sexta-feira, 31 de outubro de 2008

O mesmo de antes de nunca mais

Uma das coisas mais terríveis para o ser humano é ser submetido a uma cobrança do que não foi pedido. É gozado que um dos conceitos de qualidade mexe exatamente com essa coisa de oferecer mais do que foi pedido. E se você está acostumado a oferecer um trabalho de qualidade, você sempre procura oferecer um “plus a mais”, como se diz no centro-oeste. O problema é quando o cobrador, mal acostumado, se acostuma a receber o algo a mais. E a imaginação e criatividade tem limites, em qualquer área. E se você oferece só o feijão com arroz, o cobrador diz que esperava mais. E acha que isso é direito.

Mais sobre o nunca do mesmo antes
Uma das coisas mais terríveis sobre um casal de humanos é quando um começa a dar bom dia com o chapéu do outro.

Antes de nunca mais sobre o mesmo
Às vezes, acho que a minha vida é como andar em um parafuso gigante. Passo por áreas muito parecidas com outras, vistas de um ângulo um pouco diferente. Estou dentro de uma espiral, às vezes descendente, e outras ascendente. Eu subo e desço. É como se fosse um parafuso de plástico, numa mola flutuante gigantesca, boiando num oceano incompreensível. Caramba! Ainda bem que amanhã é sábado e vou poder dormir!

O mesmo de antes de nunca mais

Uma das coisas mais terríveis para o ser humano é ser submetido a uma cobrança do que não foi pedido. É gozado que um dos conceitos de qualidade mexe exatamente com essa coisa de oferecer mais do que foi pedido. E se você está acostumado a oferecer um trabalho de qualidade, você sempre procura oferecer um “plus a mais”, como se diz no centro-oeste. O problema é quando o cobrador, mal acostumado, se acostuma a receber o algo a mais. E a imaginação e criatividade tem limites, em qualquer área. E se você oferece só o feijão com arroz, o cobrador diz que esperava mais. E acha que isso é direito.

Mais sobre o nunca do mesmo antes
Uma das coisas mais terríveis sobre um casal de humanos é quando um começa a dar bom dia com o chapéu do outro.

Antes de nunca mais sobre o mesmo
Às vezes, acho que a minha vida é como andar em um parafuso gigante. Passo por áreas muito parecidas com outras, vistas de um ângulo um pouco diferente. Estou dentro de uma espiral, às vezes descendente, e outras ascendente. Eu subo e desço. É como se fosse um parafuso de plástico, numa mola flutuante gigantesca, boiando num oceano incompreensível. Caramba! Ainda bem que amanhã é sábado e vou poder dormir!

O mesmo de antes de nunca mais

Uma das coisas mais terríveis para o ser humano é ser submetido a uma cobrança do que não foi pedido. É gozado que um dos conceitos de qualidade mexe exatamente com essa coisa de oferecer mais do que foi pedido. E se você está acostumado a oferecer um trabalho de qualidade, você sempre procura oferecer um “plus a mais”, como se diz no centro-oeste. O problema é quando o cobrador, mal acostumado, se acostuma a receber o algo a mais. E a imaginação e criatividade tem limites, em qualquer área. E se você oferece só o feijão com arroz, o cobrador diz que esperava mais. E acha que isso é direito.

Mais sobre o nunca do mesmo antes
Uma das coisas mais terríveis sobre um casal de humanos é quando um começa a dar bom dia com o chapéu do outro.

Antes de nunca mais sobre o mesmo
Às vezes, acho que a minha vida é como andar em um parafuso gigante. Passo por áreas muito parecidas com outras, vistas de um ângulo um pouco diferente. Estou dentro de uma espiral, às vezes descendente, e outras ascendente. Eu subo e desço. É como se fosse um parafuso de plástico, numa mola flutuante gigantesca, boiando num oceano incompreensível. Caramba! Ainda bem que amanhã é sábado e vou poder dormir!

O mesmo de antes de nunca mais

Uma das coisas mais terríveis para o ser humano é ser submetido a uma cobrança do que não foi pedido. É gozado que um dos conceitos de qualidade mexe exatamente com essa coisa de oferecer mais do que foi pedido. E se você está acostumado a oferecer um trabalho de qualidade, você sempre procura oferecer um “plus a mais”, como se diz no centro-oeste. O problema é quando o cobrador, mal acostumado, se acostuma a receber o algo a mais. E a imaginação e criatividade tem limites, em qualquer área. E se você oferece só o feijão com arroz, o cobrador diz que esperava mais. E acha que isso é direito.

Mais sobre o nunca do mesmo antes
Uma das coisas mais terríveis sobre um casal de humanos é quando um começa a dar bom dia com o chapéu do outro.

Antes de nunca mais sobre o mesmo
Às vezes, acho que a minha vida é como andar em um parafuso gigante. Passo por áreas muito parecidas com outras, vistas de um ângulo um pouco diferente. Estou dentro de uma espiral, às vezes descendente, e outras ascendente. Eu subo e desço. É como se fosse um parafuso de plástico, numa mola flutuante gigantesca, boiando num oceano incompreensível. Caramba! Ainda bem que amanhã é sábado e vou poder dormir!

quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Você por aqui?



Mas ainda não mandaram você ir embora?
_Ué, confesso que estou surpreso de encontrar você! Primeiro imaginei que você tinha sido atropelado. É que ontem vieram umas pessoas. Perguntaram onde você sentava. Falaram que iam examinar o cubículo. Ficaram um tempão examinando os papéis e as gavetas. Pareciam saber o que estavam fazendo. Eles também entraram no computador. Ficaram horas clicando em arquivos e dando risadinhas. Esvaziaram a sua parte do armário. Depois pensei que você estava sendo demiti... ou melhor, transferido. É comum ter transferências por aqui, sabe? Embora não haja nenhuma filial dessa empresa em lugar algum. Aliás, nunca recebemos notícia nenhuma das pessoas transferidas. Elas simplesmente somem. Pop. Por isso fiquei surpreso em ver você. De verdade. Você não foi atropelado?! É uma coisa boa, isso. E já sabe para onde vai ser transferido?

Vai tombando, chapéu de palha!
_Careca! Estou feliz por encontrar você aqui. Eu não acreditei em nada que andavam dizendo de você, por aí. O C3PO é testemunha. Ele não me deixa mentir. Só um pouco. Eu disse para ele, “o Careca, não”! Foi ou não foi, C3? Viu? Então!!

É sempre bom fazer um pé de meia!
Sim, é sempre bom fazer um bom pé-de-meia. Meia é sempre uma coisa boa. Até cerzida. Ainda mais agora, que a Crise está chutando as portas.

Does anybody here remember Dina Sfat?
Lembro de uma vez que vi um telefilme com a Dina Sfat. Ela fazia o papel de mulher gigante. Era uma mulher enorme, muito, muito alta. Não lembro direito o nome do personagem nem da história. Minha memória é distraída. Mas a Dina andava numa rua, acho que era em São Paulo, e dava para ver até os ombros dela sobressaindo da multidão de cabeças. Não sei como fizeram aquilo, talvez tenham colocado uma plataforma para que somente ela andasse e parecesse mais alta que todo mundo, no meio da calçada. Acordei hoje pensando naquele personagem da Dina Sfat, naquela cena de telefilme. Uma mulher gigante andando em meio a um mar de gente caminhando apressado. Um monstro que fica contra a maré de ida e também contra a maré de volta. É até um pouco triste, essa esfinge, no meio da multidão. É impressionante. Chega até ser bonita. Mas ninguém dá conta de encarar. E todo mundo que passa, anda de cabeça baixa. Sem coragem de olhar para a bela esfinge gigante. É uma esfinge que pode nos devorar e gerar mais monstros.

O que você está fazendo com esse extrator de clips na mão?
Observo estrelas.

O que fazer com perguntas aparentemente sem nexo?
Responda corretamente.

quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Mais uma pane total no PC



Sim, caros amigos e amigas dessa Kombi. As oscilações de voltagem foram amplificadas ao máximo na segunda-feira. E a fonte do PC morreu. Novamente. Acho que é a terceira fonte perdida nos últimos seis meses. Isso vai me custar por volta de 75 pratas. O prejuízo é chato. Mas o mais chato é desplugar todos os fios e levar o PC para a loja. Depois terei de fazer o contrário. Mas vai ser bem legal carregar o PC até a loja. Da última vez que fiz isso, foi divertido. Três pessoas me perguntaram se eu consertava computador, no caminho. Eu respondi que sim, mas que estava com excesso de serviço. Não poderia pegar mais nenhum serviço. Então eu era obrigado a dizer não. Eu sou muito ruim para dizer “não”. Vivo pegando trabalho extra. Então aproveitei para treinar o meu não.

Para fritar um ovo na calçada
Você deve levar um ovo, óleo e sal. Tempere a gosto, ainda que já estejamos em outubro.

Vamos, vamos, vamos
Há sempre uma maneira de começar o dia.

Para boi dormir
Algumas vezes os pássaros caem sobre as nossas cabeças. Num grande esforço migratório, os pobres bichos batem as asas centenas e centenas de quilômetros e, de repente, desabam sobre as cabeças desavisadas dos plantadores de abóboras. Conheço alguns pássaros que sobreviveram. Mas são raros.

Está calor, mano?
Si, senor.

