segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Morre um gato



Arctic Monkeys - Old yellow bricks

Foi uma luta fazer as crianças irem para a escola. Todo mundo queria continuar dormindo, inclusive eu. Às seis da manhã ainda está um bocado escuro, mas em dez minutos tudo fica bem claro, com um friozinho gostoso. Tive que ir para a padaria comprar manteiga, pão, café e nescau. Eu deveria ir à pé, mas fiquei com preguiça e fui de carro mesmo. Ao entrar na garagem, vejo uma dupla de gatos, um siamês bege de cabeça preta e um angorá cinza escuro, com listas pretas finas. As crianças já haviam me avisado de que uma gata havia ganhado uma ninhada no jardim da frente de casa. Só fiquei surpreso com o tamanho da angorá, parecia um lince. Os bichos sumiram quando abri o portão de ferro.

Ao voltar do supermercado, não vi nem sinal dos gatos.

Lá pelas dez horas, a professora da minha filha liga no meu celular. Minha menina reclama de dor de cabeça continuamente. Achei melhor ir buscá-la. Na ida para a escola, vejo na calçada, na metade da minha rua, o gato siamês. Ele parece tomar sol, se espreguiçando todo. Na escola encontro primeiramente o meu filho, no recreio, com os colegas. Ele se assusta com a minha presença e eu digo que vou levar a irmã para casa. Dou um beijo em sua cabeça e os colegas ficam zoando com ele. Encontro a minha filha na biblioteca. Ela ainda reclama de dor de cabeça, mas não tem sinal de febre. Voltamos para casa. Na descida da minha rua eu mostro o gato siamês de cabeça preta para a minha filha. Passo bem devagar. Ele parece tremer sob sol. Minha filha dorme poucos minutos depois de chegarmos em casa. Quando abri o portão, a enorme gata angorá saltou para o gramado do jardim de casa. O fim de semana foi cheio de atividades, minha filha precisa repousar. Ela só vai acordar pouco antes do almoço.

Minha mulher chega com o meu filho da escola. Durante o almoço ela comenta que viu o gato siamês tomando sol na calçada.

_Você viu a angorá cinza? - eu perguntei.

_Não.

-É um bicho gigantesco.

Durante o almoço, todos estamos bem e Rafa, o cãozinho shi-tsu também está feliz. Ele fica debaixo da mesa, tentando arrancar as meias das crianças. Depois de algum tempo dispara para o quintal e começa a latir, sem parar.

_Se o Rafa for mexer com aquela gata angorá ele vai se machucar feio - eu disse.

Minha mulher vai até o quintal conferir a situação. Mas ao que parece, Rafa estava latindo para algum outro gato. Não aconteceu muita coisa depois disso. Mas às três da tarde alguém toca o interfone.

_Aqui é o Joel. Sou o seu vizinho de rua, moro na primeira casa. Você tem um gato?

_Não. Nós temos um cachorro, serve? - eu disse.

_Não, é que tem um gato morto na rua, parece que alguém atropelou ele.

_Você atropelou um gato? - eu disse.

_Não, alguém atropelou um gato, ele está no meio da rua.

_Você quer ajuda para tirar ele da rua?

_Não, só estou procurando o dono do gato.

_Aqui não tem gato, só tem cachorro - eu disse.

_Sei. Mas você também tem um gato cinza grande no jardim, não é mesmo?

_Não, essa gata cinza enorme não é minha. Ela só escolheu o meu jardim para fazer a ninhada.

_Tudo bem, tudo bem. Tem certeza de que não tem mais nenhum gato? - disse Joel.

_Tenta o vizinho. Meu cachorro estava latindo para o gato dele na hora do almoço - eu disse.

_Já falei com o vizinho. Ele disse que não tem gato. Foi ele que me disse que viu dois gatos na sua casa, hoje de manhã.

_É, os gatos vivem por aqui, mas não são meus - eu disse.

_Sei. Acredito. Bom, se você não se importar, eu vou jogar aquele gato num saco de lixo. Mas se você preferir, eu posso trazer ele aqui. Tem gente que enterra o bicho de estimação no quintal.

_O quê? Escuta, o gato não é meu, ouviu?

_Sei. O vizinho disse que viu você passar devagarinho hoje de manhã, bem onde eu encontrei o gato morto.

_Putz! Passei de suposto dono de gato a suspeito de ser um atropelador de felinos - eu disse.

_O quê?

_Olha, Joel, faz o que você quiser com o gato. Eu não ligo a mínima - eu disse.

_Insensível - pensei ter ouvido Joel.

Pela câmera do interfone vi que ele fez uma careta.

Às três e meia, quando fui levar as crianças para a aula de inglês, subi a rua bem devagar. Havia um saco plástico preto no mesmo lugar onde havia visto aquele siamês de cabeça preta. Nunca acontece nada na minha rua.





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