? Procura o sapato. E a camisa? Cadê a camisa? Perdeu a camisa? Ah. Tá na mochila. E cadê a mochila? Pô, filho, nunca está de sapato e sempre perde a mochila. Aí fica difícil. Vamos lá, vamos procurar – e saio para rodar o pátio, olhar o galpão.
Felizmente, a escola alternativa é pequena.
Mas hoje eu fiz diferente.
_Filho, seu amigo vai lá pra casa, esqueceu? Vocês vão passar a tarde inteira brincando. Não precisa despedir agora.
_Ah, é mesmo – ele diz e imediatamente abre um sorriso. O amigo também fica contente, também tinha esquecido do combinado. Os dois enxugam as lágrimas com as costas das mãos.
_ Vamos lá, me ajuda a encontrar a sandália e a mochila. E cadê a sua camisa? Não, não precisa colocar. Tá um calor danado.
Minha filha acha graça.
_Pai, esses dois são malucos. Choram à toa – e ela também enxuga uma lágrima no canto do olho.
Sexta-feira será o último dia de aula do semestre na escola alternativa. Tem festa programada. Vai ser um chitãozinho danado. E chororó também.
Depois fico pensando. É estranho como a gente tem mania de antecipar as emoções. De sofrer por antecipação. Até saudade se antecipa, às vezes. E de repente, a coisa passa e a gente nem sente.
terça-feira, 9 de dezembro de 2008
“Slow Blogging”
Achei essa ilustração do Movimento “Slow Blogging” no
http://ascoresdomeucaminho.wordpress.com/ . Nos finais de semana eu queria ser bem “Slow Blogging”. Mas não dá tempo. Durante a semana, sou o contrário. O mais extraordinário é que às vezes escrevo às carreiras uns textos que eu mesmo considero legais. Aí ninguém comenta. O que é sinal de que ninguém gostou, não houve empatia nenhuma e por isso nenhum ser humano se deu ao trabalho de comentar. Tudo isso prova que o ser humano sabe muito pouca coisa sobre qualquer coisa, inclusive sobre blogs.
A última do meu irmão
Ele sempre foi brincalhão. Uma vez, aos sete anos, depois de ler o Manual do Escoteiro-Mirim dos sobrinhos do Donald, resolveu fazer uma armadilha com um balde de água numa porta de banheiro. A vítima foi o meu pai, que se molhou todo. Desde aquele tempo, ele não parou mais de aprontar. Para chatear as minhas irmãs, ele comia os bombons e deixava só o papel de embrulho, todo armado. Os bombons eram presentes caros de namorados. Os bombons furtados eram muito mais saborosos, é claro. Para me deixar maluco, ele fazia barulhinhos com fio-dental antes que eu dormisse, “téim!téim”! Por isso, eu adivinhei logo quando minha mãe atendeu ao telefone e perguntou, em tom de galhofa:
_Ligou para pedir desculpas? – e ela logo mudou de assunto ao perceber que era eu, o Careca, ao invés do meu irmão, que tem cabelos.
Terminei a conversa rapidamente para investigar essa história de desculpas.
Converso com o meu irmão e desencavo a história inteira. Ele continua a atazanar minha mãe até hoje. Faz cócegas nela. Pega para dançar no meio da cozinha. Arremeda e implica com as coisas que ela diz. E também a mima e agrada, do jeito que só ele sabe agradar. E ela adora as brincadeiras do meu irmão.
Meu irmão conta que descobriu a lista de presentes de Natal da minha mãe. Olhou, comparou com os presentes que eu e minhas duas irmãs, os nove netos e o meu pai estaríamos recebendo. Achou o presente dele muito chinfrim. Riscou. E escreveu um outro presente na lista, super-legal e caro. Minha mãe só descobriu a alteração na lista dois dias depois, durante uma tarde de compras de Natal. Daí a pergunta sobre o pedido de desculpas. Ela havia ligado para ele fingindo uma grande indignação pela violação da privacidade de uma lista de presentes totalmente particular.
_E o meu presente? É legal? - eu perguntei.
_Mais ou menos, quer dizer, em comparação com o meu, o seu presente é bem modesto - ele respondeu.
É só para me deixar com ciúmes, como sempre fez. Finjo que nem ligo.
_Deve ser o pacote para colocar as chaves debaixo da árvore. O presente de verdade é tão grande e zero quilômetro que não dá para embrulhar - eu digo, para provocar.
_Zero quilômetro? Só se o odômetro tiver rodado duas vezes...
segunda-feira, 8 de dezembro de 2008
De volta às curtinhas
A polícia apresenta suas armas!