Um eterno mistério
Escravos de Jó, jogavam caxangá, tira, bota, deixa o Zé Pereira ficar. Guerreiros com guerreiros, fazem zig, zig, zá. Escravos de Jô, jogavam cachangá, tira, põe, deixa o Zambelê ficar. Guerreiros com guerreiros, fazem zig-zig-zá.

Nunca soube o que é Zambelê. Nem porque deixaram o Zé Pereira ficar.

Uma grande coleção de coisa alguma
Ouvi dizer que o ser humano não passa de um colecionador.
Retrós de linha.
Barbante.
Lata de ervilha.
Osso da sorte de galinha d’angola.
Estou juntando um pouco de tudo.
Com certeza, não vou saber o que fazer com nada.
Nessa minha coleção, vou colocar um quadrado de giz.
Tem que ser giz azul.
Daqueles de mesa de bilhar.
Sou um colecionador de picuinhas verbais.
Anoto desaforos em cadernos sem pauta.
Eu passo a limpo um monte de pensamentos sobre coisas banais.
Às vezes, é bem raro, os melhores são os mais sujos.
Os que ficam no canto.
Os que eu cubro com rabiscos.

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

O Careca coruja e a primeira pedra



A Patroa acha que eu tenho uma preferência descarada pela minha princesa. Ela acredita que isso é um fato inegável porque eu raramente digo não para a menina. E vivo dizendo não para o menino, meu primogênito. Além disso, eu, de acordo com as observações da Patroa, escrevo mais sobre a menina.

Talvez ela esteja certa. Eu acho que é equilibrado, mas posso estar enganado. Não fico contando “sim” e “não”. E também não sou de medir textos, acho isso um saco. Só não nego que sou um pai coruja. Nesse caso, eu mesmo atiro a primeira pedra em mim mesmo. Ai,ai!

Quando o meu primeiro filho nasceu eu estava perto dos "enta". Isso, para a geração dos meus pais, é considerado um Pai Matusa, sendo Matusa uma abreviação de Matusalém. Em outros círculos, sou apontado como um legítimo exemplar de Pai-Véi. Os nomes podem variar, mas a essência é a mesma. Um cara que quase ficou para tiozão, com cara de tiozão e que demorou a virar papai. Qualquer representante da espécie humana que tem filhos com essa idade costuma virar coruja ou babão. Eu até acho que não babo muito. Então só posso ser coruja. Com tendência a ser um coruja que baba.

Vamos à babação, como eu sempre digo. Nesse blog, eu sou até um pouco comedido em relação a toda essa coisa de falar dos filhos. Em geral, eu aqui só fico dando voltas em torno do meu umbigo. Quer dizer, eu não conto muita vantagem sobre eles. Não é que eu não gosto de dividir isso. É que a Internet é tão perigosa que tenho os meus medos e paranóias. Quanto ao meu umbigo, não.Vantagens sobre o meu umbigo eu conto aos montes. Sobre as crianças, a maior parte das vezes eu só falo do meu aturdimento, da minha estupefação com o fato fantástico dessas criaturas vivas, falantes e pensantes serem tão maravilhosamente diferentes de mim mesmo.

É muito importante ser coruja. Corujar alguém, alguma coisa, é uma das atitudes mais humanas que um ser humano pode ter. E também os chimpanzés. Os primatas. E os felinos. E os pássaros. Tá bom, corujar é uma coisa animal à beça, deve ser por isso que é tão bom. E depois desses alguns anos de treinamento, eu posso me considerar um pai coruja dos médios. É, dos médios. Porque tem uns caras que são impressionantes. Tem uns caras tão bons de corujice que só falam das crianças, o tempo todo. Com esses, não dá para competir. É impressionante. Dá vontade de jogar pedra. Ai, ai!

domingo, 26 de outubro de 2008

Ao escrever o seu nome



Quando hoje, depois de todo esse calor, pulamos na piscina refrescante, eu percebi em seus pequenos olhos um brilho de devoção. Os dois não estavam apenas se divertindo muito. Eles também estavam mostrando um ao outro que estavam se divertindo muito, comigo. E cada qual queria se divertir um pouco mais. E quando eu entrei de verdade na brincadeira e fingi que era um monstro gigante a virar e a afundar as bóias-navios e os meninos e meninas, os dois adoraram. As crianças adoram monstros inventados. Especialmente os que fazem bagunça, falam aos gritos e só dizem bobagem. Eu, na piscina, virei o perigoso e terrível monstro virador de barcos, o catastrófico Titanic Rex.

_ Cuidado, senão eu te afundo! Eu sou o Iceberg Titanic Rex! Eu afundo todo mundo!!

Eu me lembrei bem, ainda, de quando eu mesmo mergulhava e voltava a mergulhar, e depois procurava os braços seguros do meu pai. E de como ele estava sempre por perto.

É estranho como o tempo parece estar passando rápido demais e como estou deixando as coisas que são importantes um pouco de lado. E quando eu olho novamente, as coisas não ficaram mais de lado, elas estão lá trás. E eu fico com cansaço e preguiça de ir buscar.

Mergulho em devaneios prolongados e quando quase desisto de escrever qualquer coisa, percebo a minha menina atrás de mim, com um pedido pronto para ser feito.

_Paiê, sabe?, eu queria escrever o meu nome, sozinha.

E eu a ajudo a encontrar, nesse mesmo teclado, todas as letras do seu nome.

Ao terminar, ela examinou o nome com cuidado, na tela do computador. Tocou todas as letras com cuidado e carinho, com a ponta dos dedos. E aprovou a mudança de cores das letras, o apagar e o copiar e colar de nome e sobrenome. No final, não quis mais o cor-de-rosa, preferiu como estava antes, em preto e branco.

E depois escrevemos também o nome do irmão, da mãe e o meu nome. E em todas as vezes foi uma homenagem que ela fez a cada um de nós.

sábado, 25 de outubro de 2008

Ciúmes, ciúmes, ciúmes

Acho ótimo que tenham ciúmes de mim.
É verdade, eu também tenho.
De mim, não. Dos outros.
Tenho ciúmes das pessoas que eu amo.
E também das que eu acho que tenho.

É esquisito sentir ciúmes.
Mas rola.

Eu nunca consegui fazer ninguém fazer nada do que eu queria , por ciúme.
Essas coisas são complicadas.
Mas podem ser reduzidas a frases e bordões obtusos.
Assim: sinto ciúme, faça aquilo.
Se A = alguma coisa + ciúme, então A = dançou,camarada.

Na verdade, ciúme não justifica nada.
E nem cabe direito na fórmula.

O ciúme é só uma coisa adicionada.
Fora de condições normais de temperatura e pressão.
O que é a regra? Tormento, angústia e baixo astral.

No dia seguinte, e é fácil despertar no dia seguinte, com sorte já não há mais problema.
Procure uma tábua, um lema e um mote.
Construa um bote, uma régua e um poema.

Não sei nada sobre ciúmes.
Eu só os tenho.
Isso pode ser cômodo.
O principal de não saber das coisas de que ninguém sabe, é que isso não elimina a sua culpa.
A sua falta.
Aquela dor na coluna.

Portanto, meu caro, erga os braços.
Erga a língua para o céu da boca.
E faça o número quatro.

Amanhã, inspire e expire, deite de lado.
O ciúme, meu caro, é só um mau hábito.

sexta-feira, 24 de outubro de 2008

O dragão vermelho da Hot Zone



Durante duas semanas meu filho de cinco anos ficou insistindo em ir para a Hot Zone, no shopping.
_Me leva, pai? Ah, me leva? Puxa, pai! Eu ia ficar tão feliz!
Vista com olhos inocentes, a Hot Zone é uma área de divertimento, cheia de brinquedos e máquinas para as crianças. Vista com os olhos do caça-níquel travestido de humano que inventou aquele negócio, trata-se de um campo minado cuidadosamente planejado para arrancar o máximo de dinheiro do ser humano por segundo, de acordo com uma cuidadosa equação que relaciona espaço, tempo e a grana da sua modesta conta bancária.
_ Puxa, pai! Eu ia ficar tão feliz! Me leva, vai? Eu quero ir no dragão vermelho!!!
Depois de duas semanas com essas frases marteladas a cada segundo na cachola você começa a pensar seriamente em políticas públicas de adoção. Você pensa em controle de natalidade também. Mas no final, você está pensando em extermínio puro e simples. Por isso, hoje eu e a Patroa resolvemos fazer a vontade do primogênito, que já havia arrebanhado a irmã mais nova para a campanha Hot Zone.
_Paiê, sabe, eu estava pensando... você leva eu e o irmão para a Rózone? – ela gosta de começar frases com “sabe”.
E de vez em quando, os dois faziam corinho.
_Paiê, você leva a gente para a Rózone? Leva, pai? Eu quero ir no dragão vermelho.
Foi uma boa idéia ter levado, pois o shopping não estava muito cheio. Estava apenas absurdamente cheio e lotado. Entretanto, é preciso reconhecer que qualquer coisa era melhor do que ter duas crianças falando a cada trinta segundos que seria ótimo ir para a Hot Zone e brincar com aquele monte de brinquedos, especialmente com o dragão vermelho.
Entramos. E logo de cara, o enorme dragão vermelho brilhou nas pupilas do meu filho mais velho. Eu tratei de me aproximar para o reconhecimento visual. O dragão é uma mini montanha-russa montada no centro da Hot Zone, que serpenteia em curvas fechadas e abruptas em alta velocidade. Procurei as placas de sinalização e as instruções de uso. Descobri que era preciso ter um metro e trinta para entrar sem acompanhante. E mais: crianças de cinco anos precisam, obrigatoriamente, devem entrar com um acompanhante adulto.
Com as informações devidamente registradas e catalogadas, passamos a gastar dinheiro a rodo com os brinquedos. O ser humano é bobo. E os caras da Hot Zone são tão espertos quanto os lagartos que formam a turma dos cassinos. Eles utilizam o princípio do cartão de crédito. Você não sente que está gastando quando passa um cartão num sensor magnético. E lá todas as máquinas funcionam na base do cartão magnético. Gastamos o dinheiro dos cartões até o limite e fomos, pai e filho, para a fila do Dragão Vermelho.
Depois da primeira descida, numa curva de cento e oitenta graus a alguns quilômetros por hora, terminando com outra curva de 180, com uma retinha guinchada e rangida e sacolejos desestruturadores, pensei que iria precisar de um transplante de medula. Olhei para o meu filho e vi que ele estava mais branco que a camisa da prova da janela. Perguntei se ele queria parar e ele não respondeu. Na segunda descida, percebi que ele estava em estado de choque, não conseguia falar nada diferente de “aaaaahhhhhhh”. Na terceira passagem pelo controlador da montanha, eu gritei para parar, mas o cara não me ouviu. E só na quarta vez que passamos é que eu me lembrei do gesto que deveria ser feito para a parada imediata.
Foi tão imediata que bati o quadril numa barra metálica.
Daí a alguns minutos, ele me disse que não havia gostado de nada da Hot Zone, especialmente do dragão vermelho.
_Pai, você grita muito!
Ele tem razão. Estou até meio rouco.

