sexta-feira, 7 de dezembro de 2007
Rosebud
_Hoje é Natal? É, pai?
Tem duas semanas que essa é a primeira pergunta que os dois fazem, logo que acordam. Explico que ainda falta um pouco para o Natal. Sou ruim para falar sobre o sentido do Natal, essas coisas. Mas digo que o Menino Jesus vai trazer muita alegria e paz para todo mundo.
_E presente? Ele não traz presente? – pergunta a mais nova.
_É o Papai Noel que traz presente, boba – explica o outro.
_Não chama ela de boba. E o presente é só para quem se comportou direito – tento corrigir.
_Não é nada. O Chico é um mala e já ganhou presente adiantado.
_O Chico é mala? Mas que mala é essa? Quem te ensinou isso?
_Você, pai. Você vive dizendo que o Chico é um mala – esclarece o primogênito.
_Mas não é para repetir. E você só tem quatro anos. Só adulto pode falar essas coisas.
_Tá bom. Mas ele já ganhou presente adiantado.
_Eu também quero presente adiantado – diz a caçula.
_Ninguém vai ganhar presente adiantado aqui em casa.
_Que mala – dizem os dois.
_Se repetir, eu vou escrever para o Papai Noel não trazer presente nenhum. E vamos mudar de assunto.
Mas o Natal está em toda parte. Está na TV, a cada 30 segundos. Nas janelas do prédio da frente. No elevador. Em cada milímetro da sala, com a enorme árvore de Natal montada no canto, cheia de lâmpadas piscantes. E está no coração dessas duas crianças, que palpitam de ansiedade pela chegada do Natal, da alegria, da paz e das coisas boas. E o menino volta a insistir, recuperando o fio da meada que eu mesmo já havia esquecido.
_Pai, o Menino Jesus também carrega um saco de brinquedo?
_Ele tem trenó? – participa a caçula.
_E renas voadoras?
_Não. O Menino Jesus é um bebê. Ele não carrega saco de brinquedos, não tem trenó e nem renas voadoras. Mas é o Salvador de todos nós. No Natal, nós celebramos o nascimento Dele.
_Pai, o Papai Noel não pode trazer alegria e paz?
_Pode, eu acho.
_Então pede para ele trazer.
_É, pede, pai.
_O Bebê não dá conta de carregar.
_ Não dá, pai.
_E aí, já que vai trazer alegria e paz...
_É, alegria e paz...
_Então ele podia trazer logo os presentes.
_Os presentes.
_Adiantados, né? Ha,Há, Há – finjo dar risada. Nada de adiantados. E se não se comportarem direito, nada de presentes.
_Mas, pai.
_É, mais, pai.
_Nem mais, nem menos pai. Ninguém vai ganhar presente adiantado.
E penso ter conseguido uma trégua de pelo menos 15 minutos, quando ligo a televisão no desenho animado. Mas há uma profusão de neve, gelo, trenós, pinheiros e bonecos de neve na tela. Antes mesmo que eu retome o fôlego, já estão de volta, com novas perguntas.
_Pai, nós vamos ganhar um trenó?
_Não, filho. Trenó só serve para brincar na neve.
_Mas neva no Natal, pai. Sempre neva no Natal.
_É, pai, neve no Natal – repetiu a caçula.
Como eu poderia ir contra um bilhão de desenhos animados, propagandas, anúncios, fotos, filmes, canções, brindes e o meu próprio pinheiro falso, coberto de lantejoulas imitando neve, no meio da sala?
_Claro que neva, filho. Mas os trenós acabaram. Esse ano o Papai Noel teve pedidos de trenós até da África. E ele já avisou que não vai ter trenó para todo mundo. E nem presente adiantado.
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