Você vê uma blitz de longe. E de longe você vê um monte de policiais portando escopetas, pistolas e armas. É só uma operação de rotina, mas uma simples verificação de documentos exige a montagem de uma operação de guerra. Em tudo e para tudo é desse jeito. Até em jogo de futebol. Os policiais exibem suas armas fora dos coldres, destravadas, prontas para o disparo. E quando surgem as vítimas, inocentes, há sempre os que falam numa solução radical, na regra idiota que só ampliará o problema. Mas a solução é muito mais simples. O que todos nós queremos é uma polícia que nos proteja, que resguarde a segurança de todos. Uma polícia disciplinada, que segue e que impõe as regras, mas que age de forma coordenada, inteligente. O que não se quer é a polícia meganha, canina, que rosna, agride, que age desmiolada e foge da coleira. O que aconteceu com um torcedor em Brasília não pode ser chamado de acidente. Foi uma falha afrontosa, um percalço do abuso, um deslize do acinte.
Duas árvores gigantes
A Esplanada está com uma árvore de Natal gigantesca. E em São Paulo, vi pela Internet, também montaram uma árvore gigante. Não sei qual é a mais bonita.
Amigo oculto
Entrei no amigo oculto do trabalho. Ops. Vou participar da brincadeira de amigo oculto lá do meu trabalho. A chefe do departamento de pessoal passou de sala em sala, com uma lata enorme cheia de papéis dobrados. Tirei uma pessoa que trabalha no mesmo andar que eu. É uma pessoa legal. Embora seja mal-humorada, nunca tenha me dado bom-dia e troque de calçada quando me encontra na rua. Mas estou contente. Felizmente, não tirei o C3PO!!
Você pediu, você levou
Sim, minha querida Kombi de leitores e leitoras, estou num ritmo muito bom. Progrido a olhos vistos. Já escolhi quase todas as 134 fotos de paisagens ao pôr-do-sol e a música do Richard Clayderman para o meu powerpoint com musiquinha. Aguardem.
A ilustração é uma alusão ao poema transcrito abaixo. A árvore formada pelo poema não consegui reproduzir aqui.
e. e. cummings (1894-1962)
little tree
little silent Christmas tree
you are so little
you are more like a flower
who found you in the green forest
and were you very sorry to come away?
see i will comfort you
because you smell so sweetly
i will kiss your cool bark
and hug you safe and tight
just as your mother would,
only don't be afraid
look the spangles
that sleep all the year in a dark box
dreaming of being taken out and allowed to shine,
the balls the chains red and gold the fluffy threads,
put up your little arms
and i'll give them all to you to hold.
every finger shall have its ring
and there won't be a single place dark or unhappy
then when you're quite dressed
you'll stand in the window for everyone to see
and how they'll stare!
oh but you'll be very proud
and my little sister and i will take hands
and looking up at our beautiful tree
we'll dance and sing
"Noel Noel"
EE. Cummings
domingo, 7 de dezembro de 2008
Uma capa para Umberto Eco
No início de julho eu enchi de estantes as paredes da varanda de casa. É o meu escritório em casa, onde eu teclo para esse blog. Está lotado de coisas, mas existe uma porção de badulaques que eu preciso jogar fora, ou colocar no armário da garagem. A verdade é que estou precisando de mais estantes, mas não há mais lugar.
Já estou com filas duplas na estante do quarto e continuo a comprar livros. E a ganhar livros. E a receber de volta livros que havia emprestado há tempos. Hoje mesmo o meu sogro me devolveu Baudolino, do Umberto Eco. É um livrão legal, mas sem aquela mágica do “Pêndulo de Foucault” ou de “O Nome da Rosa”. E o pai da minha mulher confessou que não leu inteiro. E disse isso com um ar meio culpado, como se precisasse me pedir desculpas por não ter conseguido ler um livro recomendado e emprestado por mim. É muito humilde e gentil o pai da minha mulher. Prezo muito ele.
Ele me devolveu o livro encapado, o que achei o máximo. Arrumou uma caixa de papelão, tipo envelope, e colocou o livro ali dentro. Na borda, ele fez um chanfrado, recortou uma veneziana e colocou um plástico transparente. É engenhoso, porque o recorte permite ler o nome do livro e o autor. Dessa maneira, o livro fica super conservado. Na verdade, parecia mais novo do que quando emprestei.
Ao guardar esse livro percebi que já não há mais espaço na estante do quarto. E também na estante do escritório. Aliás, está passando da hora de arrumar essa minha bagunça. No dia 24 de dezembro estarei de recesso. Como só voltarei ao trabalho no ano de 2009, vai dar tempo de arrumar algumas coisas.
Por via das dúvidas, dei uma conferida no meu estoque de prateleiras. E ainda tenho uma porção de sobressalentes. Quando me der na telha, vou colocar uma porção delas nas paredes.
O ideal seria uma estante que fosse do teto ao chão. Que exigisse alongamentos e flexões.
Fico pensando na melhor maneira de organizar a estante. Por autor? Não, quando eu leio vários livros de um mesmo autor, em seqüência, acabo ficando meses ou anos sem voltar a ele. Fico cansado, enjoado do sujeito. Por editora? Parece legal, mas acaba ficando uma estante com cara de livraria. Por título? Essa é a pior maneira. É como organizar discos por ordem alfabética.