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Um pouco mais sobre a minha tribo




O tanto de Chefe que eu tenho
Existem poucas pessoas no mundo que têm tantos Chefes quanto eu. Eu não sei porque, mas onde eu trabalho geralmente tem um monte de caciques e pouquíssimos índios. E geralmente me escolhem para Índio. Quando eu viro Cacique, daí a pouco eu sou cortado para coibir excesso de despesas e garantir uma alta taxa de lucros para acionistas. Ou qualquer coisa parecida. Desculpa é sempre pretexto fútil. Mas o sentido é de contenção de despesas. Sou um tipo talhado para ser encaixado em contenção de despesas.

Max Berimbau avalia os caciques
_Um Cacique que é visto como despesa só é cacique no nome.
_Vá se ferrar, Max!

Uma constante na vida do Índio
Todas as vezes que eu fui Cacique, a cavalaria já estava chegando. Não consigo pegar nenhum escalpo. A indiarada se esbalda de escalpelar e eu acabo na mão.

The dark side of the moon
Por outro lado, ser Índio é legal, mas não muito. Não é que Índio tenha que dizer Ugh pro Cacique. É que Índio não apita. Você fica ali, Tupi. Come uma raiz, engole uma rã. Mas é sempre Tupi. Jamais chegará a Aritana. Além disso, tem os programas de Índio, papos de Índio, coisas de Índio. E Índio é um saco plástico. Hoje, a onda é sacola ecológica.

A minha árvore tribalista
Tem índio pé-preto, tem índio pé-branco e tem índio pé-rapado. A minha tribo é um mix dessas três.

Meu cocar tem três pontas
O meu cocar tem três pontas, tem três pontas o meu cocar, se não tivesse três pontas, não seria o meu coelhinho, da Páscoa, que trouxe pra mim...

Nós, quem, cara-pálida?
A verdade, que deve ser dita, é que ninguém sabe direito o que esse bando de Índios irá fazer. Depois de todas as grandes crises, ó meus irmãos, vieram as guerras, as diatribes e as sangreiras desatadas. E só depois de muito se maltratar, é que os seres humanos se cansaram e pararam com as escaramuças e estapeações. A História nos ensina que se o pior pode acontecer, ele acontecerá.

Prelúdio para um latejar
Todas as vezes que eu seguro um martelo e um prego eu tenho que me concentrar. Eu fico pensando no meu dedo. Eu penso em não acertar o meu dedo. Eu penso em acertar o prego. Em geral, com um mínimo de concentração, eu não acerto o meu dedo. Eu acerto o prego. E prego. Pá! E quando eu erro, dói muito mais em mim.
Os Caciques batem pregos com nossas cabeças.

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Feliz aniversário, Careca!




Estou feliz por estar vivo!
Sou um cara de sorte.
Eu olho para cima.
Eu digo obrigado, obrigado.
E estou realmente grato.

terça-feira, 21 de outubro de 2008

A indução das vinganças saudáveis

É sábado. Eu e o Cabeça saímos para almoçar, perto de casa. A Patroa e a Esposa do Cabeça também foram, um pouco mais tarde. As duas são psicólogas e gostam de conversar em psicologês.

Eu e o Cabeça preferimos beber chopp. É mais seguro. Nós falamos de filmes, músicas, livros, futebol, fórmula um, capas de revistas e das páginas centrais de revistas. Eu peço notícias dos amigos que eu vejo raramente e dos que eu não vejo. É um pequeno círculo de amigos que considero “para a vida inteira”. Fico meses sem encontrar algumas dessas pessoas, às vezes, anos. E quando encontro, a conexão é imediata. Num instante estamos antenados e batendo papos sensacionais.

Não saio muito. E o Cabeça possui uma intensa vida social. É um autêntico arroz de festa, o Cabeça. Aparece em tudo quanto é coluna social. Aperta mão de governador. Beija primeira-dama, o cara é importante. Eu sou o avesso. Na verdade, minha vida social está restrita a uma saída noturna, de vez em quando, e aos domingos na casa de um dos avós. O almoço de sábado com os amigos é a minha principal atividade social. Às vezes, isso parece pouco. Pensando bem, é pouco mesmo. Mas é fácil se contentar com pouco, quando se é preguiçoso como eu.

Aí fazemos uma pausa sobre o livro que estou lendo, A Guerra de Wittgenstein. É um bom livro. Olho para o lado e escuto um pedaço de uma frase.
_... a indução das pequenas vinganças saudáveis – diz a Esposa do Cabeça.
_Caramba, que coisa terrível de se fazer – eu digo, intrometido. Como estou fora do ramo do curandeirismo, eu fico numa boa para dar palpites sobre a maneira como os pacientes, cobaias e divanistas devem ser tratados. A Esposa do Cabeça acha graça.
_As vinganças saudáveis são muito científicas – ela me informa.
_Eu acredito – eu digo. Em geral, eu só me estendo muito sobre o que não sei absolutamente nada. Mas dessa vez eu preferi ficar calado.
_Careca, você considera a vingança uma coisa saudável? – pergunta a Esposa do Cabeça.
_Não e sim. Não considero saudável fazer uma pessoa se sentir mal. Mas também acredito que ao fazer o bem, o que é saudável, é possível fazer mal a uma pessoa, o que é péssimo.
_Por exemplo?
_Eu sou o gênio da lâmpada e você me faz dois pedidos. O primeiro pedido é “uma piscina grande, bem funda”. E o segundo é “encha a piscina de dinheiro”.
_ E que mal há nisso?
_Um bando de malucos desocupados descobre a sua piscina de dinheiro e decide que a grana deverá ser distribuída para os mais pobres, ou seja, eles mesmos. A sua piscina de grana provoca inflação descontrolada e o dinheiro não vale mais nada, as pessoas voltam a preferir a troca de mercadorias. Todos os pobres se voltam contra os ricos e os primeiros a ir para o paredão são os donos de piscinas. Antes de ser trucidada pela turba, você tenta destruir a lâmpada do gênio...
_Já chega!
_Fazer o bem é como escovar dentes de crocodilo. Você tem que ser meio louco e tomar muito cuidado – eu encerro.
O Cabeça pede mais uma rodada de chopps.
_Não sabia que você falava embromês – diz o Cabeça.
_É só pra desenferrujar.

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Digressões a granel


Uma pequena dor lombar
No sábado à noite, fui carregar o meu primogênito do sofá da sala para o quarto dele. Ele tem apenas cinco anos e é bem leve. Foi um ato impensado, minha querida Kombi. Travei. Inclinei mais do que devia. Fiz mais força do que Prometeu, o gigante traidor que roubou fogo dos deuses para entregar aos homens. Entortei a minha coluna já torta e desleixada. Sem ruído, sem um ratatuí sequer, senti uma agulhada na base da minha espinha. Valentemente, concluí a tarefa, carregando os vinte e três quilos de menino para a cama dele. No domingo, mal consegui amanhecer. E hoje, gemi mais do que uma cuíca cada vez que levantei da minha cadeira. Oh vida, oh dor! Estou pior que a hiena Hardy-yah-yah. Mas não há de ser nada, dizem que a gente fica bom no terceiro dia.

Desculpa para não fazer o que deveria ter feito
Procure ter uma desculpa sempre à mão. Nada muito elaborado. Mencione o fato desculpável como quem não quer nada, sem dar muita importância. Finja esquecer detalhes, mas guarde uma minúcia que possa ser considerada importante. Proteja a retaguarda.

Dias piores virão
Pode apostar.

