sexta-feira, 21 de setembro de 2012
Deixa chover
AC/DC - Soul Stripper
Quando falo de música com o meu filho sempre lembro de nós quatro: eu, Cabeça, Rodrigo e Ruble. O Velho Tom só fui conhecer no tempo da universidade, quando ensaiei uma migrada para o jazz e a música clássica. Para mim, música sempre foi rock´n´roll e algumas outras coisas. Mas em primeiro lugar, rock. Nós quatro levávamos isso muito a sério. Na época, parecia que a música era realmente o elo de ligação entre aqueles quatro meninos encabulados e desajustados. Não era, é claro. O que nos unia era a nossa timidez, o despreparo físico, a facilidade de aprender sem estudar e a impressão de que o futuro, para nós, acabaria cedo e de forma trágica. Isso quase se confirmou para dois de nós, eu e o Cabeça, num acidente de carro, mas sempre tivemos uma sorte danada, escapamos quase sem ferimentos. Isso ainda não falo para o meu filho, mas um dia, é claro, terei que contar.
Naquela época, eu digo para o meu filho, o mundo se dividia entre roqueiros e discotequeiros. Os roqueiros eram do bem, mas muito incompreendidos porque faziam um barulho infernal, usavam jeans e camiseta, cabelo comprido e não ligavam muito para banho. Do outro lado havia os disco boys e as disco girls, também chamados de travoltinhas. Eram criaturas bizarras que gostavam de musiquinhas melosas e dançavam sob a luz de globinhos cobertos de pedaços de espelhos. Eram muito graciosos, mas a mim não enganavam, era uma tribo cheia de regrinhas, sem a energia e a alegria libertadora do verdadeiro rock.
Durante um bom tempo os disco boys e as disco girls prevaleceram nas pistas de dança, nas festinhas na sala de visitas, nos aniversários e nas músicas de entrada das noivas nas igrejas. Mas na penumbra, nos horários mais inóspitos das rádios, na franja da programação da tv, nas bandinhas de garagem, o rock resistia com os Stones, The Who, Led Zeppelin, B. Springsteen, Prince e AC/DC. Um dia, quando todo mundo pensava que o rock tinha morrido, os travoltinhas foram varridos para fora de cena e os estádios de futebol voltaram a vibrar com farra dos guerreiros do rock. Isqueiros e velas foram acesas em comemoração. Foguetes e rojões foram estourados, e o bom e velho rock voltou a sacudir os esqueletos das pessoas em todo o mundo.
_Mas pai, eu não gosto muito de rock.
_Shhh. Deixa ver a temperatura. Hum. Você está gelado. Vou colocar um AC/DC agora mesmo para esquentar.
E enquanto coloco o CD, falo para o meu filho que o Ruble me mostrou o primeiro disco do The Police que ouvi na minha vida. E também foi gentil por me emprestar, várias vezes, os discos importados do Queen para que eu gravasse no toca-discos do meu irmão. Disso eu falo, como também entrego o Cabeça, que achava muito suspeito o Ruble gostar de Duran Duran e de Scorpions. Também comento sobre a fase excessivamente progressiva do Rodrigo, quando ele ultrapassou os limites do Yes e acabou por querer que a gente escutasse coisas como Devo e Marylion, que eu nem sei como se escreve.
E no final, passamos bem umas duas horas vendo vídeos novos e antigos sensacionais no You Tube, até ele se cansar.
P.S: Finalmente choveu.
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