Acho que a melhor estante é a organizada por afinidade. Os livros que releio pouco, mais distantes. Os que só folheei, deixarei longe, no alto. Os que me entediaram, embaixo, nos cantos. Os que me alegraram, à meia distância, em plano americano, ao alcance da mão. E, afinal, os livros que mais gosto, os que estou sempre relendo: esses eu deixarei à altura dos olhos. Às vezes, só uma olhadela na lombada do livro já é suficiente para me fazer bem.
sábado, 6 de dezembro de 2008
O tapete novo da sala
Hoje eu dormi até as nove da manhã. Foi bom demais. Aí eu chego na sala e não acredito no que eu vejo. O buraco dos azulejos havia desaparecido. A cômoda havia mudado de lugar. Um belo tapete estava estendido debaixo da mesa.
As crianças estavam no sofá, vendo Kung Fu Panda junto com a Patroa. Na verdade, o filme no horário errado foi a estratégia escolhida para conseguir que as crianças ficassem quietas para cortar as unhas.
_Benhê, que tapete é esse?
_Não é legal? - disse a Patroa, desconfiada.
_É super legal. E disfarçou o problema do piso da sala, né?
_Disfarçou, não! Escondeu.
_É, escondeu. Ficou bem escondido. Dá até para adiar a reforma, né, benhê?
_Claro, dá pra adiar uns quinze segundos.
_Dias, você quer dizer, né, benhê?
_Não, é segundos, mesmo.
_Ficou muito bom do jeito que está.
_E eu só estou esperando o orçamento chegar para autorizar a obra - disse a Patroa, irredutível.
_Caramba, será que Papai Noel é alérgico a obra?
_Que nada, como você já disse no blog, o velhinho sempre vem.
As crianças estavam no sofá, vendo Kung Fu Panda junto com a Patroa. Na verdade, o filme no horário errado foi a estratégia escolhida para conseguir que as crianças ficassem quietas para cortar as unhas.
_Benhê, que tapete é esse?
_Não é legal? - disse a Patroa, desconfiada.
_É super legal. E disfarçou o problema do piso da sala, né?
_Disfarçou, não! Escondeu.
_É, escondeu. Ficou bem escondido. Dá até para adiar a reforma, né, benhê?
_Claro, dá pra adiar uns quinze segundos.
_Dias, você quer dizer, né, benhê?
_Não, é segundos, mesmo.
_Ficou muito bom do jeito que está.
_E eu só estou esperando o orçamento chegar para autorizar a obra - disse a Patroa, irredutível.
_Caramba, será que Papai Noel é alérgico a obra?
_Que nada, como você já disse no blog, o velhinho sempre vem.
sexta-feira, 5 de dezembro de 2008
Adeus velha e boa escola alternativa
Minha filha acordou cantando hoje. E todos imediatamente ficaram felizes. Às vezes eu bem que tento, mas é difícil manter o mau-humor perto da minha filha sorridente e cantante. Acabo me deixando contagiar. Com os dois no carro, prontos para a escola, proponho uma escolha, como faço todos os dias:
_Notícias ou rock´n´roll? – eu pergunto, mas já sei a resposta. É sempre a mesma.
_ Rock´n´roll!! – eles gritam e sacodem as cabeças. Meu filho é bom de “air guitar”. Ele dedilha uma guitarra invisível no espaço, sem desprender do cinto de segurança. E minha filha, linda, ergue o polegar em sinal de positivo.
_Toca aqui, pai! – ela diz.
Mas quando tento tocar ela desvia e diz:
_Deixa que eu toco sozinha! Ting lim, ting lim! – ela também finge espanar uma guitarra.
E eles pedem novamente o rei e a rainha do rock´n´roll, mas já estou cansando de escutar “Burning Love” com o Elvis e “At Last”, com a Joss Stone. Coloco “Valerie” com a Amy Winehouse e em seguida “This Picture”, do Placebo.Estão aí, na Rádio Careca. Não é rock´n´roll, mas os meus críticos musicais ainda não sabem disso. Eles curtem e ficam sacudindo os braços nas cadeiras. Eu olho para o retrovisor e vejo as caretas que fazem. Quando escutam música nacional não se remexem tanto. A não ser quando coloco “Umbabaraumba”, do Jorge Ben Jorge. Essa não está na Rádio Careca, não consegui encontrar. O rock é a coisa tribal da aldeia global e Ben Jorge é um cacique nessa taba. Ráu!Ugh!
Ano que vem ele estarão em outra escola. O mais velho tem cinco anos e a minha garotinha está numa turma em que só existe mais uma menininha e doze garotos. Na outra escola a turma será mais equilibrada e eles possuem um boa metodologia de alfabetização, com bons professores, muitos deles saídos da própria escola alternativa.
