Sempre tive fixação por aeromodelos. Montei dezenas de aeromodelos e ainda existe um monte deles espalhados aqui em casa. De vez em quando, a Rose(babá-cozinheira-graduanda-faxineira-passadeira-faz-tudo) vai tirar o pó de alguma estante e destroça uma asa, destrói um trem-de-pouso. Eu não ligo muito. É bom ter um pretexto para remontar um aeromodelo estático, consertar um pedaço, retocar a pintura. Mas os planadores, muitas vezes, não têm conserto. Os aviões de balsa e papel de seda com dope, de tão ressecados, se espatifam sozinhos. Ás vezes um menino se distrai e quebra um Spitfire. Eu conserto. Às vezes some uma roda. Depois eu a encontro, meses depois. Mas já não serve mais, pois substituí o trem de pouso por uma base para exposição em vôo, ou simplesmente desisti do aviãozinho. Tenho uma caixa pequena, só de pedaços de aviões.
Só tenho muito ciúme de um pequeno avião que pintei caprichosamente de azul escuro. É um Corsair. Do tipo usado em porta-aviões, com asas em ângulo e dobráveis. É um belo aeromodelo. Outro dia eu o remontei, cuidadosamente, usando um removedor de cola, lixando partes adaptadas. Pintei novamente, com retoques caprichados. Encontrei novos decalques e apliques. Ficou legal. Só não encontrei o pequeno piloto.
Havia um pequeno piloto dentro do aeromodelo estático. Tirei para retocar a pintura, para pintar o uniforme com a cor certa do uniforme, um bege amarronzado. Na hora de pintar, não encontrei mais o boneco.
Terminei os retoques e dei o trabalho por terminado. Isso foi há uma semana. Somente hoje me lembrei que Rafael, o cãozinho shitsu daqui de casa, me observava atentamente enquanto fazia os reparos no aeromodelo.
Caso tenha ocorrido o que penso que ocorreu, já que o bicho gosta de roer tudo e qualquer coisa, terei de providenciar um funeral digno para o piloto, caso encontre seus despojos.
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