quarta-feira, 7 de outubro de 2009
Eye of the tiger
As pessoas não estão mais olhando umas para as outras. Não tem a ver só com a falta de preocupação com o outro. Tem a ver com a pouca importância que se dá a se olhar para o outro. Percebi isso na minha própria pele, com clareza.
Não, está tudo errado. Não posso generalizar o que acontece comigo dessa maneira. Na verdade, as pessoas não estão mais olhando muito para mim. Não tem só a ver com a falta de preocupação comigo. Mas com uma espécie de fastio em me olhar. Nunca fui muito olhável, mesmo. E acho que sou um tipo fácil de enjoar de olhar. Sou perfeitamente enquadrável numa longa série de estereótipos. Baixinho, barriga de chopp, careca, míope, bocó, caipira, provinciano, etc. A maior parte das pessoas tende a sacar o meu tipo com uma olhadela rápida, com o canto do olho, meio de esguelha, sem muito interesse em detalhes. Detalhes são para quem se dá importância.
Na segunda-feira, amanheci com um olho inchado, quase fechado. Ruim mesmo. Eu parecia ter sido vítima de um golpe bem aplicado de judô na pálpebra. Meu olho estava vermelho e inchado. Ele parecia um lutador de sumô, liso e rosado, como se tivesse bebido muita água.
Agi naturalmente. Como se não tivesse nada no olho. Beijei as crianças, brinquei com elas, joguei video game. Beijei a minha mulher, brinquei, não joguei video game. Fui levar as crianças para a escola, normalmente. Cumprimentei todo mundo. Fui trabalhar como sempre. Cheguei cedo, o primeiro a chegar. Falei com todo mundo. Ninguém reparou.
Não mudei o meu jeito de agir. Eu converso olhando as pessoas nos olhos. Sou um bocado metido e acho que não devo desviar o olho de quem conversa comigo, por uma questão de respeito. Para mostrar que estou prestando atenção. Pra mostrar concordância. Para mostrar que meus argumentos são mais convincentes e melhores. Para um monte de coisa. Inclusive para não mostrar subserviência. Quem desvia o olho, também costuma recuar em argumentos.
Na terça-feira, meu olho estava do mesmo jeito e aconteceu a mesma coisa.
Hoje, quarta-feira, meu olho piorou. De meio fechado, passou àquele jeito meio Virgulino de ser, caidaço. A primeira a perceber, foi minha filha. Depois minha mulher. Meu filho. Me olharam consternados. Na escola, algumas pessoas me olharam com um misto de asco e medo de contágio. No trabalho, depois de duas horas alguém percebeu e a notícia se espalhou, rapidamente.
Recebi a solidariedade das pessoas que trabalham comigo. Me recomendaram uma pomada. Água boricada. Em casa, me olham com uma simpatia benevolente. E agora, meu olho dói um pouco, bem pouco. E não é tanto o olho, é mais o amor-próprio que dói. Durante dois dias inteiros fiquei andando de olho inchado e ninguém percebeu. Será que ando fazendo a mesma coisa? Ignorando tudo o que não se passa ao redor do meu umbigo?
Provavelmente, sim. Da mesma falta do que nos queixamos dos outros, também estamos cheios. Não sou diferente. Eu me enquandro perfeitamente nesse e em outros estereótipos.
Amanhã eu sei que estarei bem melhor.
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