Todos os dias me despeço um pouco da escola velha, que nasceu de um sonho antigo de educadores do tempo do onça. Queriam propor novas formas de ensinar e aprender. Queriam inventar a roda, é óbvio. E o ululante é que a escola não é feita só de método, não é só o espaço. A escola é feita de gente. Para dar certo, as gentes dessa escola devem ter pelo menos alguma afinidade, alguma simpatia mútua, uma boa vontade recíproca. E de muita gente ali, eu descobri que estava muito distante ou até de que não simpatizava nem um pouco. Dois ou três, preferia não ter conhecido.
Mas também foi ali que descobri algumas pessoas bem legais, com filhos desencanados, espontâneos e livres. O espaço da escola também foi importante. Me lembrou muito das escolas da minha infância, no interior do país. Aquelas escolas de cerca fina, com pátio grande e chão batido. Com fruteira. Foi numa escola assim que eu e o meu filho aprendemos a não ter medo de subir em árvore. E foi naquele pátio que ele aboliu o uso de sapatos e criou uma crosta grossa de pele nas solas dos pés. Diferente de mim, que não podia tirar as minhas botinas ortopédicas.
Confesso que sentirei saudades da boa e velha escola alternativa. Ele também. Ela também. Mas saudade passa. Especialmente nas férias.
_Notícias ou rock´n´roll? – eu pergunto, mas já sei a resposta. É sempre a mesma.
_ Rock´n´roll!! – eles gritam e sacodem as cabeças. Meu filho é bom de “air guitar”. Ele dedilha uma guitarra invisível no espaço, sem desprender do cinto de segurança. E minha filha, linda, ergue o polegar em sinal de positivo.
_Toca aqui, pai! – ela diz.
Mas quando tento tocar ela desvia e diz:
_Deixa que eu toco sozinha! Ting lim, ting lim! – ela também finge espanar uma guitarra.
E eles pedem novamente o rei e a rainha do rock´n´roll, mas já estou cansando de escutar “Burning Love” com o Elvis e “At Last”, com a Joss Stone. Coloco “Valerie” com a Amy Winehouse e em seguida “This Picture”, do Placebo.Estão aí, na Rádio Careca. Não é rock´n´roll, mas os meus críticos musicais ainda não sabem disso. Eles curtem e ficam sacudindo os braços nas cadeiras. Eu olho para o retrovisor e vejo as caretas que fazem. Quando escutam música nacional não se remexem tanto. A não ser quando coloco “Umbabaraumba”, do Jorge Ben Jorge. Essa não está na Rádio Careca, não consegui encontrar. O rock é a coisa tribal da aldeia global e Ben Jorge é um cacique nessa taba. Ráu!Ugh!
Ano que vem ele estarão em outra escola. O mais velho tem cinco anos e a minha garotinha está numa turma em que só existe mais uma menininha e doze garotos. Na outra escola a turma será mais equilibrada e eles possuem um boa metodologia de alfabetização, com bons professores, muitos deles saídos da própria escola alternativa.
Todos os dias me despeço um pouco da escola velha, que nasceu de um sonho antigo de educadores do tempo do onça. Queriam propor novas formas de ensinar e aprender. Queriam inventar a roda, é óbvio. E o ululante é que a escola não é feita só de método, não é só o espaço. A escola é feita de gente. Para dar certo, as gentes dessa escola devem ter pelo menos alguma afinidade, alguma simpatia mútua, uma boa vontade recíproca. E de muita gente ali, eu descobri que estava muito distante ou até de que não simpatizava nem um pouco. Dois ou três, preferia não ter conhecido.
Mas também foi ali que descobri algumas pessoas bem legais, com filhos desencanados, espontâneos e livres. O espaço da escola também foi importante. Me lembrou muito das escolas da minha infância, no interior do país. Aquelas escolas de cerca fina, com pátio grande e chão batido. Com fruteira. Foi numa escola assim que eu e o meu filho aprendemos a não ter medo de subir em árvore. E foi naquele pátio que ele aboliu o uso de sapatos e criou uma crosta grossa de pele nas solas dos pés. Diferente de mim, que não podia tirar as minhas botinas ortopédicas.
Confesso que sentirei saudades da boa e velha escola alternativa. Ele também. Ela também. Mas saudade passa. Especialmente nas férias.
quinta-feira, 4 de dezembro de 2008
Muito bem, disse o Conde
Desde que eu me entendo por gente meu pai fala essa frase. “Muito bem”, disse o Conde. E o “C” maiúsculo é por minha conta, por causa da importância que ele empresta sutilmente à pronúncia do “conde”. É uma frase que ele gosta de usar quando quer acabar com cerimônia. É como se um conde dissesse uma coisa trivial, só para deixar todo mundo mais à vontade. É, provavelmente, uma citação de Eça de Queiroz, um dos autores preferidos do meu pai e de toda uma geração de brasileiros. Quando eu era menino, eu queria ser um nobre só para esnobar a nobreza.
