Aqui estou eu, nessa exposição de fotografia, numa embaixada très chic. Faz muito tempo. Eu me acho pra xuxu. Estou com uns trinta anos, tenho um carro do ano, bons investimentos no overnight, todos os dentes(menos os sisos que tirei na adolescência para colocar o aparelho), muito cabelo e muita, muita empáfia. Meninos, eu realmente me achava. Dava para se notar com uma olhadela. Meus sapatos brilham, estão muito bem encerados.
Estou examinando essa foto com um copo de vinho branco na mão. A outra tem um cigarro. Faz um calor dos diabos, meus óculos estão começando a embaçar. Eu sei como segurar um copo de vinho branco e ninguém liga a mínima para o cigarro. Hoje já esqueci como se faz as duas coisas, mas naquela época eu conseguia fumar, beber vinho e conversar, tudo ao mesmo tempo. Meus sapatos brilham. Estou olhando para essa foto, que tinha sido tirada por alguém muito famosa e inteligente.
Eu realmente consigo dizer muita coisa sobre aquela foto para a pessoa que está ao meu lado. Ela está impressionada, eu acho. Agora está tocando aquela música dos Beatles, "When I´m 64".
_Como você se vê daqui a 30 anos? Quero dizer, você consegue se ver daqui a trinta anos? - ela disse.
_Claro que consigo - eu disse.
_Então, como vai ser?
_Com óculos, daqui a trinta anos só vou conseguir me ver com óculos - eu disse.
Ela ri, é claro. Eu achava que sabia dizer coisas engraçadas. Eu me achava.
_Não, sério, como você se vê com 64 anos? - ela disse. .
_Eu me vejo velho - eu digo - com um óculos bifocal, diversas próteses na boca, dores nos joelhos, dores nas costas e nos braços, cãibras, careca e com problemas de audição. Também vejo que já terei parado com o cigarro e com a birita, que estarei preocupado com o colesterol, com o excesso de peso, com a educação dos filhos, com a rotina e com a falta de perspectivas - eu disse. Ela não achou graça nenhuma.
Eu olho para os meus sapatos e eles brilham um bocado, agora. Ainda faltam alguns anos para 64 mas o futuro está bem claro, exatamente como eu disse que seria.
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