segunda-feira, 19 de novembro de 2007
Aeroporto 2007
Chegamos três horas antes do horário marcado para o vôo e ainda assim a fila era gigantesca. Todo mundo estava precavido. O caos aéreo já determinava alterações significativas de comportamento. Há um ano, todo mundo chegava em cima da hora no aeroporto. Muitos reclamavam quando encontravam uma fila. Agora não. Poucos reclamam. Na longa, enorme fila, um passageiro, de bermuda e camiseta, tenta puxar conversa conosco.
_ Está demais, não é? Agora deixam qualquer um pegar avião. A passagem a esse preço. Onde já se viu? E aí é essa fila.
_ Mudou muita coisa, amigo. Na primeira vez que eu viajei de avião, meu pai falou para usar um terno completo. E foi o que eu fiz. De colete e tudo. E todo mundo estava becado.
_Eu gosto de viajar de camiseta e bermuda. Ainda mais para Salvador...
E a conversa morreu. Se houvesse um campeonato de matador de conversa, eu ganharia de lavada. Meu amigo, que também ia para Salvador, tentou ressuscitar o papo.
_Mas viajar de carro é pior. As estradas estão em frangalhos, não oferecem a menor segurança. Por terra, nem pensar, não há a menor condição - disse o meu amigo.
_É verdade. Está uma buraqueira danada, tem muita gente imprudente e todo mundo só anda chutado – disse o sujeito de camiseta, satisfeito por encontrar um cara normal e conversar.
_É e ainda tem os caras do Carro Mil. – eu disse.
_Que caras? – perguntou o de camiseta.
_Eles estão espalhados pelo país. Em todos os estados e em todas as estradas.
_Quem são eles? – perguntou o meu amigo que também viajava para Salvador.
_Os caras que compram carro mil com 60 prestações e pegam a estrada. E entopem o carro de amigos. E enchem a cara. E ainda querem ultrapassar o caminhão na subida.
_Esses caras são f.....!
_Bota f....... nisso!
_Mas ainda tem pior – eu disse.
_Pior?
_É. Mil vezes pior – eu assegurei.
_Não é possível – duvidou o sujeito de camiseta.
_Os caras do Carro Mil pelo menos estão com um carro novo na estrada. A turma do Opalão Preto é mil vezes pior.
Os dois me olhavam como se estivessem assistindo a uma versão não legendada de “A Bruxa de Blair”.
_Pode ser Belina Azul, Brasília Amarela, qualquer carro fora de linha. Já vi muito Opalão Preto. E a turma do Opalão Preto não liga a mínima para os pneus carecas, para os faroletes quebrados e para nada. A turma do Opalão Preto tem um monte de adesivos no que resta do para-choque. Os plásticos afirmam para o resto do mundo que eles, naquele rebotalho de automóvel, são mais filhos de Deus que eu, você e os outros otários que cuidam de equipamentos de segurança.
Deixei que eles pensassem um pouco sobre aquilo. Depois eu disse:
_É melhor voar.
_É.
E a conversa morreu para sempre. Aliás, o cara de camiseta virou as costas em seguida e não olhou mais para trás. Meu amigo, depois do check in, me perguntou se eu faço isso de propósito. Eu respondi que não. É um talento que eu tenho. Matar conversas. Encerrar discussões e papos-cabeças com opiniões definitivas, arrasadoras. Acabar com a encheção de lingüiça. Acabar com o passatempo. Não posso fazer nada contra isso.
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