“Agora é tarde, Inês é morta”! é outra citação recorrente, trecho de “Os Lusíadas”, que remete à história de D. Inês de Castro. A história de D. Inês é de uma tristeza comparável a Tristão e Isolda, está na origem dos fados e da melancolia dos patrícios. Mas confesso que tenho um pouco de preguiça de ler os clássicos portugueses ou de me embrenhar na história de Portugal.
Mas não é sobre preguiça que escrevo o post de hoje. A preguiça brasileira em relação a Portugal é coisa para tese de mestrado, xarope para acadêmico dormir. Mesmo assim, já reparou como nós, brasileiros, temos pouca paciência com os portugueses? É recíproco, é bem verdade. Os portugas também não têm muito saco para nos aturar. Mas admiram nossos artistas. Gostam de ler os livros dos nossos escritores, de ouvir as músicas dos nossos melhores, dos que souberam decantar a brasilidade e depurar o que há de mais humano em nossas almas brazucas. Eu tenho uma preguiça danada de cantor português. Só aturo Carmem Miranda. E assim mesmo porque demorei a descobrir que ela tinha nascido em Portugal. Meu bairrismo vai até as duzentas milhas náuticas. Mas eu me perco.
Quero falar das frases que o meu pai gosta de repetir e repete há anos. Não são muitas. O que talvez mostre que ele não é muito repetitivo. “C´est pendant!” – é uma que ele sempre faz questão de dizer. Nem sei se é assim mesmo que se escreve. Em geral, quando não há muito a ser dito, para preencher um vazio momentâneo numa conversa qualquer. Aí ele solta um suspiro, como a antecipar uma frase genial, e fala “C´est pendant!”. E ficamos na mesma.
Em geral, depois desse pretenso francês eu ou o meu irmão levantamos o dedo e arriscamos uma frase em latim, que ele também gosta de repetir: “Nobiscum mutamba est”. E aí rimos. A frase, de acordo com o meu pai, que estudou latim e sabe conjugar “rosa et rosae” significa “Conosco é no pau da goiabeira”. Acredito. Não sou de duvidar do conhecimento paterno. Ao contrário, sempre apelei ao conhecimento e sabedoria do meu pai para um monte de coisas. E para tudo ele sempre me tem sido muito útil. Menos para ornitologia. Passarinho não é com ele. Mas sempre suspeitei que esse latim todo não significa apenas isso. Entretanto, nunca perguntei se haveria mesmo um significado oculto. Meu irmão também não. E acho que é por isso que até hoje ainda achamos graça dessa frase, porque talvez ela possua mesmo um significado diferente do que nos foi dito. E se você souber, por favor, não me diga.
Outra frase lapidar é “Quê que há, Rondineli?! Pára com isso”! Surgiu quando ainda assistíamos aos jogos de futebol pela TV, nas tardes de domingo. Foi uma das frases mais repetidas por um locutor de TV durante uma partida do Flamengo contra o Fluminense. O sujeito disse a frase umas duzentas vezes. E ao final da partida, ela havia grudado nas cabeças dos homens da casa. E até hoje, uns trinta anos depois, é essa a frase que dizemos quando alguém está dando alguma mancada. E ultimamente, eu tenho falado muito essa frase para mim mesmo.
“Agora é tarde, Inês é morta”! é outra citação recorrente, trecho de “Os Lusíadas”, que remete à história de D. Inês de Castro. A história de D. Inês é de uma tristeza comparável a Tristão e Isolda, está na origem dos fados e da melancolia dos patrícios. Mas confesso que tenho um pouco de preguiça de ler os clássicos portugueses ou de me embrenhar na história de Portugal.
Mas não é sobre preguiça que escrevo o post de hoje. A preguiça brasileira em relação a Portugal é coisa para tese de mestrado, xarope para acadêmico dormir. Mesmo assim, já reparou como nós, brasileiros, temos pouca paciência com os portugueses? É recíproco, é bem verdade. Os portugas também não têm muito saco para nos aturar. Mas admiram nossos artistas. Gostam de ler os livros dos nossos escritores, de ouvir as músicas dos nossos melhores, dos que souberam decantar a brasilidade e depurar o que há de mais humano em nossas almas brazucas. Eu tenho uma preguiça danada de cantor português. Só aturo Carmem Miranda. E assim mesmo porque demorei a descobrir que ela tinha nascido em Portugal. Meu bairrismo vai até as duzentas milhas náuticas. Mas eu me perco.
Quero falar das frases que o meu pai gosta de repetir e repete há anos. Não são muitas. O que talvez mostre que ele não é muito repetitivo. “C´est pendant!” – é uma que ele sempre faz questão de dizer. Nem sei se é assim mesmo que se escreve. Em geral, quando não há muito a ser dito, para preencher um vazio momentâneo numa conversa qualquer. Aí ele solta um suspiro, como a antecipar uma frase genial, e fala “C´est pendant!”. E ficamos na mesma.