Mais uma da série “proteja a sua retaguarda”
Sempre que eu encontro esse sujeito, o C3PO, eu digo a ele: “Aí você, está melhor?” E enquanto ele arregala os olhos, como fazem os C3POs, eu continuo. “Você está bem melhor. Quase nem dá para notar, de longe. De perto, é verdade, se a gente repara bem, dá para perceber. Mas só se a gente sabe onde procurar. Alguém que não saiba do seu problema, por exemplo, jamais iria desconfiar de nada. Essa base disfarça bem. Mas, olha, fica tranqüilo. Conte com a minha discrição. Se você quer manter isso em segredo, é uma questão pessoal, quem sou eu para dizer o que uma pessoa deve fazer. Se bem que já existem casos de pessoas que assumiram tudo numa boa. E foram até mais valorizadas por isso. Mas não importa. Não ligue para o que os outros estão falando. Essa é uma questão de foro íntimo, eu acho. É quase de caráter. A decisão é sua. Tem gente que acha uma covardia não enfrentar tudo de peito aberto. Mas eu não estou aqui para julgar ninguém. Muito menos quem vacila na hora H. Vá em paz!”

Essa é uma viagem solitária e divertida
Blogar, como qualquer coisa que exija um planejamento prévio, é um ato solitário. Aqui estou eu, de frente para uma página em branco, datilografando o meu teleco-teco diário. Ou melhor, noturno. Sozinho. Com dor nas costas. E com sono. De vez em quando eu me perco em tergiversações e digressões nonsense. Caramba! Essa é a melhor parte.

No submarino amarelo
De vez em quando, estou dentro do carro e imagino que estou dentro do submarino amarelo. Daquele mesmo, dos Beatles, que depois virou canção dentro da Vila Sésamo. Mas, às vezes, os peixes que eu vejo são assustadores. Como faço para manter o olhar de encantamento, o olhar para uma vida mais prazerosa e bela? Sei de algumas pessoas que põem nariz de palhaço, vão alegrar crianças doentes em hospitais. Sei de outras que se fecham, carrancudas, nos sinais de trânsito. É por isso que eu sempre ando com a minha máscara de zumbi esfaqueado na cabeça. Caramba! Será que eu mesmo me agüentarei daqui a alguns anos?

domingo, 19 de outubro de 2008

Arnesto, Esfarelando e Sunflower




Faz tempo que não vejo comentário do Mwho. Fui procurar o blog dele, mas a última atualização foi em 11 de outubro. Vai ver saiu de férias de novo. O Mwho me parece ser o tipo do milionário que tira férias três vezes por ano. Aí vi um link no blog do Mwho: Sunflower Records.

Um blog irresistível. http://sunflowerrecords.blogspot.com/ . Se você gosta de rock, é o lugar certo. Eu sou um cara muito defasado em matéria de música. Em geral sou meio resistente a coisas novas. Mas a Sunflower tem umas dicas excelentes, além de escrever textos maneiros e legais. Maneiros? Sou defasado em gírias também. Mas o blog vale a pena conferir.

Aí comecei a me lembrar daquele samba do Adoniran Barbosa, o “Arnesto nos convidou”. E, ao mesmo tempo, fiquei imaginando se essa música ainda seria possível nos tempos de hoje, com tanta facilidade de comunicação. E é claro que sim. Acontece direto com os blogs. A gente vive indo e não encontra ninguém. Aí, de vez em quando, a gente deixa um recado na porta.

Samba do Arnesto

O arnesto nos convidou
Prum samba ele mora no brás
Nóis fumos e num encontremos ninguém
Nóis vortemos cum uma baita de uma reiva
Da outra veiz, nóis num vai mais
Nóis não semos tatu!
O arnesto nos convidou
Prum samba ele mora no brás
Nóis fumos e num encontremos ninguém
Nóis vortemos cum uma baita de uma reiva
Da outra veiz, nóis num vai mais
Noutro dia encontremo com o arnesto
Que pediu discurpas mais nóis não aceitemos
Isso não si faiz arnesto, nóis não si importa
Mas você devia ter ponhado um recado na porta
Um recado Anssim ói: "Ói, turma, num deu prá esperá
A duvido que isso num faz mar, num tem importância,
Assinado em cruz porque não sei escrever: Arnesto"

sábado, 18 de outubro de 2008

O horror, o horror!

De vez em quando, somos expostos a ele. Ao horror! Assim mesmo, com ponto de exclamação. E ele nos paralisa e emudece. Mas é por pouco tempo.

Houve uma época em que eu acreditava em mobilização pós-horror. E eu acreditava que as outras pessoas também acreditavam nisso. Eu vi fotos de gente abraçando baleia na praia, de multidões de mãos dadas, em volta de lagoas, às margens dos rios. Mas isso já acabou. Depois do 11 de setembro nós ainda nos irmanamos. Mas só até ver alguns episódios de uma guerra cirúrgica iniciada em seguida. E depois tudo desandou.

A natureza costumava nos irmanar.

Mas agora isso já não acontece mais. Ou se acontece, nem fico sabendo. O destino do boto cor-de-rosa e da ariranha não nos aflige. E muito menos desse outro animal, o ser humano. Já não nos solidarizamos com a desgraça alheia. Tudo o que fazemos é dar de ombros, felizes por não termos sido atingidos. De não ser com alguém conhecido. O câncer não nos sensibiliza. A pobreza não compadece. A fome não nos angustia. Somente a curiosidade mórbida não esmorece.

O que nos fascina são os espetáculos de sangue, suor, lágrimas e morte, tal como dizia Aristóteles.

sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Cachorros de plástico não mordem




Uma vez meu co-cunhado, que vem a ser o marido da irmã da Patroa, mudou de casa e me chamou para ir conhecer a nova residência. Achei a casa muitcho legal. Quarto à beça. E também, ele dizia, tem quintal grande e até piscina. Eu fui indo na frente, pelo corredor, e quando eu estava quase chegando na parte de trás da casa, meu co-cunhado falou:

_Cuidado com o cachorro!

Estaquei, de imediato. Meu instinto de sobrevivência foi treinado em escolas públicas. Sou muito bom em localizar saídas pela direita e em piques rápidos, em qualquer direção.

Apurei o ouvido esquerdo, o direito não é grande coisa mesmo, e procurei me concentrar em sons de animais ferozes. Mas nada ouvi. Nada. A não ser a pulsação do meu próprio sangue latejando nos meus tímpanos.

_Nem sabia que você tinha cachorro – eu disse, como quem pede para ser avisado antes da existência de animais ferozes e mordedores na residência.

_O Totó é mansinho. E, além disso, está preso no canil – ele afirmou, tranqüilizador.

Voltei a me aproximar da parte de trás da casa, mas a passo lento, ainda apurando os ouvidos. Adiante, vislumbrei a cerca de um enorme canil. Cauteloso, fui caçar o cão com os olhos mas não senti nem o cheiro do animal. Meu co-cunhado percebeu o meu medo e me ultrapassou. Na verdade, correu para entrar no canil.

_Totó, Totó, venha conhecer o Careca! - e entrou na casinha do canil.

Esperei um pouco, do lado de fora e, instintivamente, fechei a porta do canil. Não posso ver porta aberta que vou logo fechar. Para minha surpresa e horror meu co-cunhado pulou para fora da casinha a gritar:

_Calma, Totó! Quieto! Deita!

Sem olhar para trás, ele voltou a entrar na casinha. Ouvi mais uns gritos e comecei a ficar seriamente preocupado quando não ouvi mais nada. Fui chegando mais perto.

__Calma, Totó! Quieto! Deita!

Mas dessa vez, ele trouxe o Totó a balançar na mão. Era uma bóia de plástico, no formato de um cachorro.

_Puff! – fez o cachorro, quando enfiei a caneta e furei a bóia de plástico.

_Esse Totó não morde mais, cunhado!

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Um dia depois do outro

É só no que estou conseguindo pensar. Minha capacidade de planejamento não anda ultrapassando 24 horas. Às vezes, menos.

Beba bastante líquido
Se for sólido, não há como bebê-lo!

Videogame em casa, depois do trabalho
Estou ficando obcecado em jogar videogame com as crianças, depois que chego do trabalho. Eles estão cansados, mas eu continuo insistindo.
_Vamos lá, só mais uma partida, vai?
_Como você conseguiu fazer isso?
_Caramba! Faz esse golpe de chutar e soltar fogo de novo, mais devagar.
_Tem que apertar o quadrado ou o círculo?
Mas eles não me ensinam os macetes.
Um dia ainda vou ganhar de um deles.
Mas é preciso treinar muito.
Hoje quase empatei com a minha princesa, que tem quatro anos.

A melhor coisa de um MBA
É a pausa para o lanche.
Eles sempre oferecem lanchinho em MBA.
E todo mundo aproveita para ampliar a network.
Eu não levo a menor fé nessas técnicas de aproximação e troca de cartões em intervalo de MBA.
Fico perto dos malas que fumam, olhando saudoso para as pessoas que tragam cigarros, despreocupadas.
Aprendi com os beatnicks que não existem ex-viciados.
Sou só um fumante que abandonou o cigarro.

Achei uma pérola entre os porcos
Mas perdi de novo.
Agora, duvido que encontre novamente.

Santo de casa não faz milagre
Mas não diga isso para ninguém da família.

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Um tipo de mágica



Ela é a estrelinha da reunião de família. Com a ausência da prima, ela é a única menina entre tantos meninos. Ela tem quatro anos. Portanto, ela faz o que quer. E ela interrompe as conversas dos adultos e se aproxima para ser o centro das atenções.

