segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Murrinha



ACϟDC - Back In Black

Uma das coisas que procuro admirar em algumas pessoas é a despreocupação com que deixam transparecer sua verdadeira personalidade. Eu sou um idiota contrito, que quase sempre fica calado resmungando e remoendo decepções e rancores. Mas esses caras que eu quero admirar, não. Eles não ligam a mínima para o que outras pessoas possam estar pensando sobre suas opiniões e comportamentos. Deve haver algum episódio do Seinfeld que trata disso, mas posso estar errado, eu não assisti a todos os episódios. Seja como for, se isso aqui fosse a introdução de um daqueles episódios, se o Careca que vos fala estivesse na frente da cortina vermelha, usando gravata borboleta, ele estaria começando a explicar porque, no fundo, no fundo, sempre achou que os canalhas e os sujeitos toscos se divertem mais e são mais brutalmente felizes que os sujeitos bem educados e inofensivos que seguem as regras.

É lógico que todas as vezes que tentei ser mais tosco, fazendo o que esses sujeitos fazem, sempre me dei mal. Logo que a regra da faixa de pedestre passou a vigorar em Brasília, por exemplo, passei a evitar as pistas que passavam na frente de alguma escola. Se fosse o primeiro veículo antes da faixa, invariavelmente acabava interrompendo o tráfego até que o último pedestre deixasse a calçada. Uma vez tentei me aproveitar de um breve intervalo no fluxo de pedestres para avançar a faixa, mas acabei levando vaia e um dos estudantes chegou a passar andando sobre o capô. Devo dizer em minha defesa que no momento em que avancei, depois de esperar pacientemente e sob uma chuva de buzinas de outros motoristas, não havia nenhum pedestre sobre a faixa. Havia apenas um garoto de uns dez anos, que pisava sobre a faixa e depois mudava de idéia, tirando o pé do lugar, num vai-e-vem, só para me irritar. Achei que aquilo estava fora das regras mas o guarda que me multou não estava interessado em explicações e atenuantes. Algum tempo antes, ou depois, já não sei com certeza, resolvi avançar o sinal em cima de uma garota que tinha sido a namorada de um conhecido. Mas aparentemente o sujeito não tinha sido comunicado do fim do relacionamento pela mocinha e por isso, quando ele nos surpreendeu em pleno amasso dentro do carro, fui levado a socar seu punho com os meus dentes e nariz até que eu mesmo sangrasse bastante. Devo dizer que isso doeu pacas.

São dois exemplos singelos, mas que ilustram uma grande e breve lição aprendida: se eu pisasse no acelerador, seja na faixa ou com as garotas, eu sempre acabaria pagando caro.

Eu deveria encontrar neste parágrafo uma boa maneira de voltar a falar sobre o Seinfeld, mas já está tarde e não estou conseguindo, acredite. De qualquer forma, na minha opinião, Jerry era um obsessivo-compulsivo, sempre muito certinho, bem comportado e conformado com suas regras e códigos. Kramer, o meu favorito, estava à beira da esquizofrenia, com o seu comportamento esquisito e suas tiradas estranhas, era impossível saber o que ele pensava e o que iria fazer. Eliane, com sua auto-imagem borrada e suas variações de humor, sempre querendo se moldar ao parceiro do momento, era uma borderline completa, com total instabilidade comportamental. E George? Bom, deixei George por último porque uma grande amiga me acha muito parecido com ele, não só por causa da careca e dos óculos, mas principalmente por causa da paranóia aguda, das suspeitas irracionais e da proverbial incapacidade de confiar nos outros. Minha e do George.

E aqui eu deveria fazer mais uma pequena digressão para falar do meu amigo Murrinha e de uma conversa que tivemos durante o aniversário de um amigo, no último final de semana. Em primeiro lugar, dissemos que Murrinha é o apelido mais sensacionalmente aplicado na pessoa que conhecemos por Murrinha. Em alguma outra pessoa, isso poderia até parecer ofensivo, mas no caso dele, não. É, no mínimo, apropriado. Estou cansado de ouvir apelidos colocados para ressaltar alguma característica física ou temperamental das pessoas. Mas no Murrinha, o apelido é uma luva milimetricamente ajustada à sua personalidade e caráter, coisa difícil de acontecer com apelidos e seres humanos.

Passamos então a declamar algumas das muitas e famosas histórias do Murrinha, que além de não ter papas-na-língua e possuir um temperamento um pouco tosco, de alguma maneira consegue atrair mulheres belas e interessantes. Aqui eu deveria escrever sobre as mulheres bonitas que já vi em companhia do Murrinha, mas estou cansado e sem paciência para falar disso. Bom, talvez amanhã eu volte ao assunto.


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