Em geral, depois desse pretenso francês eu ou o meu irmão levantamos o dedo e arriscamos uma frase em latim, que ele também gosta de repetir: “Nobiscum mutamba est”. E aí rimos. A frase, de acordo com o meu pai, que estudou latim e sabe conjugar “rosa et rosae” significa “Conosco é no pau da goiabeira”. Acredito. Não sou de duvidar do conhecimento paterno. Ao contrário, sempre apelei ao conhecimento e sabedoria do meu pai para um monte de coisas. E para tudo ele sempre me tem sido muito útil. Menos para ornitologia. Passarinho não é com ele. Mas sempre suspeitei que esse latim todo não significa apenas isso. Entretanto, nunca perguntei se haveria mesmo um significado oculto. Meu irmão também não. E acho que é por isso que até hoje ainda achamos graça dessa frase, porque talvez ela possua mesmo um significado diferente do que nos foi dito. E se você souber, por favor, não me diga.
Outra frase lapidar é “Quê que há, Rondineli?! Pára com isso”! Surgiu quando ainda assistíamos aos jogos de futebol pela TV, nas tardes de domingo. Foi uma das frases mais repetidas por um locutor de TV durante uma partida do Flamengo contra o Fluminense. O sujeito disse a frase umas duzentas vezes. E ao final da partida, ela havia grudado nas cabeças dos homens da casa. E até hoje, uns trinta anos depois, é essa a frase que dizemos quando alguém está dando alguma mancada. E ultimamente, eu tenho falado muito essa frase para mim mesmo.
quarta-feira, 3 de dezembro de 2008
Minha gravata de Natal
Hoje eu acordei e resolvi usar a minha gravata de Natal. Ela é vermelha “Flash DC Comics”, ou, para usar uma terminologia mais clássica, vermelho “Blood Mary”, com listas finas creme-douradas. É uma bela gravata. A Patroa acha que eu estava de porre quando eu comprei. Ela pode ter razão. Eu não me lembro quando comprei essa gravata, mas foi num final de ano.
Lembro que um dia eu estava olhando o cabide de gravatas quando me deparei com aquele esplêndido e colorido exemplar. Achei maravilhosa. Desde então eu uso essa gravata quando quero transmitir uma mensagem de alegria para o mundo. Bacana, né? Mas a Patroa cisma com essa gravata. Toda vez que eu quero usar, ela implica.
Algumas características dessa gravata: é tão cheguei que pode ser vista a olho nu por um míope sem óculos a duzentos metros de distância; é tão esplendorosamente chamativa que um satélite pode localizá-la facilmente, mesmo que eu esteja em um elevador, túnel ou metrô; e, junto com a Grande Muralha da China, eu diria que é uma das poucas coisas feitas pelo ser humano que podem ser visualizadas do espaço.
Mas eu adoro essa gravata. Não é só porque ela me deixa ridículo. Não é porque ela praticamente elimina o risco de não ser visto ao atravessar uma rua. Ela é quase um item de segurança, uma espécie de colar da visibilidade. Com ela no pescoço, só não te vê quem é desprovido de retinas. Gosto dessa gravata. Não é porque ela me retira da obscuridade discreta dos meus dias pusilânimes. Não é só porque ela é uma afronta ao bom gosto e às cores sóbrias. Não é porque ela parece algo que um fugitivo de sanatório usaria para não chamar a atenção.
Também não é porque ela me garante pelo menos dez minutos de papo furado sobre qualquer assunto com pessoas que nunca vi antes. Esse, aliás, é um fenômeno interessante. As pessoas se sentem um pouco culpadas quando colocam pessoas e gravatas na categoria “ridículas”. E pra eliminar essa ridícula sensação de culpa elas acabam puxando conversa. E puxam um papo sobre o clima, sobre o governo, o time de futebol e a crise.
Eu uso essa gravata como uma declaração de princípios. Ser ridículo é quase uma demonstração de sociabilidade. As pessoas ficam querendo te dar dicas de como ser menos ridículo. É uma coisa estranha. E essa gravata é hipnotizante.Você não consegue tirar os olhos dela. E ela me desperta pensamentos felizes. Ou seja, gosto de pensar que também estou transmitindo pensamentos felizes para os outros seres humanos. Não que eu tenha vocação para comediante. Sou um tipo sério. E na maior parte do tempo, me acho de uma sem-graceza enorme.
Mesmo assim, sou obrigado a admitir que eu uso essa gravata porque para mim ela não tem apenas as cores convencionais do Natal. Eu uso porque essa gravata faz as pessoas rirem. Ela, para mim, é o próprio espírito natalino atado ao meu pescoço. É por isso que eu gosto muito de usar essa gravata nessa época do ano.
Depois que eu pensei nisso tudo, a Patroa olhou para mim e disse:
_Você vai mesmo sair com essa gravata? É feia demais – ela perguntou.