_Tio, eu vou fazer uma mágica. Vou fazer o urso sumir – diz a minha filha, feliz da vida.
_Ah, não, eu du-vi-do – diz o meu irmão, pronto para entrar na brincadeira.

E com um cobertor de boneca ela esconde um urso de pelúcia pela metade.

_Abracadabra, pé-de-cabra, quando eu contar até três vou fazer esse urso sumir. Três - e com uma mandinga rápida, ela aponta para o teto e esconde o urso atrás das costas. Com a outra mão, balança o pequeno cobertor.
_Ué, cadê o urso? – brinca meu irmão.
_Ele sumiu, foi pro Japão – diz a menina.
_Traz ele de volta – pede o tio.
E ela balança a cabeça, negativa e poderosa. Ela faz isso uma porção de vezes.

_Eu também sou mágico, sabia? Sei ler pensamentos – afirma o tio. E com a mão espalmada, como se sentisse as vibrações cósmicas de emanações cerebrais, ele finge capturar pedaços de coisas pensadas.
_Eu estou lendo, oh, eu estou lendo... tudo o que você pensou hoje de manhã, bem cedo. Você acordou, tomou a mamadeira, hum, que gostosa essa mamadeira de leite, hum, você pensou. Hum, vou escovar os dentes, hum, que linda essa minha escova de dentes cor-de-rosa, você pensou. E depois você pensou em trocar de roupa e escolheu um... deixe eu olhar direito esse pensamento, você escolheu um... vestido, sim, eu posso ver, um vestido lindo.

Os olhos da minha menina brilham milhares de sorrisos. Ela se delicia. E está pronta para a próxima.

_Além de ler pensamentos, eu também sou mágico de fazer gente sumir e desaparecer. Quer ver? – pergunta o meu irmão.
_Ah, não – eu brinco. Nada de fazer gente sumir. A última vez que você fez isso, a tia É foi para os Estados Unidos. Está lá até hoje.
_É, é uma mágica forte. A Tia É aproveitou para ir visitar as irmãs, nos States. Às vezes as pessoas desaparecem para muito longe e não se consegue encontrar o caminho de volta. Por isso, é preciso coragem para brincar essa mágica. Se não tiver coragem, é muito arriscado. Pode ser perigoso. Você tem coragem? – ele pergunta para a minha filha.

E eu quase posso ver ela esconder os seus medos de criança, rapidamente. É valente, a minha filha. E também não quer ficar de fora dessa brincadeira. Ele faz como ela fez com o urso. O tio a coloca no colo e cobre a sua cabeça com o pequeno cobertor.
_Sinsalabim, hocus pocus, berimbau, berimbês! Faz essa menina desaparecer no três! Um, dois e três! – e puxou o cobertor de boneca, que era menor que um lenço.

Todos nós, na roda de adultos, arregalamos os olhos para a menina no colo do tio. Todos nós fingimos que ela havia desaparecido.

-Oh, ah, nossa! Cadê a princesa? Puxa vida, traz ela de volta! – e ela mal conseguia esconder a vontade de gargalhar, os olhos brilhantes percebendo que todos também fingiam e brincavam. Não tem coisa mais gostosa que brincar e ver os outros brincando com a gente.
_Hocus, pocus, John Travolta, ABC, traz a menina de volta, faz a menina aparecer! – meu irmão é muito ruim com rimas. Mas parece ser bom de mágica. Ele cobre a cabeça da minha filha com o cobertorzinho e o retira, apressado.
_Oh, ah, nossa! Onde você estava princesinha? – nós dizemos, admirados.
_Na praia, lá na casa do Sam – ela responde. E a casa fica lá na Bahia, em Lauro de Freitas, uma casa linda, na beira da praia. As pedras formam piscinas rasas, onde é possível passar a manhã inteira brincando de enfrentar o mar com areia. Bem que dá vontade de sumir para lá.

terça-feira, 14 de outubro de 2008

O coelho neurótico e atrasado de Lewis Caroll

O coelho neurótico de Alice está solto no mundo. Ele é rápido, esse coelho. E está sempre olhando o relógio. E está sempre atrasado. E ele sabe que as cabeças vão rolar.

Nesses dias de Crise, estou me sentindo como o coelho da Alice, atrasado e correndo o sério risco de perder a cabeça. Parece que um enorme relógio está pendurado no meu pescoço e eu não tenho como escapar de um destino chinfrim.

É preciso improvisar um bocado para que o tempo passe devagar. É preciso inventar uma série de artifícios para não deixar que o tédio e a rotina empastelem a minha vontade. Mas é inevitável.

Estou atrasado para o chá das cinco com o Chapeleiro Louco.

É preciso tirar o chapéu para o Chapeleiro. Ele é louco de dar nó. E começa a reunião das cinco. Mais cedo, é claro. A hora certa é um problema para o Chapeleiro. Ele é como eu. Acha que está sempre atrasado, mas é o único a chegar no horário.

Sou eu, esse coelho neurótico. Os olhos sempre vermelhos, de olhar para tela do computador. E sempre atrasado, ainda mais com essa droga de mudança automática de horário.

Que horas são? Toda hora me confundo. É impossível pensar direito com todas essas fagulhas de pensamento incendiando a minha cabeça a toda hora.

Eu penso.

É muito legal assimilar o jeito telegráfico de escrever.

Eu penso.

Mas é uma droga pensar desse jeito. Nada parece concatenado. É tudo uma sucessão de frases desconexas.


E aí o coelho some de mim mesmo.

Onde estará Alice?

Eu penso.

Por outro lado, pensar telegráfico dá aparência de sentido às mais sonoras bobagens.

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

O Careca treina para a Crise



Eu sempre chego atrasado aos grandes momentos da história. E sempre tomo prejuízo. Eu cheguei atrasado na revolução psicodélica. Peguei o Diretas Já no finalzinho. Não sabia de nada e mesmo assim quase levei porrada. Vi o muro cair de longe. E quando os cara-pintadas pintaram a cara eu já estava em outra. De agora em diante, estarei sempre de olho no relógio, não vou me atrasar mais. Só preciso comprar um relógio legal, o que pretendo fazer amanhã, logo que tiver um tempinho extra. Preciso achar um relógio que evite que eu marque bobeira. Que me dê uns eletrochoques de advertência, quando eu estiver próximo, quase na hora, de fazer uma besteira. Ou quando alguma coisa importante estiver acontecendo e eu não perceber.

Antes de começar mais uma “magical mistery tour” com vocês todos, ó minha Kombi de leitores, devo dizer que estou assustado. É verdade. Essa crise afeta o humor das pessoas. E dá medo.

Mas vamos começar pelas regras de segurança. Eu posso ver pelo retrovisor dessa Kombi que alguns de vocês ainda não apertaram o cinto de segurança. Eu também não. E isso não é desleixo. É só que não faz diferença. O mais extraordinário dos grandes momentos históricos é que você percebe que é um pontinho minúsculo de uma partícula ínfima de um trocinho infinitesimal.

A globalização é um troço complexo. Mas também é simples. É complexo se você acha que pode se dar bem de alguma maneira. Aí, veja bem, é super-complicado pra dedéu. Mas ao mesmo tempo é super-simples porque a possibilidade de se dar bem não existe.

Quando globalizaram essa coisa toda, certamente ninguém pensou em você. Por isso, se você espirrar, não acontece nada. Mas basta alguém lá na ponta do infinito dar um chute no bumbum incauto de um indiano, de um chinês, ou mesmo de um birmanês, que você, aqui, perderá o emprego. Entendeu?

Não entendeu? Eu vou tentar desenhar. Mas já adianto que não sei nada de economia, só entendo aritmética básica. Desse modo, vamos aos conceitos essenciais. A globalização é um concerto cruel de ocorrências fúnebres. Você só faz parte dela quando a barra pesa. Só te chamam na hora de dividir os prejuízos. Enquanto os suspeitos de sempre ganham rios e tubos, você amarga o desconforto de estar fora dessa onda. Quando a marola virar tsunami, tudo o que você poderá fazer será cavar um buraco na areia. Viu?

Outro conceito básico: não tendo como pagar, ninguém emprestará nenhuma grana para o spic latino. Ainda que os Ninjas – No income, no job, no assets - dos EUA tenham abandonado os treilers onde viviam e passado a habitar mansões milionárias tenho certeza de que não foi isso que provocou a débâcle dos últimos dias. Foi uma borboleta qualquer.

É, minha querida Kombi, estamos aqui, no meio do gigantesco cíclotrons da economia, esperando um choque de partículas que irá desintegrar anos de trabalho e a tranqüilidade das aposentadorias que não conseguimos garantir. Daqui a alguns anos, estaremos todos na praia, ralando, tentando arrumar algum para inteirar as meias pensões da terceira idade dos velhinhos de alguma parte de cima do Equador. Isso, se tivermos sorte.

Portanto, caros amigos, é melhor treinar desde já:
_Hei, Mister, do you want a hot-dog?

domingo, 12 de outubro de 2008

O glorioso Dia das Crianças

Massa ainda tem chances.
Quatro a zero na Venezuela.
Não choveu.
As crianças brincaram até cansar e dormiram cedo.
Foi um domingo super-legal.

