terça-feira, 25 de setembro de 2012

Minha crise de dono-de-casa



There is an End - The Greenhornes

Todos os dias pendurávamos as bolsas, chaves, sacolas e guarda-chuvas em alguns ganchos improvisados que o antigo proprietário havia colocado nas paredes da sala de entrada. Não sei vocês, mas acho hall uma palavra muito exagerada para aquela salinha. Prefiro saleta. Ou salazinha. Bom, a daqui de casa não tem nada de uau. É até bem mequetrefe, humilde mesmo. Por isso, eu não me importava de usar os ganchos improvisados para pendurar a coiserada que a gente traz pra casa. Mas cansei. Hoje resolvi dar um basta no improviso alheio. O antigo dono da casa havia transformado modestos rodapés com pregos em cabides de tranqueiras parafusados na parede de tijolinhos. Eu decidi fazer cabides com materiais mais nobres. Usei dois pedaços de madeira compensada pintada de branco que um dia foram parte de uma cama de criança. Fiz tudo rapidamente, mas foi preciso esperar a tinta secar para colocar no lugar. Quando terminei, faltava pouco para as crianças voltarem da escola com a minha mulher.

Nenhum comentário na chegada. Nenhum comentário durante o almoço. Nenhum comentário após o almoço. Nenhum comentário depois da sobremesa. Resolvi apelar.

_Ninguém notou nada de novo na casa?

_As plantas! Você mudou os vasos de lugar! - disse a minha mulher.

_Você passou aspirador! - disse a minha filha.

_Eu não notei nada, pai - disse o meu filho.

Nessas horas eu me lembro de todos os seriados da tv dedicados a massagear o ego da dona-de-casa que se esmera em transformar o lar em um ninho agradável, confortável e repleto de amor para os seus entes queridos. Na tv, o provedor do lar se esforça em entender, agradar e antecipar proativamente as vontades da pessoa que fica em casa, angustiada, frívola e cheia de devaneios e preocupações idiotas. Obviamente faz isso de olho nos cinquenta tons de cinza das próximas noves semanas e meia de amor. Mas na vida real não é assim. Ou no meu caso, não é nada disso.

_Não era pra mudar os vasos de lugar - disse a minha mulher.

_Tem poeira aqui - disse a minha filha.

_Pai, eu realmente não percebi diferença nenhuma - disse o meu filho.

_Eu troquei aqueles cabides da salinha de entrada por uns cabides que eu mesmo fiz.

_Aahnn, que bom - disse a minha mulher.

_Nossa! - disse a minha filha.

_Pai, eu nem olhei, mas deve ter ficado legal - disse o meu filho.

É tarde demais. Para mim, não existe consolo possível. Estou à beira das lágrimas porque só me preocupo com irrelevâncias, cabides, tranqueiras de madeira e coisas que ninguém liga a mínima. Vou para a varanda, varrer umas folhas, aguar umas plantas e esfriar a cabeça. O que há de errado comigo? Se eu tivesse cabelos, correria para fazer um novo penteado? Se eu tivesse crédito, estouraria com ele no shopping? Chocolate? Sorvete? Creme-de-leite? Definitivamente, creme-de-leite. O resto do dia desapareceu numa bruma açucarada.

Então, agora estou aqui, pensando em como faço para reduzir o consumo de açúcar e começar um novo ciclo de exercícios físicos. Talvez comece amanhã mesmo, desde que não seja no horário da novela.



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