_Isso não é uma gravata, é o espírito natalino – argumentei, já na defensiva.
_Está mais para espírito do halloween – ela arrematou.
Naquele momento, se eu olhasse lá para cima, poderia ver sangrar o pobre nariz de Rudolph, a primeira e melhor rena do Papai Noel. Por isso, com um sorriso triunfante no rosto, acertei o nó da gravata e saí para levar as crianças para a escola. Elas adoram essa gravata. Riem à beça.
terça-feira, 2 de dezembro de 2008
Um filme de bailarina
Uma das coisas mais legais de ter uma filha é que, se prestar atenção, você começa a entender algumas questões básicas desses seres humanos. Eu, por exemplo, só hoje entendi porque uma das minhas sobrinhas abria os braços e esticava o queixo pra cima sempre que ia dançar. Era esquisito. Ela ficava toda torta e sorria. Depois entortava os braços em cima da cabeça, sorria e sapateava um pouquinho. Parecia que estava com coceira, procurando um pedaço de gelo na roupa, era estranho. Mas hoje tudo ficou claro e límpido. É assim que dançam as Barbies Bailarinas.
Sim, minha querida Kombi de leitores. Eu assisti a esse sensacional megahit da animação 3D chamado Barbie Bailarina na noite de hoje. É isso que o sentimento de culpa por não ter vindo almoçar em casa faz comigo. Me obriga a compensar os minutos que não passei ao lado das crianças fazendo a vontade delas. E no caso da minha princesa, ela quis que eu assistisse ao filme inteiro ao lado dela.
Eu e o meu filho, de cinco anos, não gostamos muito da história. Ele dormiu. E eu tive que me segurar. São doze princesas órfãs, cada uma com o nome mais estranho que a outra. O rei ama muito todas as filhas e quase morre de saudades da falecida. Aí aparece uma prima do rei que é muito má, além de especialista em etiqueta e educação de crianças. Ela diz que vem ajudar e o rei cai na conversa da lambisgóia.
A mulher é uma megera. E quer ser rainha. Então ela começa a envenenar o rei e a sacanear as doze princesinhas. Pra começar, ela acaba com as roupas coloridas e alegres das meninas. Põe todas de cinza. E a roupa de cama também. As meninas ficam tristes, tristes, jururus. Mas só até descobrir o segredo mágico da mãezinha falecida para o palácio dos desejos. Lá elas dançam e cantam a noite inteira. E no dia seguinte, nem conseguem ficar acordadas.
A lambisgóia megera fica fula de raiva e começa a aumentar o envenenamento do rei e a travação das meninas. Até obriga as moças a varrer o palácio e a lavar a louça. E elas nem tchum para a sirigaita. Todas as noites, fazem a dança mágica e vão até o palácio dos desejos. A trubufú acaba descobrindo o segredo mágico das doze princesas. Mas elas conseguem reverter as maldades e salvar o rei no último segundo. Termina com o casamento de uma das princesas com um sapateiro/príncipe coadjuvante que ajudou as mocinhas contra a vilã.
Não é esquisito? O roteiro é cheio de duplos sentidos. Tudo é simbólico e sujeito a uma reviravolta fantástica. Mas nada de muito sutil. Doze filhas? A mãe morreu de quê? De parto? As dondocas ficam tristes quando têm que trabalhar. E no final, o casamento redentor para uma das princesas. É boboca e manipulador.
Amanhã vou almoçar em casa. E à noite, vou ver se assisto alguma coisa inteligente ao lado dos dois.
Sim, minha querida Kombi de leitores. Eu assisti a esse sensacional megahit da animação 3D chamado Barbie Bailarina na noite de hoje. É isso que o sentimento de culpa por não ter vindo almoçar em casa faz comigo. Me obriga a compensar os minutos que não passei ao lado das crianças fazendo a vontade delas. E no caso da minha princesa, ela quis que eu assistisse ao filme inteiro ao lado dela.
Eu e o meu filho, de cinco anos, não gostamos muito da história. Ele dormiu. E eu tive que me segurar. São doze princesas órfãs, cada uma com o nome mais estranho que a outra. O rei ama muito todas as filhas e quase morre de saudades da falecida. Aí aparece uma prima do rei que é muito má, além de especialista em etiqueta e educação de crianças. Ela diz que vem ajudar e o rei cai na conversa da lambisgóia.
A mulher é uma megera. E quer ser rainha. Então ela começa a envenenar o rei e a sacanear as doze princesinhas. Pra começar, ela acaba com as roupas coloridas e alegres das meninas. Põe todas de cinza. E a roupa de cama também. As meninas ficam tristes, tristes, jururus. Mas só até descobrir o segredo mágico da mãezinha falecida para o palácio dos desejos. Lá elas dançam e cantam a noite inteira. E no dia seguinte, nem conseguem ficar acordadas.