O Guia do Careca para o bom mascador de chicletes

Tomei algumas decisões importantes. Agora só vou comprar chiclete de fita. Ainda preciso decidir o sabor mais adequado. Estou entre morango e uva. Hortelã já está descartado. Outro dia experimentei um muitcho bom, com um sabor meio picante, com o sugestivo nome de kriptonita. Até comentei com alguém. Mas acho que vou manter preferência pelos velhos e bons sabores tradicionais, por enquanto. O de morango é muito bom.

Definitivamente, uma das coisas mais importantes ao se mascar o chiclete de fita é não ceder à tentação de fazer uma bola. Ninguém precisa disso. Você não precisa mostrar para ninguém que é um expert em fazer bola de chiclete. E ninguém está a fim de ver uma bola de chiclete sair da boca de uma pessoa que deveria levar a vida mais a sério. Mesmo assim, se a vontade for irresistível, corra até o banheiro e sopre o chiclete até cansar. Mas não deixe ninguém ver você fazendo isso.

Existem maneiras boas e modos ruins de se mascar um chiclete. A melhor maneira é com a boca aberta, fazendo barulho. Entretanto, essa é uma maneira de mascar chiclete repudiada socialmente. Em geral, as pessoas não querem ver ninguém mascar chiclete. Aliás, as pessoas são tão egocêntricas que não querem ver ninguém, ponto. Eu mesmo sou assim. Especialmente quando estou mascando chiclete.

Mas isso varia, é muito particular. Em outra tendência, existe um grupo crescente de pessoas que gostam de se reunir para mascar chiclete em grupo. Elas trocam informações sobre diferentes chicletes. Importam chicletes. Compram caríssimos umidificadores de chicletes. Geladeiras especiais de chicletes. E também uma parafernália gigantesca para retirar chicletes das embalagens. Existem caixas lindas de madeira, em marchetaria feita com a mão-de-obra semi-escrava de virgens suecas contrabandeadas para Madagascar, que os experts em chicletes costumam acondicionar os melhores e mais caros exemplares de chicletes.

Uma mascada social pode ser perfeitamente realizada nos aposentos especialmente criados para isso. Embora eu mesmo não goste de entrar numa sala cheia de chicleteiros e chicletistas. Existem pessoas que só mascam chicletes nesses ambientes apropriados, embora eu considere todos os que já entrei deficientes em circulação de ar. Sei lá, o ar fica repleto de cheiros e sabores, não dá para curtir um bom chiclete desse jeito.

Mas, embora ninguém goste de ver alguém mascar um chiclete de boca aberta, o chiclete pode ser considerado um hábito social por excelência. Basta alguém perceber que você está com um tablete de chiclete de fita, daqueles de cinco chicletes, que nasce ali um filante interessado em bater papo sobre chicletes e outros hábitos. Tem gente que trata esses filantes como viciados que merecem a sarjeta onde chafurdam. Eu penso diferente. A vida está aí para ser vivida. E que mal pode fazer um chicletinho ou outro?

sábado, 11 de outubro de 2008

Uma pedalada bem estilosa

Eu e a Patroa tiramos o dia para curtir a meninada. E hoje de tarde, apesar de estar ventando um bocado, as crianças resolveram que seria divertido nadar. Então fomos para a casa dos avós e caímos na piscina. O primogênito estreou um calção branco, ficou bem bonitão. E a princesa arrasou Paris em chamas dentro de um maiô vermelho. Ela estava tão linda que eu lamentei não ter levado a câmara.

Fizemos um festival de pulos engraçados na piscina. Os dois com bóias de braço. E eu sem bóia. Devo ter pulado umas duzentas vezes. Mas a minha filha ganhou de mim. Ela pulava a cada segundo.

No meio de um desses pulos, resolvemos batizar os tombos n’água. Eu inventei o Pedalada de Robinho, um pulo que lembra o mortal carpado de uma gloriosa ginasta, só que sem nada fatal acoplado. Trata-se de um pulo que não deve ser repetido em piscinas rasas, pois consiste em cair de traseiro na água, simulando pedaladas. É difícil. Também inventei o meio mortal com água no ouvido, que eu intitulei de Casamento de Sandy. Consiste em simular uma topada numa pedra e cair de lado, com o ouvido atingindo a água antes de qualquer outra parte do corpo.

As crianças preferiram o Pedalada de Robinho. Mas só até eu inventar o Pedalada do Casamento de Sandy, uns cinco minutos depois. Esse pulo consiste em simular uma topada com o dedão do pé esquerdo numa pedra, em ficar pulando com um pé só na beirada da piscina e, de repente, desabar de lado, com o ouvido dentro dágua. Esqueci de dizer que também é necessário simular pedaladas com um só pé, ante de cair na piscina.

É difícil. É complexo. E as crianças adoraram. Quem disse que criança só gosta de coisa simples?

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Essa crise é fogo

É minha querida kombi, a Crise chegou para arrasar. Vou pensar com mais vagar sobre o que está acontecendo e depois volto para escrever.

Mas a situação me lembra o sujeito que entra no elevador lotado, olha pra você e diz:

_Olha, eu não acredito em nada que andam falando. Estou contigo e não abro. Você vai sair dessa. Mas você também precisa se ajudar um pouco, tá bom?!

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

O Careca confessa que mentiu



É verdade, minha querida Kombi de leitores. Eu menti. Ainda hoje eu estive no blog da Franka, cujo link pode ser visto à sua direita, se você for destro, e à sua direita, se você for sinistro, e foi lá que eu menti. A Franka contou uma história sobre guardas de trânsito e sinais quebrados e eu menti. Foi simples assim. Eu inventei, no comentário, que eu tenho uma máscara de zumbi com uma faca enfiada no crânio. E que eu uso essa máscara em todos os engarrafamentos, aqui, nessa bela cidade onde moro. E menti ainda ao afirmar que se todas as pessoas usassem máscaras, como eu, os engarrafamentos seriam tão divertidos que até os guardinhas de trânsito iriam sorrir. É mentira, isso.

Eu, você, a Franka e toda a minha Kombi de leitores sabemos que isso é mentira. Os guardinhas jamais sorririam de coisa alguma. Guarda sorridente não impõe respeito nem autoridade. E a minha máscara de zumbi esfaqueado no crânio não é muito engraçada. Está mais para feiosa. E eu não uso essa máscara em todos os engarrafamentos, só em alguns grandes e mais chatos, para espantar o tédio.

O resto é quase tudo verdade. Se as pessoas usassem máscaras e fizessem palhaçadas em engarrafamentos seria divertido, mas há sempre alguém querendo cortar o barato do outro. Talvez não desse muito certo.

Na verdade, essa coisa de máscara de zumbi começou por acaso, porque um dia a máscara simplesmente apareceu no carro. Ninguém nunca reclamou a máscara e , por usucapião mascaral, ela passou a pertencer exclusivamente a mim.

Uma vez, eu estava procurando um negócio que havia caído debaixo do banco, quando encontrei a máscara do zumbi. Gostei da máscara. Um crânio branquelo, com dois olhos gigantes saltados das órbitas, uma enorme falsa rachadura no crânio e ali, quase no topo, um cabo de faca de caça aparecendo sobre uma pequena pizza avermelhada. A máscara tem um cheiro fortíssimo de plástico. E também não dá para enxergar nada direito. Sempre que eu uso essa máscara, eu espirro feito um sujeito atacado por uma rinite aguda.

Naturalmente, eu jamais coloco essa máscara quando as crianças estão comigo, no carro. Em primeiro lugar, elas se assustariam. E, em segundo lugar, eles iriam querer usar a máscara. E eu não gosto muito de emprestar meus brinquedos. É terrível, eu sei, eu tenho um ciúme exagerado dos meus brinquedos, mas admito isso. Faço penitência por causa disso. Pago promessas. E já melhorei muito. De vez em quando empresto alguns dos meus brinquedos para os meus filhos, deixo a Patroa mexer em alguma coisa, mas não muito. Nos últimos dez anos, somando todos os esforços já feitos para superar esse meu ciúme exagerado dos meus brinquedos, eu devo ter melhorado uns dois por cento. O quê? Acha pouco? Foi uma melhora de duzentos por cento em relação a 1998. Mas estou entrando em processo digressivo. Freio de arrumação. Pausa.

....

Bom, onde estávamos? Sim, nas minhas mentiras. O que posso fazer? Não acredite em nenhuma delas. É o melhor conselho que eu posso dar.

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Quantas horas são no seu umbigo?




Antes da reunião de pais começar, na escola alternativa, eu vi um enorme desenho de um carro amarelo grudado numa parede. Foi reunião com as professoras da minha filha, de quatro anos. Já estou habituado às reuniões da escola alternativa.

Agora falo pouco. E também fico um pouco cansado de ouvir depoimentos emocionados. A gente se habitua com tudo e as coisas ficam sem-graça, por mais que você mantenha a mente aberta e o coração alerta.

Uma das professoras tem um prazer evidente em contar as descobertas de nossos filhos. Ela realmente se empolga.

Eu li o relatório das professoras antes de ir para a reunião. A minha menina adora desenhar. Ela desenha cabeças com olhos, nariz, boca, orelhas e cabelos. É uma coisa rara. E ela também gosta de desenhar mãos com dedos. E, de vez em quando, ela risca um risco reto, diz que aquilo é uma barriga e põe um pingo no meio.