A lambisgóia megera fica fula de raiva e começa a aumentar o envenenamento do rei e a travação das meninas. Até obriga as moças a varrer o palácio e a lavar a louça. E elas nem tchum para a sirigaita. Todas as noites, fazem a dança mágica e vão até o palácio dos desejos. A trubufú acaba descobrindo o segredo mágico das doze princesas. Mas elas conseguem reverter as maldades e salvar o rei no último segundo. Termina com o casamento de uma das princesas com um sapateiro/príncipe coadjuvante que ajudou as mocinhas contra a vilã.
Não é esquisito? O roteiro é cheio de duplos sentidos. Tudo é simbólico e sujeito a uma reviravolta fantástica. Mas nada de muito sutil. Doze filhas? A mãe morreu de quê? De parto? As dondocas ficam tristes quando têm que trabalhar. E no final, o casamento redentor para uma das princesas. É boboca e manipulador.
Amanhã vou almoçar em casa. E à noite, vou ver se assisto alguma coisa inteligente ao lado dos dois.
segunda-feira, 1 de dezembro de 2008
Primeiro de dezembro
O primeiro dia do mês de dezembro é o primeiro dia do final acelerado do ano. Agora, é ladeira abaixo. Se você tiver que fazer alguma coisa, faça depressa, senão vai ficar para o ano que vem. E eu estou enrolado. Para começar, eu tenho uma lista de coisas para fazer antes que o ano se acabe. É bem verdade que ainda não terminei essa lista. Mesmo assim é uma lista válida, pois, no máximo, vou acrescentar coisas ou tirar algumas. Aliás, já tem até linhas riscadas nessa minha lista. Dois itens que eu já cumpri e não preciso mais me preocupar. Muito.
O primeiro item de lista já cumprido da minha lista de coisas a fazer é “Trocar de carro”. Não é que eu já tenha trocado de carro. É que está chovendo horrores e fazendo frio. Como um dos principais motivos para trocar de carro era a falta de ar-condicionado, decidi postergar. Vou deixar para fazer isso depois do Carnaval, se houver l´argent. O desembaçador do carro é dos bons e eu tenho um ventilador de ar quente. Então vou conseguir segurar a onda.
O segundo item já cumprido é “Presentes das crianças”. Rá. Não pense que são só dois presentes, um para cada um dos meus filhos. Tenho 11 sobrinhos, e a tradição do Natal da família é imperial: um presente para cada um. A Patroa bolou um esquema que resolveu metade do problema e não pesou no bolso. A outra metade já está equacionada. E com isso, dois itens desaparecem da minha lista como se fosse um passe de mágica.
Agora só faltam 17 itens. Tem umas coisas bem interessantes na lista. Mas quase todos tratam de pequenos consertos que eu preciso providenciar. Algumas portas dos armários da cozinha estão meio cambetas e eu andei remendando com uma cola “Pra quê prego?”. Essas colas plásticas são muito boas, porque são brancas e à base de PVC. Quebram um galhão. Mas às vezes quebram mesmo. Então é preciso trocar o remendo. Ou trocar a porta do armário. Estou resolvendo aos poucos, porque decidi agora mesmo optar pelo velho, bom e cinza Durepóxi.
Vocês vão ver, até a próxima semana, no máximo, minha lista terá umas 13 ou 14 coisas. E eu durmo?
O primeiro item de lista já cumprido da minha lista de coisas a fazer é “Trocar de carro”. Não é que eu já tenha trocado de carro. É que está chovendo horrores e fazendo frio. Como um dos principais motivos para trocar de carro era a falta de ar-condicionado, decidi postergar. Vou deixar para fazer isso depois do Carnaval, se houver l´argent. O desembaçador do carro é dos bons e eu tenho um ventilador de ar quente. Então vou conseguir segurar a onda.
O segundo item já cumprido é “Presentes das crianças”. Rá. Não pense que são só dois presentes, um para cada um dos meus filhos. Tenho 11 sobrinhos, e a tradição do Natal da família é imperial: um presente para cada um. A Patroa bolou um esquema que resolveu metade do problema e não pesou no bolso. A outra metade já está equacionada. E com isso, dois itens desaparecem da minha lista como se fosse um passe de mágica.
Agora só faltam 17 itens. Tem umas coisas bem interessantes na lista. Mas quase todos tratam de pequenos consertos que eu preciso providenciar. Algumas portas dos armários da cozinha estão meio cambetas e eu andei remendando com uma cola “Pra quê prego?”. Essas colas plásticas são muito boas, porque são brancas e à base de PVC. Quebram um galhão. Mas às vezes quebram mesmo. Então é preciso trocar o remendo. Ou trocar a porta do armário. Estou resolvendo aos poucos, porque decidi agora mesmo optar pelo velho, bom e cinza Durepóxi.
Vocês vão ver, até a próxima semana, no máximo, minha lista terá umas 13 ou 14 coisas. E eu durmo?
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