_E isso aí é o quê? – eu pergunto.
_Umbigo, oras.
_Dá pra ver as horas no umbigo? Nossa! Quantas horas são no seu umbigo?
_Para, pai!
_No meu umbigo não dá para ver as horas. Aliás, eu nem consigo ver o meu umbigo. Mas agora já é tarde.

Ao final da reunião, somos todos levados para o gigantesco painel de obras de nossos filhos e filhas, no galpão da escola. E lá está o enorme carro amarelo. Na verdade, é uma moldura grande para a história coletiva inventada pela minha filha e seus colegas. “O passeio de carro do ciclo dois”. É uma aventura incrível. Tem seqüestro, tiro de arco e flecha, polícia, resgate e um lanche no final.

Tanta aventura assim é explicada pelo fato da sala da minha filha ter apenas duas meninas e treze meninos. E eu percebo os desenhos da minha filha em todas as folhas emolduradas do carro amarelo. As garatujas com cabelos, olhos, boca e nariz. Os cabelos arrepiados, elétricos. As mãos com dedos gordos, parecendo as luvas do Mickey.

Quando cheguei em casa, depois da reunião, os dois já estavam dormindo.

E agora estou me lembrando da história do umbigo de ver as horas. Lá na escola, dentro do carro amarelo, havia uma cabeça completa, um risco reto e uma bola grande, com risquinhos. Acho que era um umbigo despertador. Ou então era um piercing.

terça-feira, 7 de outubro de 2008

Parabéns, Mana!

Minha irmã foi promovida e estamos soltando foguetes em família. Essa minha irmã sempre foi meio gênia, até já apareceu na televisão. Era um concurso mirim de perguntas e respostas. Depois de uma maratona de perguntas durante um ou dois meses, minha irmã ganhou o troféu de prata. Segundo lugar, uma passagem para o Rio de Janeiro, com direito a visitar a Academia Brasileira de Letras e uma enciclopédia. O primeiro lugar era uma viagem para a Disney. Claro, muito mais educativa. Anos depois ela conheceria a Disney com os filhos. Depois voltou várias vezes para a Disney. Acho que nunca voltou para a Academia Brasileira de Letras, mas tem a enciclopédia até hoje.

Acho muito legal quando acontece essa coisa de reconhecimento de mérito. Quando alguém chega perto de você e fala, cúmplice: “Parabéns, você merece!”. E minha irmã, merece. Hoje eu queria muito ter estado com ela, mas coincidiu com outro evento em que a Patroa foi chamada a participar. Desse modo, fiquei em casa mesmo, porque ela mora um bocado longe daqui e ontem quase não dormi, porque veio um menino amigo do meu filho dormir aqui em casa que acabou que quase não dormiu.

Esse menino acordou às duas, às três e às três e vinte. Às quatro eu acertei o relógio com esse menino choramingando. Tentei ligar para o pai, mas acho que o telefone estava desligado. A Patroa tentou todas as táticas de sossega leão com o menino, mas ele estava decidido.

_Quero ir embora, estou com saudade do meu pai e da minha mãe – disse, resoluto. Ao mesmo tempo, ele procurava os tênis para calçar. Felizmente, a Patroa teve a presença de espírito de ligar o Cartoon Network. E o desenho animado ajudou a apaziguar os ânimos até às cinco e meia.

Por causa disso, as minhas olheiras hoje estavam me chegando aos joelhos. No trabalho, as pessoas foram super-solidárias.

_Bicho, a despeito do que andam dizendo por aí, estamos com você! – disse o Mr. Flowers.
_Careca, muita calma nessa hora, meu amigo! Levanta, sacode a poeira e roda o Chacrinha, benza Ó Pai! – disse o Engraçadinho do Cubículo.
_Careca, fica assim não, força, Careca, você vai superar essa! – disse, para minha surpresa, o C3PO. Esse sujeito lúgubre abandonou a impressora e veio cavar a minha tumba, eu pensei. Esse canibal quer roer o occipital da minha caveira, disse o meu sexto sentido dentro da minha meia. Esses caras todos querem me ver no paredón, Caracas!

Então? Pode-se observar pelo singelo exemplo apresentado, que o reconhecimento de mérito é mesmo algo raro. Por isso, fiquei contente quando alguns minutos mais tarde fiquei sabendo que minha irmã havia sido promovida. Imediatamente, tratei de dissipar aquele nevoeiro de falsa solidariedade que envolvia o meu cúbi (é o cúmulo chamar aquilo de uma palavra maior).
_Pípou – eu disse, com o melhor sotaque nordestino que consigo fazer. Pípou, obrigado por essa maravilhosa seção de mau-olhado. Desejo a vocês o dobro do que me desejaram agorinha mesmo, ó meus colegas de cubículo. E que seja eu o primeiro a chutar de bico, a canela do desgraçado de vós que desejou a minha queda nesse vale de lágrimas, nessa sarjeta de dramalhões mexicanos e brasiguaios. Tenho dito.
Parabéns, Mana!

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

De vez em quando



De vez em quando, tudo fica tão sem-graça que dá vontade de zapear personalidades.

A crise agora parece tão braba que a gente até acha bom não ter dinheiro.

Quando fico assim, gosto de inventar que eu deveria ter sido poeta.

As pessoas que fazem versos, em geral, se divertem com as palavras. Isso para mim é um problema. Eu, de vez em quando, levo as palavras a sério.

De vez em quando, o sentido remoto de um verso daquela poesia esquecida me assalta. Mas já é tarde, estou deitado, não vou levantar para escrever. E no dia seguinte, já me esqueci do verso e do seu significado.

Uma vez sonhei com um pedaço de verso que caía num rio, atrás da minha casa, na infância dos meus dias de encantamento. Era um verso bem bonito, daqueles que a gente guarda na cabeça para os dias frios. E também para esquentar noites geladas, janelas abertas ao vento. Mas o verso escorregou e caiu, coitado, dentro de um rio que um dia eu tive, que me lavava as entranhas. Alguém me falou – quem terá sido? - que esse rio dava a volta no mundo inteiro e que tudo trazia de volta. Esperei um bocado por aquele pedaço de verso, mas nada dessa volta ao mundo acabar. Ficava só olhando a curva do rio, onde acreditava ter visto um desfile de rimas e estrofes mais antigas.

Esperei, esperei, esperei. E nada do verso voltar. Tentei rimas pobres, rimas remediadas, rimas com casa própria, umas rimas sem-teto e até umas rimas assim, meio cambetas. Mas nada do verso voltar. Fiz outros versos mais compridos. Fiz declarações debaixo de chuva. Fiz um verso levado da breca, depois fiz outro, tímido, bem curto. Nenhum funcionou.

Decidi dar um tempo. Fiz outras coisas. Eu me convenci de que o verso havia passado quando eu estava olhando para o outro lado.

Fiz outras coisas mais. Esqueci uns encantamentos.

E um dia me dei conta, de que o verso que eu esperava ainda não passou, nem vai passar.

É que eu não sonho mais os versos da minha infância. É que eu esqueci um menino que se enredava com a curva de um rio. Sem esse poder, não há como o verso voltar.

Vou comprar um binóculo de olhar o passado. Com ele verei um futuro que nunca amanhecerá.

Vou comprar uma caneta que escreve presentes vivos, que mudam sempre. Um deles há de servir para quem me quer bem.

Vou comprar um papel de embrulhar amores. Guardarei numa gaveta forrada de vermelho, junto com aquele primeiro beijo.

De vez em quando, vou abrir a gaveta e olhar para aquele coração. Será o meu?

domingo, 5 de outubro de 2008

Três observações e mais respostas rápidas




Quando eu estou aqui, vivendo esse momento lindo
É mesmo lindo, mas fico pensando numa recauchutagem geral do repertório.

A noção perdida do ridículo
Já a encontrei as noções perdidas diversas vezes em auditórios, salões de baile, jantares oficiais e outras ocasiões paramentadas. Mas nunca encontrei a minha.

Uma coisa a melhorar
A minha lista de coisas a melhorar.

Qual é a hora da onça beber água?
Quando está com sede. Entre as refeições. Não sei. É melhor não estar perto.

Quando é que você paga mico?
Só tenho certeza quando me trazem o troco.

Há vida inteligente em Marte?
Tomara. Aqui já deu o que tinha que dar.

O que você faria com a sua última moeda?
Cara, eu gastaria. Coroa, eu gastaria. Em pé, eu gastaria.

Ainda sobre moedas. O que fazer com um porquinho cheio delas?
Estamos pensando há semanas, mas ainda não decidimos.

Qual é a sua definição de ócio?
Não perco tempo com isso, fico logo sem fazer nada.

Você pratica algum exercício?
Eu nado. Nadica de nada.

O que você recomenda para quem está perdendo cabelo?
Tenha fé.

O que você recomenda para quem já perdeu cabelo?
Tenha esperança.

O que você recomenda para quem insiste em falar de cabelo?
Tenha caridade.

E se a sua primeira namorada fosse um porquinho da índia?
Das duas uma: você é Manoel Bandeira ou zoófilo.

Qual é o melhor filme com o Paul Newman?
Gata em Teto de Zinco Quente - Cat on a Hot Tin Roof (1958)

sábado, 4 de outubro de 2008

Sobre monstros



Uma boa parte da minha vida eu tive medo de monstros. Não eram monstros à toa, desses de filme japonês. Meus monstros de infância eram monstros pessoas. Não eram mortos vivos comedores de cérebro, nem múmias, nem vampiros, nem frankensteins, nem lobisomens, nem nada que eu já tivesse visto em filmes, nos quadrinhos ou nas ilustrações dos livros.

Os monstros que me assombravam eram sempre pessoas comuns, um vizinho que eu achava assustador, uma balconista da padaria que uma vez me tratou muito mal. Quando se é menino, os monstros podem ser qualquer adulto misterioso e de aparência cruel que cruze o nosso caminho infantil. Mas os piores monstros são os outros meninos, os que são mais cruéis do que todos os outros meninos com quem você convive.

No meu tempo de menino, o mais cruel de todos os meninos se chamava Dídio, corruptela de Gígio, que vem de Gilberto. Era filho de um veterinário, um coroa legal. Tinha outros dois irmãos e uma irmã. O irmão mais novo, Alexandre, era gordinho, tinha o apelido de Pig e costumava andar mais comigo e os outros meninos com quem eu andava. Dídio era um pouco mais velho, adolescente de 13 anos. Era cruel conosco, os meninos que estavam na faixa dos dez anos.

Dídio era estupidamente forte para a idade. Era branquelo e sardento. Ruivo. Braços de Popeye. Tinha a agilidade dos lutadores de kung fu e era um especialista em humilhações públicas. Era um campeão em insultar quem quer ousasse dar a impressão de ter tido a intenção de desrespeitá-lo. Ninguém queria se meter com o Dídio. E isso era pior, pois ele precisava manter a fama de mau. Estava sempre nos desafiando. E os meninos, bobos como éramos, não conseguiam arrumar um jeito de desviar dos desafios lançados por ele.

O Dídio falava coisas assim:
_Duvido você conseguir ficar em um só pé, durante dez minutos, naquele canto de calçada.
E o menino bocó ia lá e ficava nove minutos e trinta segundo num pé só. Quando faltava apenas dez segundos o Dídio ia lá e passava uma rasteira no sujeito.

_Duvido alguém conseguir andar em cima daquela linha até o outro lado da rua.
E alguém ia andando até lá até perceber que o Dídio estava vindo atrás, correndo com uma mangueira de borracha girando como uma hélice de helicóptero. Vump, vump,vump.

_Podem vir dois disputar queda de braço comigo, um em cada braço, que eu ganho.
E dois aventureiros se apresentavam e o Dídio ganhava dos dois num piscar de olhos, quase quebrando os braços dos meninos.

Teve muitas antes dessa, mas essa marcou a meninada. Eu lembro de ouvir um braço estalar. Depois disso, nós ficamos mais espertos. Ninguém queria ser voluntário para os desafios do Dídio. Mas não durou uma semana.

_Meninos, façam fila para levar cascudo. Quem não entrar na fila vai ter que disputar queda-de-braço comigo.

Dídio foi um dos maiores monstros da minha infância. Outro dia vi um sujeito na rua, que só poderia ser ele. Sardento, branquelo, ruivo, braços de Popeye. Parecia normal, um cidadão comum. Rezei para que um cofre caísse sobre sua cabeça.

sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Estóico



Sempre tive, a minha vida inteira, vontade de ser mais estóico. De ter mais força de ânimo. De suportar, sem queixas, as coisas que é preciso suportar. De superar adversidades sem piscar os olhos, como se fosse a coisa mais normal do mundo. Sem soltar foguetes. Acho que é isso que admiramos nos heróis, desde crianças. A capacidade de suportar e superar, sem queixas, os piores obstáculos imagináveis. Eu admiro o estoicismo dos outros.

Aprendi sobre estoicismo há muito tempo, criança, lendo os livros de Monteiro Lobato. Para mim, os espartanos eram mais estóicos que os atenienses, embora não existam evidências históricas de que isso seja verdade. Seja como for, sempre imaginei os seres estóicos calçados com sandálias romanas. Mas isso é só uma digressão.

É pelo estoicismo que admiro os caras como o Muhamad Ali, Bruce Lee e o... sei lá, Batman. Nem mesmo Bruce Wayne seria um décimo do que é se ficasse o tempo inteiro lamentando as perdas provocadas pelo Coringa e outros agentes do mal. Ali não teria sido quem foi se não fizesse piadinhas mesmo debaixo de pancada braba. Acho até que foi por isso que escolheram Will Smith para interpretá-lo no cinema. Não podia ser só alto, bonitão e forte. Tinha que ser tudo isso, além de parecer inteligente e bem humorado. Vi um vídeo antigo do Ali no You Tube e fiquei impressionado. E o Bruce Lee? Pô, o cara era demais. E isso é um monte de digressão.

Ronaldo Fenômeno e Herbert Vianna são pessoas que eu admiro pelo estoicismo já demonstrado. Ambos superaram coisas terríveis e continuaram a fazer o que sempre fizeram. Estoicamente. E também com alegria.

Este é o ponto fundamental, que mina um pouco a minha vontade de ser estóico. Os estóicos, como você pode bem conferir no google, também são apontados como indiferentes, impassíveis, imperturbáveis e austeros. E convenhamos que nenhuma dessas características prima pelo bom humor. Aliás, eu acho que os estóicos nunca nem tiveram primas. E eu acho ótimo ter bom humor. Embora às vezes eu seja bem estóico em termos de humor.

Mas não dá para ser estóico em blog. Aliás, são muito raros os estóicos que escrevem. Em geral, as pessoas que ficam numa boa, sem reclamar ou sem achar as coisas boas ou ruins, não se dão ao trabalho de escrever. E os estóicos, puxa vida, ficam na deles. Via de regra, se um estóico se dá ao trabalho de escrever um blog, é coisa curta. Um estóico de verdade escreve pouco, sei lá, umas três, quatro linhas por dia. Aí, você vai olhar a frase e fica o resto do dia pensando nela.

“O que eu queria era fazer brinquedos com as palavras. Fazer coisas desúteis. O nada mesmo. Tudo que use o abandono por dentro e por fora.”

Manuel de Barros , In O livro sobre nada, Rio de Janeiro: Record, 3a. ed., 1997, p. 7

Manuel de Barros é estóico e tem bom humor. Os estóicos de bom humor são quase todos poetas. Mas poucos, muito poucos, são bons poetas como Manuel de Barros. E é verdade, fiquei muito tempo pensando nessas frases, estoicamente.

quinta-feira, 2 de outubro de 2008

Minha adesão ao Slow Movement

Às vezes, eu gostaria de respirar novos ares. De olhar para o horizonte e ver, lá longe, uma nesga de mar, uma montanha gelada, uma ponta de deserto. Outras vezes sou bem conformado com minha vista atual, as grandes árvores que vejo na entrada do parque da cidade.

É, também acho que às vezes eu reclamo de barriga cheia. Mas as reclamações costumam partir de quem está saciado, não é mesmo?

Plenamente consciente de que é preciso desacelerar, eu aderi de corpo e alma ao Slow Movement, uma iniciativa que deveria ter nascido na Bahia, mas teve preguiça. O Slow é uma variação de outros movimentos preguiçosos nascidos em décadas passadas, que também não vingaram porque dormiram no ponto. Tenho quase certeza de que essa nova tentativa também não vingará por falta de esforço dos integrantes do movimento, inclusive eu mesmo.

O princípio básico do Slow Movement é : faça devagar.
O segundo princípio do Slow Movement é: faça pouco.
O terceiro princípio do Slow Movement é: descanse.

Ninguém se lembra dos outros princípios. As pessoas do Slow Movement com quem eu conversei, antes de adquirir a minha camiseta Slow Movement, disseram ter preguiça de conversar sobre os princípios. Duas dessas pessoas reclamaram por eu ter puxado uma conversa que exige um mínimo de concentração e frases com verbos e predicados.

Uma delas só me respondeu com vogais:
_AaaooÔooõie.
Não consegui atribuir nenhum significado a essa expressão. E por causa da minha adesão ao Slow Movement estou escrevendo só meia lauda hoje, para dormir mais cedo.

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Respostas rápidas para perguntas capciosas

O que o gato não quer mais enterrar?
Não pergunte o que não quer escutar.

Qual é a melhor coisa para passar no pão com manteiga?
Nada. Pão com manteiga é um prato completo.

Quem você levaria para uma ilha deserta?
Uma Sexta-Feira.

Quem é o melhor amigo do homem?
Qualquer cachorro de rabo preso.

Quem é o melhor amigo da mulher?
Só pode estar brincando.

O que você faria se tivesse um milhão de dólares?
Perguntas.

Qual é a melhor posição para dormir?
Deitado. Sentado é uma alternativa. Nunca consegui dormir em pé.

Existem sonhos especiais?
Sim. Aqueles que a gente só lembra o início.

O que fazer quando não há nada para se fazer?
Você deve estar brincando.

Existe algum lugar seguro?
Sim, é claro. Mas ninguém sabe onde fica.

Anjos gostam de música de harpa?
Não existem anjos. Mas já existiram, antes de Stay, do U2.

Você faria parte de uma coisa chamada Slow Movement?
Sim, mas bem devagar.

Quem você esqueceria num bote em alto mar?
Uma Segunda-feira.

Qual é a melhor parte de um sorvete?
A parte que me cabe.

O que você deve fazer num elevador lotado?
O mínimo possível.

O que fazer com o dólar em queda? E com o dólar em alta? E com o dólar estável?
Pague, pague, pague. Dinheiro, no fim, só serve para pagar.

O que é capcioso?

Frase do dia